Índios, brancos, caboclos – II
As forças de Estado se concentraram ao sul do
Amazonas, no município de Humaitá, em atenção à situação de conflito vivido
pelos Tenharim. No entanto, os agentes públicos reduziram o fato a caso de polícia
sem responder efetivamente as demandas dos povos indígenas que habitam a região
quanto à saúde, educação, meio ambiente, segurança alimentar, gestão da
política indigenista, enfim a elaboração de um Programa de Etnodesenvolvimento
que garanta a integridade física desses povos, bem como o respeito e
valorização de suas culturas. Pelo nada consta conclui-se que no Brasil, índio bom é índio
morto.
Osíris Silva (*)
Violências contra índios e caboclos ocorrem no
Brasil em escala assustadora não é de hoje. No período pós-colonização, século
XVI, e mais recentemente, final do século XIX e início do XX, com consentimento
expresso da própria sociedade, ressalte-se, índio era morto a tiro como bicho
pelos desbravadores do Centro Oeste e da Amazônia. Aqui especialmente no
período áureo da borracha. Homens como Rondon e os irmãos Villas Boas
desempenharam papel seminal para a mudança da fúria exterminadora prevalente. O
Brasil, entretanto, não foi capaz até hoje de desenvolver ações objetivas
capazes, na forma e intensidade, de assegurar meios de subsistência adequados a
esses povos. Ao que se presume, tem sido mais conveniente, eleitoralmente,
conceder bolsas família e floresta. Eficazes instrumentos de manutenção de massas de desvalidos subjugadas a rações
alimentícias oficiais, mas não de desenvolver políticas públicas que promovam soluções
definitivas de longo prazo.
A questão indígena exerce
especial encantamento junto à intelectualidade e à Academia. Quase nada de
prático, todavia, resulta desse processo de enlevo naturalista. Crianças e
adultos morrem de doenças e fome no Mato Grosso, no Nordeste e na Amazônia. A
principal fonte alimentar de Ticunas e caboclos no Alto Solimões é frango
congelado e cachaça, transportados de Manaus em enormes quantidades
mensalmente. A produção de alimentos ali, como nas demais bacias hidrográficas
é praticamente inexistente.
A Crítica de quarta-feira
(8), publicou matéria da jornalista
Mariana Lina na qual descreve o calvário do índio Ticuna Cristovão Pinto,
Presidente da Associação Comunitária Indígena de Umariaçu II, zona rural de
Tabatinga. O líder perdera-se nos corredores burocráticos da Assembleia
Legislativa do Amazonas (Aleam) em busca de assistência médica e remédios para
sua comunidade, e sua esposa, em
particular. Aleam? E porque não junto à Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), ou à Funai? Ou ao
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (Mds) ou à Secretaria de
Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR)? Se este fato
não denota estado de perdimento do
governo em relação à causa indígena, do que então se trata?
Índios Krikati, Guajajara e Krenyê
bloqueiam, desde domingo passado, 5, trecho da Rodovia MA-280, entre as cidades
de Montes Altos, Imperatriz e Sítio Novo. Os índios pedem melhorias no
atendimento à saúde, educação, além de compensações pela instalação de torres
de alta tensão nas reservas (chegaram a derrubar duas delas). A rodovia é usada
para transporte de produtos que abastecem cidades da região. Mas os protestos
são praticamente inúteis.
Segundo
o jornal O Estado de S. Paulo da semana passada (8), comitiva de índios de
aldeias no sul do Amazonas informou ao comandante militar da Amazônia, Eduardo
Villas Bôas, “que vão reabrir em 1.º de fevereiro os pedágios na Transamazônica
(BR-320), em Humaitá. Isto a despeito da ameaça de novo ataque dos moradores da
cidade que, em 26 de dezembro de 2013, atearam fogo a postos instalados na
reserva Terra Indígenas Tenharim Marmelos como reação ao desaparecimento de
três homens na reserva desde 16 de dezembro.
Ante a argumentação de ilegalidade do
pedágio, os indígenas mantiveram-se intransigentes, informa o Estadão. Segundo
eles ilegal é também as atividades dos "flanelinhas" nas cidades e
que o pedágio é a principal fonte de renda das aldeias. "Não podemos
caçar, plantar, nem cortar pau para fazer artesanato, pois o Ibama não
deixa", afirmou Zelito Tenharim ao Estadão. Os índios se consideram
abandonados pelo Executivo. A questão, a partir desses fatos, torna-se
principalmente econômica, por transcender o âmbito social, etnográfico e
antropológico. A esse nível, só pulso forte e decisão política podem resolver.
(*) É
economista e articulista do jornal a Crítica.
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