sábado, 8 de janeiro de 2011

E O QUE DIZER DE MAQUIAVEL QUANTO À QUESTÃO DO ESTADO

Maximiano Thomaz das Neves (*)

A problemática fundamental de Maquiavel, na obra O Príncipe, liga-se à preocupação com a questão da compreensão do problema urbano, bem como o esclarecimento do papel exercido pelo Estado na organização e manutenção da ordem social instituída no contexto das sociedades.

Durante séculos o elemento sobrenatural, transcendente, foi usado na impossibilidade de uma explicação objetiva, para explicar e justificar os problemas vividos pelos indivíduos nas diversas esferas da vida. No estudo da sociedade humana, especialmente no plano da organização do poder, na esfera da própria política, a ruptura com a visão transcendente do fenômeno social e político, ocorre com Maquiavel que tratou tais fenômenos de modo objetivo e autônomo, atribuindo-lhes um caráter científico, tendo em vista o rigor e senso de realidade com que realiza suas investigações sobre o Estado, ou melhor, sobre a própria política e os jogos e manipulações que a determinam.

Essa mudança torna possível a ruptura com o “mito” da determinação divina na vida dos indivíduos; posição defendida pela Igreja Católica durante a Idade Média e que serviu de sustentáculo ideológico à ordem social feudal e também ao próprio absolutismo. Concebendo a política como atividade humana, Maquiavel desenvolverá suas “teorias sobre três pontos básicos”: a) concepção sobre o que é o Estado (o poder); b) como seria possível a sua tomada – porque e para quem: c) e principalmente comoconservá-lo, isto é, a sua manutenção, visto que concebia a política como sendo também como da “ditadura do proletariado”, na trajetória rumo à abolição de todas as classes e a supressão do Estado.

Embora Lênin reconhecesse o risco da burocracia, não pôde evitar que uma casta de burocratas se apossassem do poder na União Soviética pondo em risco o processo revolucionário engendrado com tantos sacrifícios. Com apreensão vislumbrava os riscos da apropriação do poder pela burocracia (que emergia dos escombros do czarismo) e que passaria, na medida em que se consolidava, a exercer o poder em nome dos operários, contra os próprios operários e de um modo genérico contra o povo, assim como as nações sob sua influência política, bastando observar o testemunho da história na Primavera de Praga, invasão da Hungria e outros episódios conhecidos, como é o caso dos operários poloneses de Gdanski, que viveram sob um controle rigoroso das forças de segurança. Paradoxalmente, tem-se um governo que se proclama operário, agindo contra os operários.

Esses fatos tem servido de justificativas para as classes dominantes proclamarem o caráter totalitário do socialismo e afirmarem o caráter democrático do liberalismo, residindo aí, na confluência desses dois modos de organização social (o burocrático e o liberal), o desafio de construirmos o socialismo, efetivamente pautado em cima de princípios democráticos, que torne possível a participação de todos os cidadãos nas discussões de seus problemas comuns e na ampla participação de todos nesse grandioso projeto de construção do amanhã.

Gramsci rompe com o caráter de especificidade do Estado evidenciado por Lênin, ensejando uma interpretação mais ampla, adequando o próprio marxismo às possibilidades concretas de transformação da sociedade.

O Estado não se resume aos aparatos repressores (a burocracia e as forças armadas), sendo também composto pela Sociedade Política (que ensejam aqueles aparatos) e pela Sociedade Civil. O Estado Moderno, de cunho liberal, recorre não só a coerção, mas busca igualmente “o consenso dos dominados”, constituindo-se numa sociedade regulada. O partido político, corporeificação moderna do príncipe, toma para si a responsabilidade pela transformação da sociedade, sendo que a tomada do Estado será através da Sociedade Civil, mediante um trabalho cultural e ideológico, gestando uma nova cultura.

Compete ao partido tomar gradativamente a Sociedade Civil, sucedendo-lhe, em segundo lugar, “a tomada da sociedade política que abrange os aparelhos de coerção do Estado”. Divergindo de Lênin, vê a luta armada e a violência revolucionária como um elemento desagregador da sociedade, centrando a luta do partido “muito mais em nível cultural e ideológico”. Resta saber se as classes dominantes (com o poder econômico e militar nas mãos) permitiriam a organização de um movimento de tamanha envergadura, algo ameaçador à sua dominação. A História mostra que a resposta da classe que detém o poder seria a repressão; A própria Itália, sob Mussolini, é um exemplo disso e nem mesmo Gramsci escapou da violência.

A posição de Weber se por um lado diverge das posições sustentadas pelo marxismo, por outro serve para esclarecer muitos aspectos do funcionamento das sociedades capitalistas. A princípio diverge do caráter interativo da teoria e da prática, afirmando que a primeira serve apenas para iluminar a segunda. Nega ainda a conexão entre os vários elementos e planos da vida social, ao estabelecer os três níveis de que se compõem a sociedade.

Concebe-os de modo estanque, eliminado o caráter de inter-relação entre os mesmos. O primeiro nível é o social, o segundo político e o terceiro econômico. Opondo-se ao marxismo que enfatiza a importância das determinações econômicas na estruturação da sociedade, afirma o político como mais determinante no corpo da sociedade. É contraditório, pois basta olharmos a sociedade que nos rodeia para concluirmos que a política é determinada pelo poder econômico, pois sem o mesmo não é possível nem eleger o presidente de um clube de bairro, imagine um governador ou um presidente.

Outro aspecto a destacar é a definição de classe dada por Weber que a caracteriza a partir da capacidade de consumo, isto é, do seu poder aquisitivo. Nesse caso deixa de existir exploração, passando a existir os que podem comprar e os que não podem. Esta situação nos incita a perguntar então: Porque a maioria das pessoas (o conjunto dos trabalhadores), embora trabalhando muito, produzindo riquezas, não podem comprar nem mesmo o essencial para a sua sobrevivência?

Weber concebe ainda o Estado como algo inerente a própria sociedade, definindo-o pelo seu meio, opondo-se a Marx que o concebia segundo o seu fim, qual seja, a manutenção da própria dominação sobre as demais classes. Concebido como meio “reivindica o monopólio do uso legítimo da violência física”, introduzindo-se assim o instrumento da “violência legítima” como elemento fundamental à própria existência do Estado, através do qual se mantém o domínio sobre a sociedade, associado à justificação da própria dominação.

* Especialista em Educação pela FMF (2009) e Especialista em Ética e Política pela UNICAP (2011).

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