terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

SEM PALMEIRAS, SEM PERIQUITOS E OUTROS ENCANTOS

Ellza Souza (*)

Nos 25 anos que moro no bairro da Chapada/ Dom Pedro, venho observando a decadência da natureza, das palmeiras e dos igarapés naquela que já foi uma área privilegiada quanto ao meio ambiente. Pra vocês verem, uma mudança brusca como essa em tão pouco tempo, onde a vegetação exuberante é derrubada e fica uma terra desprotegida sem uma sombra sequer para nos agasalhar do sol tórrido e inclemente. Passo a passo vamos derrubando as grandes árvores como os buritizeiros, as mangueiras, os jambeiros, os bambús e sabe–se lá mais quantas espécies que nem chegamos a conhecer.

Os últimos exemplares de taperebazeiros que encontram-se no Hospital Eduardo Ribeiro estão por um triz. É meu caminho uma parte da avenida Darcy Vargas, a chamada bola das letrinhas que separa o Conjunto Kissia da segunda etapa do Conjunto Tocantins. Mas ao passar na área e olhar para aquela mata tão verdinha que resiste por ali e que descansa nossos olhos e nossas mentes, me bate um grande receio de que tão bela vegetação venha abaixo para empreendimentos quase sempre feitos sem escrúpulos, sem cuidados, sem noção.

Um jovem de 26 anos, estudante de arquitetura, que mora no Tocantins desde que nasceu na década de 80 já tem histórias para lembrar do local. Ele me disse que a área era de muitas palmeiras do tipo buritizeiro e que existiam olhos dáguas que foram aterrados. O igarapé do Mindú foi desviado de seu caminho natural e aterros foram feitos para que mais prédios do conjunto fossem construídos. “Alguns estão com problemas de rachaduras”, disse o rapaz que não esquece que, outro dia, em sua infância, pescava no igarapé os preciosos peixinhos cardinais, muito usados nos aquários em Manaus.

A mudança é horripilante. O lugar ainda é lindo pelos resquícios de vegetação, pela pequena ponte que separa os duas etapas do Tocantins, pelo Mindú que resiste. Mas as águas do pequeno rio não são mais pra peixe nenhum. Estão poluídas e o mau cheiro dos dejetos produzidos pelo homem é bem forte. Considero isso decadência e falta de competência de uma “raça” que se considera tão inteligente.

Quando derrubaram a última palmeira do Kissia onde hoje enormes prédios estão sendo construídos, tive a impressão de final dos tempos e pude refletir na arrogância do ser humano de achar que para construir algo precisa destruir muita coisa no meio ambiente. Quantos passarinhos,periquitos, macaquinhos, preguiças perderam suas moradias? Muitos morreram e a outros só restaram os fios de alta tensão, frios e sem conforto nenhum pela falta dos galhos e das folhas em seus ninhos. Porque no lugar de derrubar tudo não fazem (ei construtoras!) um parque e colocam o nome do proprietário do terreno onde possam plantar mais e mais espécies, revitalizar o rio, fazer a parte que lhes cabe no quesito preservação da vida?

Infelizmente hoje ao passar pelo local notei mais uma ponta de um terreno, ao lado do conjunto Kissia, onde o mato resistia a invasão. A terra avermelhada brilhava na bela manhã de sol, totalmente desnuda e sem uma árvore sequer. Não vi movimentação nessa empreitada trágica. Quando amanhece, o serviço já foi feito e bem feito para os moradores que não reclamam de nada e deixam tudo acontecer em suas comunidades.

Talvez pelo excesso de matas e rios temos uma certa aversão à natureza. O mato não representa sujeira, esconderijo de bandido ou qualquer entrave para morar bem. Ao contrário significa qualidade de vida pois nos protege, nos dá sombra e água fresca e nos acalma com um simples olhar. Nossos bairros estão perdendo rapidamente o adorno natural, esse verde exuberante que imprime um ambiente mais leve onde todos os seres possam conviver em harmonia no planeta. Entender isso significa simplesmente uma enorme sabedoria.

OS PERIQUITOS DAS MADAMES - Ainda com relação às palmeiras e a natureza considero o mico do ano que mal começou, a situação dos delicados pássaros verdes que também gostam do que é bom e fizeram a morada no luxuoso conjunto habitacional Efigênio SalLes mais especificamente nas palmeiras imperiais que existem no local. Fiquei surpresa ao saber que, incomodados com o som produzido pela revoada dos periquitos e dos dejetos produzidos por eles, a solução encontrada pelos moradores foi telar as belas árvores. Que diacho de ser humano é esse que quer árvore para enfeite e não para os passarinhos. Que tipo de ser humano é esse que não se incomoda com barulho de TV, música alta no barzinho e na rua e quer calar a natureza? Quando vejo passar no firmamento azul esses bichinhos, alegres e felizes pela sua liberdade, sempre achei que nem tudo estava perdido. Impedir que os periquitinhos façam sua dorida nas palmeiras é demonstração de arrogância, de egoísmo, de maldade. Tenho medo que façam pior. Espantem os periquitos e depois derrubem as árvores para evitar qualquer incômodo. Vamos de mal a pior.

(*) É escritora, jornalista e articulista do NCPAM/UFAM.

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