quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

NO REINO DA SOLIDÃO

Ademir Ramos (*)

Muito tem se publicado sobre Amazônia. No norte do Brasil as Universidades Federais por meio de suas editoras ou em parcerias com outras agências têm feito grandes esforços para ampliar sua produção intelectual analisando a mega diversidade que abriga nesse território a se caracterizar pela complexa relação Natureza e Cultura; Desenvolvimento e Sustentabilidade; Cultura e Sociodiversidade; Etnociência e Biodiversidade; Ciência, Inovação e Tecnologia; Industrialização e Indicadores Sociais; Arte, Literatura e o Imaginário Cultural, entre outros.

No entanto, o berro dos acadêmicos compilado em tese, dissertação, monografia e em formato usual de livro não tem eco no núcleo duro da política nacional que interpreta e define as políticas a serem implementadas na região. Tal situação torna-se grave e denuncia o fosso que há entre a produção intelectual e o aparato burocrático de Estado, que por sua vez, é o formulador das políticas públicas.

Com esse descompasso, o Brasil continental nunca será uma terra das oportunidades como almeja a Presidente Dilma Rousseff, em discurso de posse. Nesse contexto também, a Amazônia que já foi qualificada de variadas formas: do inferno verde ao pulmão do mundo, merece desta vez, o epíteto de reino da solidão, enunciado feito pela Presidente Dilma, quando falava dos rincões do Brasil e da desigualdade regional.

“Vou estar ao lado dos que trabalham pelo bem do Brasil na solidão do Amazonas, nos rincões do Nordeste, na imensidão do cerrado, na vastidão dos pampas”.

E assim, o Amazonas socrático a desaguar no mar se transforma no enigma a ser decifrado pelos palacianos, tendo por referência a ignorância dos vetustos e o hiato existente entre o que é a Amazônia em contraste com os interesses daqueles que em nome da oportunidade pretendem explorá-la, bem ao modo das práticas coloniais, transferindo tecnologia e transplantando modelos, que objetivam a exploração do trabalho e dos recursos ambientais sob o domínio de uma formatação política centralizadora que exalta muito mais a solidão de um individualismo centrado na acumulação do que na vida comunal ambientada às margens do rio e da floresta em se tratando das comunidades tradicionais.

Contudo, não basta ser local para se julgar senhor do conhecimento capaz de reduzir a complexidade da nossa Amazônia no nhem-nhem-nhem de uma política governamental. Para isso faz-se necessário que tanto os acadêmicos quanto os políticos de Estado criem meios para sustentar um diálogo verdadeiro pautado na pesquisa e na probabilidade de se catalisar os estudos na perspectiva de se formular políticas públicas, não mais ancoradas na “boa vontade” do presente, mas, sobretudo, resultante das políticas de gestão do saber, da ciência e da cultura a projetar-se no tempo de forma estratégica, construindo a unidade das ações governamentais como expressão da diversidade local pautada na inserção do homem ao meio ambiente, sendo sustentada por uma nova cultura civilizatória fundamentada na ética da responsabilidade econômica e ambiental, eis a equação a ser construída, não mais na solidão dos rincões brasileiros, mas na cumplicidade orgânica de uma sociedade sustentável e justa.

(*) É professor, antropólogo e direção geral do NCPAM/UFAM.

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