domingo, 27 de julho de 2014


A VELHA QUESTÃO PALESTINA HOJE


O NCPAM – Núcleo de Cultura Política da UFAM –, juntamente com o Projeto Jaraqui, que na próxima terça-feira (29), estarão reunidos com os representantes da comunidade Árabe do Amazonas para se definir estratégia de manifestação humanitária em favor desta Comunidade da Faixa de Gaza, visto que, até a presente hora cerca de 1.060 palestinos, a maioria civis, incluindo muitas crianças, foram mortos durante os 20 dias de conflito. Israel diz que 43 dos seus soldados morreram, assim como três civis mortos por mísseis e morteiros lançados do enclave no Mediterrâneo. A certeza é que o tema do Estado palestino voltou ao centro das preocupações mundiais, que as forças palestinas se fortalecem internamente e na solidariedade internacional e que o governo Obama terá que colocar o tema na sua agenda prioritária, como bem afirma o professor Emir Sader, especialista da matéria abaixo. O fato é que os esforços diplomáticos liderados pelo secretário de estado dos EUA, John Kerry, para acabar com o conflito de 20 dias, têm mostrado poucos sinais de progresso. Israel e Hamas estabeleceram condições que parecem inconciliáveis, sacrificando diretamente o povo Palestino. Por outro lado, o texto do professor Sade, embora seja datado de 2009 orienta-nos a entender e compreender a complexa matéria como tema recorrente na geopolítica mundial, principalmente após o fim da Guerra Fria e depois dos atentados de 11 de novembro, criminalizando diretamente todo e qualquer manifestação deste povo no cenário internacional. A reunião de pauta do Jaraqui está marcada para terça-feira (29), às 18h, na Splash, ao lado do Teatro Amazonas, no Centro Histórico de Manaus. A reunião é aberta aos convidados e demais militantes das causas humanitárias que acreditam na cultura de Paz.

EMIR SADER (*)

São Paulo, 20 de Março de 2009 - A questão palestina voltou a ocupar a atenção da opinião pública internacional, depois de aparentemente ter sido relegada a um segundo plano. Este aspecto talvez tenha sido um dos que fizeram com que Israel realizasse o ataque a Gaza a partir do fim de dezembro de 2008.

Israel contava com a unificação do país em torno de uma política agressiva contra os palestinos, com o apoio bipartidarista nos Estados Unidos, com a relativa marginalização da Palestina no marco de um mundo especialmente convulsionado entre conflitos bélicos e crise econômica global, assim como contava com a divisão dos palestinos entre o Hamas e o Fatah.

Parecia que todas as condições estavam dadas para o que os dirigentes israelenses - eles mesmos apontando diretamente para as eleições parlamentares algumas semanas depois do começo do ataque - chamavam de "mudança dos termos do problema", que consistiria na eliminação da capacidade do Hamas de continuar enviando foguetes contra território israelense, e ao mesmo tempo em castigar duramente a população de Gaza, na pretensão de que assim deixassem de apoiar o Hamas.

A frase atribuída a Tallerand foi plenamente confirmada pela ofensiva militar israelense: "Pode-se fazer tudo com as baionetas, menos se sentar em cima delas", isto é, a superioridade militar não garante automaticamente a vitória. Quanto mais afirmava sua superioridade militar, mais se configurava a derrota política de Israel.

Como consequência da brutal agressão militar a Gaza, o movimento de solidariedade com a Palestina voltou a ganhar repercussão internacional e Israel passou a sofrer novas e mais fundamentadas acusações de genocídio. A Autoridade Palestina se enfraqueceu ainda mais, ao mesmo tempo em que o prestígio do Hamas cresceu. O Egito foi obrigado a retroceder de sua posição de conivência com a invasão de Gaza, na tentativa de substituir o Hamas pelo Fatah, retomando o papel de mediador entre as forças palestinas pela reconstrução de um governo unitário.

No entanto, ninguém pode dizer que uma solução política que resolva de forma minimamente estável o problema palestino está mais próxima. Se Israel se enfraqueceu, se os palestinos retomaram seu processo unitário, se o governo de Barack Obama reafirmou que deseja a retomada de negociações de Israel com os palestinos - nem por isso as condições para a aplicação da Resolução das Nações Unidas que garante aos palestinos o direito a ter seu Estado parecem próximas.

Por que isso acontece? Que condições seriam necessárias para uma resolução da questão palestina que pudesse pacificar a região? Qual o caráter explosivo do conflito?

O primeiro dos fatores que explicam a natureza do conflito e a dificuldade de sua resolução está no caráter de aliado estratégico que Israel tem em relação aos Estados Unidos - a única superpotência. O peso do lobby judaico nos EUA garante que esse vínculo estratégico se mantenha ao longo das mudanças de governo. A Secretária de Estado, Hillary Clinton, mesmo na perspectiva de um governo israelense dirigido por um representante de um partido que não reconhece o direito ao Estado palestino, reafirmou que Israel terá sempre o apoio dos EUA, qualquer que seja seu governo.

Este elemento bastaria para explicar porque Israel conta com um imenso poderio bélico, sendo o país destinatário do maior auxilio militar norte-americano no mundo. Israel trata de fazer desta superioridade um fator de dissuasão contra os palestinos. É de conhecimento público que Israel possui armas nucleares e constantemente ameaça o Irã com ataques que destruiriam armas similares.

Além disso, Israel conta com apoio generalizado dos países europeus, seja por mecanismos de culpabilidade pelo nazismo, pelo peso da dependência europeia em relação aos EUA ou pelo alinhamento tradicional desses países contra o mundo árabe. Completa-se um amplo arco de alianças com que Israel pode contar, mesmo com as posições cada vez mais direitistas dos seus governos.

Por outro lado, os palestinos foram grandes vítimas do fim do mundo bipolar, com a desaparição da URSS, aliado que se contrapunha à ação norte-americana de apoio a Israel. Isto contribuiu a aprofundar sua orfandade política internacional. Ao contrário de Israel, não contam com nenhum apoio significativo interno nos EUA. Muito pelo contrário, especialmente depois dos atentados de 11 de setembro, passaram a ser diretamente criminalizados.

Além disso, a vitória do Hamas nas eleições de janeiro de 2006 - democráticas conforme atestaram todas as comissões internacionais de controle - não foi reconhecida pelos Estados Unidos, por Israel e pelos governos europeus, que suspenderam todo tipo de ajuda a uma região cercada e bloqueada militarmente pelo exército israelense, apoiando ao mesmo tempo os perdedores - o Fatah - e o reconhecendo como Autoridade Palestina. Assim, induziram a divisão entre os palestinos, o que os enfraquece nacional e internacionalmente.

A política de criminalização de forças políticas populares do governo Bush, mediante sua inclusão numa lista de supostos "movimentos terroristas", aceita pelos aliados dos EUA e difundida pela imprensa internacional como se fosse fundada na realidade e não apenas um ponto de vista particular do governo norte-americano, ajuda ao isolamento de movimentos como o Hamas.
O conjunto desses fatores permitiu o massacre de Gaza e permite o bloqueio das negociações de paz pelo cumprimento das resoluções das Nações Unidas, com o reconhecimento do direito de existência do Estado palestino.

Em que marco se situa hoje a questão palestina? Em um mundo sob hegemonia unipolar imperial dos EUA que, mesmo enfraquecida pelas dificuldades vividas no Iraque e no Afeganistão, se mantêm como a única superpotência política e militar. O mais paradoxal é que, especialmente no caso palestino, mas não apenas nele, os EUA são agentes das guerras - os epicentros das "guerras infinitas" de Bush.

Os EUA continuam a ser o único país que toma iniciativas nos conflitos internacionais. (A exceção é a América Latina que, por meio da Unasul e do Conselho Sul-americano de Defesa, tem desenvolvido intenso trabalho de intermediação para a resolução pacífica dos conflitos regionais.) O novo governo dos EUA pode representar tentativas de negociação de acordos de paz, porém suas limitações já estão claras: o surgimento de um governo abertamente direitista em Israel, liderado por um partido que nem sequer reconhece o direito à existência do Estado palestino; a reafirmação do apoio dos EUA a qualquer governo que tenha Israel; a negativa de reconhecimento do Hamas como interlocutor político. A isso se soma o antecedente dos acordos de Oslo, cujos objetivos não incluíam o Estado palestino, o que impede uma visão otimista sobre os acordos de paz atualmente.

No entanto, é preciso reconhecer que a heróica resistência da população de Gaza impôs uma derrota política a Israel, forçando o reconhecimento de vários países europeus de que é necessário incluir o Hamas nas negociações, que se isso não acontecer não terão nenhuma eficácia ou legitimidade. Ao mesmo tempo, foram retomadas no Cairo as negociações para a reunificação dos palestinos em torno de um governo comum e a convocação de eleições gerais. Por outro lado, Israel votou por um bloco de força direitista, que não facilita o apoio internacional ao novo primeiro ministro, enquanto tem que se convencer que a superioridade militar não lhes possibilita impor vitórias políticas e que perderam a batalha na opinião pública em torno da ofensiva contra Gaza, reconhecida mundialmente como um impiedoso massacre.

A certeza é que o tema do Estado palestino voltou ao centro das preocupações mundiais, que as forças palestinas se fortalecem internamente e na solidariedade internacional e que o governo Obama terá que colocar o tema na sua agenda prioritária. O ataque a Gaza fecha um período de relativo isolamento do tema palestino e reabre nova fase na luta pelo reconhecimento do direito dos palestinos de disporem de um Estado soberano.

(*) É Formado em Filosofia pela Universidade de São Paulo, é cientista político e professor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP). Secretário-executivo do Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais (Clacso) e coordenador-geral do Laboratório de Políticas Públicas da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj). Coordena a coleção Paulicéia, publicada pela Boitempo, e é um dos organizadores da Latinoamericana - Enciclopédia contemporânea da América Latina e do Caribe (São Paulo, Boitempo, 2006), vencedora do 49 Prêmio Jabuti, na categoria Livro de não-ficção. Tem publicados pela Boitempo os livros: A Vingança da História Poder, Cadê o Poder? - Ensaios para uma Nova Esquerda e A Nova Toupeira, os Caminhos da Esquerda Latino-americana (2009))
Fonte: http://www.boitempoeditorial.com.br/v3/news/view/600
A BAIXARIA ISRAELENSE


O mínimo que Israel deve ao Brasil é um pedido formal de desculpas por ter o porta-voz da sua chancelaria, Yigal Palmor, cometido a grosseria de chamar o País de "anão diplomático" e "parceiro diplomático irrelevante" - além de fazer uma alusão que imaginava ferina à goleada de 7 a 1 sofrida pela seleção brasileira na Copa. A baixaria se seguiu à decisão de Brasília de chamar "para consultas" o embaixador em Tel-Aviv, Henrique Pinto, para marcar seu protesto pelos indiscriminados ataques israelenses à Faixa de Gaza, que já deixaram cerca de 800 mortos e mais de 4.700 feridos, a grande maioria civis. Nem uma escola da ONU que servia de abrigo escapou.

Além da convocação do embaixador, um gesto de forte repercussão em relações bilaterais, superado apenas pela retirada do representante, o Itamaraty externou ao chefe da representação israelense, Rafael Eldad, sua condenação à "desproporção" dos revides ao disparo de mísseis do movimento radical Hamas, que controla o território. Os lançamentos já passam de 2 mil. Um deles caiu a pouca distância do aeroporto de Tel-Aviv, levando companhias estrangeiras a suspender os voos para o país. Além dos intensos bombardeios a Gaza, as forças israelenses invadiram a área, alegadamente para localizar e destruir os túneis utilizados pelo Hamas para transportar munições. Mais de 30 soldados foram mortos. A macabra contabilidade, porém, é de que, para cada vida israelense perdida, os palestinos perdem 25.

Na sua primeira manifestação sobre o conflito, semana passada, uma nota convencional do governo brasileiro instou as partes a cessar as hostilidades e buscar o caminho do diálogo. No mesmo dia, a presidente Dilma Rousseff considerou "lamentável" o acirramento da violência, sem distinguir seus causadores. Já na quarta-feira, além de chamar o embaixador do Brasil e reclamar com o seu colega israelense, o Planalto emitiu outra nota - dessa vez de dura condenação a Israel, sem citar as ações do Hamas. Pouco antes, a delegação brasileira no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas votou a favor da abertura de uma investigação sobre eventuais "crimes de guerra" e violação do direito internacional durante a ofensiva israelense. A resolução foi aprovada. Por fim, o desastrado assessor de Relações Internacionais do Planalto, Marco Aurélio Garcia, equiparou os "massacres" israelenses a um "genocídio".

Pode-se especular até o fim das matanças no Oriente Médio o que terá levado um governo praticamente quedo e mudo nos últimos quatro anos diante de crises internacionais a se manifestar de forma tão estridente no caso de Gaza. A rigor, pouco importa: a guinada brasileira, que surpreendeu os próprios protagonistas de mais este ciclo de agressões e revides - cuja origem, descontados os incidentes que os precederam, parece ser a reconciliação da Autoridade Palestina do moderado Mahmoud Abbas com o Hamas do intratável Kaled Meshal -, mereceria de Israel um silêncio glacial ou uma resposta diplomática, nunca um destampatório que deixa à mostra sua prepotência. Deu a impressão de que o caudilho Hugo Chávez reencarnou em Jerusalém.

A política externa brasileira raramente é criticada - muito menos nesses termos - por autoridades estrangeiras, ainda quando a considerem um despropósito, como a tentativa do então presidente Lula de se intrometer na pendenga entre Washington e Teerã sobre o programa nuclear iraniano. A última vez que um país com o qual se mantinha relações destratou o Brasil foi em 1947, no começo da guerra fria, quando o jornal oficial do regime soviético, o Pravda, afirmou que os generais brasileiros, entre eles o à época presidente Eurico Gaspar Dutra, conquistaram as suas medalhas não nos campos de batalha, mas nos cafezais. A reação imediata do governo foi romper todos os vínculos com a URSS.

É inconcebível, obviamente, repetir a dose. Basta a elegância do chanceler Luiz Alberto Figueiredo ao lembrar que o "anão" é um dos 11 países que se relacionam com todos os membros da ONU - e "não usa termos que desqualifiquem governos de países amigos".


Fonte: http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,a-baixaria-israelense-imp-,1534349