domingo, 30 de janeiro de 2011

ALCOA INVADE "O ESPELHO DA LUA" DAS AMAZONAS

A grita é geral. A Alcoa que já provocou tamanha desordem ambiental na região de Juruti, no Estado do Pará, resolveu expandir também sua propecção mineral para o município de Nhamundá, situado a 383 km de Manaus, por via aérea. O fato é que, assim como a mineradora Vale do Rio Doce quer privatizar o Encontro das Águas por meio de seus "laranjas" no Amazonas, construindo um Porto na parte frontal desse monumento, que muito significa para os amazonenses, a Alcoa, segundo comunicação abaixo, também partiu para o ataque, invadindo o Espelho da Lua das Amazonas e o seu em torno. Belo monumento natural, cultural e histórico do povo do Amazonas que serve de armadura para o imaginário das representações de nossa etnohistória. É assim mesmo, eles começam roubando as flores e depois se apropriam do jardim que é a nossa Amazônia. Filhos das Amazonas e seus amantes, como bem diria Darcy Ribeiro, o que faremos? - reinará a indiferença e a omissão criminosa entre nós ou iremos nos manifestar, entrando em contato com o nosso interlocutor e mobilizando forças para barrar mais esse criminoso ato contra o nosso patrimônio e a nossa história. Vamos nessa, é hora do berro.

Nhamundá, 30 de janeiro de 2011.

Amigo Ademir Ramos: É com muita honra que cumprimento Vossa Senhoria e com o presente venho respeitosamente solicitar um pedido muito especial.Trata-se, prezado amigo, da SERRA DO ESPELHO DA LUA. Como o senhor é um dos conhecedores, a área faz parte da história do município de Nhamundá e, por conseguinte do Estado do Amazonas. Diz um velho e cansado slogan, “Aqui começa o Amazonas”. Ocorre que, ao que tudo indica a empresa Alcoa do Brasil, e ou/ a sucessora “invadiu” a Serra, precisamente o Topo, derrubaram árvores centenárias, e construíram um casebre de alvenaria e uma Torre com aproximadamente 40 metros de altura.

Tal ação agride e destrói um dos patrimônios que vem desde a época de Francisco de Orellana, e se não tomarmos providências no sentido de pararem o uso indevido, como uma estação de rádio, o patrimônio que é de todos os amazonenses passará a ser de propriedade do mega-grupo mineiro.

Por favor, me ajude. Me oriente sobre quais as providencias que eu preciso fazer para lhe fornecer dados sobre esse crime contra o meio ambiente. Corre a boca pequena, na sede municipal que, os empresários pretendem construir um “parque ecológico”, porém, tal pretensão é uma maneira de se burlar a legislação e continuarem o desmatamento na serra. Ainda no sábado passado, estiveram filmando o Lago do Espelho da Lua, não sei a que título. Muito respeitosamente,

LISON COSTA.
Para contato: 092-9130-8292.

DESCONTINUAR CONTINUANDO

Gaudêncio Torquato - AE (*)

Continuar ou descontinuar? Essa tem sido recorrente questão sempre que novos governantes começam a gestão. Este jornal (Estadão) mostrou, na terça-feira, que a sucessão nos governos dos Estados interrompe programas, altera ênfases administrativas, impõe novos rótulos, sendo a descontinuidade a marca não apenas de opositores que ganharam o pleito, como Siqueira Campos (PSDB), que decidiu eliminar da fisionomia pública do Tocantins todos os traços do antecessor, Carlos Gaguim (PMDB), mas de correligionários, como é o caso, em São Paulo, do tucano Geraldo Alckmin, que ordenou a revisão de contratos do ex-governador José Serra.

A descontinuidade, vale dizer, é um fenômeno natural do regime democrático, na medida em que ele ganha oxigênio com rodízios no comando de poder e, por conseguinte, com a adoção de abordagens diferentes nas administrações federal, estadual e municipal. A tese seria inquestionável se a descontinuidade abrigasse mudança de programas ineficazes e continuidade de ações positivas e aprovadas pelas comunidades. No caso brasileiro, porém, o verbo descontinuar significa apagar vestígios da gestão anterior e colocar em seu lugar a moldura do governo seguinte.

Se a estratégia objetiva elevar os perfis de novos governantes, e não a modernização de processos ou mesmo a calibragem de programas já existentes, a conclusão é de que, no País, a expectativa de mudança fica só na promessa. A descontinuidade administrativa, aqui entendida como retorno ao ponto de partida, adquire o paradoxal significado de continuísmo. Expliquemos: os governantes que se sucedem promovem mudanças de forma, mas não de fundo, consolidando o jogo de soma zero: o ganho de um é a perda de outro, o que o anterior faz o posterior anula.

A alternância do poder não significa, nesse caso, a mudança de valores e padrões de comportamento tradicionais, a racionalização das estruturas, a criação de ações e programas voltados para a melhoria do bem-estar coletivo, a substituição de critérios políticos por parâmetros de desempenho e a distribuição mais equitativa de recursos materiais e simbólicos. Em suma, o campo das reformas clamadas pela coletividade é substituído pelo território das conveniências pessoais. A dinâmica, apontada como atributo do rodízio de poder, submete-se à estática (e estética) condizente com a glorificação dos mandatários. Ora, esse custo alto que a democracia paga acaba corroendo parcela das riquezas de uma nação.

Imaginemos, por exemplo, se a política urbana e de meio ambiente fosse uma linha contínua, sempre avançando na régua dos governos, desde os idos de 1985, quando foi criado o Ministério do Desenvolvimento Urbano e do Meio Ambiente. Veríamos, hoje, as tragédias e catástrofes que assolam a vida nacional? Pouco provável. O fato é que o esforço de coordenação das políticas urbana e ambiental, que se enxergava naquela pasta, fragmentou-se ao longo das administrações, a partir de 1989, quando suas atribuições se repartiram em quatro Ministérios. Criaram-se, desde então, diversos órgãos que se foram acomodando aos novos comandos ministeriais.

A divisão de programas e espaços foi se amoldando aos interesses partidários, na esteira da complexidade que a política vem adquirindo nos últimos anos. O efeito sanfona - vai e vem - dos formatos ministeriais contribui, sobremaneira, para "a filosofia das novas soluções" que os gestores públicos expõem quando iniciam sua jornada. Nas novas planilhas, prioridades são afastadas; nomes de programas ganham rotulação criativa, atendendo aos parâmetros do Estado da fosforescência e novas ênfases são arrumadas. Como a vasta seara social é a que rende mais frutos na colheita eleitoral, é em torno dela que se processam as mais fortes ações de (des)continuidade.

Programas assistencialistas, e de evidente viés populista, passam a ser a "bola da vez" em todos os recantos. Para coroar a festança os governantes, com a maior cara de pau, pegam carona no velho refrão: "É melhor ensinar a pescar que dar o peixe".

Parte da aguerrida estratégia da descontinuidade que descamba no continuísmo de métodos convoca ao palco de guerra políticos e burocratas, estes querendo avocar domínio do conhecimento técnico, aqueles erguendo a bandeira da vitória nas urnas. Mais uma vez, os efeitos são deletérios: mudança de rumos nas ações de governo, desestímulo de equipes, tensão nos ambientes, animosidade e chantagens. Diante dessa radiografia cheia de furos, a pergunta é: como atenuar os rombos do custo Brasil do desperdício decorrente da descontinuidade?

Sementes de racionalidade, felizmente, começam a florescer. A começar pela defesa intransigente da ideia de que territórios que exijam intensa e insubstituível identidade técnica sejam administrados por perfis condizentes com seu escopo. Outro caminho que pode servir para contornar os obstáculos é a própria democracia participativa. Um corpo de representantes da comunidade - escolhidos no seio de entidades respeitadas da sociedade civil - poderia apontar os programas que devem ser continuados e as ações que precisam ganhar nova rota. A parceria entre União e Estados, resultando em programas integrados, também se apresenta como alternativa para evitar os estragos de desgovernos.

Não existe, porém, melhor baliza para os governantes que o bom senso. E não é difícil saber onde está o bom senso em matéria de administração pública. É só tentar descobrir o que é novo e o que é obsoleto. O que vou fazer é algo efetivamente inovador ou essa ideia é coisa desgastada? Srs. governantes, meditem sobre a pergunta. Jorge Luis Borges escreveu: "Somos nossa memória, somos esse quimérico museu de formas inconstantes, essa pilha de espelhos rotos". Pois bem, olhem para esses espelhos. Mesmo rotos, eles poderão mostrar aos governantes de boa vontade uma aurora brilhante na administração.

(*) É jornalista, professor titular da USP, consultor político e de comunicação e articulista do Estadão. TWITTER: @GAUDTORQUATO

AJURY: ENCONTRO DE HOMENS E MULHERES QUE AMAM AS ÁGUAS





Valter Calheiros (*)

O Movimento Socioambiental S.O.S. Encontro das Águas lançou o convite e as lideranças comunitárias, religiosos, jovens, educadores, compareceram nos dias 27 e 28 de janeiro na sede do Clube de Mães Irmã Ruth Moura – na Colônia Antônio Aleixo, para discutir a formulação de propostas para a gestão do Lago do Aleixo e do Encontro das Águas! Exercitamos em duas noites uma relação de cidadania entre o homem e seu habitat. As palavras vindas dos protagonistas de um historia perversa da cidade de Manaus, além da dor da doença o seqüestro de seus filhos, com tanta lutas já vividas eles ainda tem forças para engrandecer as palavras, e dar a elas uma dimensão muito maior, sem medo, sem qualquer receio das conseqüências impostas pela cobiça que ronda a região do em torno do belo e majestoso encontro das águas.

A beleza espetacular e a relação que este mistério da natureza proporciona à humanidade é um aperitivo para o compromisso em favor da luta pela vida, da preservação dos lagos, das águas dos rios Negro e Solimões, do exuberante Sítio Arqueológico das Lajes, tudo isso faz com esses homens e mulheres sintam-se fortes a enfrentar a tantos tropeços.

Nas noites do Ajury as imagens captadas pelas máquinas fotográficas foram como testemunha dos fatos. Para as autoridades e demais incrédulos na força dos movimentos sócias e que justificam suas manobras jurídicas com a falta de tempo e de oportunidade para se reunir com as comunidades sobre o Tombamento do Encontro das Águas, as imagens do Ajury é uma prova incontestável de que o fato realmente aconteceu e que essa história será contada pelos seus próprios atores e não por aventureiros políticos e por forças econômicas descompromissadas com a vida na Amazônia. Alguns meios de comunicação divulgam diariamente notícias, políticas e econômicas de duvidosa veracidade, somente para poder registrar em uma foto e assim criar um fato.

Aqui é bem ao contrário. As fotografias do nosso AJURY confirmam uma realidade que deve nos trazer estímulos e fortalecer nossos sonhos de cidadania. Revela o compromisso de se indispor aos poderosos do dinheiro e da política em favor do caboclo que tradicionalmente habita ilhas e lagos, desde o Marapatá, Mauazinho, Ilha do Xiborena, Lago do Catalão, Lago do Aleixo, Colônia Antonio Aleixo, Bela Vista, Igarapé da Lenha, Igarapé da Castanheira, Puraquequara, Terra Nova, Ilha do Careiro, Lago dos Reis, Jatuarana, e tantas outras paragens que incondicionalmente preservam este pedaço do planeta como um ato ao mesmo tempo humano, social, mágico, transcendente e divino!

(*) É pesquisador e fotógrafo do Movimento S.O.S. Encontro das Águas.

NUNCA É TARDE PARA MUDAR O RUMO DO OLHAR

Ellza Souza (*)

Pessoas que não se afinam com a natureza exuberante de nossa região perguntam “se o encontro das águas fosse tão importante por que a cidade está de costas para o rio”. Boa indagação para a humanidade responder. Como podemos virar as costas para essa monumental riqueza de águas doces e beleza que não conseguimos com palavras descrever. A área conhecida como Lages, um lugar que compreende a nossa história ainda pouco contada e mal estudada e que espertamente alguém de muito longe se apropriou do nome e chega aqui para enganar as comunidades carentes e tentar misturar tão doces águas que bem tratadas servem aos que lhes viram as costas e aos têm pretensões de transformá-las num mar de lama e óleo.

Um porto feito dentro das condições humanas e sociais adequadas é bom, vai servir à população. Mas não tem cabimento fazê-lo numa área histórica de uma cidade onde se descortina a mais linda paisagem de um lugar. Onde dois rios sem igual no planeta, se encontram e seguem juntos, pacificamente, esbanjando fertilidade de ambos os lados.

Os anônimos que se manifestam contra o tombamento do nosso Encontro das Águas dizem coisas do tipo: “...rebeldes sem causa deveriam viajar o mundo e ver que porto e cidades se complementam”; “...a orla da cidade tá detonada e só o dinheiro privado via poder público pode recuperá-la”; “...a igreja age contra a livre iniciativa na América Latina”. Um outro que até se identifica diz que “está disposto a qualquer discussão”. Realmente a discussão saudável e pacífica da comunidade, da Igreja, das lideranças, da população manauara (que desperta para defender seus rios como o Ajuricaba defendeu o seu povo), é primordial para que não deixemos aventureiros que querem se dar bem por aqui à custa de nossa inexperiência.

Entre o poder, público ou privado, e a natureza, já que vivo num lugar privilegiado pela exuberância de seu meio ambiente, escolho a segunda opção e apesar de um dia ter virado as costas para o rio, hoje acordei e sou capaz de enxergar o bem que o Negro, vivo, pode proporcionar aos seres humanos. Em cidades mais evoluídas e modernas já poluíram os rios, derrubaram as matas, mas estão correndo atrás do prejuízo e tentando salvar o que resta. Por que vendo essas experiências não posso aprender com elas e seguir um caminho de desenvolvimento mais eficiente e inteligente. Isso se chama aprendizado, sabedoria. É tudo que a natureza precisa para nos respeitar. Nós é que precisamos aprender com ela. Pelo bem da humanidade.

Pela homologação do Tombamento Já! Já!

(*) É jornalista, escritora e colaboradora do NCPAM/UFAM.

Foto: Pesquisador e fotógrafo Valter Calheiros.

sábado, 29 de janeiro de 2011

DESTRUIÇÃO SOB NOSSOS OLHOS

Márcio Souza (*)

É triste o fato de Manaus temer a selva e os rios que a envolvem. Os igarapés que a cortavam foram implacavelmente aterrados. Mesmo com os avanços da engenharia dos dias de hoje, que permitiu o charme de ter cursos d'água cortando espaços urbanos, não se mudou de atitude, e o Prosamim, que significa a maior e mais importante intervenção na cidade de Manaus, optou pela quase total obliteração de nossos igarapés.

Quanto ao rio Negro, mantemos às nossas costas. Este rio portentoso continua vedado ao nosso olhar, e até mesmo um camelódromo tentaram construir na área do Roadway, talvez para facilitar as atividades ilícitas que a beira do rio propiciaria, demonstra a visão curta de nossos administradores.

O rio Negro, no entanto, hoje cortado por uma ponte construída com um orçamento que daria para unir Manaus a Brasília, é o grande traço de união de nossa história. O rio Negro recebeu esse nome, na manhã do dia 3 de junho de 1542, do próprio comandante Francisco Orellana, o primeiro europeu a atravessar toda a Amazônia, dos Andes ao oceano Atlântico. Orellana havia partido em fevereiro do ano anterior, sob o comando de Gonzalo Pizzaro, numa expedição que tinha como objetivo a posse de novos território. Desde as primeiras semanas a expedição sofrera pesadas baixas, porque chovia muito e a água enferrujava os equipamentos e limitava a visibilidade.

Quase dez meses depois, eles não tinham conseguido sair do rio Napo, um afluente menor do rio Amazonas, não tinham muitas opções e o mais razoável ter sido voltar. Mas os espanhóis não estavam no Novo Mundo para serem rozoáveis. Por isso, quando Orellana se ofereceu para embarcar num bargantim e descer o rio em busca de comida, Pizarro aceitou, mas advertindo que deveria regressar em quinze dias.

Orellana partiu, e não teve outra opção que seguir em frente. Ao entrar no rio Amazonas, encontraram uma série de nações bastante populosas, com quem guerrear ou confraternizaram.

O batizar o rio Negro, estava informado que aquelas terras pertenciam ao tuxaua Machiparo, um chefe que não admitia estrangeiro e deu combate sem trégua aos espanhóis.

O reio Machiparo fazia fronteira com o reino da grande rainha Amurians, mais isto já é outra história. O certo é que a denominação do rio Negro pegou, e nunca mais foi modificada. Durante dez anos eu andei muito pelas Anavilhanas, e sempre me lembrava dos europeus errantes, febris, famintos e violentos, que haviam perdido a vida naquele labirinto de ilhotas, lagos, lagunas, praias de areias finíssima e igarapés sombrios como sonhos ruins.

Nos anos 70, o grupo Tesc, muitas vezes escolhiam uma das ilhas das Anavilhanas para descansar. Amarrávamos a nossa embarcação, emprestada por um empresário amigo do grupo, e ali desfrutamos de feriados como os da semana da pátria, semana santa ou o carnaval.

Pela Manhã, bem cedo, pegávamos uma canoa e remávamos em silêncio, especialmente nos meses de rio cheio, que vai de abril a junho, visitando as terras alagadas com suas matas que pareciam ruínas de catedrais góticas submersas. Quando chovia, o mundo inteiro parecia ficar ensopado, as aves e os animais calavam, desapreciam, e ficávamos tiritando de frio, encolhidos no fundo da canoa. Mas depois, quando os primeiros raios de sol e a aragem do mormaço chegavam, o céu ficava azul, de um azul intenso e renascentista, num firmamento puro com uma operação matemática. numa paisagem como que saída de um tapete persa na vocação muçulmana da floresta amazônica, onde estão apenas podiam florescer as criaturas engendradas pela imaginação humana, únicas a povoar aquelas águas sábias como espelhos de velhos alquimistas, criaturas incertas em seu caráter elementar, como todas as fantasias imaginadas pelas paixões e feitas para excitar os espíritos curiosos.

(*) É escritor renomado, dramaturgo, articulista de a Crítica e um dos militantes do Movimento S.O.S Encontro das Águas.

Foto: Farias (Valer) - flagrante do escritor autografando a noite suas obras em praça pública no município de Maués, no intior do Amazonas.

AJURY DAS ÁGUAS MOBILIZA LIDERANÇAS COMUNITÁRIAS

O Movimento S.O.S Encontro das Águas que muito lutou pelo Tombamento desse bem dos Amazonenses agora amplia a discussão sobre o uso dos recursos hídricos junto aos comunitários do em torno do nosso Encontro das Águas (Rio Negro e Solimões) visando à gestão desse patrimônio, que agrega também o Lago do Aleixo situado na Zona leste de Manaus. Para isso com apoio de diversas instituições religosas, comunitárias, universitárias, movimento social, partidos políticos, intelectuais e do Movimento de Reintegração das Pessoas atingidas pela Hanseníase, promoveu no dias 27 e 28 de janeiro, no Clube de Mães Irmã Ruth Moura, na Colônia Antonio Aleixo, o Ajury das Águas, oportunidade em que se definiu novas estratégias e procedimentos de gestão na perspectiva de um futuro embate com o governo do Amazonas, considerando o impacto que Adutora das Lajes provocará nas comunidades se realmente vier impor a distribuição de água pela empresa Águas do Amazonas, desqualificando todo o processo de gestão que há décadas encontra-se sob o controle dos comunitários.

O evento contou com a participação de lideranças comunitárias e consultores convidados em diversas áreas com objetivo de discutir e orientar as liderenças locais quanto ao processo de luta em diversas frentes, tendo por base a legislação pertinente e, sobretudo, a questão do uso social das águas, que além de ser direito de todos é dever do Estado mediar o acesso aos cidadãos por meio de políticas públicas includentes.

As mesas de trabalho foram ricas em discussão e na formulação de propostas que foram avaliadas no último dia (28), quando se votou os encaminhamentos na direção de se garantir a gestão das Águas sob o controle das comunidades do em torno do Encontro das Águas e do Lago do Aleixo. O desafio é grande, todos (as) sabem, mas, pelo compromisso pactuado pelos comunitários a luta pelo controle, acesso e qualidade das águas deverá se unificar ainda mais quando os demais moradores compreenderem que se trata de um bem indispensável para a vida e por isso não deve ser reduzido a uma mercadoria visando unicamente o lucro dos empresários do ramo a custa do sacrificio do povo.

Enquanto os comunitários analisavam todo o processo de usarpação dos recursos hídricos perpetrado pelo Estado na Amazônia, o jovem artista da comunidade Luiz Carvalho da Silva Neto, que empresta sua marca ao Movimento S.O.S. Encontro das Águas, presenteava aos participantes mais uma de suas belas obras inspiradas num dos textos do professor Ademir Ramos, sob o titulo "As gaivotas do Encontro das Águas contra os abutres da Lajes". Na tela, o artista militante vaticina o bota fora dos oportunistas, que querem privatizar os recursos ambientais desta região por meio da construção do Porto das Lajes, vislumbrando deste modo, a construção de um novo dia encarnado na aurora da manhã, merecida referência ao poeta Thiago de Mello, que também é um dos nosso militantes e apoiadores das gaiavotas do nosso Encontro das Águas. Artistas, escritores, poetas e outros militantes das artes também lutam para garantir a homologação do Tombamento do Encontro das Águas, que conta com chancela do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).

Superando suas limitações, as lideranças compareceram e formularam propostas que deverão ser trabalhadas pelos consultores na perspectiva de se efetivar o fortalecimento da organização comunal fincada nas lutas pelo Direito sob a luz da Justiça Social. É relevante o registro do conhecimento tradicional neste contexto, que muito tem orientado as pesquisas e os indicadores dos cientistas que prestam consultoria ao Movimento Socioambiental S.O.S. Encontro das Águas.

As discussões continuaram até se definir uma forma jurídica mais apropriada para abrigar as múltiplas reivindicações dos comunitários frente ao Governo do Amazonas, que fazendo-se de morto ajuizou Ação contra o Tombamento do Encontro das Águas, alegando não ser consultado para a efetivação do Ato de proteção desse bem. Parece brincadeira porque desde 2008, o Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM), órgão representativo do Governo do Estado, vem capitaneando as ações do EIA/RIMA, promovendo as Audiências Públcias além dos debates que tivemos na Câmara Municipal, Assembléia Legislativa do Estado, no Ministério Público Federal e Estadual, debates pelos meios de comunicação e ampla divulgação pela imprensa nacional, que tornou a legitima a decisão do IPHAN a favor do Tombamento. A luta dos comunitários agora é pelo reconhecimento desse bem como patrimônio da humanidade.

As propostas foram aprovadas assim como também a agenda de luta dos comunitários. Por uma questão de segurança não podemos divulgar as datas e nem tampouco a lista de presença dos participantes, mas, as imagem dão conta do fervor desta luta e da importância de celebrar novas parcerias nesta direção. O Movimento S.O.S. Encontro da Águas recorre as pessoas de boa vontade e as organizações corporativas que promovem a responsabiliade social e ambiental para que conheçam o projeto dos comunitários e quem sabe possam com isso fazer valer o valor social expresso da propriedade investindo nesse segmento de retorno imediato.

Fotos: do pesquisador e fotógrafo Valter Calheiros.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

CANDOMBLÉS, UMA LEITURA HISTÓRICA

Luciney Araújo (*)

A cultura religiosa africana foi desenvolvida no Brasil através do conhecimento de sacerdotes negros, que com parte de seu povo, foram capturados e escravizados juntamente com seus Deuses entre 1532 e 1888.

O tráfico escravista trouxe para o Brasil escravos de Angola, Guiné, Congo, Nigéria e Costa da Mina tendo como principal válvula de escape anular as particularidades das tribos africanas, construindo em terras brasileiras uma mistura inter-étnica, construindo novos costumes.

As primeiras nações de candomblé que surgiram na Bahia datam do século XIX, fora fundada por sacerdotes africanos – bantos, jêjês e nagôs -, na qual ensinaram ritos, tradições formas de doutrinação do corpo e da cabeça.

Ivete Miranda Pravatelli (2006), afirma que: “O candomblé se organizou em torno de nações que se originaram principalmente dos grupos sudaneses que chegaram ao Brasil através da diáspora africana” (Pravatelli, 2006; pg 05).

Luiz Nicolau Parés (2006) aponta a existência das "calunduns" em meados do século XVIII, que em um primeiro momento foram identificados como meios de designar atividades religiosas de várias índoles de origem africana.

O Candomblé ganha visibilidade somente a partir do inicio do século XX na Bahia. Em São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, porém, até meados do século, os cultos afro-brasileiros permaneceram nas sombras, às escondidas. Eram religiões de preservação do patrimônio étnico dos descendentes dos antigos escravos. Assim foram conhecidas e analisadas por Roger Bastide (1960) que, entretanto, já observava a presença de brancos no candomblé no final da década de 1940, antecipando a transformação do candomblé e congêneres em religiões de caráter universal.

No início do século XX, enquanto os cultos africanos tradicionais eram preservados em seus nascedouros brasileiros, uma nova religião se formava no Rio de Janeiro, a Umbanda, síntese dos antigos candomblés Bantos e de caboclo transplantados da Bahia para o Rio de Janeiro, na passagem do século XIX para o XX, com o espiritismo kardecista, chegado da França no final do século XIX.

A literatura sobre o candomblé vai ganhar visibilidade no início do século XX, quando em 1914 Nina Rodrigues publica a obra "Os Africanos no Brasil". Anos mais tardes, Arthur Ramos e Edson Carneiro também vieram a estudar a cultura afro-brasileira na cidade de Salvador.

Uma observação freqüente nesses estudos é a referência sobre o candomblé de Angola, e que na maioria das vezes era posta de maneira inferior a de outras formas de candomblé. Como aponta Previtalli (2006): “Concebiam-se os negros bantos como ignorantes adoradores de lascas de pedra, imitadores da estrutura religiosa nagô, além de serem sincréticos, pois misturavam suas crenças a qualquer elemento religioso que conhecessem” (Previtalli, 2006, pg 13).

Em uma outra visão o próprio Arthur Ramos (1961) também considera que “as sobrevivências religiosas e mágicas de origens banto existiam deturpada e transformadas” (1961, pg 361), escreve em "Introdução a Antropologia Brasileira" um capitulo intitulado “Sobre os Povos Banto” (1961, pg 357), onde faz uma ressalva a Nina Rodrigues quanto ao número de casa de cultos Angola. Enquanto Carneiro (1991), apontou que os bantos “esqueceram seus próprios orixás”(1991, pg. 62).

Ruth Landes (1967) em “A Cidade das Mulheres”, fala que a diferenciação do Candomblé de Angola, dava-se pela sua legitimação como um rito independente e como forma de culto a caboclos brasileiros; afirmando que: “O candomblé angola legitimou desde cedo o culto dos caboclos brasileiros, que além de se constituir como rito independente, foi também incorporado lá pelos anos 30 e 40 do século XX por casas nagôs que não as da tríade fundante, a Casa Branca, o Gantois, o Opô Afonjá” (Landes, 1967).

Reginaldo Prandi (1991) aborda o fato das influências recebidas pelo culto Angola: “Talvez pelas influências que recebeu dos ritos jejenagôs, do qual adotou o panteão de orixás iorubanos, ainda que os chame por outros nomes que fazem parte de sua língua ritual de origem banto e hoje tão intraduzível quanto as línguas rituais do queto, do efã, dos nagôs pernambucano e gaúcho, resultantes de arcaicos dialetos iorubanos. Além da adoção do oráculo nagô, de preceitos iniciáticos e da organização ritual e hierárquica à moda queto.” (Prandi, 1991, pg 19).

O pesquisador Ornato Silva (1998), aborda que a idéia de religião dos povos bantos, não se organizou no Brasil com a mesma firmeza que o povo nagô, pois sendo povos considerados “primitivos”, sua religião era vista como mais simples, “consistindo apenas em uma espécie de feitiçaria animista”, com isso, Silva (1998) aponta que essas denominações religiosas que preservavam a cultura dos Bantos diluíram-se em meios às crenças católicas e ameríndias, preservando referências africanas em religiões sincréticas com laços europeus.

Silva (1998) aponta que pelo fato de os bantos terem como destino fazendas em regiões do interior brasileiro, esse povo esteve mais próximo do contato com outros costumes. Silva aborda que: “Os bantos por terem sido trazidos para o Brasil desde os primeiros tempos da escravidão e dispersados por todas as regiões onde havia algum tipo de trabalho rural, realizaram um intenso trabalho de intercâmbio com os índios também utilizados no trabalho escravo, com tribos independentes e com europeus degredados ou emigrados” (Silva, 1998. pg 10).

Silva (1998) indica que esses povos não ficaram limitados apenas a segregação religiosa, quando aborda que: “A cultura banto, não se limitou a ficar segregada em núcleos de atividade religiosa com feições próprias, mas combinou-se com as culturas desses outros povos” (Silva, 1998. pg 10).

Com isso, Silva (1998) aponta que o fato da segregação religiosa dos povos bantos, é reafirmado por outros pesquisadores da primeira metade do século XX, apontando que: “Assim, essa religião passou quase despercebida aos estudiosos do candomblé, ficando as atenções mais voltadas para o candomblé nagô” (Silva, 1998. pg 11).
Reginaldo Prandi (1991), ao aborda essa questão em seu livro “Os Candomblés de São Paulo” ao fazer uma análise dessa lacuna faz a leitura de que: “... o candomblé nagô pode contar, além do prestígio, com muitas fontes escritas brasileiras, além de uma etnografia produzida sobre o culto dos orixás (...) Nada semelhante existe sobre o candomblé de Angola, a não ser o ensino de quicongo oferecido na Universidade Federal da Bahia” (Prandi, 1991, pg 20).

Com isso, podemos perceber que os principais estudos etnográficos sobre candomblé, em sua maioria foram direcionados para o candomblé de ketu, esse objeto de estudo foi totalmente direcionado as três casas de culto da Bahia e direcionadas para preencherem os dados necessários de pureza africana e que em se diferenciavam com denominações religiosas de outras nações.

Prandi (1991) quando aborda essa questão entende que: “A produção etnográfica sobre estes candomblés prestigiados por sua publicidade passou também em anos recentes, a oferecer modelos legitimamente puros da religião dos orixás para aquelas casas de criação mais recente, ou de origem de memória perdida.” (Prandi, 1991 pg 17).
Um olhar detalhado sobre os candomblés no Amazonas leva a perceber uma predominância de casas de culto do candomblé de ketu e que em alguns casos exercem certo poder de legitimação africana. Mas após uma convivência com o “povo-do-santo”, surgi uma nova tendência entre as casas de candomblé, aquilo que Stuart Hall (2003) classifica como “uma proliferação subalterna da diferença”.

A antropóloga francesa Stafenia Capone (2004), que estudou a religião de matriz africana no Rio de Janeiro, em seu Livro “A Busca da África no Candomblé: tradição e poder no Brasil”, aborda o conceito de puros e degenerados, abordando que até que antes se fazia uma leitura do candomblé no Brasil a partir de pesquisas etnográficas que realizadas em três terreiros na Bahia e se via neles a encarnação da tradição africana no Brasil, e cita a ramificação da religião para outros centros do país mais com diferentes nomes como é o caso do Xangô de Pernambuco, o Batuque praticado no Rio Grande do Sul, o Tambor de Mina do estado do Maranhão e a Macumba carioca, criando á idéia de um continuo religioso abordando uma premissa de que: “As diferenças entre as nações estão instituídas mais pelos discursos dos iniciados que por uma oposição real nas práticas rituais... (...) Na verdade, mesmos os terreiros considerados mais puros não estão ao abrigo das novas influências...” (Capone, 2004. pg. 22).

Afirmando assim, que as modalidades de culto de matriz africana existentes no Brasil constituem diferentes combinações dos elementos desse continuum. Como se pode observar, a diferença entre as nações existe, e vão desde as maneiras litúrgicas, suas divindades, suas danças e isso faz com que sempre exista certa lacuna a ser respondida, conforme Hall define essa questão da diferença: “Differerance que tanto pode ser “marcar diferença” (to differ), quanto “diferir” (to deffer). O conceito se funda em estratégias de protelação, suspensão, referência, elisão, desvio, adiamento e reserva.” (Hall, 2003, pg 92).

Com isso, podemos constatar que no Candomblé existe uma preocupação em resgatar certos elementos simbólicos das nações para um fortalecimento e uma possível reaproximação com as raízes africanas, uma forma de recuperação cultural e uma redescoberta de uma tradição que fora negada durante anos por estudiosos das religiões de matriz-africana.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
BASTIDE, Roger: “O candomblé da Bahia: rito nagô”. Tradução de Maria Isaura Pereira de Queiroz. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
CAPONE, Stefania: “A Busca da África no Candomblé: Tradição e Poder no Brasil”. Rio de Janeiro: Editora Pallas e Contra-Capa, 2004.
CARNEIRO, Édson: “Religiões Negras, Negros Bantos”. Editora: Civilização Brasileira, 3° Edição. Rio de Janeiro, 1991.
HALL, Stuart: “Da Diáspora – Identidades e Medições Culturais”. Org. Liv Sovik. Tradução: Adelaide la Guardia Resende, Ana Carolina Escosteguy, Cláudia Álvares, Francisco Rüdiger, Sayonara Amaral. Editora: UFMG. Belo Horizonte, 2003.
________________: “A Identidade Cultural na Pós-modernidade”. Tradução: Tomaz Tadeu da Silva e Guacira Lopez Louro. 9º Edição. Editora DP&A. Rio de Janeiro, 2004.
LANDES, Ruth: “A cidade das mulheres”. Tradução de Maria Lúcia do Eirado Silva. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1967.
LIMA, Vivaldo da Costa: “Encontros de nações de candomblé da Bahia”. Bahia, Ceao – UFB – Ianamá, 1984.
________________: “A Família de Santo nos Candomblés Jejes-Nagôs da Bahia: Um Estudo de Relações Intragrupais”. Editora Currupio, 2° Edição. Salvador, 2003.
________________: “Organização do Grupo de Candomblé”. In: “Bandeira de Alairá (outros escritos sobre a religião dos Orixás)”. Org: Carlos Eugênio Marcondes de Moura. Editora Nobel, São Paulo, 1982.
PRANDI, Reginaldo: “Os candomblés de São Paulo: a velha magia na metrópole nova”. São Paulo, Hucitec, 1991.
PARÉS, Luis Nicolau: “A Formação do Candomblé: História e Ritual da Nação”. Campinas-SP, Editora da Unicamp, 2006.
PREVITALLI, Ivete Miranda: “Candomblé: Agora é Angola.” Dissertação de Mestrado defendida ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia do Departamento de Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC-SP, 163 f. 2006.
RAMOS, Arthur: “Introdução à Antropologia Brasileira.” Obras Complementas 1° Volume 3° Ed, Editora da Casa do Estudante do Brasil. Rio de Janeiro, 1961.
RODRIGUES, Nina: “Os Africanos no Brasil”. Editora UnB, Brasília; 7º Edição, 1988.

(*) É Cientista social formado pela UFAM e pesquisador do NCPAM.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

DESCONSTRUINDO A HISTÓRIA DE UM BAIRRO

Ellza Souza (*)

Agora só vou ao bairro onde nasci, de visita. Hoje fui com um jornalista para uma conversa sobre o cine Ideal que ficava ao lado da minha casa na rua Boa Vista em São Raimundo. Entramos no prédio totalmente descaracterizado onde restou apenas as boas lembranças de quem freqüentou aquele cinema inaugurado em 1941 e que pertenceu a empresa A. Bernardino e Cia.

Há vinte anos funciona no local uma academia de ginástica. Antes havia sido uma fábrica de milhitos que encerrou as atividades por motivo de um pequeno incêndio. Durante a conversa fui recordando fatos, pessoas, filmes. A cabeça da gente funciona como um arquivo e dos modernos que ao apertar um botão, voltamos no tempo. Bons tempos, diga-se de passagem.

Durante a visita ao bairro entrei na casa da minha companheira de brincadeiras na infância, a Maria do Carmo. Na mesma casa estavam outras pessoas como a Mariazinha, professora e sua filha Ana Lúcia, todas com mais de cinquentinha. Revi a casa construída por meu pai onde morei até os 16 anos mais ou menos. As três casinhas que compunham o lado da rua atrás do Ideal agora são três casarões e não ficou nem um pedacinho de terra para plantar um pé de arruda que antes servia para espantar mal olhado e doenças de crianças.

A casa do seu Anoar, o comissário que não dava refresco aos menores no cinema mudou completamente. Agora é uma construção grande e feia que tomou conta do quintal inteirinho. O “pau das andorinhas”, o baixo muro ao lado do cinema onde a juventude namorava ou apenas conversava, não existe mais. O muro é alto e enfeia o ambiente. A casa do seu Guimarães, de 1913, ao lado do cinema, está em decomposição. Nada no prédio lembra o apogeu da juventude do bairro quando o Ideal efervescia por ali e fazia uma dobradinha com o bar do português com seus picolés, sorvetes e refrescos. É, bar no tempo do Ideal servia picolé e no máximo uns goles de pinga para os adultos.

Andei pela Rua da Sede. Observei o Tufão, o clube onde debutei esbanjando felicidade ao lado do meu pai e que se encontra espremido, abandonado e escondido pela ponte Fábio Lucena. A pracinha do Sulão ainda com duas frondosas árvores mas com bancos depredados, lixo e total falta de cuidado. Estendi meu olhar para o rio, para as casinhas da vila dos Miranda Corrêa, do castelinho de 1910 que foi a cervejaria dessa família, em Aparecida dos Tocos.

Infelizmente a minha colina está marcada para receber o prosamim. Isso para mim representa a morte da história do bairro. Pelo que sei com a ponte que atravessa o rio Negro, a especulação vai tomar conta daquela área. E como sempre fazem projetos e construções em prol dos grandes empreendedores e não pensam nos moradores, na história, na preservação da cultura e da vida no local. Podia ser diferente se a vontade política combinasse com a vontade dos moradores do bairro. Jamais fazer uma transformação tal que mais tarde vai gerar arrependimento e a inexorável impossibilidade de recuperar as lembranças. Sem histórias para contar é muito difícil construir um futuro alvissareiro.

Além do cine Ideal, no bairro de São Raimundo fechou o correio, a delegacia, o clube, a feira, a loteria, a casa das freiras. Só falta fechar a igreja que fica no alto da colina. Que o padroeiro São Raimundo Nonato interceda por esta boa causa.

(*) Jornalista, escritora e colaboradora do NCPAM/UFAM.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

COLEÇÃO HISTÓRIA GERAL DA ÁFRICA EM PORTUGUÊS


A edição completa da História Geral da África está formatada em 8 volumes. A obra toda pode ser acessada também pela internet, baixando dowload de forma gratuita. Para os professores e pesquisadores da matéria a publicação atende uma grande demanda há muito reclamada por todos que estudam a história e a cultura dos povos africanos.
Brasília: UNESCO, Secad/MEC, UFSCar, 2010.

Publicada em oito volumes, a coleção História Geral da África está agora também disponível em português. A edição completa da coleção já foi publicada em árabe, inglês e francês; e sua versão condensada está editada em inglês, francês e em várias outras línguas, incluindo hausa, peul e swahili. Um dos projetos editoriais mais importantes da UNESCO nos últimos trinta anos, a coleção História Geral da África é um grande marco no processo de reconhecimento do patrimônio cultural da África, pois ela permite compreender o desenvolvimento histórico dos povos africanos e sua relação com outras civilizações a partir de uma visão panorâmica, diacrônica e objetiva, obtida de dentro do continente. A coleção foi produzida por mais de 350 especialistas das mais variadas áreas do conhecimento, sob a direção de um Comitê Científico Internacional formado por 39 intelectuais, dos quais dois terços eram africanos.

Download gratuito (somente na versão em português):
Volume I: Metodologia e Pré-História da África (PDF, 8.8 Mb)
ISBN: 978-85-7652-123-5

Volume II: África Antiga (PDF, 11.5 Mb)
ISBN: 978-85-7652-124-2

Volume III: África do século VII ao XI (PDF, 9.6 Mb)
ISBN: 978-85-7652-125-9

Volume IV: África do século XII ao XVI (PDF, 9.3 Mb)
ISBN: 978-85-7652-126-6

Volume V: África do século XVI ao XVIII (PDF, 18.2 Mb)
ISBN: 978-85-7652-127-3

Volume VI: África do século XIX à década de 1880 (PDF, 10.3 Mb)
ISBN: 978-85-7652-128-0

Volume VII: África sob dominação colonial, 1880-1935 (9.6 Mb)
ISBN: 978-85-7652-129-7

Volume VIII: África desde 1935 (9.9 Mb)
Coleção História Geral da África
Programa Brasil-África: Histórias Cruzadas

Fonte:http://www.unesco.org/pt/brasilia/dynamic-content-single-view/news/general_history_of_africa_collection_in_portuguese/back/9669/cHash/d6c86ae49c/

CUIDAR DO PLANETA É ZELAR PELO FUTURO DA HUMANIDADE

Ivan Marsiglia e Carolina Rossetti (*)

Rubbish! É a resposta - em bom inglês - do biogeógrafo americano Jared Diamond para a pergunta sacada com frequência pelos "céticos do clima" no afã de congelar o debate ambiental: o aumento da temperatura do planeta, ao qual se atribui a intensificação dos ciclos de calor e frio testemunhada hoje por toda a parte, pode ser o resultado de um ciclo natural da Terra? Rubbish - lixo, besteira. "A ideia de que as mudanças climáticas que estamos presenciando hoje são naturais é tão ridícula quanto a que nega a evolução das espécies", fustiga o autor de Colapso (Record, 2005), um tratado multidisciplinar de 685 páginas na edição brasileira que analisa as razões pelas quais grandes civilizações do passado entraram em crise e virtualmente desapareceram. E a questão assustadora que emerge de seu olhar sobre as ruínas maias, as estátuas desoladoras da Ilha de Páscoa ou os templos abandonados de Angkor Wat, no Camboja, é: será que o mesmo pode acontecer conosco?

A resposta de Diamond, infelizmente, é sim. Ganhador do Prêmio Pulitzer por sua obra anterior, Armas, Germes e Aço (Record, 1997), em que focaliza as guerras, epidemias e conflitos que dizimaram sociedades nativas das Américas, Austrália e África, o cientista americano há anos nos adverte sobre os cinco pontos que determinaram a extinção de civilizações inteiras. O primeiro, é a destruição de recursos naturais. O segundo, mudanças bruscas no clima. O terceiro, a relação com civilizações vizinhas amigas. O quarto, contatos com civilizações vizinhas hostis. E, o quinto, fatores políticos, econômicos e culturais que impedem as sociedades de resolver seus problemas ambientais. Salta aos olhos em sua obra, portanto, a centralidade que tem a ecologia na sobrevivência dos povos.

Foi na semana subsequente à pior catástrofe natural da história do País, na região serrana do Rio de Janeiro - a mesma em que um arrepiante tornado surgiu nos céus de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense -, que Jared Diamond falou por telefone ao Aliás. Às vésperas do lançamento no Brasil de um de seus primeiros livros, O Terceiro Chimpanzé (1992), o professor de fisiologia e geografia da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, fala das providências cruciais que o ser humano deverá tomar nos próximos anos para garantir sua existência futura. Diz que as elites políticas, seja nos EUA, na Europa, nos países pobres e nos emergentes, tendem a tomar decisões pautadas pelo retorno em curto prazo - até um ponto em que pode não haver mais retorno. Avalia que o Brasil dos combustíveis verdes tem sido "uma inspiração para o mundo", mas também um "mau exemplo" na preservação de suas florestas tropicais. E fala da corrida travada hoje, cabeça a cabeça, entre "o cavalo das boas políticas e aquele das más", que vai determinar o colapso ou a redenção das nossas próximas gerações.
*********
O Brasil enfrentou tempestades de verão que mataram mais de 800 pessoas. Debarati Guha-Sapir, do Centro de Pesquisas sobre a Epidemiologia de Desastres da ONU, disse que o tamanho da tragédia é indesculpável, pois o País tem apenas um desastre natural para gerenciar. Como evitá-lo no futuro?

Precisamos estar preparados para um número cada vez maior de tragédias humanas relacionadas a mudanças climáticas. O clima se tornará mais variável. O úmido será mais úmido e o seco, mais seco. A Austrália, por exemplo, acaba de sair da maior seca de sua história recente e agora enfrenta o período mais úmido já registrado no país. Em Los Angeles, onde moro, recentemente tivemos o dia mais quente da história e, há algum tempo, o ano mais chuvoso e também o mais seco que a cidade já viu.

Em seus escritos, o sr. aponta a Austrália como um país com estilo de vida antagônico às suas condições naturais. Mas, em comparação com o Brasil, os australianos se saíram melhor: enfrentaram a pior enchente em 35 anos, mas contabilizaram apenas 30 mortos. Como explicar isso?

É verdade que o modo de vida dos australianos não está em harmonia com suas condições naturais. Mas o estilo de vida dos americanos e dos brasileiros tampouco. O modo de vida do mundo não está em harmonia com as condições naturais deste próprio mundo. No caso da Austrália, o país fica no continente que tem o meio ambiente mais frágil, o clima mais variável e o solo menos produtivo. Mas a Austrália é um país rico e dispõe de mais dinheiro que o Brasil para criar uma infraestrutura que gerencie tais problemas. Em Los Angeles, onde as enchentes são recorrentes, não resta um rio em seu leito natural: todos receberam canais de concreto para reduzir o risco de enchentes. A minha casa fica literalmente em cima de um córrego coberto por uma estrutura de concreto. Nos 34 anos em que vivi nessa casa, apenas duas vezes a água invadiu o porão.

Em Colapso, o sr. lista cinco razões que explicam o declínio das sociedades. Elas continuam as mesmas?

Sim. Os cinco fatores que levo em consideração ao tentar entender por que uma sociedade é mais ou menos propícia a entrar em colapso são, em primeiro lugar, o impacto do homem sobre o meio ambiente. Ou seja, pessoas precisam de recursos naturais para sobreviver, como peixe, madeira, água, e podem, mesmo que não intencionalmente, manejá-los erradamente. O resultado pode ser um suicídio ecológico. O segundo fator que levo em conta é a mudança no clima local. Atualmente, essa mudança é global, e resultado principalmente da queima de combustíveis fósseis. O terceiro fator são os inimigos que podem enfraquecer ou conquistar um país. O quarto são as aliados. A maioria dos países hoje depende de parceiros comerciais para a importação de recursos essenciais. Quando nossos aliados enfrentam problemas e não são mais capazes de fornecer recursos, isso nos enfraquece. Em 1973, a crise do petróleo afetou a economia americana, que dependia da importação do Oriente Médio de metade dos combustíveis que consumia. O último fator recai sobre a capacidade das instituições políticas e econômicas de perceber quando o país está passando por problemas, entender suas causas e criar meios para resolvê-los.

O colapso da sociedade como hoje a conhecemos é evitável ou apenas prorrogável?

É completamente evitável. Se ocorrer, será porque nós, humanos, o causamos. Não há segredo sobre quais são os problemas: a queima exagerada de combustíveis fósseis, a superexploração dos pesqueiros no mundo, a destruição das florestas, a exploração demasiada das reservas de água e o despejo de produtos tóxicos. Sabemos como proceder para resolver essas coisas. O que falta é vontade política.

O Brasil tem feito sua parte?

Nunca estive no Brasil, portanto não posso falar a partir de uma experiência de primeira mão. Mas pelo que entendo, vocês adotaram uma solução imaginativa para a questão energética, com a produção de etanol. O Brasil é uma inspiração para o resto do mundo em relação aos carros flex. Por outro lado, mesmo que o País esteja consciente dos riscos de se desmatar a maior floresta tropical do mundo, muito ainda precisa ser feito. A Amazônia é muito importante para os brasileiros, pois ela regula o clima do país. Se a destruírem, o Brasil inteiro sofrerá com as secas.

De que maneira as elites tomadoras de decisão podem encabeçar a solução dos problemas ou ser responsáveis por conduzir sociedades à autodestruição?

Uma elite que foi competente em solucionar problemas é a composta por políticos dos Países Baixos, que têm grandes dificuldades com o manejo de água, já que um terço da área desses países está abaixo do nível do mar. A Holanda investiu uma quantidade enorme de dinheiro no controle de enchentes. Uma coisa que motivou os políticos holandeses é que muitos deles vivem em casas que estão sob o nível do mar. Eles sabem que se não resolverem a coisa vão se afogar com os demais. Outra elite razoavelmente bem-sucedida é a realeza do Butão, nos Himalaias. O rei butanês disse ao seu povo que o país precisa se tornar uma democracia quer queira, quer não. Ele também anunciou que a meta do país não é aumentar o PIB, mas elevar o índice que mede a felicidade nacional. Isso é verdadeiramente uma meta maravilhosa. Nos EUA, temos políticos poderosos com uma visão curta e destrutiva. Acho que contamos com um bom presidente, mas temos uma oposição cujos objetivos no presente momento se resumem a ganhar a próxima eleição presidencial e, repetidamente, tem negado a existência da mudança climática e do aquecimento global.

De que forma o declínio de sociedades antigas pode nos servir de lição?

Algumas sociedades do passado cometeram erros decisivos, outras agiram com sabedoria e tiveram longos períodos de estabilidade. Um vizinho de vocês, o Paraguai, é um exemplo de país que cometeu um erro crucial, há 120 anos: lutar simultaneamente contra Brasil, Argentina e Uruguai. Isso resultou na morte de 80% dos homens e um terço da população. Tomando como exemplo o Paraguai, precisamos aprender a adotar metas realistas. Podemos aprender também com os países que manejam bem seus recursos, como a Suécia e a Noruega, ou tomar como mau exemplo a Somália - que desmatou suas florestas e hoje sofre com a seca. Em defesa da Somália, podemos argumentar que o país não conta com um grande número de ecologistas capacitados, ao contrário de Brasil e EUA.

O sr. estudou a ascensão e queda de sociedades no passado, mas o que se discute agora é o futuro da própria humanidade. Sua teoria é capaz de explicar os desafios do mundo globalizado?

Sim. É verdade que esta é a primeira vez na história que enfrentamos o risco de o mundo inteiro entrar em colapso. No passado, o colapso do Paraguai, por exemplo, não teve nenhum efeito na economia da Índia ou da Indonésia. Hoje, até mesmo quando um país remoto, como a Somália ou o Afeganistão, entra em colapso isso repercute ao redor do mundo. Mas, por analogia, é possível tirar conclusões semelhantes.

O geógrafo brasileiro Milton Santos (1926-2001) enfatizou aspectos socioculturais para explicar os dilemas da sociedade, enquanto seu trabalho é considerado por alguns como geodeterminista. Aspectos culturais não teriam mais influência sobre o futuro das sociedades que os naturais?

Com frequência as pessoas me perguntam se isso ou aquilo é mais importante para explicar o declínio das sociedades. Questões como essas são ruins. É o mesmo, por exemplo, que perguntar sobre as causas que levaram ao fracasso de um casamento. O que é mais importante para manter um casamento feliz? Concordar sobre sexo ou dinheiro, ou crianças, ou religião, ou sogros? Para se ter um casamento feliz é preciso estar de acordo a respeito de sexo e crianças e dinheiro e religião e sogros. O mesmo se dá no entendimento do colapso de sociedades. Fatores culturais são importantes, mas diferenças ambientais não podem ser ignoradas. Por exemplo, as regiões Sul e o Sudeste do Brasil são mais ricas que a Norte. Isso é por causa do meio ambiente, não porque as pessoas no norte sejam burras e as do sul mais inteligentes ou cultas. A explicação é que o norte do país é mais tropical e áreas tropicais tendem a ser mais pobres porque têm menos solos férteis e mais doenças. O mesmo é verdade nos EUA, onde até 50 anos atrás o sul foi sempre mais pobre que o norte. Ao redor do mundo, esse padrão é repetido: países tropicais tendem a ser mais pobres que os de zonas temperadas.

Que sociedades estão em colapso hoje?

Todas as sociedades do mundo estão em risco de colapso. Se a economia mundial colapsar isso afetará todos os países. Nós vimos o que houve dois anos atrás, quando o mercado financeiro americano quebrou, afetando todas as bolsas do mundo. Então, embora todos os países estejam em risco de colapso, alguns estão mais próximos dele do que outros - por uma maior fragilidade ambiental, porque são menos maduros política ou ecologicamente ou por qualquer outro motivo. Por exemplo, o Haiti, que retornou agora às manchetes com a volta do ditador Baby Doc, viu seu governo virtualmente colapsar e continua em grande dificuldade. O México enfrenta dificuldades gravíssimas relacionadas a problemas ecológicos, com a aridez de suas terras, e políticos, com a onda de assassinatos ligada ao tráfico de drogas. Paquistão é um exemplo óbvio, Argélia, Tunísia, que também estão no noticiário... Do outro lado, dos países com menos risco de colapso estão a Nova Zelândia, o Butão e, na América Latina, a Costa Rica. Chile também vai bem. E o Brasil tem melhores perspectivas que vizinhos como a Bolívia, claro.

Países podem se recuperar do colapso?

O colapso normalmente não é definitivo. Houve colapsos no passado que foram sucedidos por retomadas. O Império Romano caiu e, apesar disso, a Itália é hoje um país de Primeiro Mundo.

A Europa, onde o debate a as leis de proteção ambiental mais avançaram, também entrou em crise. Quando isso ocorre, há risco de retrocesso nas políticas ambientais?

É possível. Muita gente sustenta que, quando a economia está fraca, não se consegue investir como se deve no meio ambiente. O colapso econômico de fato põe em risco os avanços em sustentabilidade. Só que os problemas ambientais só são fáceis de resolver nos estágios iniciais. Nesse ponto custam menos, mas se aguardamos 20 ou 30 anos, eles se tornarão muito caros ou impossíveis de solucionar.

Nos EUA, quando o presidente Obama condicionou empréstimos às montadoras americanas ao investimento em carros mais baratos e menos poluentes, a crise não ajudou?

Tanto as crises econômicas podem ter bons efeitos para a política ambiental como fazê-la retroceder. Nos EUA, antes do crash financeiro, estava muito em moda o Hummer, um jipe de 3 toneladas, versão civil de um veículo militar utilizado no Iraque. Era caríssimo e gastava horrores em combustível. Aparentemente, suas vendas despencaram e isso é um efeito positivo da crise econômica. Ainda assim, há americanos ignorantes que ainda insistem em dizer que, uma vez que estamos em crise, podemos deixar a agenda ecológica de lado.

Há modelos econômicos melhores e piores no que diz respeito aos danos ecológicos?

No momento em que falamos, tenho que dizer que o modelo econômico americano não parece ser o mais adequado. Por outro lado, somos uma democracia, com maus políticos, mas também bons - que denunciam os problemas que põem em risco o futuro. Numa ditadura comunista, por exemplo, isso seria impossível. Gosto do sistema capitalista porque ele pressupõe competição, inclusive de ideias. Mas aprecio também o papel do Estado em interferir no capitalismo, evitando os monopólios e enfrentando grupos cujos interesses vão de encontro aos da maioria da população. Em comparação, eu diria que o modelo europeu de capitalismo, mais socializado e comprometido com o bem comum, é atualmente a alternativa menos ruim.

Alguns cientistas afirmam que não se pode dizer ao certo que o aquecimento global seja culpa da ação do homem; pode ser parte de um ciclo natural da Terra.

Sabe a palavra inglesa rubbish? Significa lixo, mas é usada em linguagem coloquial em referência a ideias ridículas. O argumento de que as mudanças climáticas que estamos presenciando hoje sejam apenas naturais é simplesmente ridículo. Tanto como aquele que nega a evolução das espécies. As evidências de que tais mudanças se devem a causas humanas são irrefutáveis. Os anos mais quentes registrados em centenas de anos se concentram nos últimos cinco que passaram. O planeta já enfrentou flutuações de temperatura no passado, mas nunca nos padrões registrados hoje. Não conheço um único cientista respeitável que afirme que as atuais mudanças de clima não se devam à ação humana. É por isso que eu digo: rubbish.

Seis anos depois do lançamento de Colapso, o sr. está mais otimista ou pessimista em relação ao futuro de nossa civilização?

Diria que me mantenho mais ou menos no mesmo nível. Tenho visto coisas ruins piorarem e boas tornarem-se melhores. O que mais me preocupa é que continuamos vendo um aumento vertiginoso do consumo no mundo, seja nos EUA, na China, na Índia ou no Brasil. O que me anima é que cada vez mais pessoas reconhecem a gravidade da situação e estão tomando iniciativas. Uma metáfora que gosto de usar é a da corrida de cavalos. Há dois deles correndo agora, o cavalo da destruição e o cavalo das boas políticas. Nestes últimos seis anos, eu diria que os dois têm corrido cada vez mais rápido, disputando cabeça a cabeça. Não sei qual vencerá a corrida, mas diria que as chances do cavalo do bem vencer são de 51%, enquanto o das más políticas tem 49%. E, se nossa destruição não é certa, nem um destino inescapável, é preciso saber que se não tomarmos medidas urgentes vamos ter grandes problemas.

A indústria do entretenimento mostra, cada vez mais, imagens do fim do mundo, prédios em ruínas, cidades abandonadas. Por que somos tão fascinados por nossa destruição?

Parte disso se deve à força romântica das imagens de civilizações passadas que entraram em colapso, como as ruínas dos maias, incas e astecas. Ou os escombros das guerras no Iraque e no Irã. E pensamos: quem construiu aqueles templos e monumentos, tinha uma cultura e arte admiráveis, podia imaginar que isso aconteceria? Por que essas civilizações entraram em colapso, sem poder evitar? E nos angustiamos: será que isso também vai acontecer conosco?

(*) Articulistas do Estadão. http://www.estadao.com.br/noticias/suplementos,alerta-que-vem-da-lama,669684,0.htm

UM MOTIVO PARA SER FELIZ

Ellza Souza (*)

A primeira vez que entrei no Hospital Eduardo Ribeiro, vi na grandeza das árvores do seu jardim, que ali era um lugar de paz. Fiquei encostada na parede externa do ambulatório olhando. Que frutinha tão dourada era aquela que não parava de cair daquelas árvores tão grandes. Uma senhora se encarregou de sanar a minha ignorância. –Taperebá, disse ela. Algumas crianças e adultos juntavam os frutos que se espalhavam na verde grama do local. As pessoas enchiam pequenas sacolas de plástico com aquelas frutinhas alaranjadas que segundo a senhora que me informou o nome, aquilo a levava de volta à infância quando, em Parintins, sua mãe fazia o vinho apreciado por todos de sua família.

Os gregos, sabiamente, diziam: quem está entusiasmado tem um deus dentro de si. Ter um deus dentro de si é acreditar em você mesmo, no seu potencial de transformar as coisas para melhor. É mudar, também, a própria realidade, quando necessário. A pessoa que tem esse deusinho interno chamado também de motivação, acredita em si mesmo e acredita nos outros. Isso dá uma amaciada no dia a dia. Essa confiança contagiante é que leva ao que o ser humano tanto procura: o prazer de viver, a felicidade.

Acontece que no decorrer de nossa existência seguimos sentindo, pensando, falando e agindo. Sentimos tanta coisa: angústia, ansiedade, fome, sono, saudade. Depois de sentir algum desses sintomas, pensamos o que pode estar ocasionando aquela dor ou alegria. Detectado o problema partimos para a solução. Simples assim mas nem sempre é assim tão simples. O seu deusinho interior é tão intenso que na maioria dos casos descobrimos a solução dentro da gente. Sempre será possível mudar, transformar, melhorar.

Se não conseguir sozinho vai conseguir com a ajuda dos especialistas que acreditam, como você, que as frutinhas alaranjadas, o taperebá que se espalha na grama do jardim desse lugar e que um dia foi a chácara de um homem que sonhou com a música, a beleza, a arte. Sonhou que podia construir o Teatro Amazonas no meio da floresta amazônica. Construir beleza pode. Não pode é destruir o deusinho que tem dentro de você ou seja, a motivação para uma vida feliz.

(*) É jornalista, escritora e colaboradora do NCPAM/UFAM.

domingo, 23 de janeiro de 2011

COM INVEJA DOS PAULISTAS

No próximo dia 25, São Paulo vai fazer uma baita festa para celebrar os seus 457 anos de fundação. Na oportunidade, os paulistas serão presenteados com a reinauguração da biblioteca Mário de Andrade, que teve seus 22 andares reformados e ambientados para a conservação dos 360.000 itens do acervo fixo que estarão disponíveis para consulta. Toda obra custou 16,3 milhões de reais, sendo financiada pela Secretaria Municipal de Cultura e por empréstimos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Enquanto isso, aqui em Manaus, a Biblioteca Pública do Amazonas (foto) agora em fevereiro completa 03 anos, que se encontra fechada para reforma e até o momento não se tem nenhuma previsão de sua reinauguração. Sai governo e entra governo e o descaso continua, deixando os pesquisadores e consulentes com inveja dos paulistas.

A Biblioteca Pública do Estado encontra-se localizada na Rua Barroso e ocupa toda a extremidade da quadra entre a Av. Sete de Setembro e a Rua Henrique Martins, no Centro Histórico de Manaus. Segundo o professor Otoni Mesquita, "o prédio da Biblioteca apresenta característica classicizantes, bastante próximas das tendências renascentistas, mas que no Brasil estão geralmente incluídas entre as obras ecléticas".

A reforma da Biblioteca Pública que era para durar apenas seis meses não se sabe mais quando irá ser concluída. O recurso destinado para as obras eram de R$ 27 milhões. Agora também não se sabe mais quanto irá custar toda reforma. É a prática dos Aditivos que ganha corpo na gestão pública do Estado. Além da Biblioteca Pública, o governo deve ao povo a inauguração da Ponte sobre o Rio Negro, a Adutora das Lajes, entre outras obras turbinadas pela Copa de 2014.

Mas a Biblioteca Pública faz muita falta porque as escolas também não estão aparelhadas para atender aos alunos quanto ao acesso à leitura. Além do mais, a Biblioteca é uma referencia para os estudiosos do Estado que buscam consultas em textos raros, bem como no acervo das obras históricas desse patrimônio do povo do Amazonas. Contudo, não se assustem se os burocratas reinaugurarem a Biblioteca sem aquisição de novos títulos e muito menos sem um sistema de comunicação que possibilite os consulentes a consultar outros ambientes. Por aqui impera muito mais os ditames da construção civil do que a vontade do povo: educação é obra, cultura é obra, saúde é obra e assim, o sistema é retroalimentado satisfazendo os interesses dos grupos econômicos que controlam o Estado.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

EU ACUSO: Tributo ao professor Kássio Vinícius Castro Gomes


Igor Pantuzza Wildmann (*)

Mon devoir est de parler, je ne veux pas être complice.
(Meu dever é falar, não quero ser cúmplice).
Émile Zola

Foi uma tragédia fartamente anunciada. Em milhares de casos, desrespeito. Em outros tantos, escárnio. Em Belo Horizonte , um estudante processa a escola e o professor que lhe deu notas baixas, alegando que teve danos morais ao ter que virar noites estudando para a prova subsequente. (Notem bem: o alegado ¨dano moral¨ do estudante, foi ter que... estudar!).

A coisa não fica apenas por aí. Pelo Brasil afora, ameaças constantes. Ainda neste ano, uma professora brutalmente espancada por um aluno. O ápice desta escalada macabra não poderia ser outro.

O professor Kássio Vinícius Castro Gomes pagou com sua vida, com seu futuro, com o futuro de sua esposa e filhas, com as lágrimas eternas de sua mãe, pela
irresponsabilidade que há muito vem tomando conta dos ambientes escolares.

Há uma lógica perversa por trás dessa asquerosa escalada. A promoção do desrespeito aos valores, ao bom senso, às regras de bem viver e à autoridade foi elevada a método de ensino e imperativo de convivência supostamente democrática.

No início, foi o maio de 68, em Paris: gritava-se nas ruas que ¨era proibido proibir¨. Depois, a geração do ¨não bate, que traumatiza¨. A coisa continuou: ¨Não reprove, que atrapalha¨. Não dê provas difíceis, pois ¨temos que respeitar o perfil dos nossos alunos¨. Aliás, ¨prova não prova nada¨. Deixe o aluno ¨construir seu conhecimento¨. ¨Não vamos avaliar o aluno¨. Pensando bem, ¨é o aluno que vai avaliar o professor¨. Afinal de contas, ele está pagando...

E como a estupidez humana não tem limite, a avacalhação geral epidêmica, travestida de ¨novo paradigma¨ (Irc!), prosseguiu a todo vapor, em vários setores: ¨o bandido é vítima da sociedade¨, ¨temos que mudar tudo isso que está aí¨; mais importante que ter conhecimento é ser ¨crítico¨.

Claro que a intelectualidade rasa de pedagogos de panfleto e burocratas carreiristas ganhou um imenso impulso com a mercantilização desabrida do ensino: agora, o discurso anti-disciplina é anabolizado pela lógica doentia e desonesta da paparicação ao aluno/ cliente...

Estamos criando gerações em que uma parcela considerável de nossos cidadãos é composta de adultos mimados, despreparados para os problemas, decepções e desafios da vida, incapazes de lidar com conflitos e, pior, dotados de uma delirante certeza de que "o mundo lhes deve algo".

Um desses jovens, revoltado com suas notas baixas, cravou uma faca com dezoito centímetros de lâmina, bem no coração de um professor. Tirou-lhe tudo o que tinha e tudo o que poderia vir a ter, sentir, amar.

Ao assassino, corretamente , deverão ser concedidos todos os direitos que a lei prevê: o direito ao tratamento humano, o direito à ampla defesa, o direito de não ser condenado em pena maior do que a prevista em lei. Tudo isso, e muito mais, fará parte do devido processo legal, que se iniciará com a denúncia, a ser apresentada pelo Ministério Público. A acusação penal ao autor do homicídio covarde virá do promotor de justiça. Mas, com a licença devida ao célebre texto de Emile Zola, EU ACUSO tantos outros que estão por trás do cabo da faca:

EU ACUSO a pedagogia ideologizada, que pretende relativizar tudo e todos, equiparando certo ao errado e vice-versa;

EU ACUSO os pseudo-intelectuais de panfleto, que romantizam a ¨revolta dos oprimidos¨ e justificam a violência por parte daqueles que se sentem vítimas;

EU ACUSO os burocratas da educação e suas cartilhas do politicamente correto, que impedem a escola de constar faltas graves no histórico escolar, mesmo de alunos criminosos, deixando-os livres para tumultuar e cometer crimes em outras escolas;

EU ACUSO a hipocrisia de exigir professores com mestrado e doutorado, muitos dos quais, no dia a dia, serão pressionados a dar provas bem tranqüilas, provas de mentirinha, para ¨adequar a avaliação ao perfil dos alunos¨;

EU ACUSO os últimos tantos Ministros da Educação, que em nome de estatísticas hipócritas e interesses privados, permitiram a proliferação de cursos superiores completamente sem condições, freqüentados por alunos igualmente sem condições de ali estar;

EU ACUSO a mercantilização cretina do ensino, a venda de diplomas e títulos sem o mínimo de interesse e de responsabilidade com o conteúdo e formação dos alunos, bem como de suas futuras missões na sociedade;

EU ACUSO a lógica doentia e hipócrita do aluno-cliente, cada vez menos exigido e cada vez mais paparicado e enganado, o qual, finge que não sabe que, para a escola que lhe paparica, seu boleto hoje vale muito mais do que seu sucesso e sua felicidade amanhã;

EU ACUSO a hipocrisia das escolas que jamais reprovam seus alunos, as quais formam analfabetos funcionais só para maquiar estatísticas do IDH e dizer ao mundo que o número de alunos com segundo grau completo cresceu ¨tantos por cento¨;

EU ACUSO os que aplaudem tais escolas e ainda trabalham pela massificação do ensino superior, sem entender que o aluno que ali chega deve ter o mínimo de preparo civilizacional, intelectual e moral, pois estamos chegando ao tempo no qual o aluno ¨terá direito¨ de se tornar médico ou advogado sem sequer saber escrever, tudo para o desespero de seus futuros clientes-cobaia;

EU ACUSO os que agora falam em promover um ¨novo paradigma¨, uma ¨nova cultura de paz¨, pois o que se deve promover é a boa e VELHA cultura da ¨vergonha na cara¨, do respeito às normas, à autoridade e do respeito ao ambiente universitário como um ambiente de busca do conhecimento;

EU ACUSO os ¨cabeça boa¨ que acham e ensinam que disciplina é ¨careta¨, que respeito às normas é coisa de velho decrépito,

EU ACUSO os métodos de avaliação de professores, que se tornaram templos de vendilhões, nos quais votos são comprados e vendidos em troca de piadinhas, sorrisos e notas fáceis;

EU ACUSO os alunos que protestam contra a impunidade dos políticos, mas gabam-se de colar nas provas, assim como ACUSO os professores que, vendo tais alunos colarem, não têm coragem de aplicar a devida punição.

EU VEEMENTEMENTE ACUSO os diretores e coordenadores que impedem os professores de punir os alunos que colam, ou pretendem que os professores sejam “promoters” de seus cursos;

EU ACUSO os diretores e coordenadores que toleram condutas desrespeitosas de alunos contra professores e funcionários, pois sua omissão quanto aos pequenos incidentes é diretamente responsável pela ocorrência dos incidentes maiores;

Uma multidão de filhos tiranos que se tornam alunos -clientes, serão despejados na vida como adultos eternamente infantilizados e totalmente despreparados, tanto tecnicamente para o exercício da profissão, quanto pessoalmente para os conflitos, desafios e decepções do dia a dia.

Ensimesmados em seus delírios de perseguição ou de grandeza, estes jovens mostram cada vez menos preparo na delicada e essencial arte que é lidar com aquele ser complexo e imprevisível que podemos chamar de ¨o outro¨.

A infantilização eterna cria a seguinte e horrenda lógica, hoje na cabeça de muitas crianças em corpo de adulto: ¨Se eu tiro nota baixa, a culpa é do professor. Se não tenho dinheiro, a culpa é do patrão. Se me drogo, a culpa é dos meus pais. Se furto, roubo, mato, a culpa é do sistema. Eu, sou apenas uma vítima. Uma eterna vítima. O opressor é você, que trabalha, paga suas contas em dia e vive sua vida. Minhas coisas não saíram como eu queria. Estou com muita raiva. Quando eu era criança, eu batia os pés no chão. Mas agora, fisicamente, eu cresci. Portanto, você pode ser o próximo¨.

Qualquer um de nós pode ser o próximo, por qualquer motivo. Em qualquer lugar, dentro ou fora das escolas. A facada ignóbil no professor Kássio dói no peito de todos nós. Que a sua morte não seja em vão. É hora de repensarmos a educação brasileira e abrirmos mão dos modismos e invencionices. A melhor ¨nova cultura de paz¨ que podemos adotar nas escolas e universidades é fazermos as pazes com os bons e velhos conceitos de seriedade, responsabilidade, disciplina e estudo de verdade.

(*) É Advogado, Doutor em Direito e Professor universitário.

Saiba mais:
http://www.metodistavilaisabel.org.br/paginicial/noticia.asp?Numero=1538

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

CONSELHO FAZ MOÇÃO DE APOIO AOS ARTISTAS DE RUA

Estejamos atentos. Em Porto Alegre, perseguição e prisão aos artistas de rua já foram amplamente denunciados. Na capital paulista, a Prefeitura persegue os artistas que fazem performance em troca de doações espontâneas. Os Agentes Públicos de São Paulo justificam a truculencia alegando que os artistas são ambulantes praticando o comércio ilegal.Em Manaus, a Polícia Federal andou fazendo um arrastão dizendo que muitos estavam na ilegalidade porque não tinham passaporte, em se tratando de artistas estrangeiros. Contudo, no caso dos brasileiros para o jurista Luiz Flávio Gomes, a ação é um "ato nazista". "A atividade deles é lícita. Expressão artística você pode fazer quando quiser. Ser proibido de se manifestar é uma ilegalidade, um abuso patente", diz. "Se houver prisão então é crime: abuso de autoridade", afirma.

A Moção de apoio aos artistas de rua aprovada pelo Conselho Nacional de Política Cultural(CNPC) foi publicada nesta quinta-feira (20), no Diário Oficial da União. A manifestação resulta da Sessão Ordinária feita nos dia 7 e 8 de dezembro de 2010. Confira o ato na íntegra assinado tanto pelo Presidente como pelo Coordenador Geral do Conselho e manifeste também sua indignação.
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O CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA CULTURAL - CNPC, reunido em Sessão Ordinária, nos dias 7 e 8 de dezembro de 2010, e no uso das competências que lhe são conferidas pelo Decreto No- 5.520, de 24 de agosto de 2005, alterado pelo Decreto No- 6.973/2009, tendo em vista o disposto em seu Regimento Interno, aprovado pela Portaria No- 28, de 19 de março de 2010, e:

Considerando que a Constituição da República Federativa do Brasil, em seu artigo 5º, inciso IX, garante a livre expressão artística;

Considerando que, no entendimento do CNPC, a passagem do chapéu é uma manifestação milenar que cria vínculo entre artistas e público e, portanto, não pode ser tratada como uma relação de comércio ou similar; e

Considerando que alguns municípios estão tratando os artistas de rua como
comerciantes ilegais ou equiparando-os aos megaespetáculos que são realizados em áreas públicas para multidões;

Aprova Moção de Apoio aos artistas de rua, segmento que vem sendo vítima de proibições e restrições quanto à realização de manifestações artísticas em espaços públicos em diversas cidades brasileiras.

O CNPC entende que as artes nas ruas e praças contribuem para que a relação dos cidadãos com sua cidade sejam mais afetivas, emotivas e solidárias e, desta feita, manifesta seu apoio aos artistas de rua, reconhecendo a importância dos herdeiros dos antigos saltimbancos, que enchem de sons e alegria as ruas e praças de cidades por todo o mundo.

JOÃO LUIZ SILVA FERREIRA
Presidente do Conselho

MARCELO VEIGA
Coordenador-Geral

MANAUARAS: LUTEMOS PELO ENCONTRO DAS ÁGUAS

Ellza Souza (*)

Sei que é difícil o manauara se engajar numa causa. Pegamos cada cacetada. É mau serviço prá cá, é mau serviço pra lá e o povo sorri numa placidez de dar raiva. E até acho que a natureza nem precisa do homem para sua defesa. Vemos todos os dias os ventos, os rios, a chuva dando a contrapartida dos maus tratos que recebe. Mesmo assim precisamos fazer a nossa parte quanto a preservação dessa maravilha que representa o encontro desses rios gigantes, contrastantes, cheios de mistérios, de histórias, de vida sob tão densas águas. Bem aqui na frente de nossa cidade. Isso é um privilégio a ser mantido e não podemos deixar que se transforme numa lama fedorenta de interesses escusos.

Primeiro veio a alegria pelo tombamento no final do ano passado. Agora quem deveria proteger me aparece com uma ação contrariando tudo o que foi arduamente conseguido pela comunidade e pelo Movimento SOS Encontro das Águas. Custo a acreditar em tal atitude do Estado do Amazonas que tem a obrigação de representar os interesses da sociedade, do meio ambiente, do bem estar comum. Cadê aquela “gabolice” como diz o Nicholas Jr, quando as autoridades vão aí pelo mundo e juram que são ardorosos defensores da Amazônia, que o Amazonas não desmata, não polui, cuida desse mundão de águas doces.

Faço o meu desabafo como cidadã preocupada com o seu próprio futuro e sabendo dos prejuízos morais, ecológicos, humanos que um porto de tal porte pode trazer à vida de todos, não só aos lascados manauaras que não tem nem a quem apelar a não ser ao próprio bispo, a quem já começo a pedir uma benção especial. Manauaras, a hora da união é agora. Procurem conhecer o assunto, mandem cartas para os jornais exigindo a conclusão do processo de tombamento. As entidades de classes, ONGs, sindicatos, universidades, associações de bairro devem se manifestar. Precisamos mostrar interesse por essa boa causa. É a nossa existência que está em jogo. Mostremos a esses desumanos seres que o Encontro das Águas precisa é de cuidado e não de poluição, de porto ou seja lá o que for.

Tombamento já!

(*) É jornalista, escritora e colaboradora do NCPAM/UFAM.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Tombamento do Encontro das Águas não pode ser desfeito, diz o diretor do IPHAN

Segundo Dalmo Vieira Filho é a primeira vez que o tombamento de um bem cultural e natural, após aprovado pelo Conselho Consultivo do Iphan, é contestado. O cancelamento do tombamento do Encontro das Águas seria o primeiro do país.

Elaíze Farias (*)

O diretor do Departamento de Patrimônio Material do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Dalmo Vieira Filho, não acredita que o tombamento do Encontro das Águas dos rios Negro e Solimões, em Manaus, seja desfeito, como pede o governo do Estado do Amazonas, em ação ingressada na segunda-feira (dia 17), na justiça federal.

Em declaração ao acritica.com, por telefone, Dalmo Vieira Filho disse que o processo do tombamento foi bem instruído e seguiu todos os ritos obrigatórios.

“Todos têm direito de contestar caso considerem que os procedimentos não são ideais. Mas, na minha opinião, não existe falha no processo do tombamento. A decisão foi do Conselho Consultivo do Iphan. O que foi feito é intocável. Neste momento, questioná-lo é contraproducente”, disse o diretor.

Conforme Dalmo, em toda a história do Iphan, não há informação sobre cancelamento de tombamento de algum bem cultural (material ou imaterial) que tenha sido desfeito no país após a sua aprovação pelo Conselho Consultivo. O pedido do governo do Amazonas, caso seja acatado, seria o primeiro da história do Iphan.

“Eu acho aquele fenômeno tão importante e o tombamento evidenciou essa importância que não vejo, como qualquer cidadão, que alguém possa ser contra ele”, afirmou.

Conforme Dalmo, seja qual for a decisão da justiça federal, ela precisará antes disto, consultar o Iphan para este dar sua versão dos fatos.

Ao acritica.com, o procurador-geral do Estado, Frânio Lima, disse que o Estado “não é contra o tombamento, mas também não é totalmente a favor” devido à forma como ele foi realizado.

Segundo Lima, o governo do Amazonas não foi ouvido oportunamente. Ele afirma que o prazo de 15 dias dado pelo Iphan (que é de praxe pelo órgão) não foi suficiente para o governo analisar o processo.

“Esse procedimento deveria seguir a lei do processo administrativo, inclusive com a realização de audiências públicas”, explicou.

Questionado sobre uma possível repercussão negativa que a ação do governo do Estado poderia causar na sociedade, Frânio Lima disse que o “Estado não quer desfazer o tombamento pelo tombamento”.

Afronta

O antropólogo Ademir Ramos, membro do SOS Encontro das Águas, movimento que encaminhou a proposta do tombamento ao Iphan, disse que a ação do governo do Amazonas “afronta a vontade do povo, a inteligência da justiça em benefício de interesse privado".

Na opinião de Ramos, o governo do Estado, por meio da ação da PGE, “viola os princípios republicanos e desmascara a tal responsabilidade ambiental que o ex-governador Eduardo Braga tanto exaltava com fé e determinação”.

“Mas a Justiça há de ser feita porque contra o povo os poderosos cairão de joelho e sua vontade não prosperará”, observou.

(*) É Jornalista da Equipe de A Crítica.

Fonte: http://acritica.uol.com.br/amazonia/Tombamento-Encontro-Aguas-desfeito-Iphan_0_410959038.html