sábado, 22 de junho de 2013

O BRASIL ACORDOU
Ellza Souza (*)
A passeata de quinta, dia 20, foi surpreendente. O orgulho de ser brasileiro parecia latejar dentro de cada um que se dirigiu para a avenida Eduardo Ribeiro. O céu, em contraste com o rosa do Teatro Amazonas, estava azul turquesa. Parecia que Deus estava dando a maior força aos manifestantes. Em todas as direções se via apenas o povo. Nada de políticos, nada de aproveitadores, nada de vandalismo, poucos policiais, alguns até registrando a mobilização com suas máquinas  fotográficas. Era, de fato, uma festa popular. Parecia ter sido planejada há muito tempo, tal o grau de competência, de entendimento, de clareza em suas reivindicações. A grande criatividade nos cartazes chamou a atenção. Frases bem humoradas mas sempre dentro do clamor que estava preso há muito tempo.

Professores de universidades, alunos, profissionais de várias categorias, donas de casa, executivos.. Muitos não vieram pra rua mas dos seus apartamentos ou escritórios deram seu apoio de alguma forma. Uns jogando papel picado outros piscando suas luzes durante a passagem da passeata. A revolta maior se dirigia aos politicos. A presidente Dilma, Feliciano, Lula, Robério Braga, foram os mais citados nos cartazes. Assim como a PEC 37 e a corrupção que se entranhou em todas as esferas de governo amparada na impunidade e no desmando.

Serviços básicos como saúde e educação de qualidade para todos não precisava nem pedir se o país fosse sério. É o mínimo que se pode querer em troca de um impostômetro que gira tão rápido ao contar a arrecadação. O dinheiro dos impostos era pra ir e voltar para a população que ora reclama e reclama muito bem. Pacificamente mas não mais passivamente.    Se isso aconteceu graças as redes sociais que uniu a sociedade já posso me redimir do descaso com que as olhava. 

Não precisamos mais fazer de conta que o que vem de cima não nos atinge. Tanto atinge que o país do futuro voltou a ser um país do passado. Nada contra o passado onde vivemos as nossas histórias mas aquele passado que queríamos esquecer para sempre: falta de liberdade de expressão, pobreza excessiva, maus serviços públicos, inflação, bandidagem graúda e miúda rolando solta e impunemente. Tudo que é público funcionando mal. Verbas públicas desviadas da merenda escolar, dos hospitais, dos salários dos professores. É tão simples comprovar isso. Basta visitar sem avisar uma escola da periferia, um pronto socorro, um posto de saúde. Basta precisar de qualquer atendimento numa repartição. A burocracia está com toda a força. Tudo passa por um cadastro, um oficio, um procedimento que trava.

Em Manaus é difícil falar dos igarapés que não só não foram revitalizados como ao contrário foram aterrados, tirando a água que nos  refrescava. Em São Raimundo em nome da copa (que rei é esse?) estão acabando com uma comunidade com mais de 160 anos. É só ir lá e conversar com os moradores. Acho que só vai escapar o padre e a sua igreja que fica no topo da bela colina. As primeiras ruas do século XIX, resquícios de antigas casas, histórias de quem ali se criou, tudo está sendo varrido do mapa. As melhorias de fachada para esse evento tão fugaz e simplório derrubou até o velho estádio Ismael Benigno que marcou uma época. “Não estamos aqui para comprar sentimentos” ouviu-se por lá.

E por essa e outras e outras que o povo resolveu dar um basta. Mudar de caráter os que aí estão não vão mudar. Mas retomar o poder e passar a limpo toda essa devassidão de desmandos, isso o povo pode e vai fazer. Sem deixar, em momento algum, que maus intencionados atrapalhem as reais reivindicações do movimento. Um movimento que tem tudo para dar muito certo.

(*) É escritora, jornalista e articulista do NCPAM/UFAM

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