terça-feira, 8 de julho de 2008

O CINEMA COMO ESPÍRITO DO TEMPO


Carlos Demétrio Garcia*

Desde os primórdios da misse-escene que articulistas e intelectuais engajados no cinema autoral vêm tentando descortinar o fino véu que separa a imagem pura da secundária, ou seja do pensamento pela imagem. Figuras como o psicólogo Mustenberg (1919) a doutores da filmologia tal como Arnhein (1933) tiveram o cinema como tema preferido, e particularmente, a questão da impressão da realidade no cinema.

Estes artigos ganham espaço em revistas importantes como Cahiers do Cinema e Cinéthique, provocando polêmicas e desagravos entre os teóricos e críticos numa clara tentativa de legitimar o cinema autoral, ao mesmo tempo, em que este se distinguiu do produto da indústria do filme. Podemos assim constatar que não é de hoje, dentro do campo da arte, o cinema se põe no "'fio da navalha entre a grande obra e grande público..."

Recentemente, encontramos no Brasil o Sr. Smail Xavier, PhD em cinema pela Escola de Graduação de Artes e Ciências da New York University, que entre outras publicações acadêmicas podemos distinguir “Alegorias do subdesenvolvimento” como um trabalho dos mais importantes para a NYU. Estes polêmicos artigos ganham um espaço cada vez maior na imprensa especializada do mundo inteiro, a ponto de envolver figuras gigantes da cultura mundial nas causas do cinema, uns a favor outros contra. Não é de hoje que a fina película com sua trucagem de imagens no espaço de tempo mínimo de 24 quadros por segundo provoca ensaios e discussões inflamadas sobre este fenômeno ótico que subscreve fenômenos sócio-culturais.

O nosso cérebro, segundo neorolinguístas trabalha dados separando o essencial daquilo que é contingente, ou periférico, a memória então processa aquilo que tem significado segundo as nossas subjetividades racionalizadas, daquilo que não tem importância nenhuma na busca constante das nossas ações com fim de sentido, como dado qualitativamente construindo dentro de uma significância, digamos assim, mais humana do ponto de vista da afetividade; afinal, somos seres afetivos e sensíveis e o cinema representa este homem-pensamento, imaginário construído e reconstruído segundo o tipo de pensamento social em bases míticas recorrentes de estruturas antropológicas.

“As imagens não valem pelas raízes libidinosas que escondem, mas pelas flores poéticas e míticas que revelam”, diria Gilbert Durand ao falar sobre as imagens e o recalcamento do conteúdo do imaginário. O cinema traz bases míticas complexas e a indústria por sua vez conduz o homem numa nova interpretação de uma estética nova, ou mesmo na constituição de uma nova técnica.

Eu chamo isso de “Espírito do Tempo”, a “visage Ultramoderna” que se cristaliza no plasma da película e o cinema mais do que qualquer outro dispositivo traz este espírito do tempo na forma de imagens digitais em dolby son 5.1, oniria sem drogas, vertigem sem calafrios!

Podemos dizer que hoje vivemos este “espírito do tempo” onde homens e mulheres, organizações públicas e privadas, bem como organizações civis, cada vez mais utilizam-se da linguagem visual como forma ultramoderna de destilar seus sonhos e pesadelos, suas angústia e decepções; desconstruir o discurso do outro, ou mesmo desmistificar o mitificado.

É dado estatístico atual que nunca antes a humanidade utilizou-se tanto da imagem como código de comunicação com tanta intensidade como nos dias atuais - são dados para a preocupação de simiólogos estudiosos da área -e que tem alavancado a economia mundial com seus fones celulares com tecnologia de Internet e televisão digital móvel.

Trata-se de uma sociedade em rede fincando suas estruturas mentais na imagem e, esta imagem em novas bases tecnológicas e industriais; Assim, o espírito do tempo vai armazenando imagens em dvd's, computadores, leptop's, ou palmtop's, na espera muda de ser utilizada no cinema, na televisão, videoblog ou no youtub.

Tais convergências de tecnologia trarão convergências na forma de pensar o homem? talvez passamos do homo sapiens para o homem binário, seremos “avatares” em simuladores de vida pela Internet e o cinema e a sua linguagem cada vez mais fazendo parte deste mundo paralelo, nele poderemos ter uma vida espetacular, fora do lugar comum exatamente como é a vida no cinema.

Com o popularização da tecnologia, o cinema, ou melhor, o “fazer cinema” enfim chega às camadas populares. Sim! Em tese, qualquer um poderá fabricar sua imagem e fazer seu filme; as regiões consideradas historicamente alijadas do processo de cinema: seja como indústria, ou seja, como arte de autores e assim poderão cobrar agora a sua participação no processo maior da história da arte cinematográfica.

* É cientista social, videomaker e colaborador do NCPAM.

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