segunda-feira, 29 de setembro de 2008

100 ANOS DA MORTE DE MACHADO DE ASSIS - AO VENCEDOR, AS BATATAS!

Ademir Ramos*


Senhor da ética, cumpridor dos seus deveres, respeitador das famílias e dos bons costumes. Assim, era Rubião, homem cândido, herdeiro de uma grande herança, a viver na capital da corte palaciana, na masmorra da solidão de sua existência reta e devota às leis, como bem queria o positivismo filosófico e o Partido Temporal do Império. Mas, um certo dia, Machado de Assis, em Quincas Borba, conta-nos que Rubião, deixando-se seduzir, delegou aos benfeitores a responsabilidade de administrar seus bens e valores – toda a sua fortuna - por acreditar que o homem, por mais vil que seja, principalmente aquele que vive na capital do império, é capaz de se redimir perante o povo, sem recorrer aos expedientes imorais, corruptos e extrapalaciano com denominações estranhas ao vocabulário político da época.

Firme em seus propósitos provincianos e ingênuos, Rubião delega poderes, votando na escolha do seu benfeitor para que respondesse pelo gerenciamento de seu patrimônio e, muito mais ainda, pela sua própria existência. Feito isto, sentia-se confiante que o mundo seria muito melhor porque os homens pactuavam ações de reciprocidades.

De pronto, seus benfeitores começaram a dilapidar seu patrimônio, apropriando-se de toda sua fortuna. Nada tendo mais para saquear, então resolveram, com referendo dos burocratas da saúde, interná-lo no sanatório palaciano, para protegê-lo dos insanos que ainda hoje circulam, assiduamente nos arraiais do poder central, apropriando-se indevidamente do patrimônio do povo, sobretudo, o erário público.

Rubião alienado de seus bens, do amor, da razão e da política desaparece da capital palaciana e, juntamente com o seu fiel escudeiro, Quincas Borba, alucinado e faminto, aparece nas ladeiras de Barbacena, formulando discursos obscuros, sem que sentido houvesse, segundo os tradutores plantonistas da corte.

Rubião dizia para os passantes – ao vencedor, as batatas! -, o que realmente nada entendiam porque não conheciam a trajetória deste provinciano, nascido na capital do país, enganado e desafortunado de seus bens e valores por não acreditar que os homens palacianos são ávidos para lucrar, principalmente, quando pensam que tudo podem e que todo homem tem o seu preço.

Rubião, depois de adormecer ao relento, como milhares de brasileiros sem teto, emprego, educação, saúde, cultura e segurança, a viver na rua da amargura por esse grande país, posiciona-se contra os transtornos políticos sofridos e grita sonoramente, por mais uma vez - Ao vencedor, as batatas! -, nesse momento, conforme Machado de Assis registra, “deu com olhos na rua, sem noite, sem água, beijada do sol”.

O pior de tudo é que o seu grito não tinha eco junto aos brasileiros porque muitos se encontravam surdos, cegos e mudos, até o dia em que acordaram do pesadelo e juntos gritaram com Rubião, reivindicando Direito, Participação e Voto. Nessa oportunidade, inaugura-se uma nova prática política promotora do desenvolvimento humano, sendo economicamente justa e socialmente sustentável. Desprendido de toda forma literária, afirma-se que a loucura de Rubião tornou-se a obsessão do povo brasileiro. Faça-se Justiça!



* Coordenador do NCPAM, antropólogo e professor da Universidade Federal do Amazonas.

Nenhum comentário: