terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Capitalismo de Estado patrimonialista

Não há como bem governar com o Estado disfuncional. A primeira tarefa de quem pretende fazer um bom governo será a de reconstruir o Estado. No lugar de insistir numa reforma de cima para baixo, de comando e controle, deveríamos experimentar a descentralização. Deveríamos voltar à federação, dar autonomia aos Estados e aos municípios em todas suas esferas, desde a fiscal, até a segurança, a saúde e a educação.

André Lara Resende (*)

O sentimento em relação ao Brasil no exterior mudou em 2013. O otimismo no País já vinha em queda há algum tempo, mas a percepção externa parece ter finalmente alcançado - e até mesmo ultrapassado - o recente desalento doméstico. A evidente deterioração da situação fiscal brasileira - apesar do uso de todo tipo de manobras contábeis para impedir que a extensão da piora fique clara - é o fator mais preocupante para analistas e investidores estrangeiros. A queda do superávit primário se refletiu num aumento do prêmio de risco, medido pelo seguro financeiro contra a probabilidade de calote - os chamados CDS - da dívida brasileira.
A alta do prêmio de risco, se entendido como a probabilidade de o país vir a ter problema de solvência com sua dívida pública, como ocorreu no passado recente, parece-me despropositado. A dívida em moeda estrangeira, especialmente a dívida pública, é pequena, não passa de 5% do PIB. Mesmo a dívida bruta total, que os truques contábeis têm menos capacidade de maquiar, está entorno de 60% do PIB. É alta, mas está longe de ser preocupante. O prêmio de risco reflete um desconforto mais difuso sobre o futuro do país. Os problemas são muitos, a grande maioria deles não é nova, mas há uma dimensão especialmente grave no atual quadro brasileiro: um Estado despreparado, patrimonialista, com objetivos próprios, dissociados da sociedade.
Desde a estabilidade monetária, o país vinha fazendo avanços sistemáticos na ordenação das finanças públicas. A carga fiscal passou de 25% para 36% do PIB e a dívida pública estava em queda. O processo foi revertido a partir de 2008. É preocupante, mas o problema do Estado brasileiro, hoje, não é de solvência, nem de descontrole macroeconômico, que poderia ser revertido, mas o fato de atuar contra a sociedade, a favor de seus interesses próprios. O custo do Estado está hoje perto de 40% da renda anual, equivalente aos mais altos do mundo, mas seu desempenho é abaixo da crítica.
O papel do Estado sempre foi um tema polêmico. Durante o século 20, tomou contornos ideológicos tão demarcados que praticamente inviabilizou o debate sereno e reacional. Parece inevitável que sociedades maiores e mais complexas sejam mais difíceis de ser administradas, exijam mais das empresas, das instituições e também do Estado. Há uma inexorável correlação entre tamanho e complexidades em toda empreitada humana. O mundo está superpovoado e definitivamente interligado pelo avanço das comunicações e da informática. A questão da escala e da complexidade está em toda parte, mas é ainda mais grave onde é menos reconhecido: na esfera da vida pública. As sociedades modernas se sofisticaram, tornaram-se mais complexas. O Estado foi obrigado a crescer para atender às suas novas funções.
Em livro de 2011, Vito Tanzii faz uma isenta e ponderada análise do inexorável avanço do Estado sobre todas as esferas da vida. O peso do Estado cresceu sistematicamente em toda parte do mundo. A proporção da renda extraída da sociedade pelo Estado, que era geralmente inferior a 10% no início do século 20, dobrou lá pela metade do século, até atingir mais de 40%, neste início de século 21. O avanço foi sistemático, sobretudo a partir da década de 30.
Quando se exige mais do Estado, é razoável que o seu custo suba, mas espera-se que haja alguma correlação entre o custo e o serviço prestado, entre o custo e a qualidade do Estado. Não foi o que ocorreu no Brasil. Ao contrário, a rápida elevação recente da fatia da renda extraída da sociedade não foi acompanhada pelo investimento em infraestrutura. Houve séria deterioração da segurança pública e um dramático aumento da criminalidade. Não houve melhora digna de nota nem na educação, nem na saúde. O saneamento e o transporte público continuam abaixo da crítica.
Notícias recentes indicam que mais de 20% das pessoas - até 50% em alguns Estados - dizem terem sido vítimas de assaltos nos últimos doze meses. O nível de compreensão da língua e da matemática dos alunos brasileiros, segundo resultados recém-divulgados do PISA, exame de avaliação internacional de estudantes conduzido pela OCDE, é deplorável. O Brasil continua entre os últimos colocados, junto com a Albânia, a Tunísia e a Jordânia, muito abaixo do Chile e do México.
O World Economic Forum publica anualmente um índice global de competitividade. O Brasil caiu para o 56.º lugar este ano. Ocupa o 80.º lugar em relação ao funcionamento das instituições e a 124.ª posição em relação à eficiência do governo. A educação está na 121.ª posição e a confiança nos políticos, na 136.ª. Os bolsões de excelência tecnológica e a qualidade do empresariado ocupam a 36.ª e a 39.ª posições. As estatísticas e os rankings apenas confirmam uma realidade perceptível a olho nu: o Estado brasileiro não está à altura do estágio de desenvolvimento do País.
A herança patrimonialista, misturada aos desafios de um país grande e desigual, a meio caminho para o mundo desenvolvido, criou um Estado caro, ineficiente e, sobretudo, disfuncional. Um Estado cujo único objetivo é viabilizar a expansão de seu poder e de suas áreas de influência. Um Estado que cria uma regulamentação kafkiana, com exigências burocráticas cartoriais absurdas, cujo resultado é aumentar custos, reduzir a produtividade e complicar todas as esferas da vida. O patrimonialismo do Estado brasileiro, sua incapacidade de respeitar os limites e os deveres em relação à sociedade, tem longa tradição, mas toma novos contornos com a sofisticação da economia, com a chegada do País à sociedade do espetáculo e à democracia de massas. O uso e o abuso das técnicas publicitárias, a criação de dificuldades de toda ordem para a venda de facilidades, a simbiose com cultura dos direitos especiais adquiridos e a aliança com grupos econômicos selecionados são a nova face do velho patrimonialismo.
Crítica. Diante da polarização do debate, a crítica ao patrimonialismo do Estado tende a ser desqualificada como uma reação conservadora aos avanços da cidadania. Cada uma das dimensões do progresso da cidadania - a civil, a política e a social - enfrentou, a seu tempo, fortes reações ideológicas. O século 18 foi palco da luta pela cidadania civil, pelos direitos de opinião, de expressão e à justiça. No século 19, avançaram os aspectos políticos da cidadania, o direito ao voto e de participação política. Finalmente, no século 20, sobretudo a partir da década de 30, houve o avanço da dimensão social, com a criação dos sistemas de assistência e previdência, de educação e de saúde pública, capazes de garantir um padrão de vida mínimo para o exercício das demais dimensões da cidadania.
Adotado depois da grande crise do capitalismo do início dos anos 30 do século 20, o Estado Assistencialista foi uma forma de aliviar as pressões sociais e o apelo do comunismo marxista, mas nunca deixou de enfrentar resistência. Resistência que encontrou na teoria econômica um poderoso aliado. A economia sempre teve um de seus pilares na tese de que os mercados competitivos tendem ao equilíbrio eficiente. O mercado competitivo é uma construção intelectual, uma referência importante para a alocação eficiente de recursos, mas a polarização ideológica levou a uma inferência indevida: a de que toda interferência governamental sobre o livre mercado seria contraproducente.
Com a vitória incontestável dos direitos sociais, a teoria econômica paga até hoje o preço político de ser percebida como intrinsecamente conservadora. Toda crítica à falta de critérios e à ineficiência do gasto público, sobretudo se embalado como gasto social, é tachada de reacionária e desconsiderada. No Brasil de hoje, o velho patrimonialismo do Estado se esconde por trás do assistencialismo. O patrimonialismo indefensável reveste-se de assistencialismo inatacável. Desde que sob o guarda-chuva de gasto social, toda sorte de abuso patrimonialista não admite questionamento.
A divisão do trabalho, o comércio internacional e os mercados são poderosos estímulos à criação de riqueza, mas dependem de leis, instituições e do Estado inteligentemente organizado. A complexidade do mundo contemporâneo exige do Estado ainda mais do que suas funções clássicas. As modernas sociedades democráticas requerem, necessariamente, algum tipo de assistencialismo distributivista, o que exige a coordenação do Estado. O desafio é ter um Estado competente, que contribua para uma sociedade melhor e cujos serviços justifiquem seu custo.
Um seminário recente, em Viena, em homenagem a Peter Drucker, reuniu expoentes da administração para discutir o tema da complexidade no mundo contemporâneo. Concordaram que a gestão dos negócios está mais complicada do que jamais foi e que a capacidade de lidar com a complexidade é prioridade na agenda dos empresários. Como em todas as outras esferas da vida contemporânea, os homens de negócios são confrontados com muito mais de tudo a todo tempo.
Duas linhas alternativas de interpretação se delinearam. A primeira é de que é preciso simplificar, concentrar em alguns poucos objetivos, dar às empresas um foco e uma direção para os que nela trabalham, ainda que por imposição, de cima para baixo. A segunda interpretação sustenta que a maior complexidade é apenas uma nova ordem, que exige a revisão do modo de se administrar. A revolução das comunicações e da informática tornou obsoleta a administração linear, de comando e controle, que deve ser substituída por uma nova, baseada em redes espontâneas de módulos autônomos. O mundo contemporâneo é não linear e as empresas, assim como as demais instituições, ainda não se adaptaram a essa não linearidade. O caminho a ser seguido é reconhecer a nova ordem e não insistir na tradicional gestão de comando e controle, pois é a imposição de um estilo anacrônico de gestão que é contraproducente na complexidade contemporânea.
As duas interpretações exprimem as alternativas para se lidar com a complexidade contemporânea, não apenas na vida empresarial, mas também na vida pública. A opção por simplificar, ainda que de cima para baixo, por concentrar em alguns objetivos claros e dar uma direção para o país, tem enorme apelo diante das dificuldades da democracia representativa. O encanto provocado pelo novo capitalismo de estado chinês é exemplo do apelo da simplificação autoritária. Como demonstrou a experiência soviética, é sempre possível acelerar o crescimento por meio da mobilização centralizada de poupança e do investimento estatal, com base em grandes planos, formulados a partir de um "projeto nacional" definido pelo Estado. A estratégia demonstrou ser bem-sucedida para as economias de baixa renda, onde as taxas de poupança e investimento são limitadas pelas necessidades básicas de consumo. Enquanto se percorre caminhos tecnológicos conhecidos, é possível acelerar autoritariamente o crescimento, mas quando a economia se aproxima da fronteira tecnológica, a estratégia do planejamento estatal deixa de obter resultados.
Tendo aprendido as lições do fracasso do planejamento central soviético, o capitalismo de estado chinês compreendeu que não poderia prescindir dos mercados. Usa as companhias estatais para garantir investimentos nos setores considerados estratégicos e utiliza empresas privadas escolhidas para dominar os mercados. Os resultados foram extraordinários, mas as tensões e desafios têm aumentado. Embora a China tenha dado sinais de que pode vir a aumentar o papel dos mercados, é pouco provável que a flexibilização mude a essência do modelo. Seu objetivo é manter o poder político concentrado na mão do Estado e a maximizar a probabilidade de perpetuação do governo.
Há uma diferença fundamental entre o Brasil e a China. A China tem uma tradição milenar de autoritarismo burocrático competente. O custo do Estado é menos de 30% renda e está em queda. Já a participação do Estado no investimento, na chamada formação bruta de capital fixo, é de 21% do PIB. Ou seja, só o investimento direto do Estado chinês é uma proporção maior da renda nacional do que todo o investimento brasileiro, público, privado e estrangeiro, que não chega a 19% do PIB. Na China, o Estado é competente, custa pouco e investe muito. No Brasil, o Estado é caro e incompetente, não investe, nem cumpre suas funções básicas.
É questionável se o investimento estatal direto ainda seria capaz de fazer a diferença e acelerar o crescimento no Brasil. O modelo foi adotado por aqui durante o regime militar. Depois de reformas modernizadoras, inteligentemente concebidas e adotadas com competência, as taxas de crescimento atingiram níveis de até dois dígitos, durante o chamado "milagre econômico", da primeira metade da década de 70. O seu esgotamento, a partir da década de 80, deixou um triste legado: o Estado deficitário e endividado, as empresas estatais esclerosadas e duas décadas de estagnação sob o signo da inflação crônica.
Modelo. Na última década, o Brasil se beneficiou do ganho nas relações de troca com o exterior. A alta dos preços dos produtos primários, provocada pela demanda da China, significou uma expressiva transferência de renda para o Brasil. Os governos do PT foram suficientemente inteligentes para manter as bases da política macroeconômica, mas passaram a desmontar as reformas que viabilizaram a estabilidade monetária. O processo se acelerou a partir da crise de 2008. Aparelharam o Estado, criaram novas estatais e elegeram parceiros privados incompetentes. Com a desculpa de praticar uma politica anticíclica, expandiram o gasto corrente do governo, mas não investiram em infraestrutura. O resultado é conhecido: baixa produtividade, uma economia que não cresce e contas públicas que se deterioram.
Não é possível saber se o capitalismo de estado chinês continuará bem-sucedido, mas uma coisa é certa: o capitalismo chinês requer um Estado competente e autoritário. No Brasil, não temos a requerida competência, nem desejamos - quero crer - o autoritarismo. Diante da complexidade do mundo contemporâneo, a tentação da solução autoritária estará sempre presente, mas o caminho mais promissor é o da alternativa delineada na conferência de Viena: não insistir na tradicional gestão centralizada, de comando e controle, mas avançar na descentralização. Um Estado autoritário e patrimonialista, sustentado pela demagogia, o marketing e a intimidação, onde apenas as aparências democráticas são respeitadas, é o caminho mais rápido para volta ao subdesenvolvimento. A fórmula, como demonstra sua aplicação na Argentina e em outros países vizinhos, é devastadora.
Não há como bem governar com o Estado disfuncional. A primeira tarefa de quem pretende fazer um bom governo será a de reconstruir o Estado. No lugar de insistir numa reforma de cima para baixo, de comando e controle, deveríamos experimentar a descentralização. Deveríamos voltar à federação, dar autonomia aos Estados e aos municípios em todas suas esferas, desde a fiscal, até a segurança, a saúde e a educação. Como escreveu Hirschman, no prefácio da edição alemã do seu Exit, Voice and Loyality: "Assim como os economistas, com a ênfase nas virtudes da competição (i.e. da 'saída'), não deram atenção à contribuição da 'voz', os cientistas políticos, com seu interesse na participação política e no protesto, negligenciaram o possível papel da 'saída' na análise do comportamento político." Tenho a impressão de que mais possibilidade da opção de "saída" em relação à "voz", isto é, de ter a opção de se mudar ao invés de protestar, é mais importante do que nunca, num mundo complexo e interligado.
Os mercados não são milagrosos, mas um pouco de competição no sistema político, sob o guarda-chuva de uma verdadeira federação, pode ser a única forma de viabilizar a complexidade contemporânea com a democracia e a existência de Estados eficientes e com mais respeito pelos contribuintes.
 (*) Economista e ex-presidente do BNDES.

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013


A RECEITA DO JARAQUI É: POLÍTICA COMO PARTICIPAÇÃO E A CULTURA COMO PROCESSO

O ano de 2013 chega ao fim e o Projeto Jaraqui convida a todos (as) que participaram dessa Tribuna Popular armada todos os sábados das 10 às 12h, na República Livre do Pina, a explodirem de alegria e solidariedade, renovando seus votos de compromisso pela luta social, transparência e respeito aos valores republicanos. O Encontro está marcado para o próximo sábado (28).

O Jaraqui representado por seus militantes, em parceria com os Amigos do Som do Jangadeiro, sob a batuta do maestro Mario Lino, fará no próximo sábado na Praça da Polícia um Banquete Cultural temperado com muita Política, onde o dito é participar com intensidade dos debates, com muita alegria orientada pelo saber e estratégia.

Política e Cultura é a pauta, com a sua presença, o Banquete será completo. Pois temos a participação dos Amigos do Som, de artistas, poetas e produtores culturais convidados mais ainda: formuladores de políticas públicas, parlamentares, lideranças sociais e militantes dos movimentos populares, entre outros. Para alguns, a festa é da cidadania, para outros nunca é tarde para se celebrar a Democracia e o seu canto de liberdade, lutando pela limpeza ética na política, pela criminalização dos partidos e pelo respeito à vontade popular como instrumento de controle constitucional, fazendo valer a vontade do povo contra o blábláblá dos políticos profissionais.  

Na dúvida é melhor conferir, antes que os fatos atropelem você tomando de assalto seus direitos fundamentais. Venha e participe conosco dessa nossa alegria, confirmando sua participação.


“A PROPAGANDA É A ALMA DO NEGÓCIO”, EIS A RAZÃO DO SUCESSO DE OMAR AZIZ



O corresponde da Folha de S. Paulo em Manaus, Lucas Reis desvendou o “mistério” que rondava o Palácio da Compensa quanto à popularidade do governador do Amazonas Omar Aziz (PSD).  Pesquisa CNI/IBOPE mostrou que 74% dos amazonenses consideram o seu governo ótimo ou bom. Aziz também lidera em confiança do público com 75%. Segundo a Folha, o governo do Amazonas investiu 82 milhões em propaganda em 2012, superando investimento de apoio à pesquisa e ao meio ambiente.

LUCAS REIS
DE MANAUS

Uma gestão de poucos conflitos e gastos altos em publicidade rendeu a Omar Aziz (PSD-AM) o posto de governador mais popular do país. Pesquisa CNI/Ibope divulgada neste mês mostrou que 74% dos amazonenses consideram o seu governo ótimo ou bom. Aziz também lidera em confiança do público: 75%.

Ficou à frente de colegas como o presidenciável Eduardo Campos (PSB-PE), segundo mais bem avaliado com 58% de ótimo/bom, e o tucano Geraldo Alckmin (PSDB-SP), que, com 31%, é o 14º.

Se nos bastidores o resultado foi uma surpresa para o próprio governo  –que classificou o levantamento como um "presente de Natal"–, analistas e políticos locais acreditam ter a receita dessa popularidade.

Para o antropólogo Ademir Ramos, que integra o núcleo de cultura política da Ufam (Universidade Federal do Amazonas), Aziz colhe os frutos dos investimentos que fez em publicidade. A gestão gastou, por exemplo, R$ 82 milhões em propaganda em 2012 (valor inclui pessoal da pasta e é quase o dobro gasto no vizinho Pará, de economia de porte semelhante). Supera os investimentos em apoio à pesquisa (R$ 70,5 milhões) ou em órgão ambiental (R$ 22,2 milhões).

As inserções, produções de alta qualidade, costumam ocupar horário nobre. "O Estado é muito grande, e rádio e TV são os principais canais com a população", justifica a secretária de Comunicação de Aziz, Lúcia Gama. Entre os temas da publicidade, há áreas em que o governo ainda patina, como segurança (homicídios dolosos avançaram 10% desde 2010), e obras por fazer, como a cidade universitária.

"O governo tem usado propaganda como meio de campanha antecipada: o que tem feito e o que ainda será", avalia Tiago Jacaúna, professor de ciências sociais na Ufam. Quem também trabalha pela imagem do governo é a primeira-dama Nejmi Aziz, presidente do PSD local. Presença constante em ações assistenciais e em colunas sociais, ela mantém uma equipe só para redes sociais.

O perfil mais conciliador rende dividendos políticos ao governador, que era vice, assumiu em 2010 após a renúncia do hoje senador Eduardo Braga (PMDB) e foi reeleito em primeiro turno. "Ele tem carisma. É um homem de poucos atritos", reconhece o deputado estadual Marcelo Ramos (PSB), opositor ferrenho de Aziz.

A boa costura política se reflete no cenário da sucessão – o governador é próximo dos três pré-candidatos mais fortes: o antecessor Braga, o atual vice, José Melo (Pros), e a deputada federal Rebecca Garcia (PP).

"Aziz não tem escândalo na gestão e deverá ser o fiel da balança na eleição", diz o líder do governo no Legislativo, Sinésio Campos (PT). Filho de pai palestino e mãe brasileira, Aziz, 55, nasceu em Garça (SP). Morou no Peru na infância e mudou-se, ainda adolescente, com a família para Manaus, em 1971.  

Formou-se engenheiro civil e entrou na política em 1987 pelas mãos do ex-governador Amazonino Mendes (PDT), que o indicou para uma fundação. A sua carreira incluiu cargos como vereador, deputado estadual, vice-prefeito de Manaus e secretário de Segurança do Amazonas. Para Ramos, da Ufam, o governador ainda busca uma identidade para a sua gestão. Outro desafio é deixar para trás a sombra de Eduardo Braga, hoje líder do governo no Senado, e polêmicas do passado.

Em 2004, já como vice-governador, Aziz foi investigado em CPI no Congresso por suspeita de ter feito programa com uma menina de 15 anos no ano anterior. Teve o nome retirado do relatório final em votação apertada: 8 a 7. Aziz nega as suspeitas. 

Eleito pelo PMN, o governador se filiou ao PSD em abril de 2011, convencido pelo ex-prefeito Gilberto Kassab, e ganhou a presidência da legenda no Amazonas.

domingo, 22 de dezembro de 2013

O PNE e a lista de Papai Noel
Depois de uma acirrada polêmica entre as lideranças do PT e do PSDB, sobre o limite dos investimentos públicos em todos os ciclos de ensino, o Senado aprovou o Plano Nacional de Educação (PNE). O projeto, que fixa 21 metas e 177 estratégias para o setor no período de 2011 a 2020, foi enviado pelo Executivo no último ano do governo Lula e sua votação já deveria ter sido concluída há mais de dois anos. A Câmara aprovou o texto original sem grandes mudanças, mas o Senado o alterou substancialmente, para atender a interesses paroquiais e corporativos e, por pressões governistas, para adequá-lo às conveniências eleitorais da presidente Dilma Rousseff, que disputará a reeleição em 2014.
O ponto mais importante do PNE é de caráter financeiro. O projeto prevê um aumento progressivo do investimento público na educação, até atingir o patamar de 10% do Produto Interno Bruto, em 2020. Entre as fontes de financiamento, a oposição propôs a inclusão de parte dos bônus de assinatura dos contratos de partilha de produção de petróleo e de parte dos recursos destinados à exploração mineral. Mas a proposta foi rejeitada, definindo-se que o PNE receberá 75% das receitas da União com petróleo e de 50% do rendimento do pré-sal.
A oposição também propôs a responsabilização penal dos dirigentes públicos que não executarem o orçamento programado para a educação em cada exercício. E também queria estabelecer o prazo de um ano para a aprovação de uma lei que defina o porcentual mínimo de investimentos dos Estados e municípios em educação pública. As duas propostas foram rejeitadas pela base aliada do governo.
Sobrou um conjunto de recomendações óbvias. Entre outras metas, o PNE propõe a expansão da creche, a universalização da pré-escola, a alfabetização na idade de 6 anos, a conclusão do ensino fundamental na idade certa, a universalização do acesso ao ensino médio, o atendimento especializado para alunos com deficiência, a diminuição da desigualdade de rendimento escolar entre as regiões mais desenvolvidas e as mais atrasadas, a erradicação do analfabetismo e a redução em 50% do número de analfabetos funcionais.
O PNE propõe ainda a educação de jovens e adultos integrada ao ensino profissional, a expansão do acesso ao ensino superior, a melhoria da qualidade desse nível educacional, o aumento do número de mestres e doutores no corpo docente das universidades e a expansão da pós-graduação, para que sejam formados 60 mil mestres e 25 mil doutores por ano. Também enfatiza a valorização do magistério público, a melhoria da formação dos professores de ensino básico e estímulos para a produção científica. Por fim, com claro enviesamento ideológico, o PNE substitui o princípio do mérito pelo proselitismo e pelo assembleísmo na direção de escolas e universidades, ao propor a "gestão democrática do ensino público básico e superior".
Como essas metas são vagas e imprecisas, o PNE sempre foi muito criticado pelos setores interessados. Pedagogos respeitados, como Cláudio Moura Castro, J. B. Araújo e Oliveira e Simon Schwartzman, já chamaram as metas de "lista de Papai Noel". Pesquisadores como Paula Louzano, da Faculdade de Educação da USP, acusam-no de "desresponsabilizar o governo federal do financiamento, monitoramento e cumprimento do Plano". ONGs independentes alegam que a melhoria na qualidade da educação só é possível com políticas consistentes e persistência na implementação, e não com planos grandiosos, metas genéricas e interferências políticas na designação de gestores escolares. E especialistas em finanças públicas lembram que, se não houver rigoroso controle dos gastos dos Estados e municípios, o aumento das verbas para educação será apenas mais um foco de corrupção.
Várias entidades já começaram a se mobilizar para tentar restabelecer a versão original do projeto, quando ele voltar para a Câmara. Isso significa que o PNE não tem data para ser votado. Ele corre o risco de ser aprovado pouco tempo antes do término do período para o qual foi concebido.
Fonte:http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,o-pne-e-a-lista-de-papai-noel-,1111258,0.htm
Carga tributária cresce pelo 3º ano seguido e chega a 35,85% do PIB

Dado divulgado pela Receita Federal é referente a 2012. Arrecadação cresceu mais que a economia no ano passado. A Receita Tributária total d e 2012 foi de R$ 1,574 trilhão, frente a um PIB de R$ 4,392 trilhão. De todo esse conjunto, fatia de 69,05% ficou com a União (R$ 1,087 trilhão); parcela de 25,16% foi para os Estados (R$ 396 bilhões); e 5,79%, com os municípios (R$ 91 bilhões).
A carga tributária bruta em 2012 foi de 35,85% do Produto Interno Bruto (PIB), ante 35,31% em 2011. Trata-se da terceira alta seguida. O dado foi divulgado na sexta-feira (20), pela Receita Federal. Já a carga tributária líquida foi de 19,82% no ano passado, ante 20,17% em 2011.
Segundo explica a Receita, a alta de 0,54 ponto porcentual na carga tributária bruta de 2012 em relação a 2011 resulta da combinação dos crescimentos, em termos reais, de 1,0% do PIB e de 2,44% da arrecadação tributária nos três níveis de governo (municipal, estadual e federal). A Receita Tributária total do ano passado foi de R$ 1,574 trilhão, frente a um PIB de R$ 4,392 trilhão. De todo esse conjunto, fatia de 69,05% ficou com a União (R$ 1,087 trilhão); parcela de 25,16% foi para os Estados (R$ 396 bilhões); e 5,79%, com os municípios (R$ 91 bilhões).
A Secretaria de Política Econômica, por sua vez, informa que a carga tributária líquida de 2012 foi de 19,82%; ante 20,17% em 2011. "Esta queda, explicada pelo fato das transferências (TAPS) terem crescimento mais que a carga tributária bruta, se deve principalmente à ampliação da rede de proteção social no Brasil, que inclui a política de valorização do salário mínimo, que elevou o seu valor em 14,1% em 2012 em relação a 2011, e a ampliação da cobertura dos programas sociais", cita nota da SPE sobre o tema.
A carga tributária líquida é definida como o valor da totalidade dos impostos, taxas e contribuições arrecadadas pelo governo, deduzido dos subsídios ao setor privado e das transferências previdenciárias, assistenciais e subsídios, efetuadas pelo governo às famílias e às instituições privadas sem fins lucrativos, explica a Secretaria de Política Econômica. As transferências para a Previdência e Assistência Social e Subsídios (TAPS) em 2012 representaram 16,03% do PIB, ante 15,14% em 2011.
Fonte: http://economia.estadao.com.br/noticias/economia-geral,carga-tributaria-cresce-pelo-3-ano-seguido-e-chega-a-3585-do-pib,173688,0.htm

domingo, 15 de dezembro de 2013

Nesta segunda as lideranças populares do Amazonas vão se reunir na sede da OAB



O Projeto Jaraqui e o Movimento SOS encontro das águas confirmam participação na reunião na sede da OAB Amazonas para intensificar a campanha em favor do projeto de lei de Iniciativa popular elaborado pela Coalizão pela Reforma Política Democrática e Eleições Limpas, que objetiva afastar das eleições o abuso de poder econômico, racionalizar o sistema eleitoral, promover a inclusão política das mulheres e demais representações excluídas numa perspectiva de afirmação da democracia direta. A reunião foi convocada pelo vice-presidente da OAB - sessão Amazonas, Dr. Marco Aurélio Choy que participou no sábado (14) dos debates do Projeto Jaraqui.

A Sede da OAB em Manaus fica situada na Av. Umberto Calderaro Filho, n. 2.000 (Rua Paraíba), nas proximidades do supermercado DB, a reunião está marcada para 16h, nesta segunda-feira (16). Além da discussão específica, o Movimento SOS encontro das águas deverá encaminhar também tratativas juntos a OAB para retomar a luta pela Homologação do Tombamento do Encontro das Águas, que se encontra em disputa no Supremo Tribunal Federal porque o governador do Amazonas Omar Aziz contestou em juízo o Tombamento por não ter sido ouvido em tempo hábil, o que não corresponde aos fatos, segundo o Instituto do Patrimônio Histórico e  Artístico Nacional (IPHAN), bem como o Movimento SOS encontro das águas.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

O JARAQUI DISCUTE AS ELEIÇÕES DE 2014, COMEÇANDO PELO FINANCIAMENTO DE CAMPANHA



“É Pau, é pedra é o fim do caminho...”. No ritmo de Tom Jobim, o Jaraqui deste sábado (14), em parceria com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), sessão Amazonas, vai debater a conjuntura eleitoral do Estado, centrando a discussão no financiamento de campanha.

O Jaraqui é uma tribuna popular que congrega lideranças de diversos segmentos da sociedade, sobretudo, dos movimentos populares e estudantis que juntos combatem a corrupção e a imoralidade política que assola o País. A Tribuna inicia-se às 10 horas prolongando-se até às 12h, na República Livre do Pina, na Praça da Polícia, no Centro Histórica de Manaus, tendo como convidado o Vice-presidente da OAB do Amazonas, Dr. Marco Aurélio de Lima Choy, que vem acompanhando junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4650 apresentada pelo Conselho da Ordem, questionando alguns artigos da Lei Eleitoral (9.504/1997) e da Lei dos Partidos Políticos (9.096/1995) que tratam de contribuições de pessoa jurídica e pessoas físicas para campanhas eleitorais.

No STF, o relator é o ministro Luiz Fux, que manifestou em seu voto, na quarta-feira (11), a decisão de que as empresas não deveriam influenciar no processo eleitoral por meio de quantias “vultuosas” de dinheiro. O relator criticou também a crescente influência do poder econômico nas eleições com o aumento dos gastos dos candidatos. Para o relator, as mudanças já deveriam valer para o pleito de 2014.

Dados apresentados pelo ministro Fux dão conta que “em 2002 foram gastos no país R$ 798 milhões em campanhas eleitorais, e em 2012, o valor foi de R$ 4,5 bilhões – um crescimento de 471%. O gasto per capta do Brasil com campanhas supera o de países como França, Alemanha e Reino Unido, e como proporção do PIB, é maior do que os EUA, em 2010, o valor médio gasto por um deputado federal eleito no Brasil chegou a R$ 1,1 milhão, e um senador, R$ 4,5 milhões. Esses recursos, por sua vez, são doados por um universo pequeno de empresas – os dez maiores doadores correspondem a 22% do total arrecadado.”

Os ministros do STF Luiz Fux e o presidente Joaquim Barbosa votaram a favor. A Sessão de quarta-feira terminou com o pedido de vista do ministro Teori Zevascki.

Nesta quinta-feira (12), prosseguindo no julgamento após o voto do ministro Dias Toffoli, que acompanhou o relator, deixando para se pronunciar sobre a modulação de efeitos em momento oportuno; o ministro Roberto Barroso também votou acompanhando integralmente o relator, o julgamento foi suspenso entre o pedido de vista formulado pelo Ministro Teori Zavascki em assentada anterior, empurrando a decisão para 2014, bem ao gosto palaciano.


Para o coordenador do Jaraqui, professor Ademir Ramos, a redefinição do financiamento de campanha com transparência e igualdade jurídica deve necessariamente coibir o recurso de pessoas jurídicas porque o poderio econômico nas campanhas tem sido o motor da corrupção e da lavagem de dinheiro, gerando o desequilíbrio no pleito, como é o caso do mensalão.        

domingo, 8 de dezembro de 2013

O ATIVISMO CIDADÃO


Estas manifestações primárias pouco a pouco vão ganhando força, principalmente, quando esta é catalisada por lideranças políticas moralmente responsáveis e politicamente sob controle das forças populares e do movimento social.

Ademir Ramos (*)

A política é uma Deusa bem dotada a exigir das pessoas participação, relação, cumplicidade e domínio de si mesmo frente aos desafios que a sociedade apresenta. A todo o momento a pessoa é posta à prova, contrariando ou não a sua vontade, devendo se manifestar para garantir ou fazer concessão quanto a determinado direito que lhe é intrínseco ou socialmente conquistado. Em não fazendo torna-se fragilizada, permitindo que o outro se imponha pela retórica ou pela força. Pode parecer fácil, mas, para aqueles (as) que sonham e lutam por ideais coletivos e sociais a participação faz-se necessária para validação do direito como instrumento de cidadania.

A participação evoca relação, disputa para se garantir o direito e consequentemente afirmação e reconhecimento do interesse público. Esta manifestação é socialmente determinada, agregando forças originárias de variados segmentos sociais e econômicos vivenciados por atores que sofreram e sofrem violações em seus direitos fundamentais. Essas pessoas por algum momento sentem-se desprotegidas e impotentes não tendo a quem recorrer para ecoar o seu grito de protesto e de indignação. Alguns passam a desacreditar nas instituições e buscam resolver os seus problemas de forma individual e particular, posicionando-se indiferentes as questões sociais que mutilam milhares de homens, mulheres, crianças e jovens, quando não, aceita a condição de subalternidade satisfazendo-se muito mais com os favores porque são imediatos do que com o direito a ser conquistado e assegurado por meio das lutas sociais.

O ativismo cidadão é o estranhamento que essas pessoas provocam em si e no outro quando concebe e percebe que há entre eles uma liga capaz de mover a si e o outro para o enfrentamento contra o Estado e os seus agentes públicos pelo não cumprimento dos direitos constitucionais; contra os políticos profissionais que usam da política para beneficio próprio; bem como também contra o poder judiciário que se deixa corromper por vendas de sentenças, obliterando a Justiça para que a impunidade reine e o crime prevaleça.

Nesta perspectiva, as manifestações de rua têm servido para demonstrar esta força. Assim como também as barricadas que as populações periféricas das grandes cidades têm armado nas ruas, ateando fogo em objeto inflamável, para denunciar os desmandos e descasos que afetam diretamente essa gente que reivindicam segurança efetiva, água e luz para todos, educação e saúde de qualidade, moradia e empregabilidade, acesso a cultura, entre outros direitos violados.

Estas manifestações primárias pouco a pouco vão ganhando força, principalmente, quando esta é catalisada por lideranças políticas moralmente responsáveis e politicamente sob controle das forças populares, visto que o mandato não é nem do candidato, nem do partido, mas sim do povo. Para tal fim é necessário que o ativismo se converta em organização, em prática estruturante agregando força, coragem, saber e domínio estratégico para intervir na política como agente coletivo propositivo assentado legitimamente nas estruturas colegiadas das comunidades e das demais representações sociais que juntos lutam contra a corrupção, a impunidade, a desigualdade e Justiça Social.    


(*) É professor, antropólogo, coordenador do projeto Jaraqui e do NCPAM-UFAM.
A BABÁ DE BORGADO


Gaudêncio Torquato (*)

Quem diria, hein? O Paraguai, cantado em prosa e verso como o território da muamba, foi capaz de oferecer uma das mais vigorosas lições de cidadania nesta região tão pouco afeita ao civismo, à ética e à racionalidade. Na semana passada, a sociedade civil desse pequeno país de 6,5 milhões de habitantes, na onda da mobilização social que começa a sacudir o continente, decidiu realizar o mais veemente protesto contra a corrupção ao proibir a entrada de um grupo de políticos em bares, restaurantes, cinemas, supermercados, postos de gasolina e até em hospitais particulares. Isso porque 23 congressistas votaram contra a perda de imunidade do senador Victor Borgado, do Partido Colorado, denunciado pela Justiça por contratar com dinheiro público a babá de seus filhos.
A fogueira que se formou no rastilho da expulsão de senadores de alguns ambientes - aos gritos de "fora, ladrão!" - correu o país, multiplicando reações e induzindo garçons, vendedores, frentistas, etc., a não oferecer seus serviços a "corruptos", sob a percepção de que era necessário não apenas punir os agentes de um caso concreto, mas eliminar a impunidade.
A mobilização paraguaia assume extraordinária importância porquanto nosso vizinho exibe o estereótipo de terra do contrabando. Na linguagem das comparações em torno de objetos de consumo, o "relógio paraguaio" assume o sinônimo de falso, tosco, sem qualidade, imagem que ganhou força por estas bandas no enredo de novelas como Avenida Brasil ou de músicas como Muamba, de Bezerra da Silva: "Muamba, olha, quem vai querer muamba?/ Tô vendendo barato, malandro, quem vai?/ Tô levando minha sogra pra vender no Paraguai".

É verdade que os movimentos de junho, que abriram as portas da indignação em quase todas as regiões do nosso país, continham elevada taxa de repúdio a padrões e costumes da velha política, incluindo o combate ao nepotismo, um dos alvos da "guerra paraguaia". Ali, denúncias deram conta de centenas de familiares contratados para servir a S. Exas. os congressistas em funções tão desimportantes quanto singulares, como preparar-lhes o tereré, o popular chá de mate e água fria. Aqui não chegamos a esse passo avançado de democracia participativa, simbolizado pela decisão social de coibir a políticos o uso de serviços de lazer e alimentação.
A experiência do nosso vizinho, somada à semente cívica que se planta por estas plagas, permite vislumbrar cenários promissores no entorno da democracia participativa, que se expande no continente. Emerge, primeiro, a impressão de que a região fura a redoma da inércia e da tradição patrimonialista que por décadas tem impregnado sua cultura política. A paisagem calcinada de desconfiança e ódio, tão bem descrita por Simón Bolívar meses antes de morrer de tuberculose, em 1830, na região de Santa Marta, na Colômbia, não mudou por completo, mas permite enxergar avanços daquela visão pessimista: "Não há boa-fé na América, nem entre os homens nem entre as nações; os tratados são papéis; as Constituições são livros; a liberdade é anarquia e a vida, um tormento".
A boa-fé já se faz presente no sistema de parcerias e integração que caracteriza um bloco de países, como bem o demonstram organismos como o Mercosul, a Unasul e a Celac. Confiança também se observa no ingresso de novos parceiros na frente comercial, como é o caso da China, cujo efeito se dá por aqui na reversão da deterioração histórica de preços de produtos primários e na geração de superávits comerciais.
É patente a melhoria de condições de vida, apesar de remanescerem na região traços de populismo, demagogia e autoritarismo, como os que se observam na República Bolivariana da Venezuela, onde o falecido comandante Hugo Chávez elevou ao altar da veneração o Libertador Bolívar. Registre-se, ainda, a tendência de governos a incentivar um nacionalismo populista, vinculado a um capitalismo de Estado, a par da adoção dos fundamentos macroeconômicos neoliberais. Apesar de abrigar ainda cerca de 50 milhões de latino-americanos vivendo em condições precárias de alimentação, moradia, saúde e educação, merecem destaque políticas de inclusão social, a começar pela experiência brasileira, base de uma sociedade mais solidária.
Nesse desenho é possível divisar sinais de forte empuxo popular na direção do centro da política e um caminhar gradual, apesar de lento, na esfera participativa. Reformas lideram o vocabulário das ruas, como atestam pesquisas no Brasil - mesmo com 41% aprovando o governo Dilma Rousseff, 66% dos entrevistados, segundo o Datafolha, pedem mudanças na próxima administração. Na Argentina, passados dez anos de protecionismo, duras políticas fiscais e cambiais e reservas descendo a um piso de US$ 32 bilhões (eram US$ 52 bilhões em 2010), o kirchnerismo ameaça ruir.
A aprendizagem democrática obedece a um processo irreversível. As nações reconquistaram o direito de escolher seus governantes - equatorianos em 1979, peruanos em 1980, argentinos em 1983, uruguaios e bolivianos em 1985, paraguaios e chilenos em 1989, e no final desse ano também os brasileiros puderam escolher diretamente seu presidente. Tentativas golpistas, na Venezuela e no Peru, em 1992, foram frustradas. Maior transparência das administrações e combate ao poder invisível que age nas entranhas do Estado são ferramentas da modernização institucional. Órgãos em defesa da sociedade, a começar do Ministério Público, esforçam-se para extirpar os cancros que corroem governos.
As populações escancararam a vista, apontam o dedo para os malfeitos, chegando a fechar portas para corruptos. Maneira de evitar que helicópteros, lotados de cocaína, sejam abastecidos com o nosso "rico" dinheirinho. Ou que o povo paraguaio use seus parcos guaranis para pagar os serviços da babá do senador Borgado.
(*) É Jornalista, professor titular da USP, é consultor político e de comunicação. Twitter: @gaudtorquatoFonte: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,a-baba--de-borgado-,1105737,0.htm
O verdadeiro bom combate

Ariel Dorfman  (*)
 Não me lembro quando soube pela primeira vez da existência de Nelson Mandela. Talvez tenha sido em 1962, ano em que o futuro presidente da África do Sul foi condenado à prisão perpétua entre os rochedos de Robben Island. Poderia ter sido naquela época, mas não foi.
Eu era então um jovem de 20 anos e, como tantos outros de minha geração no Chile, pregava a revolução. Ao menor pretexto, nacional ou internacional, saía com outros estudantes às ruas de Santiago para exigir justiça, contra uma maré de policiais armados. Entretanto, nessa multiplicação de protestos não houve nenhum, que eu lembre, voltado para exigir a liberdade de Mandela. Nós entendíamos, com uma clareza meio borrada, que o apartheid sul-africano era uma mácula racista, o sistema mais desumano e cruel do mundo; mas a luta de Mandela era um mero clarão distante frente às urgências de uma América Latina empobrecida e abrasada. Nem mesmo nos três anos da presidência de Salvador Allende - cujo programa de libertação nacional poderia ter sido calcado na Freedom Charter do Congresso Nacional Africano - a figura de Mandela chamou minha atenção.
Foi somente em 1973, quando o golpe militar contra Allende me mandou para o exílio, deixando-me desnorteado e sem país, que o nome de Mandela foi se tornando uma espécie de lar e refúgio, uma chama de esperança que foi meu alento nos dias de desterro com um indômito e terno exemplo de lealdade. Seu significado cresceu mais ainda por causa do distorcido conluio dos dois regimes proscritos, o de Augusto Pinochet e o de Balthazar Vorster e Pieter Botha, que trocavam medalhas, embaixadores e exportações (inclusive de armas e gás lacrimogêneo). Essas ditaduras irmanadas em sua obsessão por eliminar toda rebeldia, toda dissidência, fizeram crescer ainda mais minha identificação com o destino de Mandela. Fizeram com que eu sentisse, como tantos que buscavam um mundo mais decente e insubornável, que sua luta era a minha, era a nossa.
Mesmo assim, o Chile precisou recuperar sua democracia em 1990 - mesmo ano em que Mandela enfim saiu triunfalmente do cárcere - para eu começar a compreender que aquele ex-preso político era muito mais que um símbolo ou um eco. Num momento em que a África do Sul, o Chile e muitos outros países enfrentavam os dilemas turbulentos de uma transição para a democracia, em que nos perguntávamos como fazer frente aos horrores do passado sem sermos reféns do ódio que este passado continuava gerando, Mandela foi nosso modelo e guia. Ao conseguir que sua pátria eliminasse pacificamente o apartheid, ao negociar com o inimigo, mantendo, contudo, sua dignidade inquebrantável, ele ofereceu a todos que tínhamos lutado durante décadas contra a injustiça uma lição fundamental. Tivemos de aprender que pode ser eticamente mais complicado navegar entre as tentações e os matizes da liberdade do que manter a cabeça erguida e o coração batendo forte em meio a uma opressão que separa, sem ambiguidades, o bem do mal.
Admirável esse homem que, embora tendo passado quase 30 anos no cárcere, talvez por ter coexistido tanto tempo com os adversários mais aguerridos compreendeu que a reconciliação é sempre possível. E nos advertiu a não trair a memória sempre que se exija o arrependimento alheio. Mais que admirável. Porque justamente quando pensamos que não poderia ser mais venerado ainda, exatamente então ele decidiu não eternizar-se na presidência. Preferiu dar um exemplo de probidade e confiança na democracia. Um dos homens mais populares do planeta e ídolo em seu país, escolheu não acumular todo o poder em sua pessoa, optando por preparar a pátria para o momento inevitável de seu desaparecimento.
Esse momento chegou.
Agora o mundo, e em especial a África do Sul, terão de encontrar um rumo no futuro incerto sem sua prodigiosa presença, o que me atrevo a chamar de sua luz em nossa escuridão.
E é agora, evidentemente, que Mandela irá se tornar cada vez mais perigosamente lendário. Se não pôde defender-se em vida da santificação insensata, como conseguirá depois da morte ser tratado simplesmente como um ser humano de carne e osso, alguém que, como todos os seres do nossos universo, nasce e come, come e ama, ama e morre?
Gostaria então neste instante doloroso em que Mandela começa a nos escapar entre os discursos e os panegíricos, os elogios, os monumentos e as estátuas, gostaria de resgatar esse homem real, tangível, corpóreo.
Tive a sorte de estar com  Madiba (seu nome de clã) no dia 28 de julho de 2010, quando visitei a África do Sul para proferir a Mandela Lecture, conferência que cada ano é dada em sua honra. Quando me mandaram o convite - o primeiro a um latino-americano e a um escritor -, meus anfitriões me disseram que Mandela receberia a mim e a minha mulher, Angélica, em sua casa para almoçar - desde que, evidentemente, não estivesse doente. Sua saúde não permitiu nosso almoço, mas pudemos conversar durante uma hora na sede da fundação que tem seu nome.
Seria um dos últimos encontros de Mandela com um visitante estrangeiro, alguém que não pertencia a seu círculo imediato.
Chamou-me atenção sua fragilidade, a lenta precariedade de seus movimentos, a firmeza de sua mão quando apertou a minha, a forma como seu rosto se transformava, como um sol ao amanhecer, quando sorria. E seus maiores sorrisos eram para Graça Machel, sua terceira mulher, que cuidou dele na velhice, a quem devemos que um homem tão maltratado no cárcere tenha sobrevivido até os 94 anos.
Do que falamos naquela oportunidade? De Allende, evidentemente. E dos ataques xenofóbicos aos forasteiros e aos estrangeiros, que, segundo Mandela, são uma vergonha nacional. E de suas esperanças para a África do Sul.
Tudo isso era previsível.
O mais impressionante é quando ele fala do pai e da mãe. Como todos os homens em idade avançada, Mandela vive uma grande parte de cada dia no passado remoto e, na ocasião, como conversamos sobre seu aniversário, mencionou um incidente no qual o pai bateu na mãe, uma degradação que não está em nenhuma de suas biografias.
Imediatamente, apareceu outro Mandela. Alguém que adora o pai, mas o critica. Alguém que ama a mãe, mas se envergonhava por sua desonra. Alguém que, muito antes de ser o grande protagonista que salvou sua pátria e ofereceu um exemplo moral inigualável a nossa espécie desgarrada, foi uma criança, pequenina e indefesa, que percebia que a injustiça sempre começa pelos menores atos, os mais aparentemente desprovidos de importância. Uma criança que presencia esse ataque contra a mãe - ou talvez o relato do fato, que pode mesmo ter ocorrido antes de seu nascimento, não fica evidente em sua rememoração - e que se pergunta, ante a imensidão desolada do continente africano, por que existe a dor, se pergunta sobre um mundo autoritário que parece imutável e, no entanto, precisa ser corrigido, precisa ser melhorado.
Esse é o Mandela que quero lembrar.
O que viveu dia após dia seu século terrível e não saiu destroçado do cativeiro.
O que cultivou um jardim na prisão.
Ele gostava de plantar e colher debaixo de chuva e sol, sabendo que, assim como exercia um mínimo controle sobre um pedacinho de terra, também podia controlar sua dignidade e suas memórias e a fidelidade com os companheiros.
O que compartilhava frutas e verduras com os outros presos, mas também com os carcereiros, prefigurando o tipo de nação que desejava e com o qual sonhava.
É assim que quero lembrar de Mandela.
Como um jardim que cresce, assim como cresce a memória. Como um jardim que cresce como deveria crescer a justiça. Como um jardim que nos reconcilia com a existência e a morte e as perdas irreparáveis. Como um jardim que cresce como cresce Mandela dentro de todos nós, dentro do mundo que ele ajudou a criar e terá de encontrar, tateando, uma maneira de ser fiel a ele. /Tradução de Anna Capovilla.
(*) É escritor chileno, autor, entre outros, de Entre Sueños y Traidores: Um strip-tease del exilio (seix barral).