sábado, 5 de julho de 2008

POLÍTICA E CIDADANIA EM HABERMAS


Cleison Fernandes de Souza*

Quando se tem a idéia de “cidadania efetiva” e “cidadania participativa”, não há como dissociar estas propostas sem antes ter uma idéia clara da efetiva participação política.

No entanto, uma questão preponderante para que uma cidadania efetiva não se concretize na prática, reside muitas vezes na aversão do brasileiro tem em relação às questões políticas do Brasil e à própria atividade política em si, em decorrência a muitos fatores que contribuem para isso.

As contradições existentes no cerne das discussões sobre uma proposta efetiva de cidadania podem ser melhor entendida à luz do pensamento do filósofo alemão Jürgen Habermas (último herdeiro da escola de Frankfurt), que reflete sobre questões que acabam por se constituir numa espécie de anomalia no sentido da consolidação da democracia e posteriormente na efetivação de uma sólida cidadania.

A conjugação de fatores impede a não concretização de uma cidadania efetiva, ocorre ora pelo fato do personagem central dessa discussão – o cidadão – não ter apreço pela atividade política que deveria exercer, e também pela banalização e descrença em relação ao sistema político-partidário, onde temos um congresso totalmente descolado das mazelas que assolam a maioria do povo brasileiro.

Entram neste contexto, o crescente déficit de moradia, a violência em sua curva ascendente, a má distribuição de renda que ainda persiste de forma assustadora, reformas estruturais no sentido de reduzir a altíssima carga de impostos que minam o fôlego não só do contribuinte individual, mas sobretudo das empresas, em resposta a esse descaso engavetam projetos que resultariam em mais empregos, desenvolvimento e conseqüentemente, contribuiria na tentativa da implementação da cidadania, embora ela não se reduza somente a esses fatores.

Por outro lado, a crescente onda de escândalos, práticas de corrupção, impunidade, corporativismo político, faz com que a classe política de um modo geral caia no descrédito, seja motivo de intensa desconfiança por parte do povo, e conseqüentemente sejam vistos como uma instituição que não cumpre com o papel que lhes cabe, que é de legislar em favor do povo e representar bem os seus anseios, as suas vontades, ou seja, dar uma resposta aos problemas pontuais existentes e que deveriam ser combatidos.

Tudo isso resulta numa constatação clara e lógica: a formulação da referida proposta de cidadania encontra resistência no início da sua concepção, assim, não há uma concretização da cidadania porque não há antes uma participação política.

Para Habermas, a questão de uma cidadania efetiva remete primeiro à discussão que envolve a institucionalização de dois modelos políticos: o republicano e o liberal. Para filósofo, o modelo liberal argumenta que os direitos humanos freiam a vontade coletiva em detrimento das liberdades individuais, enquanto os republicanos afirmam que a função dos direitos humanos implica em impor a vontade coletiva sobre uma suposta autonomia dos cidadãos, propondo também um modelo de cidadania que se auto-organiza, privilegiando a vontade coletiva.

Todos os fatores negativos mencionados acabam por provocar a banalização da atividade política por parte do cidadão. Assim, como provocar o povo a uma participação política mais intensa, e em seguida produzir a proposta de cidadania mais efetiva, mais participativa quando esta mesma “ação política” já está obstaculizada por esses fatores?

Habermas afirma que uma idéia de “cidadania ativa”, isto é, sutilmente imbuída de caráter impositivo, acaba por se constituir na verdade, - é em uma concepção liberal se sobrepondo sobre a republicana.

Para ele, isso implica em apontar que o modelo republicano de construção da cidadania não se torna suficiente porque é oposto ao modelo liberal, pois exige uma unidade de valores e práticas políticas que podem não se estabelecer em uma sociedade composta de várias complexidades, propondo um equilíbrio entre os dois modelos, ou seja, a ação política proposta pelo modelo republicano e ao mesmo tempo a inviolabilidade das liberdades individuais e privadas do cidadão propostas pelo modelo liberal.

Portanto, Habermas com essa proposta abre uma discussão importante para um modelo de reconstrução de cidadania, onde há vários fatores a serem observados, colocando os modelos republicano e liberal frente a frente, e incitando um aprofundamento importante nas discussões postas em questão.

* Pesquisador de Ciência Política e graduado na Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Amazonas - UEA.

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