sábado, 1 de agosto de 2020

CARAMBOLEIRA QUE NÃO É SÓ MINHA CARREGADA DE SONHOS

 

Ademir Ramos (*)

Há mais de vinte anos tenho cuidado com zelo do meu pé de Carambola no recanto do jardim da modesta casa da Alameda Juruá. Faça sol ou chuva ela, a Caramboleira, continua servindo de morada para os passarinhos que voam longe, mas, ao cair da tarde voltam cantantes para o refugio noturno buscando abrigo em sua copa.

Na aurora matinal a passarada desperta em festa cantarolando os mais variados tons que se harmonizam na sinfonia da floresta com sonoridade difusa como se quisessem despertar também nos homens o canto como linguagem comunicante marcada pela alegria do bem-te-vi e do bem-viver.

No fim da tarde, o abrigo aconchegante do verde acolhedor da copa da Caramboleira faz adormecer os justos, que ao despertar pela manhã com sol ou chuva regozijam-se com alegria fazendo o mais desatento dos homens acordarem para o mundo livre voando tão longe com os passarinhos livrando-se das amarras que não apetecem seus corações e muito menos a imaginação criativa daqueles que buscam aprender a pensar guiados tão somente pelo conhecimento balizado pelo saber filosófico e da ciência em movimentação.


A Caramboleira, que não é só minha, acolhe também todos os dias as Curicas assanhadas, faladeiras com suas penas verdes que nem dos periquitos amazônicos, buscando satisfazer seus apetites comendo o fruto ainda verde, não deixando nada ou quase nada para ser consumido pelo cuidador que gosta e muito de cortar a Carambola em estrelas para degustá-la, principalmente esta, que é de um gosto doce e terno a remexer em nossa memória afetiva.

Traído pelas Curicas faladeiras e festivas, o cuidador dar-se por satisfeito em admirar as minúsculas flores da Caramboleira como promessa de fruto, alimento e pão. No curso dos projetos e sonhos quer porque quer que esta prática se espalhe como vento geral em forma de lei a garantir que a mesa seja farta e o pão de cada dia não falte jamais às crianças e jovens vindos a vicejar com saúde e beleza na aurora das manhãs com alegria e sedução na cantoria dos pássaros muito além do jardim e do Pé de Carambola da Alameda Juruá, a exigir cuidado e proteção contra os malfeitores embrutecidos, que não permitem que o outro seja capaz de amar e voar como os passarinhos na esperança do encontro de um novo amanhã.

(*) É professor, antropólogo, coordenador do jaraqui e do núcleo de cultura política do Amazonas vinculado ao Dpto. de Ciências Sociais da UFAM. E-mail: ademiramos@hotmail.com   

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