sexta-feira, 6 de abril de 2012

JUDAS E AS MARIAS DE CRISTO
Ademir Ramos (*)

           A narrativa histórica dos cristãos celebra na Páscoa, a vida, morte e ressurreição do Cristo libertador. Os fatos comungados nas liturgias comunitárias são carregados de paixão, elevando a pessoa ao pertencimento da dor do outro, que consumado pela redenção do filho de Deus é elevado à condição de homem livre contra o poderio do Império Romano, dos sacerdotes da Corte e toda forma de redução do homem, assim, explorado, dominado e excluído do lucro da terra, do trabalho, vivendo sob as estruturas do pecado social.  

           As alegorias são múltiplas e na idade média a reinvenção da tradição ganhou cores e formas que povoaram o imaginário popular migrando para as terras conquistadas, merecendo das culturas leituras variadas em formato não muito aceito pela tradição Romana.

            A trama da Paixão tem gosto amargo da injustiça, quando o Sumo Sacerdote sente-se ameaçado e começa a interrogar o jovem Cristo como força contrária a sua plataforma política, pondo em dúvida a legitimidade do poder que o exerce. Assim, o Cristo Messias é condenado por blasfêmia e sofre as mais cruéis humilhações que um homem poderia sofrer, tendo sido injuriado, escarnecido e por fim a cruz como paga.

           Mas, antes, bem antes, a profecia reserva ao Cristo, a dor da traição, manifestação recorrente no cotidiano dos homens que lidam com a paixão e o labirinto da política. Pois, como diz o salmista (Sl 41,10): “Até meu amigo, em quem eu confiava, que comia do meu pão, levantou o calcanhar contra mim”.

           Contra o Messias levantou-se Judas Iscariot, que com ele comia e bebia, para dedurá-lo em troca de alguns dinares. E assim o fenômeno tornou-se mais próximo porque faz pensar sobre a condição humana e as disputas vividas em suas diversas frentes institucionais. Mas, o fim do traidor é a morte de forca, o suicídio, que ganhou vida na arte popular, passando a ser execrado em praças públicas pelos populares, identificando-o com Atores sociais, religiosos e políticos que também ludibriam o povo de Deus, fazendo as maracutaias nos poderes instituídos, metendo a mão no dinheiro público em benefício próprio.

          Desse modo, na calada da noite de hoje (sexta) para amanhecer o sábado, o Judas Traidor se faz presente nos postes das cidades do Brasil e das culturas barrocas, com fisionomia de pessoa pública para ser malhado, fazendo-se justiça contra os corruptos que crucificam o povo, enganando, prometendo e dando pinta de honesto.

          Mas, a morte é consumada pela ressurreição do Cristo, que por sua vez tem como testemunha Maria Madalena, Maria Mãe de Tiago e Salomé. A beleza desta Saga está nestas mulheres, que por força do amor e de sua paixão iam ungir o corpo do sacrificado e lá chegando encontraram, segundo elas, o túmulo saqueado. Ainda sob espanto, foram convencidas de que Ele havia ressuscitado e a elas o espírito de Deus confiou para que anunciassem aos apóstolos a consumação do tempo porque o Cordeiro de Deus, segundo Apocalipse (Ap 5,9), em sendo imolado, pelo seu sangue, havia resgatado para Deus, os homens de toda a tribo, língua, povo e nação. Elas, as mulheres, são as primeiras a vivificarem o cristianismo desde a revelação até a ressurreição. No entanto, foram também as primeiras excluídas do mandamento dos ministérios eclesiásticos romano, rogando a Deus, em tempo, que a Justiça seja feita.

(*) É antropólogo, professor e coordenador do NCAPM/UFAM.                  

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