segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

FLORA E HALLEY EM MANAUS

José Ribamar Bessa Freire*

Meu sobrinho ‘Pão Molhado’, conhecido nos hotéis e praias de Miami como ‘Wet Bread’, concedeu ontem entrevista coletiva para anunciar que não é mais cabo eleitoral, no Amazonas, do presidenciável Ciro Gomes: – “Ciro Gomes? Nunca mais. Never more. A favorita, agora, é a Dilma”, declarou ele a um auditório praticamente vazio, em cujas cadeiras estavam sentados apenas quatro jornalistas: Zé Bob Mala, Túca, Serginho Bártholo, do Diário do Amazonas, e Taquiprati, esse aqui por razões de nepotismo. Zé Bob aproveitou para atirar seu sapato no entrevistado.

Desviando-se da sapatada com mais agilidade que o Bush, ‘Pão Molhado’ explicou sua renúncia. Ele está in-dig-na-do, porque Flora Pilar Gomes, presidente do grupo Fontini, na última reunião do Conselho ocorrida anteontem, para se vingar de Halley Massafera, decidiu nomeá-lo gerente administrativo – adivinhem onde? – é isso mesmo, na filial de Manaus. – “Essa megera não pode ser a primeira dama do país” – denunciou ‘Wet Bread’, manifestando sua perplexidade diante da reação do cometa Halley.

Halley ficou de-ses-pe-ra-do. Ele diz que Flora mentiu, esfolou, corrompeu, matou, subornou, torturou, seqüestrou, chegou até a extrema crueldade de obrigar toda a cidade de Triunfo a ouvir o cd de Cassiano Copolla, com sua voz desenxabida, mas o pior de todos os crimes que cometeu foi condená-lo a viver em Manaus: - “Pelo amor de Deus, qualquer lugar do mundo, até Coari ou Urucurituba, mas Manaus não. Eu aceito a tortura, ouço o cd do Cassiano, mas Manaus não” - chorou.

Ulha lá, Marapatá!

A pergunta que não quer calar e que atormenta o coração desprotegido do ‘Pão Molhado’ é: por que Flora, querendo punir o Halley, exemplarmente, escolheu logo a cidade de Manaus como lugar de seu exílio? O que a malvada está pretendendo? Qual a representação que ela tem de nossa cidade? Que imagem de Manaus ela está projetando para todo o Brasil? Por que, afinal, Halley ficou tão apavorado com a idéia de passar uma temporada em Manaus, como se estivesse condenado ao fogo eterno do inferno?

É que Flora, na realidade, está pensando em transferir a sede do Grupo Fontini para a capital do Amazonas. Ela descobriu que Manaus tem uma porta, a ilha de Marapatá, onde todo forasteiro deixa sua vergonha, o que torna a cidade o lugar ideal para trapaças e crimes. Durante os dezoito anos em que passou presa em São Paulo, Flora leu livros de economia, psicanálise, administração de empresas, antropologia, mas também de poesia. Conhece o nosso grande poeta Aníbal Beça: “É Marapatá, patati, patatá. Mordendo a leseira dizendo: Ulha lá”.

- “Ulha lá” – ela apontou no mapa. “É aqui que eu vou faturar, porque em Manaus, os bons sempre perdem, os malvados sempre ganham. Aqui, os bons é que são castigados e os maus é que recebem medalhas. Em Manaus, a Fábrica de Celulose Fontini pode poluir o meio-ambiente, pode trancar ruas, pode cometer danos ambientais, que receberá prêmios por contribuir para o progresso. Quem protesta em defesa do meio ambiente, é que é condenado a indenizar os criminosos”.

Flora declarou publicamente - quem estava ligado na TV Globo depois do Jornal Nacional ouviu – que o Judiciário estava na sua mão: “Eles vão comer aqui. Aqui, oh! – ela disse, martelando o dedo indicador da mão direita na palma de sua mão esquerda”. Ela debochou quando soube da prisão dos juízes e desembargadores que vendiam sentenças no Espírito Santo. - “Em Manaus, isso não acontece nunca” (ela se referia à prisão dos juízes, não à venda de sentenças).

Vê bem, Maria!

A localização de Manaus, mais perto de Miami do que de São Paulo, permite que a grana acumulada ilicitamente seja gasta sem problemas nos Estados Unidos, aonde Flora pretende comprar uma mansão luxuosa, como fez o Dodi. Saindo de Manaus, é possível recolher a vergonha deixada na ilha de Marapatá – e patati, patatá - tornando-se um cidadão respeitável. Depois que Romildo Rosa foi nomeado conselheiro do Tribunal de Faz-de-Contas de Triunfo, tudo é possível. Flora sairá de Manaus cantando Waldick Soriano, a quem tanto aprecia: “Adeus, Manaus, adeus meu paraíso minha viiiiiiida”.

O Grupo Fontini, liderado por Flora, pretende, aliás, se associar ao empreendimento privado de uso misto, que planeja construir um complexo portuário no bairro Colônia Antônio Aleixo, na zona Leste de Manaus, bem diante do encontro das águas. O Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM) já atestou restrições ambientais ao projeto, que ameaça o patrimônio paisagístico da cidade. Esse será o maior crime da Malvada.

A estupidez e a boçalidade humana não têm limites. Os caras são capazes de derrubar o Teatro Amazonas para construir lá um enorme Shopping Center ou um estacionamento. De qualquer forma, esse seria ainda um crime menor do que destruir o encontro das águas, porque o Teatro Amazonas é construção humana, pode ser demolido e reconstruído. Mas o Encontro das Águas, uma vez destroçado, não pode ser recriado. Esses crimes podem até ficar impunes, mas a Mãe Terra e o grande arquiteto do universo costumam se vingar, punindo quem os comete ou permite que aconteçam.

Tem gente que não permite. Um grupo de ambientalistas e de pessoas que amam a cidade decidiu rearticular a AMANA, a associação dos ‘Amigos de Manaus’ e organizou um protesto contra a construção do Porto das Lajes. Fizeram uma carreata, que começou na Bola do Coroado. Lá, a ambientalista Elisa Wandelli leu um texto que defende o encontro das águas. Somos poucos, ainda, os que defendemos a qualidade de vida para nossos filhos, mas vamos crescer, em quantidade e qualidade.

Bem que a AMANA podia organizar, no mesmo local, um sarau literário, com a leitura de poemas dos escritores que cantaram a cidade. Começando com o Pão Molhado recitando o poeta cearense Quintino Cunha: - Vê bem, Maria, aqui se cruzam: este / é o Rio Negro, aquele é o Solimões./ Vê bem como este contra aquele investe,/ como as saudades com as recordações. / Se estes dois rios fôssemos, Maria / todas as vezes que nos encontramos / que Amazonas de amor não sairia/ De mim, de ti, de nós que nos amamos”.

P.S. – Em nome da Preta, mãe do ‘Pão Molhado’ e de outros leitores desejo um Feliz Natal à juiza Maria Eunice Torres. Nós estamos orgulhosos por ter no Judiciário uma mulher corajosa, íntegra, competente, que representa um fio de esperança na luta contra a estupidez e o mau-caratismo da Flora e da Fauna local.


* Artigo publicado no dia 21/12/2008 - Diário do Amazonas e no seu blog Taqui Pra Ti.

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