ABISMO NA EDUCAÇÃO
O fracasso das políticas públicas para o ensino médio no Brasil ficou
ainda mais evidente pelos resultados, por escola, do Exame Nacional do Ensino
Médio (Enem) de 2011. Nesta edição, o Ministério da Educação deixou de fora
escolas que tiveram participação de menos de 50% de seus alunos - a inscrição
no exame não é obrigatória. Com isso, foram excluídos da lista vários colégios
particulares tradicionais que haviam obtido boas notas na edição anterior, em
2010, mas cujos alunos não se interessam pelo Enem como forma de ingressar na
universidade. Mesmo assim, das 100 escolas de melhor desempenho, apenas 10 são
públicas, e quase todas são ligadas a instituições militares, a universidades
federais e ao ensino técnico - cujo processo de ingresso de estudantes é tão
disputado quanto o das melhores faculdades. Considerando-se que as escolas
privadas respondem por somente 12,2% do total de matrículas no ensino médio no
Brasil, o quadro é devastador.
Formalmente, o exame não se presta a medir a qualidade das escolas, e
sim a competência dos alunos, razão pela qual é usado como meio de seleção para
universidades. No entanto, os resultados deixam claro não só que as escolas
particulares continuam mais bem preparadas para ensinar as disciplinas exigidas
no processo de seleção, como também que as escolas públicas não conseguiram
acompanhar as mudanças do Enem. Resultado: o número de escolas da rede pública
entre as 100 que obtiveram os melhores resultados caiu de 13 para 10 entre 2010
e 2011; já entre as 50 mais bem colocadas, o total recuou de 6 para 3.
A crise no ensino médio fica ainda mais evidente quando se constata que
92% das escolas estaduais, onde está a maioria dos alunos, obtiveram pontuação
abaixo da média geral na prova objetiva. No ranking, a primeira escola, ligada
à Universidade Estadual do Rio, aparece somente na 60.ª colocação. A primeira
escola estadual sem nenhum vínculo com universidades ou com ensino técnico
surge num distante 248.º lugar. O Rio, Estado de melhor desempenho na rede
pública estadual, teve apenas 18% das escolas com notas acima da média geral.
Em São Paulo, foram 14%. No Ceará, apenas 2%.
O ministro da Educação, Aloizio Mercadante, torturou os números para
extrair conclusões positivas dos resultados. Ele afirmou que a média da
pontuação dos 37,5 mil alunos de escolas públicas mais bem colocados - isto é,
dos estudantes que teriam direito a cotas nas universidades federais - foi de
630,4, contra os 569,2 obtidos, em média, pelo total de estudantes das escolas
particulares. Logo, segundo Mercadante, os alunos de escolas públicas não farão
feio ao ingressar nas universidades por meio das cotas. Nem é o caso de notar
que se trata de comparar bananas com abacaxis - afinal, essa elite das escolas
públicas, festejada pelo ministro, vai disputar vagas em universidades não com
a média geral dos alunos das escolas privadas, mas com a elite dessas escolas,
cujo desempenho é significativamente melhor.
Ademais, é o caso de perguntar ao ministro por que razão ele defende as
cotas se os alunos das escolas públicas parecem, em sua opinião, tão bem
preparados para enfrentar o vestibular e a concorrência das escolas privadas. A
realidade, essa madrasta, mostra porém que a aposta nas cotas é o que resta a
um governo que não investe na melhoria do ensino público, cujos resultados
pioram a cada ano. A conta dessa distorção não tardará a ser cobrada. Em 2015
haverá reserva de 50% de vagas universitárias federais para alunos da rede
pública, ou 150 mil matrículas. Segundo os números do Enem de 2011, a média dos
150 mil melhores alunos das escolas públicas, que teriam direito às cotas em
2015, foi de 582,2 pontos, bem abaixo do desempenho dos alunos da rede
particular. E mesmo excluídas do cálculo as notas da prova de redação, que
normalmente pioram o resultado dos alunos de escolas públicas, a média geral da
rede pública foi de 474,2 pontos, muito distante dos 569,2 pontos obtidos nas
escolas privadas. São fatos que a demagogia das cotas não corrigirá.
Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,abismo-na-educacao,975487,0.htm
Nenhum comentário:
Postar um comentário