domingo, 31 de outubro de 2010

BRASILEIROS VOLTAM ÀS URNAS PARA DECIDIR ENTRE DILMA E SERRA

Fabrícia Peixoto
Da BBC Brasil


Os brasileiros voltam às urnas neste domingo para decidir os votos que vão eleger quem governará o país nos próximos quatro anos: Dilma Rousseff (PT) ou José Serra (PSDB).

No primeiro turno, a diferença entre os dois candidatos ficou em 14 pontos, com vantagem para a petista, que obteve 46,9% dos votos válidos contra 32,6% para o tucano.

Segundo os principais institutos de pesquisa, não houve mudança de tendência nas últimas semanas, com os levantamentos apontando para uma vitória de Dilma Rousseff.

Os resultados parciais começam a ser divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a partir das 19h, e a expectativa é de que ainda neste domingo o vencedor seja "matematicamente" conhecido.

Durante as quatro semanas que separaram os dois turnos da eleição, o eleitor teve a chance de comparar melhor os dois projetos, mas também se viu diante de um período com intensa troca de acusações, inclusive com foco em temas polêmicos, como aborto e religião.

Nenhum dos dois candidatos chegou a apresentar um programa de governo em detalhes, o que para muitos analistas abriu espaço para um debate "pouco programático" e mais agressivo.

Uma das marcas da campanha no segundo turno acabaram sendo os projetos de governo passados, com uma maior comparação entre as administrações de Luiz Inácio Lula da Silva e de seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso.

Também neste domingo serão definidos os governadores de oito Estados do país, além do Distrito Federal.

Marina e aborto

O intervalo entre as duas votações foi marcado ainda pela projeção de Marina Silva, candidata pelo Partido Verde que, no primeiro turno, surpreendeu ao conquistar quase 20% dos votos válidos.

Considerado o fiel da balança no 2º turno, o apoio formal de Marina passou a ser fortemente disputado tanto por Dilma como por Serra, mas a candidata verde acabou optando pela neutralidade.

Um dos principais grupos de apoio à candidata do PV, os evangélicos também estiveram no centro da disputa durante a campanha nas últimas semanas, com as duas equipes buscando o apoio de lideranças religiosas.

A equipe de campanha de Dilma, que chegou a apostar em uma vitória já no primeiro turno, responsabilizou a campanha do adversário por "disseminar boatos" sobre a posição religiosa da candidata, o que segundo eles impediu uma vitória antecipada da petista.

Os aliados de José Serra, por sua vez, exploraram as "contradições" no discurso de Dilma sobre o aborto, trazendo à tona antigos comentários da ex-ministra da Casa Civil em defesa da descriminalização da prática no país, diferentemente do que defende atualmente a candidata.

Raio X do 1º turno
Eleitores aptos: 135,8 milhões
Votos válidos: 101,5 milhões
Dilma Rousseff: 47,6 milhões (46,9%)
José Serra: 33,1 milhões (32,6%)
Marina Silva: 19,6 milhões (19,3%)
Votos nulos e em branco: 9,6 milhões (7%)
Abstenções: 24,6 milhões (18%)

Lula

A disputa tem, de um lado, a candidata do governo, Dilma Rousseff (PT), apresentada ao eleitorado não apenas como a preferida do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como também aquela cujo principal compromisso é continuar os projetos do atual governo.

Principal candidato de oposição ao governo, José Serra (PSDB) evitou a crítica generalizada à atual gestão. O ex-governador de São Paulo concentrou seu discurso na ideia de que o Brasil precisa mudar, mas não necessariamente jogando fora os feitos do governo Lula.

Junto com a análise das duas propostas está ainda uma questão que foi constantemente colocada ao eleitor nesta eleição: a opção ou não pela continuidade dos oito anos do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Essa é a sexta vez, desde o fim do regime militar, que o brasileiro pode escolher, pelo voto direto, o seu candidato preferido para governar o país. É também a primeira vez em 20 anos que Lula não está entre as opções de voto.

Desafios

O brasileiro chega às urnas neste domingo com uma série de demandas, que vão da economia à segurança pública, passando por questões como saúde, educação e meio ambiente.

O novo presidente vai encontrar um país que avançou nos últimos anos em diversos aspectos, sobretudo no campo econômico e social.

Se por um lado o país parece ter encontrado o rumo do crescimento com inflação sob controle, por outro lado os juros continuam os mais altos do mundo, pressionando a dívida pública para cima.

A economia brasileira se consolidou como a oitava maior do mundo neste ano, mas o país ainda é apenas o 72º em renda per capita, atrás de países como Argentina (50º), México (53º), Turquia (57º), Venezuela (66º) e Irã (68º), segundo dados do Banco Mundial.

Outro setor que também evoluiu no país foi a educação. A taxa de analfabetismo, que em 1960 chegava a 40%, caiu a 9,7% no ano passado, segundo dados do IBGE.

Mas, se os números absolutos mostram uma evolução, a qualidade do ensino ainda deixa a desejar. Um estudo elaborado pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) em 2007 colocou os alunos brasileiros entre os piores em conhecimentos de matemática, capacidade de leitura e ciências entre 57 países analisados.

Fonte: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2010/10/101029_eleicoes2turno_fp.shtml

sábado, 30 de outubro de 2010

TOMBAMENTO DO ENCONTRO DAS ÁGUAS SOFRE IMPUGNAÇÃO

Ademir Ramos (*)

Enquanto o Instituto do Patrimônio Histórico Artístico Nacional (Iphan) informava para todo o Brasil sobre o Tombamento do Encontro das Águas, o jornal A Crítica de Manaus, quinta-feira (28), em reportagem investigativa, noticiava que duas empresas haviam entrado com impugnação contra o Ato de Tombamento deste bem natural e cultural do povo do Amazonas.

O Edital de Notificação publicado na segunda-feira (11), no Diário Oficial da União, fixou em “15 (quinze) dias, a contar da publicação desta notificação, assiste aos proprietários dos bens abrangidos pela poligonal de tombamento a faculdade de anuir ou impugnar a iniciativa”.

A reportagem de A Crítica cita como fonte a própria Assessoria de Comunicação do Iphan, que se recusou a dar os nomes das empresas e do escritório jurídico que representou contra o Tombamento do Encontro das Águas dos rios Negro e Solimões, nos arredores de Manaus. Mesmo assim, a Assessoria afirmou que a “contestação não interfere na votação que decidirá ou não pelo Tombamento definitivo do Encontro das Águas. Caberá ao presidente do Iphan, Luiz Fernando de Almeida, dar seu parecer e enviá-lo para o Conselho Consultivo do Instituto”, que deverá se reunir no dia 04 e 05 de novembro, no Rio de Janeiro, no Palácio Gustavo Capanema, para avaliar a proposta do Encontro das Águas juntamente com mais cinco processos de Tombamento.

IMPUGNAÇÃO

Embora a Assessoria de Comunicação do Iphan tenha se recusado a informar o nome das empresas e do escritório jurídico que moveu ação contra o Tombamento do Encontro das Águas, o Ncpam ouviu outras fontes que garantiu se tratar das empresas Log-In Logística Intermodal e da Lajes Logística S/A, representadas pelo escritório jurídico da Log –In sediado em Botafogo, no Rio de Janeiro.

As manifestações contra o Tombamento foram apresentadas também no dia 22 de outubro, aos Deputados da Assembléia Legislativa do Amazonas, em resposta a não participação da empresa Lajes Logística, na Audiência Pública, convocada para o dia 25, pela Comissão de Assuntos Amazônicos Meio Ambiente e Recursos Hídricos. Entre as considerações feitas, a empresa argumentava que: “seríamos sim favoráveis, ao tombamento do Fenômeno do Encontro das Águas, dado que não haveria conflito entre tombamento e os empreendimentos públicos e privados na área desde que fossem cumpridas as exigências sócio-ambientais colocadas pela legislação”.

No entanto, é bom que se diga que o Terminal Portuário das Lajes é um empreendimento privado estimado em 220 milhões de reais, capitaneado pela Log-In Logística Intermodal, empresa controlada pela Vale. A determinação de se construir o Porto da Vale (Lajes), no Encontro das Águas, decorre do aval do grupo da coca cola no Amazonas por meio da Juma Participações S/A (comodante), signatária do Contrato de Comodato com a empresa Lajes Logística S/A (comodatária).

Nos termos do Contrato, a Juma (comodante) é proprietária de um imóvel situado na Alameda Cosme Ferreira, km 17, no Município de Manaus, Estado do Amazonas, com área de 596.464,64 m² registrado no Cartório de Registro de Imóveis do 1° Ofício, sob Matrícula 48.252, e registro no Livro N° 2, AV 2/48.258. Nas negociações para a construção do Porto da Vale, o terreno da Juma corresponde a 30% do valor do empreendimento.

POR FORÇA DE LEI

O Tombamento do Encontro das Águas sendo de forma compulsório, conforme procedimentos estabelecidos pelo Decreto-Lei N°. 25, de 30 de novembro de 1937, confere que: “ se a impugnação for oferecida dentro do prazo assinado, far-se-á vista da mesma, dentro de outros quinze dias fatais, ao órgão de que houver emanado a iniciativa do Tombamento, a fim de sustentá-la. Em seguida, independentemente de custas, será o processo remetido ao Conselho Consultivo do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, que proferirá decisão a respeito, dentro do prazo de sessenta dias, a contar do seu recebimento. Dessa decisão não caberá recurso” (Art. 9°, 3).

Com a impugnação apresentada pelas empresas, o julgamento definitivo do Tombamento do Encontro das Águas pautado para o dia 04 e 05 novembro fica prejudicado, impossibilitando que o diretor do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional mande de pronto, por simples despacho, que se proceda à inscrição do Encontro das Águas no competente Livro do Tombo. Ao contrário, passa a valer os prazos prescritos no artigo acima citado, exigindo do Iphan "sustentação vestibular da proposta" frente às justificativas das empresas que defendem tempestivamente a construção do Terminal Portuário no turbilhão do Encontro das Águas, dos rios Negros com Solimões, na Colônia Antonio Aleixo, Zona Leste de Manaus, capital do Amazonas.

GRITA DO POVO

O Movimento S.O.S. Encontro das Águas amparado na vontade popular articulou-se com o Ministério Público Estadual e Federal com propósito de mobilzar formadores de opinião, força acadêmica, intelectuais, donas de casa, religiosos, estudantes e demais lideranças comunitárias para sustentar com determinação a defesa do Tombamento Já do Encontro das Águas. Destemidamente, o Movimento Socioambiental pró Encontro das Águas tem monitorado o processo de Tombamento desse bem e alertado o povo do Amazonas para as manobras tramadas contra este que é o Cartão Postal do Amazonas. Assustador é a omissão criminosa do Governador do Estado, da Assembléia Legislativa, da Câmara Municipal e do próprio Prefeito de Manaus. Mas a luta há de continuar com os holofotes sobre o Iphan, que por natureza deve fundamentar com muito densidade a salvaguarda do Encontro das Águas, que é sem dúvida Patrimônio do povo brasileiro.

(*) É Professor, Antropólogo e Coordenador do NCPAM/UFAM.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

PRAZER DE LER

Ellza Souza (*)

O livro também tem seu dia. Hoje é o dia nacional do livro. Isso é bom porque nos faz pensar que a leitura não está fora de moda. Ao contrário precisamos ler cada vez mais para avançarmos como sociedade. Ao falar de livro lembro de duas pessoas que amam as letras, a arte, a vida. Uma é o Tenório Telles que agora se diz meu avô e que de uma forma simples e correta faz grandes crônicas sobre o seu cotidiano. Tenório escreve, ensina, incentiva, faz o que pode pela literatura. A vida e o livro foram feitos para serem “traçados” não pelas traças mas por nós mesmos. E você é como uma “tracinha” que nunca abandona as páginas de um livro. A benção vovô pelo seu dia como grande escritor que você é.

A outra pessoa é o pintor-escritor Moacir Andrade pelo qual tenho também uma grande admiração. Moacir é um leitor voraz no qual os jovens da era do computador devem muito se espelhar.

Para Moacir, o ato de ler “representa um dos grandes prazeres do ser humano, assim como o sexo”. A sensação prazerosa até passa “mas fica o conhecimento, a informação, a vontade de ler cada vez mais”, diz o famoso leitor. No seu ateliê onde se mistura aos pincéis e tintas até hoje, aos 83 anos, se encontram espalhados por todo canto muitos livros. O que importa para o artista é entre uma tela e outra a leitura de um bom livro, onde Moacir Andrade aguça sua memória e retira a criatividade para sua arte. “Humano, demasiado humano” do filósofo alemão Friedrich Nietzsche, publicado em 1878, é um dos livros que o pintor amazonense Moacir Andrade leu recentemente.

No Brasil apenas 1% das pessoas com mais de 70 anos, lê. E os homens lêem menos que as mulheres. É a vista, é a impaciência, é a falta de costume, é o preconceito. “Livrinho na mão é coisa de mulher”. Mas para quem chega lá, lendo, não tem possibilidade de a memória enferrujar. Leia devagar, superando os limites próprios do tempo ou peça para alguém ler pra você, o que terá dupla vantagem, pois duas pessoas serão beneficiadas com o prazer da grande viagem que é a leitura de um bom livro.

Moacir adora ler. É incrível, mas quantas vezes ao visitá-lo o encontrei com um livro na mão. E não é qualquer livrinho não. Ele gosta de livros sobre a história do Brasil e da humanidade. Ele adora livros de muitas páginas. Desses que os jovens querem distância. Por essas e outras leituras o pintor / leitor sabe contar as histórias de sua existência como ninguém. Lembra dos fatos, das pessoas, dos nomes, dos lugares e assim passa para gerações futuras a sua própria história, a sua experiência. Com fotos, com objetos, com recortes de jornais, com pinturas e com relatos. Só precisa quem o escute. O pintor Moacir resolveu isso muito bem escrevendo seus próprios livros de histórias. Dentre eles o lindo “Manaus - ruas, fachadas e varandas”. Um resgate da cidade do seu tempo.

Parabéns a todos que ainda "traçam" os livros com amor.

(*) É escritora, jornalista e colaboradora do NCPAM/UFAM.

O BEM BOM DA VIDA E AS VEREDAS POLÍTICAS DA SOBERANIA

Para tirá-lo do perigo não há caminho senão o que vamos percorrendo.
Dante

Ademir Ramos (*)

A condição humana é marcada por vícios, virtudes e encantamentos. O vício é múltiplo e se múltiplica com facilidade no tecido social dos mais diversos, gerando dor horrenda para uns, enquanto outros, assim como aves de rapina, alimentam-se do sofrimento dos desgraçados, construindo castelos de areia no mundo movediço das relações políticas mercantis.

As virtudes, por sua vez, são instituídas para orientar os homens em sociedade quanto à construção do “reino da liberdade” à luz do Direito e da consecução da Justiça, na perspectiva do estatuto do homem, pautado nas culturas e no desenvolvimento cognitivo dos protagonistas da história.

Nesse processo, os homens embriagam-se tanto pelo vício quanto pela virtude, tentando defini-los como instrumento de dominação ou liberdade, criando valores e regras hegemônicas, movendo interesses, sonhos e corrupção.

Nessa fronteira concorrente, invisível, os homens constroem veredas que permitem alçar vôos montanhosos às vezes distanciando-se do mundo para conformação de sua inquietude existencial. Outras vezes, desvelam o fetiche e desabam da montanha do encantamento, transformando-se em militante da condição humana por arrebatar dos poderosos a espada da Justiça, conclamando os demais para lutarem contra a desigualdade social e o fosso da indignidade onde se encontram a maioria dos homens ardendo em desejo de serem resgatados para a vida.

O salto a se dar exige determinação e coragem porque os alienados encontram-se embrutecidos socialmente, esperando que tudo aconteça de forma mágica, arrebatando a todos para o mundo das encantarias por meio de lideranças carismáticas, que tudo prometem no calor das lutas sem resolução objetiva dos fatos.

Nessa circunstância, não há caminho a ser percorrido que não seja o da política. A relevância da ação requer que se defina comportamento estruturante ancorado em instrumentos capazes de impulsionar os homens para garantir seus direitos fundamentais com acesso às políticas públicas referentes à saúde, educação, segurança, habitação, sustentabilidade, cultura, empregabilidade entre outras.

Na Democracia, o levante da cidadania fundamenta-se nas estratégias de mobilização, fazendo crer que todos somos capazes de mediar às lutas sociais, promovendo participação, organização, transparência e controle social. Nesse embate, é importante que, sinergicamente, opere entre os homens confiança, credibilidade e respeito valores que sirvam de marcos reguladores no curso das ações das lutas contra os exploradores, corruptos, aduladores e saqueadores da riqueza do povo.

O cenário por excelência dessa disputa são as eleições. Momento oportuno para que a sociedade organizada, sob a direção do movimento social e de partidos políticos libertários com representações dos segmentos sociais, possa patrocinar mudança de qualidade, elegendo candidato comprometido com políticas públicas com responsabilidade ambiental, social e respeito às organizações sociais, assegurando à nação o cumprimento de seus direitos fundamentais movidos por políticas de distribuição de renda e empregabilidade de forma soberana.

(*) É professor, antropólogo e coordenador do NCPAM/UFAM.

O MUNDO SE AFLIGE, O BRASIL ESQUECE

Washington Novaes
O Estado de S.Paulo

Não terá sido por falta de informações sobre a gravidade da situação dos recursos naturais no mundo que foram tão difíceis as negociações no Japão, desde a semana passada, no âmbito da Convenção da Diversidade Biológica. Enquanto ali se sucediam os impasses, na Assembleia-Geral da ONU era apresentado um relatório sobre o direito à alimentação em que se afirma que a cada ano são perdidos no mundo 30 milhões de hectares cultivados, ou 300 mil quilômetros quadrados, área equivalente à da Itália, mais que o Estado de São Paulo - por causa de degradação ambiental e urbanização. "500 milhões de pequenos agricultores sofrem de fome porque seu direito à terra é atacado", diz o documento (France Presse, 22/10).

A redução da biodiversidade significa perdas anuais entre US$ 2 trilhões e US$ 4,5 trilhões, confirma o relatório Economia de Ecossistemas e Biodiversidade, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). O relatório da Global Footprint Network diz que a sobrecarga já imposta aos recursos naturais pela atividade humana exigirá (ou exigiria) que em 2030 precisemos de mais um planeta como a Terra para mantermos os formatos e o ritmo. Em 40 anos se perderam 30% da biodiversidade global. E 71 países já enfrentam déficits na área dos recursos hídricos.

É preciso começar a computar nos cálculos do produto interno bruto (PIB) de cada país as perdas sofridas por esse caminho, diz o Pnuma. E inevitavelmente faz lembrar mais uma vez o falecido secretário nacional do Meio Ambiente José Lutzenberger, segundo quem não há nada melhor para aumentar o PIB que um terremoto - porque os prejuízos não são incluídos nessas contas e o valor da reconstrução é todo adicionado.

O fato é que as perdas são brutais. E um dos setores em que isso se tem tornado mais evidente é o dos ecossistemas marinhos, embora o I Censo Marinho Global diga (Agência Estado, 10/10) que os anos dourados das descobertas da riqueza de espécies dessas áreas ainda estejam por vir. Até agora foram identificadas 250 mil espécies marinhas e os cientistas acreditam que haja pelo menos mais 750 mil - fora milhões de espécies de micróbios (90% da biodiversidade oceânica), que talvez sejam bilhões.

A situação mais grave é a dos corais, por causa da acidificação das águas. De acordo com a Organização Mundial para a Alimentação e a Agricultura (FAO), da ONU, três quartos das espécies de peixes estão em perigo no mundo todo, próximas do esgotamento, por causa de pesca excessiva, inclusive em lagos e outros ecossistemas continentais, afetados pelo carreamento de nutrientes das lavouras.

No Brasil, segundo estudo publicado na revista Nature (Estado, 30/9), a situação é grave principalmente no Sudeste e no Nordeste. Rios e lagos contribuem hoje com pelo menos 13 milhões de toneladas anuais de pescado, que podem chegar a até 30 milhões, afirma o Pnuma (20/10). É uma atividade particularmente importante para a geração de proteínas para crianças e de trabalho para mulheres.

Umas das razões para a gravidade da situação nos oceanos está na falta de zonas costeiras e marinhas protegidas. No Brasil mesmo, são apenas 1,5% do total, segundo o experiente diretor de Conservação da Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente, Bráulio Dias (Estado, 3/10), quando a proposta no Japão foi de proteger pelo menos 20% dos ecossistemas em terra e no mar. Menos de 10% das espécies marinhas em águas brasileiras são conhecidas.

E há uma "bomba de tempo" à espera nos oceanos, alerta a revista New Scientist (4/9/10): o imenso estoque de óleo diesel acumulado nos porões de milhares de navios afundados durante a 2ª Guerra Mundial, que faz parecer brincadeira de criança o recente vazamento de petróleo no Golfo do México, 20 vezes menor do que aquele estoque. O apodrecimento dos cascos levará a vazamentos nas próximas décadas.

Diante de todo esse quadro, não podem deixar de preocupar muito os rumos impostos à captura de pescado pelo nosso Ministério da Pesca, principalmente o recente edital (O Eco, 27/7) que abre as águas brasileiras para embarcações estrangeiras, navios que serão arrendados, com isenção fiscal, para incentivar a pesca de atum espadarte. Será uma festa para frotas que já recebem 1 bilhão em subsídios da União Europeia. Isso quando são conhecidos os estudos oficiais do Revizee, que consideram ameaçadas 80% das espécies marinhas brasileiras pescadas - enquanto o Ministério não deixa de apregoar seu objetivo de multiplicar por dez a tonelagem pescada.

Da mesma forma, não podem deixar de inquietar editais do Ministério que abrem novas áreas em terra e no mar. A aquicultura já aumentou a produção em 44% entre 2007 e 2009. A produção total brasileira de pescado subiu 25% em oito anos e chegou a 1.240 mil toneladas em 2009. Na aquicultura foram 416 mil toneladas em 2009 (quando muitos estudos internacionais dizem que na aquicultura o consumo de recursos é maior que a produção); na pesca extrativa, 825 mil toneladas. Mas "a gestão pesqueira é um caos", dizem os especialistas (Estado, 3/10). E o Ministério do Meio Ambiente quer controlar a expansão, trafegando na direção contrária à do Ministério da Pesca - que em sete anos teve suas dotações orçamentárias ampliadas de R$ 11 milhões para R$ 803 milhões, 73 vezes mais. Nesse período, a produção de pescado passou de 990 mil toneladas anuais para menos de 1,3 milhão de toneladas (Estado, 26/6).

É evidente que o quadro brasileiro precisa ser repensado. Seja pelo contraste entre os objetivos oficiais no setor e o que dizem estudos sobre a situação das espécies pescadas, seja pela grave situação dos recursos marinhos no mundo, enfatizada pelos estudos e discussões na Convenção da Diversidade Biológica. Não há como não levar a sério os diagnósticos e não caminhar para políticas adequadas em matéria de conservação. As futuras gerações vão cobrar.

(*) É jornalista especializado em questões ambientais, um dos defensores do Tombamento já do Encontro das Águas, e articulista de O Estado de S. Paulo.

Fonte: http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20101029/not_imp631443,0.php

QUANTO CUSTA A DESTRUIÇÃO AMBIENTAL?

"As abelhas, por exemplo, valem cerca de 440 milhões de libras (R$ 700 milhões) para a economia da Grã-Bretanha". Imaginem o valor estimado das águas e florestas para o povo da Amazônia. No entanto, algumas corporações aliadas com governantes irresponsáveis buscam se beneficiar diretamente desses recursos, privatizando seu uso enquanto os danos são distribuídos em forma de depredação, poluição e miséria.

Richard Black
Especialista de meio ambiente da BBC News


O Banco Mundial lançou um programa global cujo objetivo é ajudar países a incluir os custos da destruição da natureza nas contas públicas.

O presidente do banco, Robert Zoellick, disse que a destruição ambiental acontece em parte porque os governos não contabilizam o valor da natureza.

O programa foi anunciado durante a Convenção da ONU sobre Diversidade Biológica em Nagoya, no Japão. Dez nações participarão do projeto na fase piloto - entre elas, Índia e Colômbia.

"Sabemos que o bem estar do homem depende de ecossistemas e biodiversidade", disse Zoellick. "Também sabemos que eles estão sendo degradados de forma alarmante."

"Uma das causas é o nosso fracasso em avaliar propriamente os ecossistemas e tudo o que fazem por nós - e a solução, portanto, está em contabilizar os serviços (oferecidos pelo) ecossistema quando os países fazem políticas."

O ministro do Meio Ambiente da Noruega, Erik Solheim, disse que reavaliar a natureza dessa forma obrigaria as empresas a mudar a forma como operam.

"Nós precisamos sair de uma situação onde os benefícios dos serviços do ecossistema são privatizados enquanto os custos são socializados", disse Solheim.

"Os custos totais do impacto negativo sobre os ecossistemas deve ser coberto pelos que recebem os benefícios de sua destruição."

Trilhões de Dólares

O novo programa toma como base as conclusões do estudo "A Economia dos Ecossistemas e Biodiversidade". A proposta é ajudar governos a embutir as revelações do estudo em suas políticas.

A principal conclusão da pesquisa, feita com o apoio da ONU, foi que a degradação do mundo natural está custando à economia global entre US$ 2 bilhões e US$ 5 bilhões por ano.

O estudo também concluiu que o valor econômico do mundo natural, em termos de sua provisão de água limpa, solo de boa qualidade, polinização e outros serviços, é negligenciado por governos por ser "invisível".

"Esse relatório (...) ajudou a definir a importância da biodiversidade de uma nova maneira", disse a secretária britânica do Meio Ambiente, Caroline Spelman.

"O que ficou absolutamente claro é que precisamos mudar a forma como atribuímos valor ao capital natural e serviços do ecossistema e integrá-los aos processos principais de tomada de decisões."

Spelman e Solheim indicaram que seus governos apoiam o programa.

Ameaças

Questionados se as empresas se oporiam a esse tipo de contabilidade ambiental porque ela afetaria seus balanços, Spelman diz que elas não farão objeções se entenderem as razões por trás dela.

"As abelhas, por exemplo, valem cerca de 440 milhões de libras (R$ 700 milhões) para a economia da Grã-Bretanha", diz ela.

"Quando você pensa em ter de substituir o que a natureza dá de graça, acho que não haveria reações negativas quando as pessoas compreenderem o que os serviços do ecossistema provêm."

Achim Steiner, diretor executivo do Programa Ambiental da ONU, acrescentou que uma análise recente mostrou que as companhias consideravam a perda de biodiversidade uma ameaça maior do que o terrorismo.

A informação veio originalmente de um relatório do Fórum Econômico Mundial, que indicou que as empresas viam 8% de probabilidade de que uma perda da biodiversidade as afetaria - principalmente por sujar sua reputação -, enquanto cerca de 4% viam o terrorismo internacional como uma ameaça. "Alguns negócios tiram vantagem da legislação frouxa para fazer coisas que não poderão fazer no futuro", disse Steiner. "Mas muitos negócios estão procurando formas de minimizar seus riscos."

Fonte: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2010/10/101028_ambiente_economia_mv.shtml

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

MOVIMENTOS S.O.S ENCONTRO DAS ÁGUAS FAZ DOIS ANOS DE LUTA


A luta do Movimento S.O.S Encontro das Águas completa dois anos de resistência contra a pretensa construção do Terminal Portuário das Lajes capitaneada pela Vale, que é controladora da Log-In Logística Intermodal associada a Lajes Logística e a Juma Participação S/A. O empreendimento em disputa está situado na Zona Leste de Manaus, no Bairro da Colônia Antonio Aleixo, ameaçando o complexo ecossistema do Encontro das Águas dos rios Negro e Solimões.

O movimento socioambiental S.O.S Encontro das Águas é uma expressão da sociedade manauara formado por pessoas física e jurídica, em destaque a participação de lideranças comunitárias da Colônia Antonio Aleixo, do Movimento das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan), de escritores e intelectuais renomados , entre outros.

A militância socioambiental na prática tem articulado o saber tradicional dos ribeirinhos em consonância com os paradigmas da academia, com objetivo de interpretar e compreender o conjunto de paisagem, da flora e fauna dos ecossistemas formadores do Encontro das Águas.

O Encontro das Águas é um desses fenômenos magníficos a se apresentar ao mundo, catalisando sentimento de espanto, admiração e identidade traduzidos em valores culturais, potencializando não só a história do povo do Amazonas, mas a sua própria sustentabilidade. O Encontro dos rios Negro com o Solimões é extensivo conectando com outros tributários formadores do riquíssimo e majestoso Rio Amazonas.

A luta do Movimento S.O.S Encontro das Águas é alertar os governantes, assim como as empresas privadas quanto à responsabilidade social e ambiental referente ao valor desse patrimônio e todo o Manancial Amazônico formador desse fenômeno, promovendo pesquisa que possam inventariar esse ícone, na perspectiva de garantir o Tombamento Definitivo desse bem público enquanto Patrimônio Natural e Cultural do povo brasileiro seguido de um Plano de Monitoramente e Gestão dos Recursos Ambientais sob o controle dos próprios sujeitos atuantes na área a ser protegida.

O processo de Tombamento do Encontro das Águas contraria os interesses daqueles empreendedores reducionistas que fazem pouco caso da responsabilidade ambiental, ferindo de morte o Cartão Postal dos Manauaras. Por isso, já se pronunciaram pela impugnação tentando sustar o Tombamento desse bem, que para nós Amazonenses é dotado de valor incomensurável.

A Luta torna-se ampliada, devendo agregar novos participantes para o enfrentamento dessa batalha que tem por fim último a defesa da Amazônia e de sua sociobiodiversidade manifesta no conhecimento tradicional de sua gente.

COLETIVA DE IMPRENSA
Dia 03/11 (quarta-feira) às 10h
Local: Espaço Cultural da Livraria Valer
Rua: Ramos Ferreira, 1195 - Centro de Manaus.

NCPAM NO SEGUNDO TURNO DO TOP BLOG 2010

Khemerson Macedo (*)

Pelo segundo ano consecutivo o Núcleo de Cultura Política do Amazonas – NCPAM/ UFAM está pautado entre os cem melhores blogs corporativos de política e, mais uma vez, está concorrendo ao TOP 03 de sua categoria no Prêmio Nacional Top Blog, evento realizado anualmente por entidades do setor interessadas em avaliar e dar visibilidade às iniciativas midiáticas interessadas em difundir conhecimento e informação através dos blogs pessoais, profissionais e corporativos, formando uma rede de interação já batizada pelos parceiros de “blogosfera”.

Neste contexto, o NCPAM, núcleo de estudos interessados em discutir e analisar os fenômenos políticos, culturais e sociais da Amazônia, sobretudo do Amazonas, mais uma vez obteve aprovação dos internautas e encontra-se entre os melhores de sua categoria.

Este reconhecimento de nosso trabalho é o principal retorno que nós, pesquisadores integrados ao NCPAM, temos e, como não podia deixar de ser, estamos mais do que aptos a passar por mais este turno de votação, esperando sinceramente nos situarmos entre os três melhores de nossa categoria.

De nossa parte, continuamos nosso trabalho de forma intensa, desenvolvendo temáticas e promovendo o debate sobre as mais diferentes questões, além de desenvolver projetos de pesquisa e extensão voltados para o estudo e a compreensão dos fenômenos políticos, sociais e culturais que tanto inquietam os corações e mentes daqueles preocupados em entender e se apaixonar pela Amazônia.

O segundo turno do Top Blog 2010 iniciou-se no dia 10/10/10 e vai até o dia 10/11/2010, onde os três melhores de cada grupo/ categoria serão escolhidos a partir de júri popular (voto do internauta) e júri acadêmico. Esperamos contar com o reconhecimento daqueles que nos acompanham para nossa qualificação entre os três melhores de nossa categoria, lembrando ainda que a abrangência de nosso espaço interativo só é possível a partir do acesso e participação dos internautas! - Para votar, basta clicar no espaço abaixo do Prêmio Top Blog e depois confirmar no seu e-mail.

(*) É Coordenador de Pesquisa do NCPAM/ UFAM.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

CONFIRMADO: TOMBAMENTO DO ENCONTRO DAS ÁGUAS NA PAUTA DO IPHAN

Encontro das Águas entre os rios Negro e Solimões deve integrar o rol dos bens protegidos pelo Iphan. Os mais de 10 quilômetros em que é possível observar as águas escuras e transparentes do Rio Negro correndo ao lado das águas turvas e barrentas do Rio Solimões, no Amazonas, podem se tornar o mais novo bem protegido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan no norte do país.

O Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural estará reunido nos próximos dias 4 e 5 de novembro, no Rio de Janeiro para avaliar a proposta de tombamento do Encontro das Águas como bem cultural brasileiro, considerando seu alto valor paisagístico. De acordo com o parecer do Departamento de Patrimônio Material e Fiscalização – Depam/Iphan, o fenômeno de encontros das águas é relativamente comum na bacia amazônica. Acontece sempre que um chamado rio branco encontra com um de águas escuras, como no caso do encontro entre o Tapajós e o Amazonas em Santarém, no Pará.

Em Manaus, no Amazonas, o encontro das águas entre os rios Negro e Solimões é coberto de excepcionalidades e singularidades. Um dos principais destaques são o volume e a vazão das águas dos dois rios no momento do encontro. A força e grandeza são tão expressivos que, certamente, trata-se do maior encontro das águas do mundo, pois são mais de 10 quilômetros de distância entre o ponto onde as águas se encontram até a diluição total entre as duas. Os primeiros três quilômetros são marcados por uma linha quase rígida onde, à margem direita estão as águas claras e barrentas do Solimões e à esquerda, as escuras e transparentes do Rio Negro.

Outra singularidade do fenômeno é que ele ocorre a poucos quilômetros da cidade de Manaus, a maior concentração populacional da região, com uma população que ultrapassa 1,7 milhões de pessoas.Levando-se em conta cidades vizinhas, o aglomerado humano ultrapassa 2 milhões de habitantes.

A Região Metropolitana de Manaus possui cerca de 60% da população do estado do Amazonas. Por isso, o Encontro das Águas de Manaus se reveste de valores simbólicos e afetivos para população amazonense. É também, um dos principais cartões postais do Estado do Amazonas e da cidade de Manaus, constituindo um de seus mais importantes atributos turísticos.

Além da excepcionalidade do Encontro das Águas no rio Amazonas, o Depam reforça no parecer favorável ao tombamento que a área deve integrar o rol dos bens protegidos pelo Iphan e também de bem em risco, considerando que alguns dos recentes projetos de intervenção na área a ser protegida não respeitam os valores culturais e paisagísticos deste que é um fenômeno natural revestido de singularidades. Como se trata de um fenômeno formado essencialmente por obra da natureza, o parecer destacada a oportunidade e atualidade de um dos mais belos e importantes parágrafos do Decreto Lei 25/37, que apesar dos mais de 70 anos de publicação, está ainda bastante atual, visto que expressa textualmente que “são também sujeitos a tombamento os monumentos naturais, bem como os sítios e paisagens que importe conservar e proteger pela feição notável com que tenham sido dotados pela natureza ou agenciados pela indústria humana”.

A proposta do Iphan é que tombamento do Encontro das Águas seja delimitado por poligonal que proteja tanto a superfície líquida da área principal de ocorrência como uma pequena porção da Ilha do Xiborema (a última ocorrência natural antes da junção dos rios Negro e Solimões), uma faixa de 200 metros das margens direita e esquerda, além do lago do Aleixo e a primeira ilha fluvial da margem direita do Amazonas, por serem o conjunto de elementos da paisagem que compõem e conformam o Encontro das Águas de Manaus. Dentro dos limites do perímetro de tombamento, não deverá ser permitida nenhuma nova construção e nem instalação que avance o leito aparente do rio. É o caso da construção do Porto da Laje, que a Vale pretendia construir nestas imediações.

Já em relação ao aspectos paisagísticos e a necessidade de resguardar uma faixa contígua ao perímetro de tombamento de interferências nocivas à apreensão do fenômeno, o Depam sugeriu como área de entorno uma faixa de mil metros a partir do perímetro de tombamento. Nesta faixa, toda nova intervenção que possa interferir nos valores arqueológicos, etnográficos e paisagísticos do bem deverão passar pela avaliação prévia do Iphan.

O Rio Amazonas é o maior do mundo, tanto em volume de água quanto em comprimento. Desde sua nascente, no Peru, até a foz, que no Oceano Atlântico, o Amazonas percorre 6,9 quilômetros. Sua bacia hidrográfica também é a maior do mundo e o sua vazão é de aproximadamente 209 mil metros cúbicos por segundo, o que representa 1/5 de toda a água fluvial da Terra. Até os estudos realizados em 2007, afirmava-se que as nascentes do Rio Amazonas estava na cabeceira do Rio Marañon. Entretanto, a pesquisa revelou que na verdade o rio nasce a partir da laguna McIntyre, ao sul do Peru, e recebe diversos nomes ao longo do percurso. Entra no Brasil com o nome de Solimões e, a partir do encontro com as negras e transparentes do Rio Negro, recebe o nome de Amazonas.

O Rio Negro é o maior afluente da margem esquerda do Amazonas e o segundo em volume de água. Nasce na bacia do Orinoco, na Colômbia, e percorre cerca de 1,7 mil quilômetros. Caracteriza-se pelas águas negras, decorrentes da existência de matéria orgânica vegetal em decomposição.

A reunião do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural será nos próximos dias 4 e 5 novembro, no Salão Portinari, que fica no Palácio Gustavo Capanema, sede do Iphan no Rio de Janeiro. O Conselho que avalia os processos de tombamento e registro, presidido pelo presidente do Iphan, Luiz Fernando de Almeida, é formado por especialistas de diversas áreas, como cultura, turismo, arquitetura e arqueologia. Ao todo, são 22 conselheiros de instituições como Ministério do Turismo, Instituto dos Arquitetos do Brasil, Sociedade de Arqueologia Brasileira, Ministério da Educação, Sociedade Brasileira de Antropologia e Instituto Brasileiro de Museus – Ibram e da sociedade civil.

Além do tombamento do Encontro das Águas, fazem parte da pauta da reunião do Conselho Consultivo a proposta de registro como Patrimônio Cultural do Brasil o Ritual dos sistemas agrícolas do Alto Rio Negro e do Ritual Yaokwa do Povo Indígena Enawene Nawe no Mato Grosso. Os conselheiros avaliarão também a possibilidade de tombamento para o sítio histórico de São Félix, na Bahia, da paisagem natural de Santa Tereza, no Rio Grande do Sul, e do Monumento aos Mortos, na cidade do Rio de Janeiro.

Serviço:
Reunião do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural
Data: 4 e 5 de novembro de 2010
Local: Palácio Gustavo Capanema
Rua da Imprensa, 16 – Centro – Rio de Janeiro - RJ

Mais informações:
Assessoria de Comunicação Iphan
Adélia Soares – adelia.soares@iphan.gov.br
Daniel Hora – daniel.hora@iphan.gov.br
Mécia Menescal – mecia.menescal@iphan.gov.br
(61)2024-6187/ 2024-6194 (61)9972-0050 www.iphan.gov.br / www.twitter.com/IphanGovBr

Fonte: http://www.acritica.com.br/

DEPOIMENTO: EDUARDO GALVÃO

Orlando SAMPAIO SILVA (*)

Em uma manhã de Domingo de 1942, tendo eu dez anos de idade, fui com meu pai fazer mais uma visita ao Museu “Emilio Goeldi”. Lá encontramos conversando de pé, em frente ao Aquário, dois antropólogos, Carlos Estevão e Curt Nimuendaju. Meu pai, cearense, era amigo de seu conterrâneo Carlos Estevão. Fomos apresentados a Nimuendaju, esta figura quase lendária da antropologia brasileira, que fez etnografia em grupos indígenas de todas as regiões brasileiras.Tomando este fio da meada, passo a narrar outro encontro meu, ocorrido no Museu, porém, já em 1955. Eu, estudante universitário, lá conheci o antropólogo Eduardo Galvão, recém-chegado do Rio de Janeiro. Ainda jovem, Galvão chegou para um longo labor profissional em nossa prestigiada instituição de pesquisa ao longo de vinte anos.

Poucos anos mais tarde, eu e Galvão éramos colegas como professores da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Pará – FFCL-PA. Galvão dava aulas de Etnologia e Etnografia Geral e de Etnologia e Etnografia do Brasil e Língua Tupi. Nosso antropólogo não se demorou no magistério em nossa Faculdade; outros professores foram sucessivamente indicados por ele para ocupar as referidas cátedras.

A partir de março de 1966, novos fatos vieram a estreitar meu relacionamento profissional e pessoal com Eduardo Galvão. Tendo eu retornado a Belém de meus cursos de pós-graduação realizados na Escola de Sociologia e Política de São Paulo, assumi a chefia do Departamento de Ciências Sociais da FFCL-UFPA. Então, eu era o professor titular de Metodologia e Técnicas de Pesquisas em Ciências Sociais. Passei a convidar alguns colegas para fazerem palestras sobre a metodologia de pesquisa que empregavam no campo, entre estes, Eduardo Galvão, Edson Diniz, Protasio Frikel e Mário Simões.

Galvão com sua voz rouca e baixa despertava grande interesse nos alunos, que se esforçavam para compreender suas palavras, enquanto eu alertava o palestrante para tentar falar mais alto, esforço que não era cômodo para o ilustre mestre. Também, passei a organizar e coordenar seminários sobre temas antropológicos e sociológicos relacionados com a Amazônia, eventos que se realizavam à noite na Faculdade, na Av. Generalíssimo Deodoro. Galvão foi convidado por mim a participar e levou aos nossos encontros as narrativas de suas experiências e seus saberes, enfatizando a questão teórica e empírica da aculturação, tema que com ele discuti.

Em 1966, com a anuência oficial da direção da Faculdade de Filosofia e com a concordância do Chefe da Divisão de Antropologia do Museu Goeldi, Eduardo Galvão, passei a dedicar meio expediente de meu trabalho diário como professor em tempo integral ao estágio naquela Divisão de Antropologia, sob a orientação de Galvão, que dizia ser eu um estagiário especial, já que lavara comigo para a sua instituição o meu projeto de pesquisa entre japoneses da Zona Bragantina, que eu estava desenvolvendo como estudo de campo de minha cadeira. Meu projeto se enquadrava nos interesses que tinha Eduardo Galvão por estudos sobre mudanças culturais em áreas rurais.

Fui estagiário na Divisão de Antropologia do Museu Goeldi, sob a batuta competente de Eduardo Galvão, até fins de 1969, quando, tendo sido aposentado pelo governo militar, mudei-me para São Paulo. Meu estágio foi contínuo, tendo apenas sido interrompido em duas oportunidades em que, na minha condição de Vice-Diretor da FFCL-UFPA, assumi a direção da Faculdade.

Meu estágio no Museu Goeldi e a convivência com os colegas da antropologia (Galvão, Edson Diniz, Adélia Engrácia de Oliveira, Expedito Arnaud, Protasio Frikel, Mário Simões, Judith Shapiro), por um lado, reforçaram em mim meu interesse pelos estudos etnológicos e etnográficos em sociedades indígenas e, por outro lado, me propiciaram acompanhar, em parte, o pensamento e a produção antropológicos de Galvão ao longo de seu labor constitutivo, no tempo em que os mesmos eram gerados. Nessa fase, Galvão efetivou excursões às aldeias indígenas e elaborações de alguns de seus textos.

Em face desta circunstância vivencial, decidi conhecer, ao longo dos anos, toda a obra publicada de Eduardo Galvão e mais o que fosse, então, possível de seus cadernos de campo ainda não publicados. Esse conhecimento levou-me a eleger a obra de Galvão como a matéria e a substância de minha tese de doutorado, que defendi na PUC-SP. Debrucei-me sobre a obra de Galvão, que foi objeto de minha análise-crítica com a profundidade perceptiva e gnosiológica possível; análise-crítica de seu trabalho de campo em um número considerável de grupos indígenas e em comunidades rurais, bem como, de seu pensamento e de suas propostas orientadoras, indicadoras de caminhos.

Minha tese se intitula “Índios e Caboclos: Estudo da Obra de Eduardo Galvão”. Publiquei-a, com alterações necessárias, no meu livro “Eduardo Galvão: Índios e Caboclos” (Ed. Annablume, São Paulo, 2008). Em meu estudo percebi a vida produtiva de Galvão dividida em três períodos. Seus trabalhos publicados são abordados como criações próprias de cada um destes períodos. O primeiro período (P. 1) é o do jovem Galvão, eu diria, é o período de formação do antropólogo.

Nele, os trabalhos publicados são, predominantemente, em co-autoria, sendo que parte deles tendo como companheiro Charles Wagley, antropólogo norte-americano muito ligado ao nosso país, que veio a ser o orientador no doutorado de Galvão na Universidade de Colúmbia, nos Estados Unidos. Os textos desta fase contêm as observações de campo de Galvão desde a primeira, que ele realizou aos dezenove anos de idade (1939 e primeiros meses de 1940), em companhia de Wagley, entre os Tapirapé. Porém, seu primeiro trabalho publicado versou sobre o parentesco tupí-guaraní, em co-autoria com C. Wagley (1946). Durante este período, Galvão cursou História e Geografia na Faculdade de Filosofia do Instituto Lafayete (que veio a ser a Faculdade de Filosofia da Universidade do Estado da Guanabara), tendo concluído seu bacharelado em 1946. No ano de 1939, E. Galvão ingressou no Museu Nacional como estagiário.

Em 1941, Galvão fez cursos de formação em antropologia no Museu Nacional. Deste então até 1947, trabalhou nesta instituição de pesquisa como naturalista. De 1947 a 1949, Galvão faz seu doutorado na Columbia University, vindo a defender sua tese em 1952. Em seu estudo doutoral, Galvão estudou principalmente a dimensão religiosa de uma comunidade do interior do Pará, Itá (Gurupá). Retornando dos Estados Unidos, nesse mesmo ano, Galvão foi contratado pelo Serviço de Proteção aos Índios – SPI, dando início à sua vida propriamente profissional e adentrando no segundo período (P. 2) de sua produção científica, cujo primeiro marco é sua tese. Este período se caracteriza pela publicação de textos científicos individualizados. Na terceira fase de sua produção acadêmica (P. 3), Galvão retorna à publicação de trabalhos em co-autoria, basicamente, com colegas do Museu Goeldi, tais como Adélia Engrácia de Oliveira Rodrigues.

No SPI, Galvão trabalhou ao lado de Darcy Ribeiro e de Roberto Cardoso de Oliveira, e chefiou a Secção de Orientação e Assistência, no Museu do Índio, no Rio de Janeiro. Em 1955, Galvão foi para o Museu Paraense “Emilio Goeldi”, onde teve o principal locus de trabalho de sua vida; lá labutou, com curta interrupção quando foi para a Universidade de Brasília, ao longo de duas décadas, onde foi, fundamentalmente, o brilhante coordenador do setor de antropologia, tendo passado pela direção do Museu. Quando Galvão foi para o Goeldi, encontrava-se no segundo período de sua produtividade científica, fase de notável maturidade intelectual, que vem da conquista de seu título de doutor em antropologia e se estende até os primeiros anos 60. Neste período, Galvão levou à comunidade científica seu pensamento e suas idéias sobre como fazer antropologia em nosso país, concepções que ele expôs principalmente por intermédio de conferências. Foi ao campo, pesquisou sociedades indígenas em si mesmas (como os Kamaiurá) e, fundamentalmente, em grupos em contatos entre si e com a sociedade inclusiva, desvelando processos de mudanças culturais e aculturativos, temas de sua predileção.

Com base nessas constatações e inspirado, porém criticamente, em hipóteses de áreas culturais de colegas norte-americanos, tais como Steward, Murdock e Kroeber, ele percebeu que as sociedades indígenas vivem (ou viviam, no período de 1900 a 1959) em espaços que se constituíam em Àreas Culturais Índígenas do Brasil: 1900-1959 (Bol. do Museu P. Emilio Gueldi, n.s., Antrop., n° 8, Belém, 1960), nas quais interagiam em processos culturais intertribais e extratribais. Galvão intuiu nos dados empíricos observados no campo por ele e por outros antropólogos, ocorrências de sistemas de inter-influências culturais e sociais entre diferentes sociedades gestados no complexo social tempo-espacial. Voltou-se para a etnologia da “cultura xinguana”, na prototípica “área do uluri”, Parque Indígena do Xingu, onde vicejam processos aculturativos intertribais.

Eduardo Galvão, também, captou, com sabedoria, a categoria social do caboclo já constituído em Itá (Gurupá), em sua Tese (“Santos e Visagens: Um estudo da vida religiosa de Ita, Baixo Amazonas”, 1976) e, do caboclo em formação, nas pesquisas que desenvolveu entre os Tenetehára, no Maranhão, e em meio às populações indígenas e não indígenas do Alto Rio Negro. Galvão, em textos densos, caracterizou e conceituou esse ser social mestiço,“híbrido” cultural, social e biologicamente, e, quase sempre, marginalizado, subordinado e explorado economicamente.

(*) É professor doutor em antropologia com profundo conhecimento da problemática Amazônica.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

MENTIRAS, POLÍTICA, UNIVERSIDADE

AE - Roberto Romano (*)

Na busca do verdadeiro reside a essência universitária. Norberto Bobbio dizia existir um anti-Estado quando setores políticos e sociais agem ao arrepio das leis e da transparência democrática. Também é possível afirmar que a ordem acadêmica que renega seu múnus - a pesquisa acima das assertivas ideológicas, religiosas ou políticas - gera uma antiuniversidade.

Cientista que aceita e patrocina a distorção de enunciados e de atos atraiçoa a sua missão: vencer o sofisma e o fanatismo que castigam indivíduos ou grupos. Tomás de Aquino, ao receber o aviso de certo frade sobre um boi voador, incontinenti se dirigiu à janela para verificar o fenômeno. Vieram as caçoadas do brincalhão. "Prefiro acreditar que um boi voa, pois não aceito que um religioso minta", observou Tomás de Aquino. Quem age de maneira decorosa sempre opta inicialmente por atribuir veracidade aos professores. Se eles mentem ou aceitam a mentira, deixam sua condição, passam ao estatuto de sofistas.

É certo que algumas "classes e profissões forçam os seus representantes a mentir, como, por exemplo, os teólogos, os políticos, as prostitutas, os diplomatas, os poetas, os jornalistas, os advogados, os artistas, os fabricantes de alimentos, os operadores da bolsa, (...) os falsificadores, os gigolôs, os generais, os cozinheiros, os traficantes de vinho" - cf. Victoria Camps, in Carlos Castilla del Pino (Org.): El Discurso de la Mentira, Madrid, Alianza, 1988.

Mentiras profissionais são partilhadas. Nelas a vítima assume a aparência, não exige a plena verdade. Temos aí algo lícito ou ilícito, segundo o caso. Torquato Acetto escreveu, em 1641, um livro cujo título já elucida o ponto: Sobre a Dissimulação Honesta. Pior é a mentira como ato de violência e poder. É o que pregou, na mesma ocasião, Gabriel Naudé, com o pior maquiavelismo, nas Considerações Políticas sobre os Golpes de Estado.

As falsidades mencionadas são convencionais. A mentira real identifica-se com a injustiça do poder, uma violência só justificada pela submissão do violentado. Nela as duas partes - falsário e vítima - sabem que estão mentindo um para o outro, mas ao dominado só resta aderir. Existe mentira jurídica e política se a competência linguística é assimétrica: mente-se à criança, ao doente, ao fraco, ao vulnerável, ao que depende de tutores. A mentira é possibilitada pela dominação religiosa ou ideológica. Na democracia, a competência linguística é simétrica e compartilhada.

Montaigne define a mentira como "valentia diante de Deus e covardia diante dos homens". Sendo assim, impera a assimetria discursiva entre cidadania e governos. E temos o poder de quem decide sobre o que pode ser ouvido e compreendido pelos governados. Mentira é não dizer a verdade a quem tem direito a ela. Assim, a censura à imprensa, sobretudo quando emana de juízes, mostra que uma sociedade não é democrática, pois nela se recusa aos governados o direito à verdade. O censor imagina-se acima do corpo cidadão. Tirania, eis o nome de tal prática na ética ocidental. No Brasil existem juízes censores, o que basta para mostrar o quanto nossa democracia é frágil.

Voltemos aos universitários e professores. Eles não devem nem podem tolerar, na própria vida e na coletiva, atos deliberadamente cometidos no campo da mentira, mesmo que tudo seja feito para maior glória do povo, do partido ou mesmo da divindade. "Deus não precisa de nossa mentira", dizia Santo Agostinho contra quem ousava inventar desculpas para o Ser que é a própria Verdade. Grandes causas, cultura, valores, quando defendidos com dolo, transformam-se imediatamente no contrário.

Agora, a realidade acadêmica de hoje, em clima eleitoral. Alguns professores universitários se reuniram na Sala dos Estudantes (Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo) para apoiar uma candidatura à Presidência da República. O ato, que ocorreu no dia 8 de outubro de 2010, é ilegal, pois é vetado o uso de prédios públicos para fins político-partidários (artigo 73 da Lei n.º 9.504/97). A ilegalidade foi cometida até mesmo por ilustres juristas. O pior é a desculpa usada para obter a referida sala: os estudantes afiançaram que nela fariam um regular "estudo de grupo".

Os intelectuais que endossaram o ato não desconhecem a lei. Eles também não podem ignorar a mendacidade praticada pelos estudantes, pois juntos organizaram a manifestação. Seria desgraça em demasia se professores do Direito desprezassem a norma legal. Pior é a atitude de professores de Ética e Política que, em plena consciência, aplaudem um truque onde reluz a mentira. Tudo vale em nome da causa?

Muito regrediu o Estado brasileiro em nossos tempos, rumo às trevas. Renasce entre nós todo o ódio trazido pelas religiosidades autoritárias, as quais retomam a face obscurantista. O avanço de bispos católicos e pastores na seara política se faz em prejuízo da ordem estatal, da sociedade e das próprias igrejas ou seitas.

No Estado, a plena soberania sai arranhada. Na sociedade, a intolerância gera frutos malditos. Nas próprias igrejas, a hegemonia dos retrógrados afasta os que respeitam crenças alheias. A divisão nas hostes da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) indica algo inédito na história daquele plenário. E Igreja Católica sem união conduz ao desarrazoado das massas. "Não se deve usar Deus como punhal", disse certa feita Denis Diderot.

Um nume reduzido a instrumento de luta política é pura mentira.
Uma universidade que permite no seu interior truques ignóbeis é pura mentira.
Saibamos evitar, com prudência máxima, tais ameaças à nossa frágil democracia.

(*) É filósofo, professor de ética e filosofia na Universidade Estadual de Campinas, é autor, entre outros livros, de "O Calderão de Medeia"(perspectiva) e articulista do O Estado de S. Paulo.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

FLAGRANTE DA AUDIÊNCIA QUE NÃO HOUVE

Em respeito ao IPHAN

Presidente da Comissão de Assuntos Amazônicos, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Assembléia do Estado do Amazonas, Deputado Luiz Castro, reeleito para mais um mandato, quando lamentava na plenária da Audiência Pública, nesta segunda-feira (25), no Auditório Bethe Azize, a ausência do superintendente do IPHAN, Juliano Valente, convidado para dar ciência do Tombamento do nosso Encontro das Águas dos rios Negro e Solimões. O não comparecimento do superintendente, que era objeto da convocatória, prejudicou o andamento dos trabalhos, levando o presidente Luiz Castro a suspender a Audiência Publica, em respeito muito mais ao IPHAN do que ao repente do seu gestor no Amazonas, o que contou com o apoio da plenária.

De Costa para o Povo

O Auditória Bethe Azize, da Assembléia do Estado Amazonas, nesta tarde do dia 25, estava cheio com a presença dos especialista convidados, prontos a contribuírem para consecução da proposta do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) referente ao Tombamento do Encontro das Águas, em cumprimento aos Termos do Edital de Notificação publicados no Diário Oficial da União, no dia 11 de outubro do ano em curso. No entanto, para surpresa de todos, o Superintendente do IPHAN Amazonas, Juliano Valente, mas uma vez resolveu não comparecer para dar satisfação dos seus atos à sociedade civil manauara. Desta vez, resolveu afrontar os deputados do Amazonas que participam da Comissão de Assuntos Amazônicos, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Assembléia do Estado, que convidaram para vir a público apresentar a proposta de Tombamento do Encontro das Águas, bem como o arrazoado que justifica o meritório Ato. Sem nenhuma justificativa a Casa, o superintendente do IPHAN virou as costas as organizações sociais e aos próprios deputados da Assembléia Legislativa do Estado do Amazonas.

Pego no Flagrante

Com a não realização da Audiência Pública, os participantes deixaram o Auditório da Assembléia Legislativa do Estado do Amazonas se perguntando o porquê o superintendente do IPHAN Amazonas, Juliano Valente, não compareceu a Assembléia. Quem também não compareceu foi os executivos da Lajes Logística S/A, empresa controlada pela Log-In Logística Intermodal, que gostariam de construir um Terminal Portuário nas imediações do Encontro das Águas, a Lajes pelo menos acusou o recebimento do convite da Comissão de Assuntos Amazônicos, Meio Ambiente e Recursos Hídricos, declinando porque, segundo eles, entre outras razões: “entendemos, Senhores Parlamentares, que esta Casa, dada sua representatividade política e sua delegação popular, não podem abrigar o sectarismo. Jamais fomos procurados pela Comissão para debater o novo Terminal, uma obra comprovadamente necessária ao crescimento econômico e social do Estado”. Os executivos da Lajes não compareceram, mas enviaram sua “tropa de choque” para intimidar as lideranças comunitárias do Movimento Socioambiental S.O.S. Encontro das Águas. Na saída, a tropa promoveu um verdadeiro piquenique no estacionamento da Assembléia, saciando a cede e matando a fome dos incautos.

MOACYR ANDRADE A CORES E EM RITMO DE VIVALDI


Ellza Souza (*)

Quem foi, viu, ouviu e se emocionou diante de uma apresentação tão linda. O quinteto de cordas formado por Kimberly, Wesley, Thiago, Diego, Gustavo, alunos do Liceu de Artes e Ofícios Cláudio Santoro deram um show que sensibilizou a todos que estavam no salão nobre do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (Igha). Na manhã um pouco chuvosa de 23 de outubro, como parte das festividades pelo aniversário de Manaus que completou 341 verões bem vividos, acontecia no local o lançamento do livro “Moacyr de todas as cores”, de minha autoria. Como disse no “discurso” Moacir é a cara de Manaus. Nem glória e nem dinheiro o fizeram se afastar da cidade onde nasceu. E olha que ele foi reconhecido no mundo inteiro.

Fiz com carinho esse trabalho por considerar Moacir Andrade o artista da inquietação. Não só desenhou, fez projetou de grandes construções, ensinou. Na verdade pintou e bordou. Fez de um tudo como dizia minha avó. Ouvindo suas intrigantes histórias surgiu a idéia do livro e depois de algumas dificuldades de percalço, saiu a cria. Não podem jamais cair no esquecimento as histórias de vida e da arte de um artista assim, inquietantemente criativo.

A sala estava lotada. Bernardo Cabral, Marcus Barros, Armando Menezes, Arlindo Porto, desembargador Paulo Feitosa, Cleomar Feitosa, Jaime Pereira, Pedro Lindoso, Ademir Ramos, Benayas, Geraldo dos Anjos (presidente do Igha), o próprio Moacir Andrade e outros formavam o grupo dos ilustres. Estavam presentes na platéia os amigos e os parentes que não podiam faltar. Minha mãe garbosa até fez novas amizades com as quais pretende desenvolver uma troca de produtos regionais como andiroba e mel de abelha. Recebi de todos caloroso apoio, felicitações, elogios e me senti profundamente feliz.

Logo que cheguei, um pouco mais cedo dei de cara com a mídia. Essa é a parte da história que me assusta um pouco. Desde criancinha nunca gostei nem de tirar foto quanto mais falar para uma câmera. Mas ao ver que não tinha jeito encarei o desafio. Isso antes de começar a festa. Ainda bem.

Na sala numa espécie de púlpito, que aliás encantou meu sobrinho Luciano por lembrar-lhe o tribunal, sentou Moacir, Geraldo dos Anjos, eu e o Jaime Pereira que representava a Secretaria de Cultura do município. Como no livro, o Arlindo falou de Moacir e o Moacir falou do Arlindo, em gratas recordações da infância. Essas lembranças levaram a platéia a dar boas risadas.

Precisava dar a esse dia tão especial, um toque de contos de fadas. O que fazer? Queria muito alguém que tocasse violino. Procurei o Liceu e soube do quinteto maravilhoso de cordas composto por uma menina e quatro meninos na faixa dos 15, 16 anos e que tinham tudo a ver com o livro. O pai de Moacir Andrade era pedreiro e tocava flauta. Fazia parte de um quinteto também e levava o garoto para os saraus. Kimberly, Wesley, Thiago, Diego, Gustavo foram as estrelas da festa. Fizeram vários contatos, profissionais e pessoais. Aumentaram sua legião de fãs. Claro que os pequenos músicos têm a competente supervisão de Helena, que concordou com a apresentação do quinteto.

Assim, encerrando os procedimentos oficiais de lançamento, a música de Vivaldi inundou o ambiente. Foram três peças musicais escolhidas pelos artistas que deixou a todos mudos de felicidade. Soube de gente que não conteve as lágrimas, alguns ficaram embargados pela alegria, todos estavam atentos a tão preciosa apresentação. Foi lindo de engasgar.

Em seguida aconteceu um coquetel em que eu passei debaixo da mesa. Sem ser Ana Maria não deu nem para fazer o huuuuuummmmmmm...Dancei nos salgadinhos. Ainda bem que ao som de Vivaldi que não me saía da cabeça e do coração.

(*) É escritora, jornalista e colaboradora do NCPAM/UFAM.

domingo, 24 de outubro de 2010

LEI DA BIODIVERSIDADE EM DISCUSSÃO

Academia e indústria avaliam que a medida provisória que regula o acesso à biodiversidade, em vigor desde 2001, restringe a pesquisa. Ausência do debate, a formalização dos instrumentos regulatórios e a omissão governamental contribui para o saque, a pirataria, o empobrecimento dos povos tradicionais. A questão é muito mais ampla denuncia a falta de gestão da ciência e do conhecimento tradional em território brasileiro. Enquanto isso, a depredação continua provocando grande erosão na economia da biodiversidade. O Brasil nesse terreno é um País sem Lei, sem mando e sem visão.

Afra Balazina
O Estado de S.Paulo


Com vasta riqueza em espécies de plantas e animais, o Brasil pouco avança na inovação científica a partir da biodiversidade. Para empresas e pesquisadores, o maior entrave é a atual legislação para coleta e exploração de recursos genéticos.

Ninguém envolvido com a questão defende liberdade absoluta para pegar e usar espécies da natureza em pesquisas ou para criar produtos, como remédios e cosméticos. Mas academia e indústria avaliam que a medida provisória que regula o acesso à biodiversidade, em vigor desde 2001, é problemática.

"A legislação atual é uma barreira à pesquisa aplicada e à pesquisa pura", diz Rodolfo Guttilla, diretor de assuntos corporativos da Natura. O gerente técnico científico da Aché Laboratórios, Emerson Queiroz, considera a lei "de tamanha complexidade que desestimula o aproveitamento desses recursos, dada a dificuldade de se obter autorização para acessar e pesquisar os recursos genéticos".

Ele dá um exemplo concreto. A legislação exige que antes do desenvolvimento do produto se efetive um contrato de repartição de benefícios - para pagar comunidades tradicionais, como índios, que já utilizem a planta ou animal analisados.

"Ocorre que os estudos de desenvolvimento de fármacos são de longa duração, possuem elevado custo e apenas uma pequena fração chega ao mercado. Assim, o eventual pagamento deveria incidir apenas no produto efetivamente desenvolvido e comercializado", argumenta.

Segundo empresas, a situação não é muito melhor no resto da América Latina. "Apenas a Colômbia está interessada em aperfeiçoar seu marco regulatório", diz Gutilla. No Hemisfério Norte, as leis são mais simples - mas muitos países já não têm florestas nem diversidade de espécies. "Ainda não existe um país que conseguiu estabelecer um sistema jurídico adequado e justo", afirma Queiroz.

Biopirataria: Os cientistas reclamam que são vistos como biopiratas e criticam principalmente o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (Cgen), que avalia e autoriza projetos que necessitam de coleta de materiais. "Da forma como está, somos todos ilegais", diz Vanderlan Bolzani, vice-diretora da Agência Unesp de Inovação. Ela desistiu do último projeto por não conseguir autorização para fazer novas coletas. "É mais fácil um estrangeiro vir ao País e levar pequenas amostras, que são suficientes para estudar, e patentear lá fora um composto da nossa flora."

Em 2008, o governo se comprometeu com os cientistas a resolver a questão. Um projeto de lei foi elaborado, mas nunca chegou ao Congresso. "Foi para a Casa Civil e não avançou. Fiz tudo o que estava a meu alcance para resolver", disse Luiz Antonio Barreto de Castro, secretário de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento do Ministério de Ciência e Tecnologia.

O País acabou indo à COP-10 da Convenção sobre Diversidade Biológica, em Nagoya, com a lacuna. A reunião, que termina nesta semana, pretende firmar compromissos para garantir a conservação e o uso sustentável da biodiversidade nos próximos dez anos. O Ministério do Meio Ambiente, que preside o Cgen, afirmou não ter resposta às críticas, pois a ministra Izabella Teixeira e o secretário de Biodiversidade e Florestas, Bráulio Dias, estão em Nagoya.

FORÇA E BELEZA DO AMAZONAS

O encanto e beleza de nosso Amazonas, não está nos porcentuais de rendimento do Parque Industrial de Manaus apresentado como se fosse a matemática de nossa salvação... ora, ora, sem ele, dizem os políticos, estaríamos no inferno, dançando cancã para o demo em troca dos favores do regatão e dos demais aventureiros, que por aqui passaram e resolveram aceitar o convite de seus governantes para viver os prazeres de explorar a força de trabalho de nossa gente.

Quando não, o governante resolve sair pelo mundo, alardeando que está pagando para os índios e demais comunidades tradicionais uma bolsa de valores como garantia da integridade do verde de nossas florestas.

A estratégia é fazer as agências financiadoras internacionais acreditarem que o governante local é o senhor da floresta, enquanto agrega valor em seus empreendimentos particulares, somando em seus rendimentos o verde dólar para multiplicar suas atividades comerciais em outras selvas.

O encanto e beleza de nosso Amazonas estão, verdadeiramente, nos valores de seu povo, que sabiamente vivem e moram há séculos no interior das florestas às margens dos rios, incomodados apenas em épocas eleitorais por promessas e delírios de candidatos que, por meio da política, saltam de galho em galho tentando assegurar o privilégio de viver à custa do povo.

Dessa feita, é importante que ampliemos o olhar e vejamos na imensidão de nosso território as riquezas e jóias que abrigamos como pérolas de nossas culturas tradicionais. Assim sendo, o encantamento concentra-se na estreita relação do homem indígena, do caboclo, do seringueiro, dos quilombolas instituídos em comunidades e relacionados completamente com o meio ambiente em que vivem.

Dessa relação circunscrita, entre homem e natureza, sistematizam-se os saberes que ganham formas diferenciadas interpretando e compreendendo segredos que calam fundo no universo de nossas culturas, formando e constituindo representações da mitohistória, que ordenam e regram comportamentos quanto ao modo de ser desses povos.

Esses processos próprios instituídos por essas culturas dominam formas de saber associadas à natureza referenciadas pela força da tradição oral, como conhecimento adquirido das observações e experimentos catalisados na formatação da ciência da floresta capaz de curar, matar, alimentar, embelezar e ensinar, fazendo inveja a indústria farmacêutica, que mobiliza em todo mundo, segundo o Jardim Botânico de Londres, mais de US$ 70 bilhões de dólares em pesquisa de produtos derivados de recursos genéticos. Assim, como também a indústria de sementes, que em pesquisa mobiliza mais de US$ 30 bilhões de dólares.

Enquanto isso, o governo brasileiro continua a promover leilão para alugar as florestas, atestando publicamente sua incompetência gestora no trato do patrimônio do povo brasileiro. Hoje, como bem afirmou a antropólogo Alba Zaluar, articulista da Folha de S. Paulo, são as bolsas que vigoram na política local como forma compensatória. Sob esse mando governista “estaremos todos condenados ao neoliberalismo que faz do mercado a solução para tudo?” – Hoje é Amazônia, o pré-sal e amanhã a própria soberania popular negociada por meios dos mandatos parlamentares dos nobres representantes do povo.

Para essa gente embrutecida, o belo, a paisagem, o por do sol, a floresta e suas vidas, nada mais interessam porque foi contagiada pela febre do oportunismo e da ocasião que exalta o ladrão, condenando o povo a miséria e a mendicância, o que favorece e muito o clientelismo eleitoral. Mas, a corda vai quebrar porque os interesses são múltiplos e diferenciado é o momento em que a vontade popular deve arrebatar sua liberdade e dignidade, fazendo valer sua força e beleza.

sábado, 23 de outubro de 2010

O VALOR DA POESIA: NOSSAS HOMENAGENS A THIAGO DE MELLO

* Ademir Ramos

Na relação dos homens com o mundo a questão recorrente é a origem das coisas, o princípio motor da história, o movimento, a utopia, o encantamento, desencantamento dos homens e suas formas de manifestação. Nesse contexto, pergunta-se o valor da poesia, o seu significado, sua linguagem, seus interpretes e criadores.

O valor da poesia e dos poetas reside na exaltação tanto da criatura quanto do criador. Nessa circunstância se a poesia-criatura for exaltada em si mesma, o poeta-criador transforma-se em página em branco e sua obra passa a ser determinada pela força da natureza empírica. Contrário a esta situação imposta pela natureza há de se destacar o mérito do poeta, sendo capaz de ânimo para cantar o mundo em verso, prosa e arte na forma dialógica de sua existência. Portanto:

Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?

A indagação de Carlos Drummond de Andrade faz pensar sobre o valor do poeta porque é ele o sujeito significante, o arquiteto da poesia, a construir o universo onde os homens tornam-se criança por formular questões aparentemente óbvias, capazes de abrir portas da consciência e mobilizar a todos para indignação, transformação ou resistência, como bem faz o poeta Thiago de Mello, andarilho do tempo e da esperança:

Volto armado de amor
para trabalhar cantando
na construção da manhã.
Reparto a minha esperança
e canto a clara certeza
da vida nova que vem.

O canto dos poetas tem forma e mensagem diferenciada. São leituras do mundo, que resultam da contemplação ativa ou de uma prática reflexiva fundada numa experiência criativa da compreensão. Por isso, o poeta Drummond de Andrade faz a seguinte recomendação: Convive com teus poemas, antes de escrevê-los. Passado esse momento, os poemas serão expropriados do seu contexto e relidos por atores que julgam responder a alegria, a dor e o convívio dos homens. É a poesia, em sua forma plena operando no mundo.

Poeta e poesia são interfaces que se completam nas formas diversas de compreensão e comunicação. Nessa perspectiva, ampliam-se a fronteiras, despertam-se os sentimentos e emoções, projetando no horizonte o olhar afirmativo da cultura local. Fernando Pessoa é um bom exemplo, destituído de qualquer preconceito, considera-se universal por cantar a sua aldeia. Assim o poeta dos poetas garante: Da Minha Aldeia vejo quanto da terra se pode ver no Universo.../ Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer/ Porque eu sou do tamanho do que vejo/ E não do tamanho da minha altura. . .

Da mesma forma, o poeta Aníbal Beça busca com estilo decifrar o seu território natal, demarcando seus versos com exclamações pontuais, que muito dizem da força de uma tradição. No galope do poema denuncia a insanidade da cidade com gemidos e suspiros, manifestando o poeta a sua amargura: AH! Manaus, a tua loucura verde/ é algo que não se aceita/ vive-se.

A cumplicidade do poeta com a poesia é de tamanha significância, às vezes, proposital ou não, esquecem a rima, quando de pronto são lembrados pelos consumados leitores ou narradores – filhos da poesia - a retomar o curso dos versos, em resposta à arquitetura do poema e sua própria abstração. Assim sendo, pela sua importância e valor exaltemos a poesia e por mérito, o reconhecimento do poeta como observador participante da nossa história, a cantar fundo o sentimento humano.

(*) Professor, antropólogo e coordenador do NCPAM/UFAM.

JUVENTUDE FASCINANTE

Ellza Souza (*)

A noite era de gala no Teatro Amazonas. Os alunos do Liceu de Artes e Ofícios Cláudio Santoro exibiram agilidade e talento no palco. A apresentação da Orquestra de Câmara do Amazonas (OCA) e da Camerata Amazônica abriu o espetáculo, sob o comando do maestro, garoto ainda, mas gigante em sua performance. Usou da criatividade e interagiu com as crianças da platéia fazendo-as participar junto com a orquestra de uma peça musical numa homenagem ao mês dedicado às crianças. Trinta crianças subiram ao palco, ensaiaram com o maestro a fazer soar pequenos instrumentos e fizeram direitinho a sua parte. É uma pena que no folheto do evento não cite o nome do maestro e dos músicos. Confesso minha ignorância e gostaria de conhecer um a um esses sim artistas de verdade. E pedir os seus autógrafos.

Foi emocionante também a apresentação junto com a orquestra de experientes e novos profissionais, de uma garota de uns 6 anos chamada Alexandra, que fez calar o público com o som de seu violino. Personalidade não faltou a essa pequena artista, filha de artista também.

Em seguida foi a vez dos dançarinos que deram uma mostra de tenacidade, persistência, beleza, leveza, talento. O balé clássico, a dança de rua, contemporânea, movimentos exuberantes de uma juventude saudável que se esforça e luta por um mundo melhor. Sabemos que esses jovens deixam de lado alguns desejos de consumo próprios da idade para conseguir fazer a roupa da apresentação, comprar a sapatilha, o instrumento musical. Geralmente são jovens da periferia da cidade e com poucos recursos. Muitos talentos se perdem nesse espinhoso caminho e o resultado sabemos qual é. Uma juventude transviada como se dizia antigamente.

Pas de deux, Lago dos Cisnes, A Bela Adormecida, Ballet Paquita fazem parte do universo da dança. Rostos e corpos perfeitos na vontade de mostrar o melhor de suas habilidades fazem passos e contorcionismos ao som de maravilhosas músicas clássicas e populares como a brasileira “Fascinação”. Arrepia de verdade ver esses talentos tão promissores apresentando-se no Teatro Amazonas. Pena que o teatro é pequeno para a população que o procura nesses eventos.

Do lado de fora do teatro duas filas foram feitas na entrada. Choveu, escureceu e sem aviso oficial ficamos sabendo que haveria mudança no horário. De seis passou para as sete da noite. Não deu todo mundo na primeira sessão e tiveram que fazer uma outra para acolher todo o público. Isso é sinal de que o nosso gosto musical está mudando. E para melhor. Os nossos sentidos estão se sensibilizando com os verdadeiros talentos. E chô com o grande arsenal de barulhos, letras e rebolation que fazem mal aos ouvidos e aos olhos dos mais atentos e preocupados com a alma, também.

Em relação a platéia só falta mesmo parar de gritar. Teatro não é cinema, nem showmicio. Teatro é arte, é sensibilidade, é beleza. Ao invés de gritos, os aplausos demonstram melhor a aceitação do artista no palco. De pé, bravo a todos que nos emocionaram no teatro.

(*) É escritora, jornalista e colaboradora do NCPAM/UFAM.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

TOMBAMENTO DO ENCONTRO DAS ÁGUAS É FATO CONSUMADO

Atendendo reivindicação do Movimento S.O.S. Encontro das Águas, a Comissão do Meio Ambiente, da Assembléia Legislativa, presidida pelo deputado Luiz Castro (PPS), realiza uma audiência pública para discutir o processo de tombamento do Encontro das Águas como patrimônio natural e cultural brasileiro. O evento está marcado para o próximo dia 25 (segunda-feira), às 13h, no auditório Beth Azize, 4º andar da ALEAM.

Integrantes do movimento querem aprofundar o debate sobre o projeto de tombamento proposto pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que na visão dos ambientalistas, é insuficiente para garantir a preservação da região do Encontro das Águas.

As águas correm paralelas, sem se misturar, por mais de 20 quilômetros após a foz dos rios Negro e Solimões, porque apresentam densidades, temperaturas, velocidades e composições químicas diferentes, que propiciam o exuberante fenômeno paisagístico.

Para o Movimento S.O.S. Encontro das Águas, a demarcação sugerida pelo Iphan deixa a região vulnerável a especulações, sobretudo com a expansão da Região Metropolitana, que poderá atrair empreendimentos que acarretarão danos ambientais àquela área.

Na avaliação do deputado Luiz Castro a área deve ser delimitada de forma satisfatória, a fim de evitar futuros impactos socioambientais. “Essa região abriga uma rica diversidade de espécies aquáticas, e à população ribeirinha que sobrevive da pesca naquela área”, destaca o deputado, que apóia o Movimento S.O.S. Encontro das Águas.

Deverão participar da audiência representantes do Iphan, do Centro de Ciências do Ambiente da Ufam (CCA), do Ipaam, da empresa Lajes Logística S/A, do Inpa, do CPRM, dos Ministérios Públicos Estadual e Federal, do Núcleo de Ciência Política do Amazonas (NCPAM/Ufam), do Centro Social e Educacional Lago do Aleixo e da Associação de Moradores da Colônia Antônio Aleixo.

IPHAN e a Sociedade

A Audiência Pública promovida pela Assembléia Legislativa do Estado é uma rara oportunidade para que o Superintendente do Iphan Amazonas sustente publicamente as razões que justifique o Ato demarcatório restrito do Tombamento do Encontro das Águas. Por isso, a presença do superintendente do Iphan Amazonas faz-se necesária para se esclarecer os critérios adotados e definir os futuros encaminhamentos que venham assegurar a integridade desse patrimônio conjugado com a qualidade de vida dos moradores da Colônia Antonio Aleixo e demais vizinhos. O não comparecimento na Audiência Pública do superintendente, Juliano Valente, é uma afronta a ALEAM e ao povo do Amazonas.

PELO ANIVERSÁRIO DE MANAUS


MAIS AMAZÔNIA NO DEBATE SUCESSÓRIO

A Amazônia tem grandes desafios a vencer nos próximos anos, mas pouco ou quase nada tem sido falado sobre os mesmos no atual debate sucessório. Infra-estrutura, meio ambiente, segurança nacional e tráfico de drogas são apenas a ponta de um iceberg de problemas que afetam fortemente a região e a condenam a permanecer como um velho subproduto do Estado Nacional. A propósito deste tema foi muito oportuna a palestra da geógrafa Bertha Becker, no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, na última sexta-feira.

Professora universitária no Rio de Janeiro e, ao lado do também geógrafo Aziz Ab’saber, uma das intelectuais mais qualificadas para falar sobre a região, Bertha Becker defende que até o presente momento não houve uma política adequada para a Amazônia. No entendimento dela houve adequações locais a demandas mundiais, o que em outras palavras significa que estamos tratando a região não com os olhos da Nação Brasileira, mas com os do lobby ambientalista mundial, que se por um lado incutiu nas autoridades e na sociedade civil o necessário e urgente gosto pelo cuidado com a natureza, por outro quer nos condenar a viver das esmolas dadas pelos programas de transferência de renda.

Não é este o destino que os amazônidas desejam para si próprios. Sem uma política conseqüente que relacione na medida certa meio ambiente e desenvolvimento econômico, a opção de muitos habitantes da região foi enveredar pelos caminhos da criminalidade, num círculo vicioso que, a julgar pelo atual debate sucessório nacional, ainda vai perdurar por alguns anos. Neste aspecto de nossos problemas salta aos olhos o crescente número de pessoas sobrevivendo dentro ou no entorno do trafico internacional de drogas.

Há muito, por exemplo, as autoridades federais sabem que o Amazonas é rota internacional, mas não criaram as condições satisfatórias para combater este problema.

Por fim, e ainda nos socorrendo dos saberes de Bertha Becker, muito oportuna e digna de reflexão pelas autoridades – as eleitas e as que restaram com a missão de fazer oposição – é a proposta que ela encaminha de se fazer “a modernização da Amazônia”.

Tal proposta quer “realizar um extrativismo aliado à industrialização, serviços florestais e uma melhoria da circulação fluvial”. Se tivermos um pouco disso no futuro, já teremos um caminho para trilhar e afastar os habitantes do perigo que a criminalidade e o tráfico internacional de drogas representam.

Fonte: Editorial do Jornal A Crítica (18/10)

CONVITE PARA II SEMINÁRIO DE SAÚDE AFRO