PAPO
CABEÇA COM A PROCURADORA DE JUSTIÇA JUSSARA PORDEUS
Ademir
Ramos (*)
Em
recente publicação, em a Crítica, 20 de junho de 2014, p. A4, sob o título “Participação
Social”, a Procuradora do Estado Jussara Pordeus, manifestou-se a respeito do
Decreto Nᵒ 8.243,
de 23 de maio de 2014, de iniciativa da Presidente Dilma Rousseff, que tem por
ordem instituir a Política Nacional de Participação Social – PNPS e o Sistema
Nacional de Participação Social – SNPS – mais ainda, o Comitê Governamental de
Participação Social – CGPS – para assessorar a Secretaria-Geral da Presidência
da República no monitoramento e na implantação do PNPS e na Coordenação do
SNPS.
Em
suas considerações preliminares, a Procuradora do Amazonas se diz “assustada”
porque “alguns partidos de oposição, jornais, analistas políticos e juristas
acusam a Presidência de ter enveredado por um caminho autoritário.” E sem muito
esforço analítico ou qualquer outro que seja concluiu gratuitamente com a
seguinte pérola: “é de assustar essa reação conservadora, já que o ‘autoritarismo’
que os críticos enxergam no Decreto estaria exatamente no que ele tem de mais
democrático: a abertura para a participação.” Não satisfeita, a articulista
ironiza a crítica social afirmando que: “é como se a democracia estivesse
ameaçada exatamente pela previsão de mais democracia.”.
Mais
democracia. Eis a palavra de ordem a se gritar por todo o Brasil,
principalmente referindo-se a 20 de junho de 2013, quando o Brasil e o Amazonas,
em particular, ocupam as ruas e praças, protestando contra a tarifa do transporte
coletivo e o imobilismo que engessa o Estado e o Governo, com exclusão dos
movimentos sociais e por consequência a da sociedade civil organizada. As “Revoltas
de Junho” fazem parte do cenário político que justificam o tal Decreto de Dilma
Rousseff, muito bem lembrado pela própria Procuradora, em afirmar que, “as manifestações
que tomaram as ruas do país no ano passado evidenciaram a necessidade de mais
democracia, de mais canais de participação.”
Verdade,
verdadeira. Pois além de gritar, os jovens manifestantes escreveram em seus
cartazes que “eles” tanto o Governo como o Parlamento “não me representa”. Para
o professor Marcos Nobre, “Imobilismo em Movimento”, (2013), p. 143: “ao gritar
e escrever ‘Não me representa’, quem se manifesta não quer apenas que o sistema
político mude seu modo de funcionar: pretende mudar o jeito como a
representação política é entendida. Não quer apenas votar periodicamente e
guardar apenas a esperança de ser devidamente representado pelas instituições
formais. Pretende encontrar novos caminhos de participar da política, tanto
institucional quanto cotidiana.”
A
manifestação de apoio ao Decreto Nᵒ
8.243, de 23 de maio de 2014, da Presidente Dilma Rousseff, lavrada pela
Procuradora Jussara Pordeus, integrante da Rede para o Constitucionalismo
Democrático Latino-Americano, requer mais densidade visto que o Direito como
bem nos ensinou o professor Lenio Luiz Streck “Verdade e Consenso” (2012),
p.65, É uma ciência política e, portanto, “constitucionalismo (contemporâneo)
deve significar uma ruptura com o positivismo. [...] Qualquer postura que, de
algum modo, enquadre-se nas características ou teses que sustentam o
positivismo entre em linha de colisão como esse (novo) tipo de
constitucionalismo.”
Parte
desta construção requer, sobretudo, a superação da velha epistemologia kantiana,
como bem afirma Streck: “ou seja, é preciso compreender que o direito – neste momento
histórico – não é mais ordenador, como na fase liberal; tampouco é (apenas)
promovedor, como era na faz de welfare
state (que sequer ocorreu no Brasil); na verdade, o direito, na era do
Estado Democrático é um plus
normativo em relação às fases anteriores, porque agora é transformador da
realidade.” (p.67).
É
também nesta perspectiva que o professor Marcos Nobre, acima citado, arremata
suas afirmações em analisar as “Revoltas de Junho” - ao gritar e escrever “Não
me representa”. O povo na rua “pretende que mecanismo tradicional de
representação, como o voto, seja acompanhados de outras formas de participação
e de representação, de formas de participação direta, de mecanismo de
deliberação colegiada, de órgãos de controle da representação próximos do seu
alcance. Algumas dessas novas formas até já podem existir, mas não têm
efetividade, não alcançam o coração do sistema político.” (p.143)
Do
mesmo modo que a Procuradora do Amazonas não se deteve na estrutura formal do
Decreto, assim também fizemos porque mais de uma vez já nos manifestamos sobre
a matéria analisando o processo como forma e mando político visando à
despolitização dos movimentos sociais. Em suma, o que está em discussão é sem
dúvida a afirmação, o valor e o reconhecimento da Sociedade Cível, não mais a
sombra do Estado autoritário, nos moldes hobbesiano, mas, ao contrário como
instrumento de controle social assentado na soberania popular e no Estado de
Direito. O debate faz-se necessário para clarificar a conjuntura, por isso,
pautamos em Praça Pública, na Tribuna do Jaraqui, para este sábado e que bom se
pudéssemos contar com a presença da nossa conceituada Procuradora Jussara
Pordeus, juro que estaríamos fazendo o que tanto pregamos quando falamos sobre
o Direito achado na Rua.
(*)
É professor, antropólogo, coordenador do Jaraqui e do NCPAM/UFAM.
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