NEM
A PAU, JUVENAL
A peça condensa em si alguns instrumentos
recorrentes que fazem parte também do apelo do marketing político para “vender”
ao eleitor o candidato plastificado como cordeiro, quando se sabe que é um
bruta lobo, a gritar e afrontar a sua gente. Em assim sendo, a galera nas urnas
vai gritar: Voltar, “nem a pau, Juvenal.”
Ademir
Ramos (*)
Notabilizou-se nos meios de
comunicação uma campanha publicitária de grande porte com apelo de que o
produto em tela é superior ao “outro”. Nada especial se não fosse à provocação
aberta que os autores fazem ao concorrente, valendo-se de uma representação
popular impressa na memória coletiva dos consumidores quando indagados sobre a
possibilidade do “outro” fazer parte de sua cesta básica. De pronto, o
interlocutor recebe o sonoro não com seguinte bordão: “Nem a pau, Juvenal.” E
para completar a mensagem, a negativa é seguida de um puxão nas bochechas do
garoto propaganda, o que torna o ato mais hilário e significativo.
A peça condensa em si alguns
instrumentos recorrentes que fazem parte também do apelo do marketing político
para “vender” ao eleitor o candidato plastificado. Neste processo de
massificação assentado em sociedades complexas, as relações sociais são difusas
e extensivas, não permitindo ao eleitor outra forma de participar que não seja
impositiva, principalmente, quando se trata de sociedades em extrema pobreza
sem opção de escolha e muito menos de decidir sobre o seu futuro e da sociedade
em que vive. Nesta conjuntura, o marketing política reduz o eleitor ao
consumidor e, por sua vez, o candidato é um produto a ser antropofagicamente
devorado no banquete dos excluídos.
Além desta ação impositiva
que a mídia nos impõe é importante que se diga também que a mensagem torna-se
presente quando o político conta com maior tempo de televisão e rádio, permitindo
contagiar o eleitor com suas peças publicitárias sem provocar, no entanto,
nenhum segundo de reflexão e análise. Por isso, para os candidatos
plastificados, os debates e os confrontos com outros concorrentes são fatais,
porque o dito cuja é um produto de laboratório é uma invenção da mídia, isto
quer dizer que não tem voz própria e nem tampouco decide sobre sua agenda.
Certa vez, o ex-governador
do Amazonas, Eduardo Braga (PMDB) comparado com o seu antecessor Amazonino
Mendes (PDT), foi indagado se era verdade que suas ações de governo não tinham sustentabilidade
por falta de uma plataforma intelectual que lhe desse legitimidade e soberania
as suas determinações. Em outras palavras, ele governava mais para grupos
econômicos, os poderosos, do que para o povo como um todo. E não satisfeito o repórter
ainda perguntava se era verdade que o seu universo de leitura era tão minúsculo
que nem sequer Maquiavel ele havia lido. Foi neste momento que o ex-governador
saiu-se com esta: para que ler Maquiavel, que é do mal se posso ler a Bíblia,
que é do bem.
Esta sacada contagia os
desatentos e desavisados e firma uma identificação com os leitores
fundamentalistas ofuscando os corações e mentes com resultado positivo nas
urnas. Eis a razão porque os políticos recorrem aos céus para consagrar suas
trapaças; constantemente abençoam também o povo como se fosse um bom pastor;
usando, desavisadamente, o nome de Deus. Não bastasse ainda, recorrem ao campo
privado, tratando o povo como se fosse uma família e ele, naturalmente, fosse o
patriarca zeloso capaz de suprir todas as necessidades reclamadas. Ademais,
quer mostrar também que é o amigo de todos (as) e como “servidor” fará tudo
para promover a felicidade de sua gente.
Neste universo, o marketing
político transforma o eleitor em consumidor, em rebanho de ovelhas, em
indigentes, em família extensiva, em “amigos do rei”, embriagando cada vez mais
o eleitorado. E o pior de tudo, ainda veremos esta cena por muito tempo, porque
a desigualdade se alastra tanto no urbano como no campo, dificultando ao leitor
estabelecer diferença entre um e outro candidato, visto que a linguagem é a
mesma, a estratégia do toma lá dá cá é a mesma, as bravatas são as mesmas, bem
diferente da campanha do Juvenal, onde o consumidor consciente, conhecedor do
produto que compra não se deixa enganar pelo concorrente, que em época de
eleição se apresenta com nova embalagem passando-se como cordeiro, quando todos
sabem que é um lobo, a mandar, a gritar com os seus e com povo. Se assim for, o
grito da galera nas urnas será um só: Volta, “nem a pau, Juvenal” e sabacu nele.
(*) É professor da UFAM,
antropólogo, coordenador do Jaraqui e do NCPAM.
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