quarta-feira, 28 de maio de 2008

EM DISCUSSÃO O FUTURO DAS CIÊNCIAS SOCIAIS NO AMAZONAS


Alunos, ex-alunos, professores e acadêmicos do campo de Ciências Sociais estão convocados a discutir e se manifestar frente à extraordinária decisão do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), que compromete a qualidade do curso de Ciências Sociais e, muito mais ainda, o seu futuro.

Feito a avaliação da matriz ocupacional da UFAM, O Departamento foi beneficiado com 5 (cinco) vagas para concurso público. Em reunião extraordinária, datada do dia 28 passado, os professores e somente eles, decidiram que as 5 (cinco) vagas destinadas ao curso de Ciências Sociais devem ser oferecidas unicamente para área de Sociologia, deixando totalmente descoberto o campo da Política, considerando que o curso não tem em seu quadro nenhum professor especificamente pós-graduado em Ciência Política.

A decisão dos doutos justifica-se porque se deve, necessariamente, segundo eles, fortalecer a pós-graduação, o que indiretamente fortaleceria também a graduação, argumento como esse e outros serviram de base para o julgamento final. No entanto, sabe-se que a decisão é discutível, inclusive quanto a sua legitimidade, pois matéria dessa magnitude não pode e não deve ser decidida sem ouvir os principais interessados que são os alunos e muito mais ainda a toque de caixa.

Dessa feita, damos publicidade à decisão do Departamento de Ciências Sociais e formulamos as seguintes perguntas:

É justo que se destinem as 5 (cinco) vagas para sociologia enquanto o curso sofre da ausência de um profissional qualificado em política?

A decisão não denuncia também uma forma de reducionismo da política à sociologia regrada por forma de corporativismo profissional?

Estaria com essa decisão comprometido o futuro do Curso de Ciências Sociais na UFAM e, particularmente, a formação no campo da Ciência Política, visto que não se vislumbra nenhum curso de pós-graduação na área e muito menos vontade para se realizar.

A decisão tomada, não mata por sua vez a galinha dos ovos de ouro, que é o próprio Curso de Ciências Sociais, pois sem ele a Pós-Graduação em Sociologia não se justifica, a não ser que os doutos estejam planejando acabar com Ciências Sócias e implementar um Curso de graduação em Sociologia para vestir o próprio modelito, um tido de “lei alfaiate” como se diz na prática parlamentar.


Participe da discussão, manifestando seus argumentos pois eles serão analisados e encaminhados aos Colegiados competentes.

CRISTOVAM BUARQUE E A DEFESA DA AMAZÔNIA



O NCPAM com apoio da Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) está promovendo um grande debate com Professor e Senador da República Cristovam Buarque, no dia 30/05 sexta-feira às 9horas, discutindo estratégias, que possam garantir efetivamente a defesa da Nossa Amazônia.

A principal ameaça é o descaso do governo brasileiro, que historicamente, trata a Amazônia como se fosse quintal do Brasil. Pois, tudo que não presta é jogado para cá afirma o ex-senador Evandro Carreira, quando se lembram desse território é para saquear nossas riquezas ou reduzir nossas fontes em matrizes produtivas em beneficiar do grande capital, reduzindo também a participação das comunidades regionais em “intrusos para o desenvolvimento”.

Esse modelo neocolonial deve ser discutido amplamente junto às forças democráticas, principalmente nas Universidades, nas escolas, onde a formação é o instrumento de conscientização, mobilizando os jovens para o exercício da cidadania plena.

Assim sendo, a Educação deixa de ser um gasto para se transformar num investimento de qualidade capaz de priorizar metas, que beneficiem diretamente os protagonistas de nossa história, que é o povo brasileiro.

terça-feira, 27 de maio de 2008

JORNALISMO POLÍTICO NO AMAZONAS


* Ademir Ramos

O Sindicato dos Jornalistas do Amazonas, em parceria com Tribunal Regional Eleitoral, estará realizando nesta terça-feira (27) às 14, no auditório da Justiça Federal, o Seminário sobre Jornalismo Político.

Na oportunidade, os especialistas irão discutir e analisar a legislação referente às eleições 2008, bem como a prática do jornalismo político, primando pela qualidade da informação e pela credibilidade dos profissionais da comunicação em respeito ao cidadão consumado pela notícia.

Entre os palestrantes, estarei representando o NCPAM, expondo sobre a complexidade do ofício do jornalismo quanto à questão política. Para esse momento preparei um Caderno de Notas, estilo Gramsci, para suscitar debate e apreciação, tendo como pedra de toque a afirmativa da pesquisadora da UNB, a jornalista Liziane Guazine, que sintetiza a matéria nos seguintes termos: “é preciso vencer o medo de desvendar a caixa-preta do jornalismo político sob pena de não construirmos efetivamente, uma sociedade democrática”.

A provocação requer que se esclareçam os fundamentos dessa assertiva, formulando questões prospectivas tais como: Quem tem medo? - Medo de quem? - O jornalista em si ou a indústria da informação? – Medo por quê? – O que tem de comprometedor nesta prática?

As indagações são múltiplas, exigindo que seja feita uma análise profunda, na medida do possível, compreendendo a micro-física do poder, que assenta a relação de interesses entre governo, indústria da informação e os interesses difusos da sociedade civil democrática.

Nessa perspectiva são importantes que se discutam os bastidores da prática do jornalismo político no Amazonas quanto à relação com as fontes, onde a disputa pelo furo pode comprometer a qualidade da informação por não checar a veracidade dos fatos. Dessa feita, o profissional é reduzido em garoto de recado dos interesses dominantes, aliados é claro, com os interesses da empresa de comunicação.

Mas, a pergunta que também nos fazemos é: Existe jornalismo político no Amazonas? Como a questão política eleitoral tem sido tratada nos meios de comunicação no Estado? - com autonomia, oportunismo, compadrio ou simplesmente uma mera negociata, minimizando o interesse público em favor do favoritismo político dominante. Quem ganha com isso?

A título de reflexão: Todos sabem que assim como o ex-Senador Jéferson Peres, o senador Artur Neto era articulista de a Crítica. No entanto as denúncias de malversações de verba pública, corrupção e outras falcatruas contra o dinheiro do povo praticado pelo governador Eduardo Braga, não receberam guarida nesse jornal, tendo o senador de migrar para o Diário do Amazonas.

Em discussão: O direito a informação, contrapondo aos interesses privados. Nessa circunstância, a eleição pode transformar-se numa grande oportunidade de negócio, sendo a piracema para os tubarões da imprensa.

Mas, o que tem sido feito para se vencer o medo enquanto prática organizacional? Quais os investimentos que podemos destacar nesse campo sejam eles oriundos da empresa de comunicação ou da categoria dos jornalistas?

Outros dirão: indagações como estas não procedem porque o jornalista é um assalariado e necessariamente deve garantir o seu tostão. Esse argumento centrado na necessidade reduz qualquer qualificação do profissional aos interesses imediatos.

No entanto, é necessário insistir que o jornalista, o profissional da comunicação, é um sujeito senhor da informação detém um capital simbólico que se traduz em credibilidade, em valor imaterial capaz de agregar força dissertativa e de sustentar o convencimento do leitor e do eleitor.

Nem tanto, dirão outros, o que se discute na prática são “a verdade efetiva das coisas”, os valores e as concepções ideológicas dos jornalistas, editores e proprietários dos meios. Enfim a cadeia produtiva do noticiário, suas múltiplas versões. Esse realismo político vivido em tensão com os fatos, as fontes, o interesse público e privado é determinante para construção de uma cultura profissional.

Reclama-se ainda, a falta do leitor, ouvinte ou telespectador capaz de operar criticamente, avaliando e condenando financeiramente as publicações e seus autores. Pois, na qualidade de consumidor o cidadão pode se manifestar, recusando-se a consumir o discurso da farsa e da corrupção, bem como também migrar de matutino ou mudar de canal.

Por exemplo: domingo eu quero ler o Diário do Amazonas porque preciso conhecer as falcatruas internacionais do Alibaba do Amazonas (avaliar, analisar, conferir e julgar). É uma opção, mas para isso é preciso ter informação, principalmente se tratando de um jornalista ou um analista da política local. Desconhecer tal fato e outros fantasmas da corrupção, que por hora ronda o estado, é se tornar um profissional “lacaio e obtuso”. Desses estamos fartos.

Ao contrário, tem se identificado no jornalismo local prática de jornalismo investigativo, que requer pesquisa, conferência das fontes e interesse público. Uma prática de convivência com o poder instituído com autodeterminação e credibilidade, transformando o jornalista em Educador Social, porque o acesso à informação faz do cidadão aprendiz da democracia, como bem afirmara Gramsci - Os Intelectuais e a Organização da Cultura/1979. Dessa feita, enaltece na prática a credibilidade, lealdade moral e intelectual contrapondo-se ao cinismo, arrogância e o esnobismo paroquial, que nada mais é do que o diabo da pavulagem.

Iniciativa como esta, promovido pelo Sindicado dos jornalistas denuncia a necessidade de se aprimorar cada vez mais a pena do profissional da política, sua capacidade intelectual e desenvolvimento de sua prática criativa (ferramentas de investigação, qualificação de suas fontes), assim como clarifica também sua compreensão quanto às relações de poder, porque o jornalismo político atua onde o poder instituído se manifesta.

Essa relação é tensa, verdadeiramente, e requer do profissional credibilidade e autodeterminação para superar as ciladas do jogo político do poder dominante. Assim, deixamos de escrever para satisfazer as fontes e nos afirmamos como um profissional de opinião, de armadura intelectual reconhecido.

Comprova-se tal prática quando tomamos consciência de que o jornalista em seu ofício deve necessariamente organizar e interpretar os fatos a partir da “verdade efetiva das coisas”. Trata-se de uma visão estratégica, que requer análise de conjuntura pertinente e visão de futuro capaz de influir nas determinações de poder junto aos seus agentes, numa perspectiva democrática de justiça social.

* Professor, antropólogo e coordenador do Núcleo de Cultura Política do Amazonas, Ciências Sociais, UFAM.

domingo, 25 de maio de 2008

MIRANTE DO COTIDIANO - FEIJOADA DE SANTARÉM


Foto: Marcelo Henrique Sáez Quiñónez

* Marilene Fernandes

Não foram apenas costumes, danças, lendas, festas e dentre outras inúmeras manifestações culturais que são frutos da miscigenação racial do povo brasileiro, na sua formação. A Culinária do povo brasileiro também é uma das qualidades inigualáveis quanto ao sabor, beleza e variedade. No percurso histórico a culinária brasileira congrega variados pratos típicos e queremos aqui ressaltar a influência da cultura negra na Região Norte.

Os Africanos quando foram trazidos para o Brasil, já eram dotados de uma vasta sabedoria na Culinária. E nosso enfoque, é para um dos principais pratos tipicamente brasileiro -a feijoada- fruto da adaptação dos negros as condições adversas da escravidão, na qual eram privados dos direitos de uma alimentação “saudável”, em caráter de sobrevivência, como expurgos da sociedade, não participavam das refeições de seus senhores, para tanto, valiam-se do feijão preto, rejeitado pelos senhores e com sobras de carnes de porcos e bois, preparavam uma alimentação rica em cálcio, fósforo, ferro, etc. e em torno dos caldeirões alimentavam-se juntamente com seus filhos, unindo a fome com a sábia culinária africana, herança trazida e perpetuada até os dias de hoje, dando origem a um dos pratos típicos mais apreciados em todo o País.

Neste domingo, no Oeste do Pará, em Santarém acontece a mais tradicional feijoada santarena, uma iniciativa que perdura há mais de vinte anos e celebra a união, a solidariedade, a esperança e a fé de um povo que não cansa de sonhar por uma comunidade mais justa e igualitária.

O evento envolve pais e mães de família, jovens e adolescentes membros da comunidade de Santa Rita de Cássia, localizada no bairro Floresta, que reúnem-se desde as primeiras horas da manhã de sábado; trabalham em sistema de revezamento e passam a noite acordados para que no dia seguinte, no domingo, possam oferecer uma deliciosa feijoada para aproximadamente 1.000 pessoas, os ingredientes são frutos de doações de comerciantes, comunitários e religiosos, devotos de Santa Rita de Cássia.

Trata-se de um trabalho árduo, que tem por objetivo reunir a comunidade em prol de bens comuns ao povo santareno. Trabalham com alegria, motivados pela fé, gratos pelos milagres recebidos, e certos de que o trabalho realizado não será em vão. A Feijoada faz parte dos Festejos de Santa Rita de Cássia, e conta com a simpatia e participação de moradores de vários bairros de Santarém e de turistas que tradicionalmente visitam a cidade no período dos festejos.

Essa é, portanto, uma festa popular onde cultura e religião dão os braços, evidenciando a riqueza cultural religiosa do povo santareno e o compromisso social, que move o trabalho, fortalecendo laços de amizade e respeito, resgatando a esperança e fé do povo.


* Pesquisadora do NCPAM, discente de pedagógia da Universidade Federal do Amazonas.

NO SENADO, HONESTIDADE VALE MAIS MORTA DO QUE VIVA


* Josias de Souza

No ano da graça de 2001, a presidência do Senado foi disputada à maneira dos caiapós de Altamira: na base do facão.

Disputaram a cadeira o baiano Antonio Carlos Magalhães (PFL, à época) e o paraense Jader Barbalho (PMDB).

Prevaleceu, como se sabe, Jader. Depois, descobriram-se “barbalhidades” que assentaram na história do Senado uma de suas páginas mais funestas.

Poderia ter sido diferente. Sob o ruído rascante dos facões, o senador José Jefferson Carpinteiro Péres (PDT) constituía uma alternativa mansa.

Ofereceu aos colegas o bom nome e a biografia impoluta como opções ao escárnio. Jefferson Péres era chamado, então, de “terceira via”.

O Senado preferiu a via de sempre, a tradicional, a “barbalha”. E arrastou para dentro do plenário as malfeitorias que levariam o Congresso à crise e Jader à renúncia.

Mais tarde, Jefferson Péres viu formar-se à sua frente uma barricada. Ergueu-a o ex-senador Ney Suassuna (PB), na ocasião líder do sempre majoritário PMDB de Jader.

Negaram à correção uma cadeira no Conselho de Ética do Senado. O vetado, em entrevista ao repórter Carlos Marchi, reagiu com o humor que lhe era próprio, corrosivo:

"Eu aceitei com humildade, porque o Suassuna, com seu espírito de modernidade, achou que estou superado, com meus 75 anos. Eu defendo umas teses que não são muito atuais – ética, moral, essas coisas. Para o Suassuna, isso é coisa superada."

Enrolado no escândalo das sanguessugas, Suassuna sucumbiu ao entrincheiramento do eleitor paraibano. Jader foi devolvido ao Congresso pelas urnas do Pará. Voltou rebaixado a deputado. Mas voltou.

Na manhã da última sexta-feira, um infarto apontou para Jefferson Péres (PDT-AM) a última, a inevitável, a inelutável via. O senador foi ao esquife com 76 anos. E converteu-se, aos olhos dos colegas, num santo instantâneo.

Seguiram-se à morte lamentações unânimes. “O Senado perde a sua referência moral”, lamuriaram muitos. “É uma perda irreparável”, choramingaram outros tantos.

No Brasil é assim. O cidadão nasce, cresce e vive sob a pele de homem. Mas fenece como santo. Entre nós, a morte é de uma eficácia promocional hedionda.

Os cemitérios brasileiros são hortas de virtudes. O morto com defeitos é uma utopia. A morte canoniza até os piores canalhas.

No caso de Jefferson Péres, todas as loas são justificáveis. Não era santo. Mas levou para a cova a ventura de ter cruzado o pântano da política incólume.

Em meio à impudência, escreveu uma biografia de decência. Compensava a miudeza do físico com o comportamento graúdo.

Esquivava-se das nomeações políticas. Mantinha a mulher no gabinete, negando a ela o acesso ao salário da Viúva. Não punha a mão em verba de representação. Devolvia os presentes que aportavam sobre sua mesa.

Nas muitas crises do Legislativo –à de Jader sobreveio a de Renan Calheiros— Jefferson Péres nunca foi pilhado em gestos ou intenções suspeitas. Confrontado com tentativas de acobertamento, postava-se do lado dos que queriam arrancar a coberta.

Andava desiludido o senador. Falava em abandonar a vida pública. Havia uma dose de cálculo na fuga anunciada das urnas de 2010. Sabia que não eram negligenciáveis as chances de ser barrado pelo voto.

A morte, em sua nefasta sabedoria, poupou o eleitor amazonense de um desatino. E forçou os colegas do senador a pronunciarem um lote de hosanas que soam como expiação tardia de um pecado imperdoável.

Os senadores enxergam no cadáver de Jefferson Péres virtudes que não foram capazes de valorizar enquanto o virtuoso ainda equilibra-se dentro dos sapatos.

No Senado, a honestidade vale mais morta do que viva, eis a revelação que José Jefferson, carpinteiro de um Péres raro, deixa como legado.


* É colunista do jornal Folha de S. Paulo e o artigo é deste domingo, 25/05/008, no blog www.josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br

sexta-feira, 23 de maio de 2008

NOSSAS HOMENAGENS AO SENADOR JEFFERSON PÉRES

As últimas participações do Senador Jefferson Péres, do PDT do Amazonas, foram registradas no dia 15 passado, quando junto com o prefeito de Manaus Serafim Corrêa (PSB), inauguraram o complexo Educacional Renata Gonçalves e Ignês de Vasconcellos Dias, na Zona Leste de Manaus.

Na oportunidade, o líder do PDT integrava a comitiva do prefeito de Manaus, que cumprimentava os familiares das professoras homenageadas com nome das Escolas, na pessoa de Carlos Eduardo Gonçalves e Bartholomeu de Vasconcellos Dias.

Desse momento temos o registro da presença do Senador Jefferson Péres, em diversos planos: dialogando, conferindo as instalações das escolas, no palco das homenagens ou concedendo entrevista a imprensa local.




Para o Senador Jefferson Peres “o desalento e a náusea são sentimentos que, embora compreensíveis, não devem determinar o nosso comportamento. [...] De uma parte, temos de exigir que os representante do povo no Congresso Nacional, sob pena de perderem seu mandato na próxima eleição, não deixem nada sem apurar, levem às últimas conseqüências as investigações das CPIS e punam com cassações os culpados”.

A MORTE E SEUS FANTASMAS


A única certeza que temos é a morte, afirmavam os filósofos existencialistas. No entanto, nunca estamos preparados para o enfrentamento dessa fatalidade. A morte do Senador da República, Jefferson Péres (PDT-AM), vem sendo festejada nos arraiais dos corruptos tanto aqui no Amazonas como em Brasília.

A satisfação dos políticos corrosivos é tanta que já articulam forças para engavetar os projetos e propostas do senador, e, até mesmo influenciar no comportamento do suplente, tratando-se de um jovem professor da Universidade Federal do Amazonas, Jefferson Praia, criando dificuldades para intimidar ou constranger politicamente.

O baixo clero no Congresso Nacional é satisfeito pelo favorecimento de cargos, por liberação das verbas vinculadas as Emendas do orçamento, bem como às influências dos convênios, reduzindo o parlamentar no garoto de recado dos interesses privados.

Conduta abominável, que o Senador amazonense repudiava tanto na tribuna como também no dia-a-dia de sua prática parlamentar. Jefferson Péres encarnava os interesses republicanos, não compactuando com o conluio das empreiteiras, dos marqueteiros e, principalmente, das alianças políticas pautada na máxima de que “todo homem tem seu preço e que o poder pode tudo”.

O Senador da República José Jefferson Carpinteiro Péres faleceu em Manaus, sua cidade natal, no dia 23 de maio, às 6h30, em sua própria residência em Adrianópolis, deixando o povo do Amazonas perplexo com a notícia.

Das manifestações presenciadas registra-se a fala de um feirante de Manaus, Raimundo Mocorongo, que lamentava o seguinte: “Poxa! Só morre do nosso lado, parece até que os corruptos e bandidos tem poderes de vida e morte sobre os homens justos”.

O NCPAM manifesta profundo pesar aos familiares do Senador, reconhecendo o quanto a sua participação na política nacional contribuiu para afirmação do Direito, deixando aos homens de bem e, principalmente, aos jovens a certeza de que é possível fazer política com ética e justiça, honrando a delegação que o povo lhe concedeu nas urnas. Enfim, morre o homem, mas o fantasma da Justiça persegue a todos.

quarta-feira, 21 de maio de 2008

A SOCIOLOGIA DO NEGRO NO BRASIL



* Breno Rodrigo de Messias Leite


A tradição sociológica no Brasil traz no seu projeto histórico – diferentemente da sociologia européia – à problemática do negro; a observação de seus dilemas histórico-estruturais; as manifestações significativas num modelo de exploração do trabalho escravo alicerçado no modo de produção colonial-dependente.

Os mesmos pensadores que observaram o Brasil sob a perspectiva da mestiçagem, em especial: Nina Rodrigues, Oliveira Vianna, Sylvio Romero, Euclides da Cunha, Gilberto Freyre etc., abordaram a questão do negro e seu papel na formação da identidade nacional moderna.

Ocorre que estes pensadores não tinham como perspectiva teórico-prática o processo de afirmação radical do negro enquanto ente social e cidadão pleno de direitos e deveres do projeto de sociedade democrática – como se tem colocado atualmente. Viam o negro ainda sob o prisma do evolucionismo raciológico ou de corte culturalista que hierarquizava os sujeitos de acordo com suas formas físicas, étnicas, raciais, culturais, em detrimento de uma abordagem crítica.

Nesse espírito, Guerreiro Ramos desloca as leituras tradicionais sobre o negro no Brasil, ao apontar que, “a sociologia do negro tal como tem sido feita até agora, à luz da perspectiva em que me coloco é um forma sutil de agressão aos brasileiros de cor [os negros] e, como tal, constitui-se num obstáculo para a formação de uma consciência da realidade étnica do país”.

A proposta de Guerreiro Ramos é superar as discussões abertamente estritamente raciológicas e culturalistas, e colocar a questão do negro num novo patamar, isto é, discutir com o propósito de criar um vínculo dialético entre a experiência concreta da escravidão e as possibilidades que se abriam no ambiente democrático do novo Brasil.

Tendo como parâmetro fundamental a Escola Paulista de Sociologia, pode-se constatar que no pensamento de Octavio Ianni está contida a perspectiva da “metamorfose” do escravo negro, tendo como ponto de partida à condição de escravo, a sua transformação em camponês submisso a relação de senhor e servo, no engenho e na fazenda, e, consequentemente, em proletário a serviço do capital produtivo.

Na verdade, sua análise se preocupa com o processo de reificação (coisificação) do ser social e sua transformação em mera força de trabalho, isto é, mercadoria-geradora-de-outras-mercadorias, ou, em puro elemento de força de trabalho, numa economia mercantil, industrial, agrária e exportadora associada. “A liberdade que se dá ao escravo é a liberdade de oferecer-se no mercado de trabalho, como mão-de-obra apenas”. E mais adiante acrescenta que “à medida em se organiza a concepção social do negro e mulato, como pertencentes à camada assalariada [proletária], redefine-se reciprocamente negro, mulatos e brancos, criando-se em conseqüência as condições ideológicas do comportamento social específico da sociedade de classes”.

Nesse horizonte conceitual, Jacob Gorender critica esse tipo de visão reificadora da condição do escravo negro. A redução do escravo em elemento adicionado ao capital fixo, máquinas e equipamentos associados ao processo produtivo geral, que sustentou materialmente o modo de produção escravista-colonial, seria uma forma de negar qualquer tipo subjetividade, de criatividade e a possibilidade da revolta. Se o escravo fosse apenas uma força de trabalho – capital fixo no engenho, p. ex. – o escravismo colonial não apresentaria as contradições inerentes a sua lógica reprodutiva que se apresentou nas várias revoltas nas senzalas e a formação protoguerrilheiras de quilombolas.

Dando prosseguimento a discussão, reconhecidamente os trabalhos de Florestan Fernandes são fundamentais para a interpretação sociológica das condições sociais, econômicas e psicossociais do negro após-regime escravista. Para Fernandes, o negro começa de forma desigual em relação ao branco, uma vez que é inserido numa “ordem social competitiva” – formação das classes sociais no capitalismo periférico-dependente – e não consegue alcançar uma autonomia de classe social necessária ao seu projeto político de emancipação de raça e de classe – perspectivas indissociáveis.

Ocorre o que efetivamente pauta as análises da moderna sociologia do negro no Brasil, não é tanto a questão da raça. Tampouco no passado protagonizado pelo modo de produção colonial-escravista. E muito menos a questão entre negros, brancos e índios na utópica “democracia racial” freyreana. Talvez o problema mais pertinente nos dias atuais seja o problema da participação sociopolítica do negro.

Mais e mais os negros, os indígenas e os outros grupos sociais minoritários, através de suas formas de representação civil, reivindicam espaços nos foros de participação no interior da sociedade e nos processos decisórios da esfera político-institucional.

E as conquistas têm sido expressivas: discussão das políticas de Ação Afirmativa em várias Universidades, discussão e encaminhamento do Estatuto da Igualdade Racial, demarcação de territórios de remanescentes de Quilombos etc. São sinais de avanços que marcam uma nova fase de lutas e reivindicações sobre a questão do negro. Agora a discussão sai da retórica e invade a sociedade civil com a implementação de políticas reparatórias de um passado de senhores e escravos. Um passado que nunca deve ser esquecido.

* É mestrando em Ciência Política pela Universidade Federal do Pará (UFPA), bolsista da CAPES e colaborador do NCPAM.

BADERNA NUNCA MAIS!


* Luciana Soares Veras


No dia 20 de maio, ontem, por volta das dez horas da manhã, a UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS - UFAM teve suas aulas suspensas pela manifestação que ocorre tradicionalmente em todos os anos – o Trote. Como de costume, o trote vem sendo acompanhado no uso de vários materiais tais como: Trigo, Apitos, Tinta, Ovos, entre outras “gelécas”. Ultimamente os simpatizantes desta prática estão ultrapassando dos limites, especialmente quando usaram DOIS ARTEFATOS EXPLOSIVO DE MÉDIO escalão, ocasionando total e completa desordem, concentrando-se no último bloco ao lado da RU.

"O Ritual de ingresso na universidade é uma prática que há muito se mantém durante os séculos. Trote estudantil (ou simplesmente Trote) é uma tradição brasileira, em alguns aspectos, similar à praxe em Portugal, que consiste em um conjunto de atividades, que podem ser leves (brincadeiras) ou graves (humilhações ou agressões). Costuma ocorrer o trote nos dias de calourada (que acontecem no início de um semestre ou ano letivo) em escolas, faculdades e universidades que é realizado pelos estudantes mais antigos (denominados veteranos) que recepcionam os recém-chegados (denominados calouros ou bixos).

Porém o trote também costuma acontecer na escola depois dos dias de calourada, principalmente porque calouros não compareciam à ela. O trote estudantil não é uma exclusividade brasileira, muito menos foi inventado no Brasil. Seu histórico pode ser traçado a partir do começo das primeiras universidades, na Europa da Idade Média (Vasconcelos, 1993, p.13).

Nestas instituições, surgiu o hábito de separar veteranos e calouros, aos quais não era permitido assistirem as aulas no interior das respectivas salas, mas apenas em seus vestíbulos (de onde veio o termo "vestibulando" para designar estes novatos). Por razões profiláticas, os calouros tinham as cabeças raspadas e suas roupas muitas vezes eram queimadas.

Todavia, já no século XIV, as preocupações com a higiene haviam se transformado em rituais aviltantes, com nítida conotação sadomasoquista. Isto é observado nas universidades de Bolonha, Paris e, principalmente, Heidelberg, onde os calouros, reclassificados como "feras" pelos veteranos, tinham pêlos e cabelos arrancados, e eram obrigados a beber urina e a comer excrementos antes de serem declarados "domesticados".

Em Portugal, os trotes violentos (como o notório "Canelão") podem ser rastreados a partir do século XVIII na Universidade de Coimbra. Não por coincidência, estudantes da elite brasileira que por lá realizaram parte de seu processo educativo, trouxeram a "novidade" para o território nacional (Zuin, 2002, p.31). Em decorrência disso, surgiram desavenças entre veteranos e calouros que culminaram com a morte, em 1831, de um estudante da faculdade de Direito de Olinda, Pernambuco – seria a primeira, mas lamentavelmente não a última vítima de um trote violento no Brasil". (nota do Wikipedia on-line)

O que muitos não entendem, é que esta prática é uma porta aberta para indivíduos que mesmo estando ao nosso redor, aproveitam a oportunidade da “ingênua brincadeira” para utilizar artefatos e/ou utensílios como bebidas alcoólicas, bombas e outros apetrechos capazes de denegrir não só a imagem do indivíduo em particular, mas a integridade da instituição como estabelecimento de ensino superior. Será esta a universidade que queremos? Será esta a prática de um conjunto de alunos que poderiam reorganizar uma sociedade? Fica aqui o meu repúdio e minha vergonha por fazer parte de um dos cursos participantes deste evento.

* Discente do 3° período do curso de Ciências Sociais da Universidade Federal do Amazonas, Ufam.

terça-feira, 20 de maio de 2008

SUPREMO ATROPELA O CONGRESSO


* Maria Rachel Coelho

O processo de concessão da Floresta Nacional do Jamari, em Rondônia, que estava em fase de habilitação, poderá ser retomado pelo Serviço Florestal Brasileiro e pelo Ministério do Meio Ambiente, depois de decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, que cassou uma decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, sediada em Brasília, que obrigou a União a suspender a concorrência.

A Desembargadora Federal Selene Maria de Almeida, atendendo a pedido do Ministério Público Federal, havia determinado em antecipação de tutela, a suspensão da licitação até que o Congresso Nacional autorizasse previamente a concessão florestal. Sua decisão teve como fundamento o artigo 49, inciso XVII da Constituição Federal que dispõe: “cabe ao Congresso Nacional, aprovar previamente, a alienação ou concessão de terras públicas com área superior a dois mil e quinhentos hectares”.

A licitação da Floresta Nacional do Jamari, suspensa em março, envolve uma área de 95mil hectares. É o 1º processo de concessão de uma Floresta Pública à exploração privada realizado pelo governo de acordo com a Lei 11.284/2006 de Gestão de Florestas.

O ministro Gilmar Mendes, no entanto, acolhendo argumento do Advogado-Geral da União e suprimindo a competência do Superior Tribunal de Justiça, cassou a liminar da juíza e determinou o prosseguimento da licitação. Segundo ele: “não se mostra indispensável a submissão prévia ao Parlamento Nacional para a aprovação ou não de tal certame porque não se trata de alienação de domínio. Não se pode confundir concessão florestal com concessão dominial. A concessão florestal não implica em transferência da posse da terra pública, mas sim a delegação onerosa do direito de praticar o manejo florestal sustentável na área e o artigo 10, parágrafo 4º da Lei 11.284/2006, citado pelo MPF e que exigia, no caso, a autorização do Congresso Nacional, foi vetado pelo Presidente Lula”.

A base normativa que usou para justificar a competência do STF foi o artigo 297 do regimento interno daquela corte, que permite que “a presidência do STF, para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia pública, suspenda a execução de decisões concessivas de segurança ou de tutela antecipada, proferidas em única ou última instância, pelos tribunais locais ou federais, quando a discussão travada na origem for de índole constitucional”.

O projeto de lei que deu origem a lei 11.284/2006 não previa a aprovação pelo Congresso para a concessão de Floresta com área superior a 2.500 hectares, como determina o texto constitucional em seu artigo 49, XVII. Mas no Senado Federal, o projeto recebeu emenda para que se adequasse a esse dispositivo. E embora aprovado por unanimidade foi vetado pelo presidente da república.

A concessão é um ato administrativo pelo qual se institui um direito de uso, aproveitamento, exploração e um direito real sobre coisas de domínio público. Embora seja de sua essência a revogabilidade e que não haja transmissão do domínio pleno e a exploração que venha a ocorrer seja sempre limitada por esse domínio público, não há como se explorar uma Floresta sem a transferência da posse direta do solo e tudo quanto lhe for incorporado natural ou artificialmente. A doutrina subdivide a concessão em duas modalidades: a de serviço público e concessão dominial. A concessão de Floresta Pública seria dessa última espécie, porque implica na outorga de um privilégio ao vencedor da licitação sobre um bem imóvel da União.

No caso, a Constituição não permite se conceda o uso de terras públicas com área superior a 2.500 hectares sem prévia anuência do Congresso e o dispositivo constitucional não faz qualquer distinção entre concessão dominial ou florestal, quem elabora tal distinção, inexistente no texto constitucional é o ilustre ministro, professor e jurista.

Também fere a lógica hermenêutica que o fato de um dispositivo ter recebido veto do chefe do Poder Executivo o torne constitucional.

Ressalte-se que a questão relacionada a inconstitucionalidade da referida lei em relação ao artigo 49, inciso XVII, também é objeto da ADI nº 3.989/DF, cujo relator é o Ministro Eros Grau. Não custa lembrar que a principal defensora desta lei e nossa principal fiscalizadora, ministra Marina Silva, entregou o cargo semana passada.

Cabe agora a nós, representados, “representarmos” nossos representantes, usurpados em uma competência exclusiva conferida pelo artigo 49, XVII da Constituição, fiscalizarmos o processo de licitação.

* Coordenadora Estadual do Movimento Educação Já e Professora de Direito Constitucional e de Direito Processual Civil da UFRJ e UNESA, e colaboradora do NCPAM.

domingo, 18 de maio de 2008

MIRANTE DO COTIDIANO - "PRIMEIRO QUILOMBO URBANO RECONHECIDO NO BRASIL"

Em São Paulo, no município de Itatiba, o primeiro quilombo urbano oficialmente reconhecido no Brasil, conhecido como a comunidade do Quilombo Brotas, onde hoje vivem 32 famílias que descendem de Emília Gomes de Lima e Isaac de Lima, escravos de uma fazenda da região. Após a morte do fazendeiro, o casal foi alforriado e passou a morar no sítio Brotas, propriedade de um casal que ajudava escravos libertos e fugidos.

Para a antropóloga Patrícia Scalli dos Santos da Universidade São Francisco, que elaborou o relatório juntamente com a geógrafa Rose Leine Bertaco Giacomini, há indícios de que a localidade fosse um quilombo, abrigando escravos fugidos, desde 1700. Ela defende, inclusive, a hipótese de que Itatiba tenha sido fundada pelos quilombolas. Entre 1878 e 1885, Emília e Isaac conseguiram juntar dinheiro suficiente para comprar o sítio. A geógrafa Rose esclarece que, com o crescimento da cidade, o sítio Brotas acabou sendo englobado pelo perímetro urbano. Hoje, a área faz divisa com alguns loteamentos.

Por isso é considerado um quilombo urbano. É devido à força das mulheres que o grupo conseguiu se manter ao longo do tempo em seu território. Quem detém o poder no Quilombo são as mulheres nos diferentes espaços, desde as relações familiares, na hora de definir as normas internas do grupo ou até mesmo discutir questões de terras, sempre são as mulheres que dão a última palavra.

MIRATINGA - "O PODER TEM MEDO DA INTERNET"

Se alguém estudou as interioridades da sociedade da informação é o sociólogo Manuel Castells (nascido em Hellín em 1942). Sua trilogia "A Era da Informação: Economia, Sociedade e Cultura" (editada no Brasil pela editora Paz e Terra) foi traduzida para 23 idiomas. É um dos primeiros cérebros resgatados: voltou à Espanha para dirigir a pesquisa da Universidade Aberta da Catalunha em 2001, depois de ter pesquisado e dado aulas durante 24 anos na Universidade da Califórnia em Berkeley. Uma de suas pesquisas mais recentes é o Projeto Internet Catalunha, no qual durante seis anos analisou, por meio de 15 mil entrevistas pessoais e 40 mil através da rede, as mudanças que a Internet introduz na cultura e na organização social. Ele também acaba de publicar, com Marina Subirats, "Mujeres y hombres, ¿un amor imposible?" (Alianza Editorial), no qual aborda as conseqüências dessas mudanças.

El País - Esta pesquisa mostra que a Internet não favorece o isolamento, como muitos crêem, e sim que as pessoas que mais batem papo são as mais sociáveis.
Manuel Castells -
Sim. Para nós não é nenhuma surpresa. A surpresa é que esse resultado tenha sido uma surpresa. Há pelo menos 15 estudos importantes no mundo que dão esse mesmo resultado.

EP - Por que acredita que a idéia contrária se propagou com sucesso?
Castells -
Os meios de comunicação têm muito a ver. Todos sabemos que as más notícias são mais notícia. Você utiliza a Internet e seus filhos também; mas é mais interessante acreditar que ela está cheia de terroristas, de pornografia... Pensar que é um fator de alienação vem a ser mais interessante do que dizer: a Internet é a extensão da sua vida. Se você é sociável, será mais sociável; se não é, a Internet o ajudará um pouco, mas não muito. Os meios de comunicação são de certo modo a expressão do que a sociedade pensa: a questão é por que a sociedade pensa assim.

EP - Por medo do novo?
Castells -
Exatamente. Mas medo de quem? A velha sociedade da nova, os pais de seus filhos, as pessoas que têm o poder ancorado em um mundo tecnológico, social e culturalmente antigo, em relação ao que lhes vem por cima, que não entendem nem controlam e que percebem como um perigo, que no fundo é. Porque a Internet é um instrumento de liberdade e de autonomia, quando o poder sempre se baseou no controle das pessoas, através da informação e da comunicação. Mas isso está acabando, porque a Internet não pode ser controlada.

EP - Vivemos em uma sociedade em que a gestão da visibilidade na esfera pública midiática, como a define John J. Thompson, se transformou na principal preocupação de qualquer instituição, empresa ou organismo. Mas o controle da imagem pública exige meios que sejam controláveis, e se a Internet não o é...
Castells -
Não é, e isso explica por que os poderes têm medo da Internet. Estive em não sei quantas comissões assessoras de governos e instituições internacionais nos últimos 15 anos, e a primeira pergunta que os governos sempre fazem é: como podemos controlar a Internet? A resposta é sempre a mesma: não podem. Pode haver vigilância, mas não controle.

EP - Se a Internet é tão determinante na vida social e econômica, seu acesso pode ser o principal fator de exclusão?
Castells -
Não, o mais importante continuará sendo o acesso ao trabalho e à carreira profissional, e, antes, o nível educacional, porque sem educação a tecnologia não serve para nada. Na Espanha a chamada divisão digital é uma questão de idade. Os dados são muito claros: entre os maiores de 55 anos, só 9% são usuários da Internet, mas entre os menores de 25 anos são 90%.

EP - Então é só uma questão de tempo?
Castells -
Quando minha geração tiver desaparecido não haverá divisão digital no acesso. Mas na sociedade da Internet o complicado não é saber navegar, mas saber aonde ir, onde buscar o que se quer encontrar e o que fazer com o que se encontra. Isso exige educação. Na realidade, a Internet amplia a mais antiga lacuna social da história, que é o nível de educação. Que 55% dos adultos não tenham completado a educação secundária na Espanha é a verdadeira divisão digital.

EP - Nessa sociedade que tende a ser tão líquida, na expressão de Zygmunt Bauman, em que tudo muda constantemente e que está cada vez mais globalizada, pode aumentar a sensação de insegurança, de que o mundo se move sob nossos pés?
Castells -
Há uma nova sociedade que tentei definir teoricamente com o conceito de sociedade-rede, e que não está muito longe da que Bauman define. Creio que, mais que líquida, é uma sociedade em que tudo está articulado de forma transversal e há menos controle das instituições tradicionais.

EP - Em que sentido?
Castells -
Se amplia a idéia de que as instituições centrais da sociedade, o Estado e a família tradicional, já não funcionam. Então todo o nosso chão se move ao mesmo tempo. Primeiro, as pessoas pensam que seus governos não as representam e não são confiáveis. Assim, começamos mal. Segundo, pensam que o mercado vai bem para os que ganham e mal para os que perdem. Como a maioria perde, há uma desconfiança do que a lógica pura e dura do mercado possa proporcionar às pessoas. Terceiro, estamos globalizados; isso quer dizer que nosso dinheiro está em algum fluxo global que não controlamos, que a população está submetida a pressões migratórias muito fortes, de modo que é cada vez mais difícil encerrar as pessoas em uma cultura ou em fronteiras nacionais.

EP - Que papel a Internet desempenha nesse processo?
Castells -
Por um lado, ao nos permitir o acesso a toda a informação, aumenta a incerteza, mas ao mesmo tempo é um instrumento chave para a autonomia das pessoas, e isso é algo que demonstramos pela primeira vez em nossa pesquisa. Quanto mais autônoma é uma pessoa, mais ela utiliza a Internet. Em nosso trabalho definimos seis dimensões de autonomia e comprovamos que quando uma pessoa tem um forte projeto de autonomia, em qualquer dessas dimensões, utiliza a Internet com freqüência e intensidade muito maiores. E o uso da Internet reforça ao mesmo tempo sua autonomia. Mas, é claro, quanto mais uma pessoa controla sua vida menos confia nas instituições.

EP - E sua frustração pode ser maior devido à distância que há entre as possibilidades teóricas de participação e as que se exercem na prática, que se limitam a votar a cada quatro anos, não acha?
Castells -
Sim, há uma enorme defasagem entre a capacidade tecnológica e a cultura política. Muitos municípios implantaram pontos de acesso sem fio, mas se ao mesmo tempo não forem capazes de articular um sistema de participação eles servirão para que as pessoas organizem melhor suas próprias redes, mas não para participar da vida pública. O problema é que o sistema político não está aberto à participação, ao diálogo constante com os cidadãos, à cultura da autonomia, e portanto essas tecnologias só distanciam ainda mais a política dos cidadãos.

Entrevista realizada por Milagros Pérez Oliva do Jornal El País, no dia 10/01/2008.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

O LEVIATÃ QUASÍMODO



* Breno Rodrigo de Messias Leite

Em De l’Esprit des Lois, Montesquieu constrói um modelo político-institucional que revolucionou o modo de se pensar e fazer as instituições políticas no Ocidente: inaugurou o princípio da divisão dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Para Montesquieu, os poderes seriam interdependentes e teriam como principal finalidade o controle mútuo. E mais ainda, a divisão dos poderes seria a única forma de se evitar o absolutismo e a autocracia.

Inspirados diretamente em De l’Esprit des Lois, Madison e os Federalistas, os pais fundadores do modelo político-constitucional dos Estados Unidos da América, construíram os mecanismos de “freios e contrapeso” (checks and balances). Este tinha como princípio o estabelecimento de instrumentos capazes de manter e conjugar os padrões de interação entre os poderes Executivo e Legislativo; dotar o poder Judiciário de autonomia e força constitucional; e inviabilizar a ditadura da maioria legislativa, possibilitando assim a participação política das minorias, o revezamento da situação e da oposição.

De forma bastante clara, o modelo madisoniano “está apoiado na idéia de que uma ambição pode ser neutralizada por outra ambição. A partir dessa perspectiva, se idealizou uma estrutura institucional na qual o Executivo e o Legislativo deviam ser escolhidos de forma independente um do outro. O pressuposto era o de que, desse modo, seriam criadas duas instituições independentes entre si, capazes de se controlar mutuamente”. (Ver, Mariana Llanos e Ana María Mustapic, O Controle Parlamentar na Alemanha, na Argentina e no Brasil, 2005).

É claro que a realidade é dura e o modelo de democracia dos Estados Unidos não funciona necessariamente assim. O sistema partidário tornou-se dual e majoritário, seguindo invariavelmente a lei de Duverger; inviabilizou, de certa forma, a participação de minorias políticas relevantes; além disso, o poder do presidente tomou a dianteira no sentido de exercer um forte controle institucional sobre os demais poderes, fato que acabou sendo designado de
presidencialismo imperial.

No caso latino-americano e brasileiro em especial, a construção da república inspirada nos modelos dos Estados Unidos e da França conservaram, no plano prático, a essência da divisão assimétrica dos poderes. Para os construtores do Brasil republicano, a conjunção dos três poderes, entendidos de forma administrativamente autônoma, dentro de uma unidade político-institucional, só poderia ser colocado na prática a partir da construção de um Estado de Direito que fosse constitucionalmente forte e estruturado em valores republicanos.

Ocorre que, por outro lado, a auto-regulação e a divisão dos poderes sempre foram problemas inerentes às instituições políticas no Brasil. Dessa forma, a construção da república criou as condições objetivas para um funcionamento mais autônomo do poder Executivo e uma retração dos demais poderes, o Legislativo e o Judiciário.

A idéia de um Brasil moderno, onde a divisão dos poderes pudesse estruturar uma trajetória dependente de instituições políticas democráticas, deu lugar para a existência de um Brasil de instituições ineficientes. Também não podemos nos esquecer que o Brasil moderno é ao mesmo tempo uma construção inacabada – um retrato de modelos deformados e que ainda persistem.

A construção e divisão dos poderes seria potencialmente um instrumento de democratização das relações políticas, partindo do princípio de que as instituições importam no contexto da responsabilização e da participação da cidadania, bem como na construção de um Estado Democrático de Direito capaz de responder a demandas econômico-sociais através do processo decisório legítimo. Mas a dinâmica tem funcionado no sentido de sobre-determinar assimetricamente os poderes e radicalizar as suas contradições, inviabilizando, portanto, qualquer projeto republicano de democracia, de auto-regulação autônoma dos três poderes e de participação popular.

Os paradoxos do presidencialismo, por exemplo, podem não só comprometer seu próprio funcionamento – o que é uma evidência em si mesmo –, mas corroer todas as outras instituições políticas que se sentem acuadas pelo excesso de poder do presidente. Uma vez que no presidencialismo tem “um Executivo com consideráveis poderes constitucionais e geralmente com o controle completo da composição de seus ministros, e seu governo é eleito pelo povo por um mandato fixo, que não está em função de um voto de confiança dos representantes democraticamente eleitos no parlamento. Além disso, o presidente não é somente o proprietário do poder executivo, mas o Chefe de Estado que não pode ser demitido, exceto em casos de impeachment” (Ver, Juan Linz. Presidential or Parliamentary Democracy: does it make a difference?).

Dessa forma, superar os paradoxos do presidencialismo e construir uma transição institucional para uma forma de governo democrático capaz de responder as pressões sociais, respeitando a construção do sistema multipartidário, a plena divisão dos poderes e inviabilizando, portanto, a paralisia decisória pode ser uma alternativa de reformas eficazes e urgentes para a atual tragédia do nosso Leviatã Quasímodo.

* Mestrando em Ciência Política (PPGCP) pela Universidade Federal do Pará, bolsista da CAPES e colaborador do NCPAM.

terça-feira, 13 de maio de 2008

13 DE MAIO - UMA ABOLIÇÃO INCOMPLETA

"A abolição da escravatura é um processo a exigir do Estado brasileiro ações de governo capazes de reparar politicamente, economicamente e moralmente os feitos históricos acometidos contra os povos africanos em território nacional, que reduziram os homens pela sua diferença de cor em besta produtiva, insitituindo a monocultura, o latifúdio agrário e a sociedade patriarcal. Portanto, nesta data, 13 de maio, façamos um gesto de manifestação público, que denuncie o trabalho escravo, a discriminação, o preconceito, a intolerancia e o racismo no Brasil".

Ademir Ramos
Coordenador do NCPAM


Em Sessão Especial do Senado Federal em comemoração aos 120 anos da abolição da escravatura no Brasi, o pequeno trecho do comovente discurso do senador Cristovam Buarque:
"Embora tenha sido o mais importante gesto ou único gesto revolucionário da história do Brasil pois de lá pra cá só comodismo e uma abolição incompleta, não devemos sair daqui comemorando a abolição, mas sim preparados para o desafio de completá-la.

Tivemos 150.000 dias de escravidão e 43.830 de liberdade, é ainda um tempo muito curto para nossa história. Fiz um pequeno folheto com discursos de Joaquim Nabuco, onde se pode ver o nome de todos que falavam que ainda não era a hora de se fazer a abolição. E não importa quem assinou a lei, e não importou o partido, o que importava era acabar com a absurda vergonha da escravidão.

Hoje também temos quem fale: queremos educar todas as crianças mas não há dinheiro, queremos que todos os negros entrem na universidade mas não pelas cotas.

Completar a abolição é não ter filas nos hospitais,

Completar a abolição é que todos tenham um endereço e que depois esse endereço se transforme numa moradia com água e esgoto,

Completar a abolição é que a Amazônia seja permanentemente conservada,

Completar a abolição é acabar com a violência que está sobre tudo sobre os negros pobres,

Completar a abolição é garantir os direitos dos nossos índios,

Completar a abolição num mundo globalizado é olhar para a África e ver o que podemos fazer para ajudá-los,

Completar a abolição é garantir que a escola para os filhos da senzala seja a mesma do filho do condomínio.

As pessoas não achavam possível o fim da escravidão como hoje não acham possível a "escola igual pra todos".

Era preciso libertar os escravos, hoje é preciso libertar os cérebros!"

Senador Cristovam Buarque

VIVA A LIBERDADE, A DEMOCRACIA E A EDUCAÇÃO!



*Marilene Fernandes de Souza

Os discursos vinculados aos temas liberdade, democracia e educação são atrativos e sempre comentados, mas trazem também a ilusão, o engodo, a tergiversação. E certamente nos atrai porque nos faz pensar em novas perspectivas, assim como na esperança de um tempo melhor seja no campo econômico, cultural, político e educacional.

Temos vivido cercados por manobras políticas. Enquanto sociedade, nos comportamos como se estivéssemos vivendo um estado letárgico, são poucos que se manifestam, opinam e se propõem a subverter tais situações.

Hoje dia 13 de Maio, comemoramos o dia da libertação dos escravos no Brasil, nos propomos a uma reflexão histórica deste feito e outros atrelados a ele, pois em documentos oficiais da nação, a escravidão acabou, mas recentemente numa reportagem na Rede Record de televisão, assistimos uma criança de 12 anos de idade trabalhando em uma fazenda no Estado do Pará, na qual tem sido cravado o selo quente na pele, o mesmo usado para marcar gados, tendo no seu corpo queimaduras de 2° e 3° graus. Seu patrão alegou tratar-se apenas de uma brincadeira, e o caso, muito lentamente, vem sendo analisado por autoridades locais.

Porém, as atrocidades deste nível ocorrem diariamente. E nos questionamos por que em pleno século XXI ainda presenciamos atitudes como esta?

Que responsabilidade nós temos daquilo que se tem feito em nosso país? A pobreza econômica tem alimentado a pobreza política em nosso país, se justifica pela renitência daqueles que detém o poder fazendo uso de atividades que recriam a subserviência, o esmoler, a troca de comida pelo cabresto, culminando na depredação persistente da cidadania brasileira.

Ser pobre não é apenas não ter, mas ser tolhido da possibilidade de ter, ou seja, ao passo que a população vicia-se nestas práticas de troca de alimentos e favores, distancia-se da liberdade, da democracia e da educação capazes de desenvolver o senso crítico, que forma indivíduos criativos e capacitados de lutar pela cidadania igualitária, por isso a pobreza vem sempre acompanhada da humilhação, da subserviência e não apenas da fome.

A realidade salarial, de moradia e de sonegação a educação básica camuflam nossa essência, de um povo que viveu a intolerância dos colonizadores, de um solo que foi palco de morticínios e de um longo período de escravidão. Ganhamos fama de povo pacífico, principalmente pela ótica oficial da história transmitida nos livros didáticos, a qual mostrar um país que não vivenciou guerras civis de grandes proporções ou com bombas (deixando no segundo plano as várias revoltas e lutas em favor da liberdade neste país). Mas a realidade não nega, presenteamos ainda guerras de poder, guerras do narcotráfico, guerra contra nossos índios e guerras de demais interesses que no fundo trazem a marca da subserviência, nos calando para não parecermos violentos.

Lutar por um país melhor, onde àquilo que está nos papéis, prescritos em leis seja legitimado é um exercício de cidadania, pois, se os direitos não forem conquistados, não se realiza algo que é o cerne da cidadania: o saber, a capacidade de produzir, construir com iniciativa própria uma nova realidade. Não podemos nos eximir de nossa responsabilidade, seja com organização civil, seja com sindicatos, na escola e fora dela, visto que, a educação é difusa, sendo essencialmente política e provida de ferramentas que podem mudar a realidade de um povo.

É fundamental cercar o Estado pela cidadania organizada, não aquela partidária que defende interesses próprios, mas a que traz em seu bojo perspectivas, resultados e oportunidades a todos que formam a sociedade, independente de classes.

* Pesquisadora do NCPAM e discente do curso de Pedagogia da Universidade Federal do Amazonas.

domingo, 11 de maio de 2008

MIRANTE DO COTIDIANO - COMPETÊNCIA E HABILIDADE



As fotos dão conta do trabalho que o NCPAM vem desenvolvendo junto à comunidade acadêmica da Universidade Federal do Amazonas, investindo na formação de novos pesquisadores. O primeiro plano mostra o laboratório feito nos estúdios do Centro de Mídia da Secretaria de Estado de Educação, quando os jovens pesquisadores se preparam para realização das oficinas sobre a Cultura Indígena e Afro-brasileira em cumprimento a Lei 11.645/2008, iniciando-se no dia 02 até o dia 30 junho para formação continuada dos professores do Estado.

Esses e outros projetos são implementados sob a coordenação do NCPAM, que se define como Laboratório das ciências sociais, bem como Observatório da cultura política, primando pela competência e habilidades dos pesquisadores quanto à capacidade de análise e formulação de propostas políticas que promovam o desenvolvimento humano na Amazônia.





sábado, 10 de maio de 2008

NCPAM REALIZA OFICINA DE TEXTO



O ofício acadêmico deve desenvolver competências intelectuais em sintonia com habilidades artísticas e profissionais que qualificam os atores quanto ao saber fazer. Nessa perspectiva, o Núcleo de Cultura Política do Amazonas (NCPAM), com o apoio do Programa Atividade Curricular de Extensão (PACE) da Universidade Federal do Amazonas, vem implementando Oficinas de Textos junto aos alunos do Instituto de Ciências Humanas e Letras (ICHL), que pretendem qualificar ainda mais sua prática acadêmica em função do fortalecimento das ações realizadas pelo NCPAM.

Os pesquisadores do NCPAM referenciados pelos projetos em curso no campo da Cultura Política explicam que “precisam aprimorar cada vez a qualidade de seus textos, primando pela variedade das formas de linguagem em respeito à comunidade”. Para o coordenador do Núcleo, professor Ademir Ramos “faz-se necessário diversificar os textos e dar visibilidade para interagir com os atores afins”.

As oficinas iniciaram-se nessa sexta-feira (09/05) às 9 horas, no ICHL, no Campus Universitário, com a participação do professor Walmir Albuquerque, ex-reitor da UFAM, contando também com a presença da diretora Magela Andrade, representante da Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Federal do Amazonas.

Na abertura dos trabalhos, o professor Walmir Albuquerque, enquanto convidado, salientou a importância da iniciativa, afirmando que “precisamos sair da noção do ‘trabalho escolar’ para a prática reflexiva acadêmica. Esse exercício funda-se na textualidade e contextualidade, exigindo dos atores a capacidade de leitura e análise”.

Para o ex-reitor da UFAM, que é doutor em comunicação pela ECA/USP, “ninguém começa pensar eletronicamente. Na verdade, os meios eletrônicos potencializam as formas de pensar”. Dessa feita, “o conhecimento é um processo cumulativo, que exige competência, habilidade e estilo”, conclui.

A continuidade dos trabalhos das Oficinas de Textos está sob a competência do professor Tenório Telles, editor da livraria Valer, que é um dos parceiros do NCPAM na realização do evento. Assim sendo, a partir deste sábado (10/09) das 14 às 16 horas, assim como todos os sábados até o dia 06 de junho próximo, estarão acontecendo as Oficinas de Textos, nas dependências da Livraria Valer (Rua Ramos Ferreira, nas proximidades da Av. Getulio Vargas, no centro de Manaus).

O objetivo das oficinas, segundo uma das facilitadoras, a pesquisadora Marilene Fernandes, “é promover a difusão da ciência centrada na produção e análise de textos jornalísticos, literários e científicos, instituindo normas gerais que regrem a forma dos textos a serem publicados tanto na página como também na Revista Puxirum do NCPAM”. No final das oficinas os alunos farão uma avaliação, conferindo a proposta de trabalho com o desempenho das atividades implementadas, quando também serão avaliados pela sua produção.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

HORÁRIO NACIONAL ÚNICO: SÓ FALTA MEIA HORA


* Mario Nelson Duarte



O Brasil ousou um primeiro passo – essencial, mas ainda insuficiente – para resolver o grave problema da falta de simultaneidade das atividades econômicas, financeiras e culturais.

Demorou, porque o projeto de lei estava engavetado nas comissões e nos plenários do Congresso há muito tempo, até que a "bendita" pressão das televisões (até o diabo às vezes faz bons milagres...) fez Suas Excelências votarem e liquidar a questão. Aprovado e sancionado o projeto, incluiu-se todo o Extremo Oeste do País na hora padrão de Manaus, dando à Amazônia unificada uma diferença, de apenas 60 minutos, em relação ao Centro-Sul.

A mudança, porém, só atingiu (como sempre) as comunidades mais esquecidas e distantes: todo o Acre, parte do Amazonas e Roraima. Os estados poderosos continuam com rotinas e relógios intactos – e é aí que reside o ponto crucial, a necessidade de agir com coragem e determinação, dividindo entre todos os brasileiros o peso das indispensáveis mudanças.

Não tenho a pretensão de ser salomônico, repartindo em partes iguais o ônus da unificação do horário nacional; falta-me inspiração divina para assim agir...

Baseio-me em questões objetivas, materiais, de ordem econômica e reflexos sociais, muito discutidas nos últimos dias – desde quando a televisão teve de adaptar sua programação às normas que disciplinam o acesso às faixas etárias da audiência. Mas o problema vai muito além, como já se disse exaustivamente, e o principal exemplo é a disparidade dos horários dos bancos e demais instituições financeiras, que seguem os de São Paulo.

O resto do País que corra atrás. E, no caso de aviões que chegam praticamente na "mesma" hora da partida, que "voe" atrás".

Cito, novamente, o exemplo da Índia, o chamado Sub-Continente Indiano, que se destaca na Ásia: um dos segredos de seu explosivo crescimento econômico está no horário nacional único, cinco horas e meia a mais que o padrão-base universal.

É o caminho que se aponta para o Brasil: quebrar meia hora no Centro-Sul e adicionarem-se também 30 minutos na Amazônia, estabelecendo o nível nacionalizado de menos 3 horas e 30 minutos em relação ao GMT (Greenwich Mean Time). Mais do que assistir ao vivo à programação de televisão, todos os brasileiros terão, também, ao mesmo tempo, suas operações bancárias e financeiras on-line e simultâneas, além de poderem controlar o tempo real de cada viagem aérea, confrontando o horário de partida ao de chegada.

“Acertar os ponteiros” é uma expressão muito comum em nosso País, que significa unir esforços para construir algo bom.

Quando acordaremos para a necessidade de fazer-se isso, real e materialmente, nos próprios relógios de todos os brasileiros?


* É Jornalista, especializado em turismo cultural e colaborador do NCPAM.

quarta-feira, 7 de maio de 2008

"AS TERRAS INDÍGENAS INTEGRAM UM BRASIL ÚNICO!"


* Maria Rachel Coelho Pereira

Depoimento exclusivo, "um desabafo", enviado pela professora Maria Rachel ao NCPAM, no dia 05/05 sobre a situação lamentável e de calamidade pública que permeia os sérios conflitos na reserva indígena Raposa Serra do Sol.

"Acabei de chegar de Roraima, estive não só em Pacaraima como também em Mucajaí (do outro lado), no carnaval também passei pela 174 e Pacaraima, ao atravessar para a Venezuela com um grupo de alunos.Na verdade estou bastante preocupada.
O STF pode nos levar a um retrocesso sem precedentes na história do indigenismo, falo isso porque alguns ministros já se anteciparam em alguns comentários, a tendência é uma grave mudança na Raposa Serra do Sol, desmembrando-a em "ilhas" para acomodar alguns arrozeiros que a esbulharam ilegalmente a alguns anos atrás.

O fundamento legal seria o risco à soberania nacional. Mas nunca na história do Brasil o nosso território sofreu perda para outro país por causa dos índios, pelo contrário, foi pela aliança de alguns povos indígenas com os portugueses que ganhamos parte do território brasileiro, assim como tiveram papel fundamental na inclusão de Roraima ao território nacional, as pessoas tem que começar a respeitar os índios como primeiros brasileiros!

O STF não pode voltar atrás na homologação da terra não só pelo ato já realizado mas também pelo que a homologação representa como ato jurídico que oficializa o reconhecimento do Estado e da nação sobre as terras indígenas. Os povos indígenas são parte essencial da nação brasileira, as terras indígenas integram um Brasil único! Enquanto as pessoas não entenderem isso vamos continuar tendo conflitos.

Muito grave é a situação em Dourados, Mato Grosso do Sul, com a morte de crianças indígenas por desnutrição e por suicídio e a essência do problema também gira em torno da terra. É crítica a situação dos indígenas em Dourados, vivem confinados em diminutas proporções de terra. É inadmissível uma criança de 11 anos se suicidar, ato drástico, mas que nem assim chama a atenção do Estado. Temos que nos mobilizar para evitar este descalabro.

Existem algumas ONGs sérias, outras entretanto que só fazem reverter os benefícios que recebem. Outra questão gravíssima e que ninguém se preocupa é a venda de terras pela internet, há videos até no you tube, americanos estão vendendo hectares de terras brasileiras pela internet, como conseguem esses registros?"


* É doutoranda em Ciências Políticas, mestre em Direito, especialista em Direito Público e Privado, Direito Penal e Processual Penal e Direito Civil, além de professora de Direito da Pós-graduação da Universidade Estácio de Sá. www.cidadaniaejustica.blogspot.com/

domingo, 4 de maio de 2008

A AFLORAÇÃO DE UM VELHO ÓDIO



* Márcio Souza

O debate nacional levantado pela questão da Demarcação das Terras Indígenas, especialmente aquela da Raposa Serra do Sol, em Roraima, resvalou para um desvão sinistro, ressuscitando ideologia que pareciam adormecidas e pondo à luz do dia interesses escusos.

As mentiras em torno do assunto ressoam pelas mídias poderosas da televisão e da grande imprensa, e até um general, numa remissão aos idos da ditadura militar, fez discurso no Clube Militar do Rio de Janeiro. Para este general, a integridade do território nacional estaria ameaçada pela demarcação das terras indígenas na Raposa Serra do Sol.

Os membros das ONGs estrangeiras, sucedâneos dos comunistas dos tempos da guerra-fria, estariam prestes a proclamar a independência dessas áreas, manipulando os pobres silvícolas. Como bem escreveu o Dr. Samuel Johnson, o patriotismo é o último refúgio dos canalhas.

Primeiro, porque o governo brasileiro nunca “deu” terras aos índios. As Reservas são Terras da União, onde os povos indígenas têm o usufruto, mas ali os órgãos do governo podem entrar e sair. As terras da Raposa Serra do Sol são do Estado, ou seja, do povo brasileiro.

Ali vivem historicamente diversas etnias, que sempre defenderam o Brasil e optaram pela nacionalidade brasileira. Mas, o que o general parece querer é privatizar as terras da União, entregando-as aos grileiros, aos invasores, usurpando-as do povo brasileiro.

Que tipo de nacionalismo é este?

O que vemos é a afloração do velho ódio contra os povos indígenas, que já pagaram caro por isso.

Vejamos um povo do passado.

A impressão deixada pelos viajantes espanhóis é de que as margens do Amazonas e outros grandes rios estavam densamente povoados. Mesmo descontando os exageros dos narradores coloniais, todos eles e num espaço de dois séculos foram unânimes em registrar as aldeias e vilas densamente povoadas.

Critobal de Acunã, um século depois de Carvajal, dizia que as terras de dentro são igualmente tão populosas que “se atirarmos uma agulha para cima ela ira cair fatalmente na cabeça de um índio”.

Enfim, a Amazônia estava ocupada por grupos tribais de diversos padrões e diferentes origens antes da chegada dos europeus. Assim os mitos e lendas dos atuais povos indígenas ainda guardam certas lembranças de um passado que se perdeu na voragem da conquista.

As rotas comerciais que ligavam a selva amazônica às grandes civilizações andinas ainda continuam traçadas nas entranhas da mata virgem, reconhecidas apenas pelo olhar dos que sabem distinguir antigas veredas dissimuladas pelas folhagens.

É por essas rotas que um índio Tukano do norte amazônico pode visitar seus parentes do sudoeste, seguindo o mesmo curso que levam produtos da floresta ao Cuzco de lá trazia artefatos de ouro, tecidos e pontas de flechas de bronze.

Feitos heróicos dos tempos que se perdem nas brumas ressoam em épicos como a saga do tuxaua Buopé, marco central da literatura oral dos índios Tariano, em que a conquista do norte amazônico pelos Aruak está fielmente descrita, como a mostrar que, assim como as culturas já haviam atingido alturas, os dramas humanos mais intensos, como as guerras, as paixões e a aventura, aqui já se desenrolavam como em qualquer outra parte da terra onde a humanidade escolheu para encenar seu drama.

Por Justiça a Reserva Raposa Serra do Sol, de forma contínua, é dos índios.

* Márcio Souza é escritor, dramaturgo, articulista de a Crítica e um dos primeiros intelectuais Amazonenses a contribuir efetivamente com a luta e organização do movimento indígena da América Latina.

MIRANTE DO COTIDIANO - TRISTEZA, HORROR E TRAGÉDIA NO RIO SOLIMÕES (AM)



Para o sociólogo e professor da Universidade Federal do Amazonas Luiz Antônio, a cena do naufrágio em Manacapuru, no Amazonas, presenciada por ele, às 8h30 deste domingo (4) foi “um misto de tristeza, horror, tragédia anunciada. Centenas de pessoas atônitas, umas chorando, outras em silêncio fúnebres. Todas incrédulas frente a mais um acidente nos rios da Amazônia, desta vez, foi o barco Comandante Sales, a impunidade e o descaso continuam”.

Segundo o noticiário da Folha Online, a embarcação Comandante Sales, que naufragou na madrugada deste domingo no rio Solimões, na proximidade da cidade de Manacapuru (AM)às 5h45, estava irregular, segundo a Marinha. Ao menos dez pessoas morreram no naufrágio, no entanto, esse número pode mudar conforme ocorrem os trabalhos de resgate de vítimas. O barco transportava cerca de 113 pessoas, segundo estimativas divulgadas pela Marinha.

De acordo com informações da Marinha, o barco não estava inscrito na Capitania dos Portos e em janeiro foi apreendido por falta de documentação, além de estar navegando com tripulação sem habilitação.

Segundo a nota enviada pela Marinha, a embarcação não poderia estar em navegação no momento do acidente porque estava apreendida. A Norma da Autoridade da Marinha, segundo informa a nota, diz que o proprietário deveria comparecer à Capitania dos Portos de Manaus para apresentar sua defesa e a documentação para regularizar o barco, o que não aconteceu.

A capacidade de carga e passageiros da embarcação seria definida pela Capitania dos Portos quando o proprietário comparecesse para o processo de regularização, de acordo com a nota.

A embarcação tombou aproximadamente 20 minutos depois que partiu do Lago do Pesqueiro, onde ocorria uma Festa do Divino, quando tombou para um lado e foi invadido pela água.

Os passageiros da embarcação foram auxiliados, primeiramente, pelos ocupantes de outro barco que navegava atrás, de acordo com a Polícia Civil. Com a chegada do Corpo de Bombeiros, a embarcação acidentada foi estabilizada perto da margem do rio, e o resgate dos corpos que estavam no interior do barco começou.

A assessoria do 9º Distrito Naval de Manaus confirmou que dez corpos de vítimas do naufrágio já foram resgatados. Eles serão levados para Manacapuru. De acordo com a Polícia Civil, no entanto, antes do registro das mortes, os corpos precisam ser levados ao IML (Instituto Médico Legal) de Manaus para o reconhecimento. O trajeto de Manacapuru a Manaus, em barco veloz, dura três horas. A viagem comum pode levar seis horas, segundo a polícia.

O Comando do 9º Distrito Naval encaminhou cem homens para os trabalhos de buscas e resgate, além de uma embarcação do Corpo de Bombeiros, um navio e um helicóptero da Marinha e embarcações civis.

Um inquérito administrativo será instaurado pela Marinha para apurar este acidente, sob a coordenação da Capitania Fluvial da Amazônia Ocidental, que terá o prazo inicial de 90 dias para ser concluído, prazo que pode ser prorrogado por até um ano.

sábado, 3 de maio de 2008

MIRATINGA POÉTICA - TODA PALAVRA



*Anibal Beça ©

Toda palavra guarda uma cilada
Torquato Neto




Toda palavra voa nebulosa
até chegar latente ao nosso chão.
Pousa sem pressa ou prece em mansa prosa
caída chuva breve de verão.

Toda palavra se abre generosa
para abrigar segredos num porão
lá onde sobram sombras sinuosas
levantando a poeira no perdão

Toda palavra veste-se vistosa
para fazer afagos na paixão
uma pantera em paz, porém tinhosa.

Toda palavra enfim é explosão
que o mundo só é mundo por osmose
pois há um outro ser no coração

Apenas uma palavra é capaz de salvação. Seja no amor, no dia-a-dia, na solidariedade com os esquecidos do mundo. Uma palavra basta para salvar aquele à beira do penhasco. Doe-se em palavra, salve e salve-se.


* Poeta amazonense, membro da academia amazonense de letras e presidente do conselho municipal de política cultural de Manaus.

quinta-feira, 1 de maio de 2008

A GLOBALIZAÇÃO DA AMAZÔNIA


* Alberto Teixeira da Silva

Múltiplos campos teóricos e discursivos focam vulnerabilidades e possibilidades de inserção da Amazônia na alta modernidade. No rastro da modernização capitalista, notadamente a partir da emergência de temas como meio ambiente, direitos humanos, narcotráfico, novas tecnologias, erosão das soberanias nacionais e temas vinculados a defesa territorial, a questão da Amazônia ganha relevância na mídia, nos círculos acadêmicos e nas políticas multilaterais.

A Amazônia deixou de ser apenas um desafio para o desenvolvimento sustentável regional e nacional, sendo agora uma questão vital para o desenvolvimento sustentável continental e mundial. Estão em curso processos multidimensionais de globalização da Amazônia. O tema da ‘internacionalização’ deve ser focado a partir deste prisma. A controvérsia associa a fragilidade do governo brasileiro na proteção da maior floresta do planeta diante da ameaça intervencionista dos países desenvolvidos em nome de salvaguardar o maior “patrimônio ecológico da humanidade”.

Visões de riquezas do além-mar têm seduzido colonizadores europeus mais remotos, inicialmente Portugal e Espanha, depois outros países que sob a saga da dominação colonial, ergueram empreendimentos e fincaram seus interesses sobre esta vasta porção úmida e tropical. Interesses distintos acompanham de forma dramática a história regional até os dias de hoje, envolvendo matizes ideológicos, ranços nacionalistas, delírios transnacionais, num intrincado jogo político engravidado de significações e simbologias.

Segundo Ignacy Sachs, “a perspectiva de internacionalização por motivos ecológicos é mais do que remota, em que pesem alguns raros e episódicos excessos verbais sobre o tema de um ou outro político europeu”. A base de interesses é bastante diversa: recursos minerais, banco fantástico de espécies derivados de singular megabiodiversidade, e hoje, sobretudo, o papel das florestas na estabilização climática do planeta. Apesar do notório reconhecimento de que a Amazônia desperta interesse, o argumento da “internacionalização” que configura perda de soberania sobre a região, do ponto de vista da geopolítica dos militares é absolutamente insuficiente para dar conta dos movimentos globais que transitam na fronteira do capitalismo periférico. Essa polêmica ressurge com maior vigor na década de 1980, sendo reintroduzida a “teoria da conspiração” no discurso de defesa da região pelas forças armadas.

Alguns analistas mais eufóricos com viés nacionalista extremo advogam a tese de que estaria havendo um cerco sobre a região amazônica por parte das grandes potências mundiais, sendo esta (teoria do cerco) complementar a “teoria da conspiração”. Os seguidores desta teoria passaram a ver nos ambientalistas uma quinta-coluna que deveria ser politicamente trucidada. É lógico que a Amazônia atrai o interesse de outras nações, por razões já aqui apresentadas; o que não quer dizer que uma eminente ocupação se concretize. Também nunca pode ser totalmente descartada a hipótese de uma intervenção militar na Amazônia, tendo em vista um cenário onde esteja em jogo interesses vital para os países mais desenvolvidos, sobretudo para os Estados Unidos, que tem adotado política externa agressiva e imperialista nas últimas décadas.

No entanto, desde a segunda metade da década de 1970, o governo brasileiro vem efetivando uma política de segurança para a Amazônia, acionando, num primeiro plano, tentativas políticas de cooperação entre os demais países que formam a Amazônia Continental (Bolívia, Colômbia, Peru, Equador, Suriname, Guiana e Venezuela). Firmado em 1978, o Tratado de Cooperação Amazônica (TCA), traduzindo a idéia de um Pacto Amazônico, postulou a necessidade de se fundar as bases de um desenvolvimento regional integrado, crescimento econômico e preservação ambiental, que possibilitaria a integração física e administração de problemas comuns.

O problema da segurança e soberania da Amazônia, sob a égide do aparato geopolítico, está ancorado no Projeto Calha Norte e o Sistema de vigilância e proteção da Amazônia (SIVAM/SIPAM). O Projeto Calha Norte surgiu em 1985, como reação unilateral ao imobilismo deliberado dos demais países signatários que assinaram o TCA. Foi elaborado como plano de ação governamental com a finalidade de intensificar a presença do Estado ao norte dos rios Solimões e Amazonas, abrangendo uma área praticamente inexplorada, que corresponde a 14% do território nacional, com mais de 6,7 mil quilômetros de fronteiras terrestres, que se estendem desde Tabatinga à foz do Oiapoque. Apesar de limitado e controverso, constitui uma ação de defesa do território amazônico.

O SIVAM dentro de uma ação mais abrangente de proteção da Amazônia (SIPAM) constitui uma resposta ao monitoramento do espaço aéreo regional e de apoio logístico de planejamento dos governos locais. No entanto, a lógica que preside a política de proteção da região está baseada na geopolítica dos militares, a partir da idéia de segurança nacional. Além disso, a concepção do SIVAM/SIPAM foi pensada sem levar em consideração a comunidade científica e os atores políticos representativos das populações regionais e tradicionais, se constituindo numa parafernália cara (1,4 bilhão de dólares) e centralizadora. Ao invés de um sistema poderia ser criado um centro de inteligência e o fortalecimento institucional de políticas públicas para a Amazônia.

Não resta dúvida que os acordos de cooperação representam pressão política dos países doadores, na medida em que a questão financeira influencia interesses e prioridades, geralmente favoráveis as políticas domésticas desses países. Todavia, existem pontos em comum que devem ser considerados, visto que a promoção do desenvolvimento amazônico se relaciona diretamente com a sustentabilidade do desenvolvimento nacional e global, ou seja, a cooperação internacional e a coordenação de políticas nacionais tornaram-se requisitos indispensáveis para lidar com as conseqüências de um mundo que se globaliza rapidamente. Cresce a interdependência de problemas e soluções, que certamente está afetando instituições e relações de poder, tencionando e reconfigurando a geopolítica mundial, numa correlação de forças que vai progressivamente modelando diferentes formas de governança nos diferentes níveis da vida social.

Um antídoto à ameaça externa seria uma posição corajosa e determinada do governo brasileiro no sentido de planejar um padrão de ocupação seguindo as orientações do zoneamento ecológico-econômico, de tal modo que a região fosse tratada como prioridade na efetivação de políticas sustentáveis, no aproveitamento racional de seus recursos naturais, respeitando o saber local e as identidades culturais das populações que nela habitam e forjado um novo modelo de desenvolvimento, baseado na conservação da floresta e nos serviços ambientais provenientes da sociobiodiversidade existente.

Todavia, não são poucos os que se reportam as estratégias de “dissuasão estratégica”, que seria uma forma de evitar um conflito mais violento, invocando uma ameaça cujo preço o adversário saiba, a priori, que terá que pagar. No que tange a Amazônia, essa estratégia dá munição ao projeto de militarização da Amazônia, para além do papel tradicional desempenhado pelas forças armadas na região.

O reconhecimento dos sucessivos fracassos das políticas de desenvolvimento para a Amazônia deveria conduzir a uma nova política do Estado Nacional, atacando problemas crônicos, o que levaria a investimentos maciços em infra-estrutura social. Para além das teorias e posturas geopolíticas conspiratórias - de direita e de esquerda - que sob o manto ideológico da defesa territorial, tem obscurecido as correlações de forças mundiais, dando lugar a síndrome da vulnerabilidade e fraqueza psicológica; o cenário mais próximo do atual estágio de diplomacia política hegemônica aponta para uma impossibilidade de invasão militar na Amazônia para o atendimento de interesses exógenos ou do imperialismo norte-americano, ainda que conflitos plantados em países fronteiriços (Colômbia, Peru, Bolívia) possam representar uma ameaça potencial.

A internacionalização política e territorial da Amazônia deve ser reformulada e inserida no contexto da globalização multidimensional, diante do processo histórico de interdependência crescente entre países, blocos regionais e, sobretudo, na agenda das políticas públicas globais. As mais variadas formas de conflitos, tensões e impasses, refletem novas configurações no plano da geopolítica mundial, interesses estratégicos de países hegemônicos, diante de um processo de globalização excludente e concentrador de riquezas.

Os militares defendem o ideal da soberania do Estado e o controle das fronteiras, como argumento de defesa estratégica e de segurança nacional. O mainstream doutrinário militar enxerga a movimentação das Ongs como perigosas intervenções financiadas por interesses exógenos, associados aos países desenvolvidos. Paradoxalmente, foi durante o ciclo da ditadura que as políticas de internacionalização da economia brasileira, em particular da Amazônia, frutificaram sob o emblema da integração e ocupação produtiva dos espaços vazios. As Ongs têm uma visão mais afinada com estratégias globalistas de cooperação e integração de ações na esfera pública, limitando a soberania do poder estatal. Contudo, mecanismos de controle social e transparência, são absolutamente indispensáveis para a atuação e acompanhamento dos atores e programas desenvolvidos. Uma internacionalização silenciosa (biopirataria e domesticação de produtos regionais) vai lenta e progressivamente sugando o que de mais precioso e estratégico as florestas e a diversidade ecossistêmica amazônica pode oferecer: saber milenar e base de substâncias ativas para a indústria de ponta do capitalismo avançado. A soberania da Amazônia não é uma questão militar. Somente uma cultura de defesa e segurança regional fundada sob o primado do conhecimento tradicional, ciência, tecnologia, inovação e educação, pode promover um desenvolvinento sustentável endógeno e valoração de riquezas para as populações amazônidas atuais e futuras.


* Alberto Teixeira da Silva é doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas - Unicamp e professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Pará (alberts@superig.com.br).