quinta-feira, 31 de julho de 2008

A "REVOLUÇÃO COMUNISTA" NO AMAZONAS


Antônio Oliveira Neto*



Hoje muito se tem debatido sobre as mudanças teóricas e práticas nas organizações da esquerda tradicional, como os PCs e os partidos sociais democratas. Esses partidos não só vêm assumindo claramente posições políticas cada vez mais à direita como têm participado diretamente de governos nitidamente burgueses.

Para por em prática esse completo giro político, os PCs e os Partidos Sociais Democratas, rebaixam seus programas e se ajustam cada vez mais ao regime democrático-burguês, defendendo suas instituições, compactuando com a corrupção e com políticas econômicas neoliberais.

O pragmatismo político dessas organizações tem impactado aqueles que estavam sob sua esfera de influência e acreditavam nos propósitos e ideais socialistas que aparentemente defendiam. Para essas pessoas, a crise dessas organizações é também uma crise do socialismo. Por isso, encaram o debate com um misto de espanto, ceticismo e frustração.

Demonstra-se que nem os PCs e nem a Social Democracia podem ser vistos como portadores da herança do socialismo ou do marxismo. Essas organizações iludiram as amplas massas com um discurso de que buscavam o socialismo, mas, na prática, atuaram como seu coveiro. Nesse sentido, é importante separar a crise dessas correntes políticas e a perspectiva do socialismo.

É nesse marco que podemos discutir a degeneração do PCdoB em escala nacional e regional. De um ponto de vista histórico, esse partido foi uma variante do regime stalinista. Tinha como referência o modelo "socialista" da Albânia. Um regime que já nasceu burocratizado. Os PCs no mundo inteiro, a partir do regime stalinista, se pautaram pela colaboração e pela conciliação entre as classes antagônicas, pela teoria dos campos ( um campo progressista e um campo conservador) e pela completa deformação do marxismo ao defender no plano teórico e prático a revolução por etapas e o socialismo em um só país.

Desde então esses partidos não apenas aprofundaram a burocratização nos Estados Operários (URSS e países do Leste Europeu) como protagonizaram as maiores traições às lutas históricas da classe trabalhadora em todo o mundo. Os PCs já tinham, portanto, rompido com o materialismo histórico e com o marxismo desde o regime stalinista. O que se tinha era uma grande influência ideológica desse poderoso aparato burocrático (Estados operários degenerados – URSS e Estados Operários burocratizados - Albânia, Cuba, China, etc) que impedia a classe trabalhadora de enxergar a verdadeira essência desses partidos. Por isso, milhões continuaram sob essa influência.

A Queda do Muro de Berlim, simbolicamente revelou essa trágica realidade. Desde então, os partidos ditos comunistas entraram numa nova fase de degeneração. Desceram muito abaixo do que já haviam descido. Passaram a participar diretamente dos governos burgueses, e quando falam de aliança com a burguesia nem enrubescem mais as suas faces. Perderam aquilo que já não tinham, qualquer escrúpulo.

O PCdoB é a expressão desse processo. Esse partido é a degeneração da degeneração do marxismo. E, sua crise é tão profunda, a sua identidade parece tão distante que não consegue nem mesmo se apresentar como caricatura do que já foi. E isso significa que, até mesmo os resquícios de stalinismo (não de marxismo) estão sendo renegados.

Em outros momentos se permitiam ao trabalho de elaborar justificativas para legitimar suas alianças espúrias com uma certa lógica e um certo verniz de esquerda, mas hoje, nem isso eles fazem mais. Utilizavam a “teoria dos campos” para dizer que estavam se unindo a um campo progressista para impedir o avanço de um campo conservador, definiam com certos critérios as alianças, etc. Mesmo considerando que essas teorias são alheias ao marxismo (uma espécie de revisionismo), elas funcionavam com uma espécie de anteparo ideológico que definia um campo, uma fronteira para esse partido. Isso se perdeu no vendaval oportunista a partir dos anos de 1990.

Então, rigorosamente, se antes não se podia considerar os PCs, ou especificamente o PCdoB como um partido marxista – comunista, atualmente, seria um erro considerar que a sua degeneração se confunda com a perda de perspectiva no socialismo ou no comunismo. Para ser cuidadoso com os conceitos e com a experiência política mundial, podemos dizer que se trata da degeneração de um Partido Stalinista que se travestia de comunista. O conceito comunista é um conceito muito caro para ser atribuído ao PCdoB.

Aqui no Amazonas fica cada vez mais nítido o colaboracionismo e a participação direta desse partido nos governos burgueses. A sua degeneração chegou a um ponto tão dramático que se encontra dividido em facções dos que apóiam Braga ou dos que apóiam Serafim. Mas, esse não é um privilégio apenas do stalinismo – do PCdoB. O reformismo, a social-democracia petista está trilhando o mesmo caminho, com o mesmo enfoque e o mesmo cálculo pragmático dos cargos e privilégios do poder.


* É sociólogo, mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia e professor da Universidade Federal do Amazonas.

2 comentários:

Anônimo disse...

CARO PROF. NETO, LI SEU ARTIGO SOBRE OS COMUNISTAS. GOSTEI DE ALGUNS APONTAMENTOS, MAS DISCORDO EM OUTROS PONTOS ESSENCIAIS. DO PONTO DE VISTA DA ANÁLISE DA CIÊNCIA POLÍTICA, POSSO DIZER QUE OS PARTIDOS POLÍTICOS SÃO ORGANIZAÇÕES QUE CANALIZAM DETERMINADOS INTERESSES DOS GRUPOS SOCIAIS. LOGO, SE SOU UM LIBERAL, MILITO NUM PARTIDO DE COLORAÇÃO LIBERAL. SE SOU UM SOCIAL-DEMOCRATA VOTO NOS POLÍTICO DA SOCIAL-DEMOCRACIA, E SE SOU UM COMUNISTA DEFENDEREI AS TESES HISTÓRICAS DO MOVIMENTO COMUNISTA. OBVIAMENTE QUE AS COISAS NÃO SÃO TÃO SIMPLES ASSIM. OS PARTIDOS FUNCIONAM A PARTIR DE DELIBERAÇÕES INTERNAS QUE OBJETIVAM ALCANÇAR UM CALCULO RAZOÁVEL PARA CONCORRER E VENCER ELEIÇÕES. OS PARTIDOS SÓ EXISTEM PARA REDUZIR OS CUSTOS DA TRANSAÇÃO ENTRE O ELEITOR (REPRESENTADO) E O POLÍTICO (REPRESENTANTE), E PARA CONCORRER ÀS ELEIÇÕES PERIÓDICAS. NADA MAIS, NADA MENOS. OS PARTIDOS NÃO DEVEM NECESSARIAMENTE SER ORIENTADOS POR SUAS BASES SOCIAIS. COMO NUNCA DE FATO O FORAM. AS BASES SERVEM APENAS PARA LEGITIMAR SOCIALMENTE AS DECISÕES DOS LIDERES PARTIDÁRIOS. A VELHA E ATUAL LEI DE FERRO DAS OLIGARQUIAS DE MICHELS. A COMPREENSÃO DE QUE UM PARTIDO POLÍTICO É UMA ORGANIZAÇÃO DEMOCRÁTICA É FALSA. NUNCA FOI E NÃO TEM RAZÃO DE SER. OS PARTIDOS COMUNISTAS (OS PCS) SÃO PARTIDOS COMO TODOS OS OUTROS. DEVEM CONCORRER E VENCER ELEIÇÕES. E PARA ISTO DEVEM, SE OBEDECEREM AO CÁLCULO RACIONAL MÍNIMO, NUMA LEITURA DOWNSIANA DA TEORIA ECONÔMICA DA DEMOCRACIA, ISTO É, EFETIVAREM COLIGAÇÕES ELEITORAIS E ATINGIREM O QUOCIENTE ELEITORAL MÍNIMO PODEM CERTAMENTE COGITAR UMA VITÓRIA ELEITORAL, E UMA CADEIRA NO PARLAMENTO. AS INSTITUIÇÕES IMPORTAM E MODELAM OS COMPORTAMENTOS INDIVIDUAIS E COLETIVOS. E ESTAS SÃO AS REGRAS DO JOGO IMPOSTAS PELAS INSTITUIÇÕES (SISTEMA ELEITORAL DE VOTO PERSONALIZADO, SISTEMA PARTIDÁRIO FRAGMENTADO, E ULTRAPRESIDENCIALISMO ESTADUAL QUE SUFOCA O PODER LEGISLATIVO) E QUE AS ORGANIZAÇÕES PARTIDÁRIAS DEVEM SEGUIR A PARTIR DE ESTRATÉGIAS E DECISÕES DE AÇÃO COLETIVA. ESTA É A CHATICE DA ESTABILIDADE DEMOCRÁTICA. DESDE MEADOS DO SÉC. XX, OS PCS, ESPECIALMENTE OS EUROCOMUNISTAS, ABANDONARAM AS TESES DA SEGUNDA INTERNACIONAL (DA LUTA ARMADA) E PASSARAM A DEFENDER FRIAMENTE AS TESES DA TERCEIRA (AS FRENTES POPULARES DE INSPIRAÇÃO LENINISTA). MAS ISSO SÓ CHEGOU AO BRASIL MUITO TARDIAMENTE, OS PCS DEIXARAM DE SER UMA ALTERNATIVA VIÁVEL PARA AS CRISES SISTÊMICAS DO CAPITALISMO. OS SOCIAL-DEMOCRATAS E AS POLÍTICAS DE CORTE KEYNESIANO PASSARAM A ASSUMIR A FUNÇÃO DA ESQUERDA REFORMISTA. HOJE, OBJETIVAMENTE, OS PCS PASSAM POR UM PROCESSO DE SOCIALDEMOCRATIZAÇÃO DE SUAS BANDEIRAS: ELEGEM PRESIDENTES DE CÂMARA DOS DEPUTADOS (VIDE O CAMARADA ALDO REBELO), FAZEM ALIANÇAS ESTRATÉGICAS COM PARTIDOS MAIS MODERADOS (LIBERAIS, VERDES, SOCIAL-DEMOCRATAS; OU GOVERNISTAS), E PARTICIPAM DAS ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL EM ONGS, SINDICATOS ETC. OS TEMPOS MUDARAM, O PROBLEMA É QUE OS NOSSOS COMUNISTAS FORMAM DUROS NA QUEDA.

UM ABRAÇO E PARABÉNS PELO DEBATE.

Anônimo disse...

Caríssimo Breno!

A crítica aos PCs não tem a intenção de ser uma formulação mecanicista. Ao contrário, partimos da perspectiva de um debate no seio do marxismo. E, por essa perspectiva, a essência do debate é a superação do capitalismo. O que estamos dizendo é que tanto os Partidos Sociais Democratas quanto os Partidos Comunistas, revisaram o marxismo e mudaram seus programas para atender os seus objetivos – estranhos ao marxismo revolucionário. Não nos propusemos a discutir com que política pode se obter mais cargos no parlamento. Até porque esse cálculo político é feito porque qualquer partido burguês.

A sua análise parte de premissa da disputa política por dentro do Regime Democrático-Burguês. Esse regime foi formulado pelos ideólogos da moderna sociedade burguesa, como Montesquieu, J. Locke, Roussseau, etc. E, é um regime que serve para reproduzir, por meio de eleições, a sociedade burguesa. Na obra "A questão Judaica", K. Marx expõe com clareza os limites desse tipo de regime. A Revolução Francesa emancipou o homem política e juridicamente, mas não o emancipou econômica e socialmente. Só uma revolução socialista cumpriria esse papel. Uma transformação que tenha no seu cerne a superação do capitalismo.

Esse é o debate que estamos travando aqui. A 2ª Internacional não passou pela prova histórica, rompeu com a solidariedade de classe quando a maioria de suas seções nacionais, os Partidos Sociais Democratas romperam com o internacionalismo operário, ficando ao lado das burguesias de seus respectivos países, na Primeira Guerra Mundial. A 3ª Internacional que nasceu no apogeu da Revolução Russa cumpriu um papel importante, mas com o stalinismo ela se degenerou e foi totalmente destruída.

A política de Frentes Populares nunca foi orientação de Lenin. As Frentes Populares são uma invenção do Stalinismo. Aliás, o próprio nome Frente Popular só vai surgir com a ascensão do Nazismo. Em "Revolução e Contra-Revolução na Alemanha", obra de Leon Trotsky, isso fica bem claro. E, para fechar essa questão convem observar o comportamento de Lenin e do partido bolchevique ante ao Governo Provisório, no período de fevereiro a outubro de 1917. Esse governo pode ser considerado uma Frente Popular. Mas, Lenin e o partido bolchevique não só não entraram nele como cuidaram de preparar as massas para derrubá-lo e tomar o poder.

O Stalinismo é que difundiu essa idéia de que as Frentes Populares haviam sido idealizadas por Lenin. Mas, isso é mais uma das de suas falsificações.

Rigorosamente falando, as Frentes Populares, constituem-se em governos burgueses. Existem para gerenciar o capitalismo e não para superá-lo. Os PCs ao entrarem nesses governos estão ajudando, com o seu prestigio, a gerenciar os negócios capitalistas e, em última instância estão iludindo os trabalhadores com uma falsa perspectiva de que é possível mudar por essa via.

Em síntese, os Partidos Sociais Democratas não passaram pela prova de fogo e a Segunda Internacional se tornou um grande aparato de conciliação e de perpetuação do Capitalismo. A Terceira Internacional, fundada por Lenin e Trotsky, sob a égide dos Partidos Comunistas, como forma de se diferenciar dos Partidos Sociais Democratas, foi degenerada pelo Stalinismo.

Esse é um debate antigo. A oposição de esquerda que não concordava com os rumos que vinha sendo imprimido por Stalin, deixou um legado pouco conhecido, especialmente na academia, que merece ser resgatado.

A participação nas eleições burguesas tem um objetivo muito claro em Lenin. Em "O Esquerdismo a doença infantil do comunismo", Lenin delineia bem o papel dos comunistas nas eleições. Não há nele uma única ponta de ilusão no Regime e muito menos na superação do capitalismo por essa via.

Mas, o marxismo-leninismo que foi difundido para todo o mundo, foi o marxismo-leninismo difundido pelos PCS, sob o dominio do stalinismo. No Brasil não foi diferente. Em "A derrota da Dalética”, de Leando Konder, encontramos uma bela análise de como Marx entrou no Brasil. Isso tem uma importância enorme para a formação de gerações de ativistas e de intelectuais que se aproximaram do marxismo.

Antonio P. Oliveira Neto