terça-feira, 1 de julho de 2008

QUAL É O FUTURO DAS LÍNGUAS INDÍGENAS?


Aquiles Pinheiro*

O eminente perigo de extinção das línguas de povos indígenas do Amazonas tem atraído à atenção de lingüistas, bem como de pesquisadores preocupados com a preservação das culturas destes povos. Há nove anos, o lingüista Michel Krauss chamou atenção dos lingüistas do mundo para o problema de línguas que correm o risco de serem extintas. No Brasil, a maioria das línguas faladas no tempo do contato colonial europeu já está extinta, e estima-se em 75% das línguas indígenas.

O desaparecimento de tantas línguas e culturas, segundo os pesquisadores, se deve a eventos dramáticos, tais como: morte maciça por doenças, escravidão ou aprendizagem forçada de uma língua de contato, entre outros fatores. No Brasil, um fator que contribui para a perda de uma língua refere-se à não-valorização das línguas indígenas pela comunidade envolvente, onde ainda persistem idéias de inferioridade das línguas indígenas.

No caso particular dos povos indígenas do Amazonas, registram-se 58 línguas ainda faladas. Evitar a extinção de uma língua é, sobretudo, tarefa dos povos envolvidos, falantes da língua e portadores da cultura, bem como de lingüistas e pesquisadores das diversas áreas cientificas.

A preocupação com o futuro das línguas dos povos indígenas da Amazônia, principalmente no Amazonas - implica necessariamente em se entender o valor que elas têm em termos presentes. A língua é o traço mais marcante de um povo, pois é o instrumento mediante o qual o conhecimento tradicional é repassado às gerações futuras.

Por essa razão, o conhecimento e a preservação das línguas dos povos indígenas do Amazonas, é de grande importância, pois possibilita a apreensão do conhecimento tradicional desses povos sobre aspectos como: os sistemas nativos de classificação de espécies animais e vegetais; de reconhecimento de tipos de solos; de conhecimento de astronomia para plantio e coleta; uso de plantas medicinais, entre outros. Sem conhecer as línguas indígenas é impossível alcançar este conhecimento; quando uma língua indígena morre, perde-se, por conseqüência o conjunto desse conhecimento.

Estudos recentes sobre as conseqüências da perda de uma língua, apontam que a principal delas é a perda da identidade, com implicações direto as na percepção, por meio da linguagem, da vida cultural, espiritual e intelectual do povo em questão. O lingüista Nilson Gabas Júnior (pesquisador do Museu Emilio-Goeldi-PA) afirma “Tal percepção é encontrada, por exemplo, em orações, mitos cerimônias, poesia, oratória, vocabulário técnico, estilos conversacionais (respeitoso, profano etc.), estilos de fala (fala masculina vs. fala feminina, etc.), humor, maneiras próprias de comunicação com crianças, termos próprios para hábitos, comportamentos, emoções, etc.”

Além das perdas apontadas acima, um outro tipo de perda também acontece quando morre uma língua indígena: a perda científica. É muito pouco ainda o que se conhece das línguas indígenas brasileiras em termos de tipologias, universais lingüísticos, lingüística históricas (diacrônica) e reconstrução lingüística (com repercussão sobre o levantamento de evidências sobre o passado dos povos que falavam estas línguas). E atualmente no Brasil, cerca de 160 línguas indígenas são faladas.

Entretanto, ainda há falta de descrições completas de línguas indígenas brasileiras publicados por brasileiros. Apenas a descrição da língua Kamayurá (situado na região do Xingu no estado do Mato Grosso) estuda pela pesquisadora da UNICAMP, Lucy Seki, é a primeira descrição publicada por uma brasileira em décadas.

As razões expostas até aqui, são suficientes para justificar a necessidade cada vez maior de realizar de seminários, círculos de debate e outros eventos acadêmicos que possam redundar na elaboração de políticas públicas que se articulem no sentido de revitalizar as línguas indígenas ainda faladas no vale amazônico. O futuro das línguas dos povos amazônicos está, portanto em nossas mãos.

* É pesquisador do NCPAM e finalista do Curso de Ciências Sociais da UFAM.

Um comentário:

Anônimo disse...

Valorizar o que é nosso, ainda é uma grande passo a ser dado, contudo muitos esperam sempre que este passo seja dado pelas instituições federais, estaduais e etc. Mas depende de todos nós! Hoje, além do trabalho de não deixar essas poucas línguas que existem morrerem, acho que também deve ser discutido até que ponto a escola e ou metodologia da mesma é válida para esses povos. Datavenha que é através desta, é que se aprende a visão de mundo dos brancos, mas como conceber o ensino sem desvalorizar a cultura linguistica desses povos? Gostei do lenvatamento da questão, mas fica uma pra se pensar...