quarta-feira, 20 de outubro de 2010

BRASILEIROS CONTRA PROPOSTA DO INCRA PERMANECEM NA BOLÍVIA

Ray Melo (*)

Do Estado do Acre: As negociações para a retirada dos posseiros brasileiros da faixa de fronteira da Bolívia não avança. Na manhã de segunda-feira (18), no município de Capixaba, mais uma reunião dos trabalhadores rurais brasileiros, com os representantes do Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty), Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Organização Internacionais para Migrações (OIM) e Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Acre, terminou em recusa da proposta de reassentamento dos agricultores em terras brasileiras.

A proposta inicial do Incra, assentaria apenas 90 das mais de 400 famílias que vivem ilegalmente na faixa de fronteira da Bolívia. O representante do Incra, Hildebrando Veras, chegou a reunião com uma lista de pessoas que seriam assentadas numa área de terra denominada Projeto Triunfo, distante 60 quilômetros do município de Plácido de Castro.Segundo Hilebrando, a área disponibilizada seria de 90 lotes, cada um com 10 hectares, que estaria recebendo as ultimas obras de infraestrutura, para receber as famílias que estivessem dispostas a ocupar a área.

O local de acordo com representante da instituição foi objeto de um processo de desapropriação, que durou aproximadamente 10 anos. Os Trabalhadores rurais receberiam os lotes com ramal e casa de alvenaria, com dois quartos, sala e cozinha, além de uma verba de R$ 3.200, em credito para compra de ferramentas e alimentação. O dinheiro não seria entregue aos posseiros, que receberiam os benefícios através de um grupo de trabalho do Incra. De acordo com Hildebrando, pontes, ramais e bueiros, já estariam praticamente prontos.

As propostas do representante do Incra, não chegaram a seduzir os posseiros, que ao tomarem conhecimento das regras do instituto, recusaram e imediato serem transferidos para terras distante do município de Capixaba. Hildebrando Veras informou que faria uma chamada das pessoas que teriam direito as terras oferecidas pelo governo brasileiro, enfatizando que grande parte das pessoas levantadas pela OIM, não teriam direito a ser reassentadas. Os posseiros que trabalham por temporada, em época de colheita da castanha, corte de seringa e pessoas que já tenham sido beneficiadas pelos projetos de assentamento no Brasil, não estariam aptas a receber lotes do Incra, que descarta ainda as pessoas que tenham vinculo empregatício com instituições públicas.

Hildebrando Veras lembrou que a área a ser ocupada é de pastagem, que os 10 hectares que cada família receberá, na prática equivalem a 50 nas regras atuais de permitem desmatamento de 20% do total das terras. Ao tomarem conhecimento das regras do projeto de reassentamento, e que não teriam direito a qualquer tipo de indenização pelas benfeitorias nas propriedades edificadas no país vizinho, os posseiros brasileiros, através do presidente do sindicato Rural e Associação dos Produtores de Capixaba, se negaram a ouvir a chamada das pessoas que seriam retiradas de imediato das propriedades na fronteira, e seriam levadas a localidade de reaasentamento, no Projeto Triunfo, apenas com as promessas de ajuda, para recomeçar a vida em terras totalmente desconhecidas.

“Se for preciso, vamos derramar sangue novamente”

"A conversa está bonita, mas paras as pessoas que se enquadram”, afirmou o presidente da Associação dos Produtores de Capixaba, Francisco Assis (o Careca), que em resposta, a proposta do Incra, destacou que os posseiros da área de fronteira, só aceitam ser reassentados em terras próximas ao município.

O presidente afirmou ainda, que os posseiros só sairão das propriedades, após a legalização da situação de todos, que as pessoas que possuem terras na Bolívia, tenham os mesmos direitos, sem discriminação, com indenização das benfeitorias ou naturalização de todos os brasileiros, para que possa permanecer na localidade, como cidadão boliviano.

Revoltados, os posseiros chegaram a citar a trajetória de Plácido de Castro na revolução Acreana, e que se fosse preciso repetiriam o feito, colocando as armas em evidência novamente, para resolver a situação.

“Se for preciso, vamos derramar sangue novamente. Somos discriminados e temos nossos direitos desrespeitados, mas caso seja necessário vamos repetir o feito de Placido de Castro, recorrendo às armas novamente”, enfatizou Careca. Francisco Assis pediu que os trabalhadores rurais, não assinassem o documento do Incra, lembrando que a luta de todos estaria prejudicada, caso 10 pessoas assinassem, o movimento perderia força.

O posseiro pediu a união de todos, para que permaneçam firme. “Precisamos nos unir, só sairemos quando todos tiverem os direitos respeitados. Queremos Justiça, se 10 aceitarem, o resto leva pé na bunda”.

Cidadania boliviana e a principal reivindicação dos posseiros

Desde a última sexta-feira, quando a reunião com os representantes do Incra e OIM, foi agendada, os posseiros procuraram o Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Aleac, deputado Walter Prado (PDT), que entre as reivindicações apresentadas, pediram que o parlamentar agendasse uma reunião com os representantes do Governo do Acre, e bancada federal, para que pudessem apresentar uma proposta de naturalização dos trabalhadores rurais, para que não sejam retirados das propriedades.

Segundo os posseiros, um grande pecuarista do Acre, usa do mesmo artifício, para manter uma grande propriedade na faixa de fronteira boliviana. O fazendeiro, de acordo com as afirmações dos produtores, teria uma área de terra que começaria do lado brasileiro, se estendendo por uma grande parte da fronteira boliviana.

Os posseiros pedem o mesmo tratamento que foi dispensado ao fazendeiro, que obteve a cidadania boliviana, para permanecer na localidade.“Se tirarem nossas terras, vamos invadir a propriedade do senhor Wilson Barbosa, e exigir que ele seja tratado da mesma forma que todos nós. Ele garante seus direitos sendo um cidadão boliviano, uma saída que pode ser usada para todos, ou para nenhum. Se ele permanecer vamos exigir nossos direitos de naturalização”, desabafa Sandro Marcelo.

O deputado Walter Prado compareceu a reunião ouviu as reivindicações dos produtores, se colocando a disposição para intermediar as reuniões com autoridades estaduais e o presidente do INCRA, buscando uma solução pacifica para o problema que o deputado considera como social e de prioridade máxima, já que envolve famílias inteiras. O parlamentar lembrou que o esforço do Governo Federal e sincero, mas que existe muito mais em jogo.

De acordo com o deputado, o suor de gerações precisa ser respeitado, lembrando os investimentos do governo Brasileiro, na Bolívia, destacando que o mesmo poderia ser feito com os posseiros brasileiros, que deveriam receber uma indenização, já que segundo ele, existem famílias que estão a mais de três gerações em terras bolivianas, investindo nas terras, e agora podem sair sem qualquer perspectiva.“Está é uma questão que envolve direitos humanos.

Temos famílias inteiras nesta área que dependem exclusivamente destas terras para sua sobrevivência. Não podemos apenas dizer amém a todas as vontades de nosso vizinho. Vamos esgotar todas as possibilidades de negociação. Vivemos em novos tempos, não precisamos derramar sangue para chegar a uma solução. Meu mandato é comprometido comas questões sociais, para tanto me coloco a disposição para reivindicar junto às autoridades a atenção necessária para os trabalhadores”, enfatizou Walter Prado.

ENTENDA O CASO DOS TRABALHADORES BRASILEIROS

Desde 2006, quando foram intimadas pelo governo da Bolívia a deixar as posses que ocupam, as famílias de brasileiros passam por momentos de tensão. De acordo com o Itamaraty, elas têm sido submetidas a chantagens e achaques por parte de pessoas que se apresentam como se fossem autoridades bolivianas ou brasileiras. Por causa das ameaças, algumas famílias até venderam as posses por preço vil.

Nessa confusão, o Brasil contratou por U$ 10 milhões a Organização Internacional para Migrações (OIM), entidade com experiência em migrações, principalmente na África e no Leste Europeu. Ela ficou encarregada de fazer desde os levantamentos sobre as famílias, quantas são, do que vivem o que fazem, até o processo final de reassentamento.Posseiros chegaram a denunciar supostas ameaças de membros da OIM, que várias vezes em reuniões informaram que representantes da instituição, responderam de forma ameaçadora, quando questionaram pela permanência nas propriedades, poderiam permanecer, caso tivessem peito pra bala.

(*) É jornalista da Tribuna Acreana.

Nenhum comentário: