quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

AS CORES DE OBAMA


O fim da arrogância deve levar a uma postura de tolerância com a diversidade cultural.O presidente negro, para ser o primeiro do século XXI deve aceitar as variadas cores que há na sociedade planetária dos seres humanos, aceitar para seu governo e para seus cidadãos o respeito às cortes internacionais, e efetuar a inflexão do desenvolvimento pela economia do consumo material para poucos, em direção a uma sociedade do desenvolvimento do conhecimento para todos.


Cristovam Buarque*

O Presidente Obama já está na história como o primeiro presidente negro dos EUA. Mas, nem os EUA, nem o presidente Obama tiveram ainda a oportunidade de mostrar ao mundo que têm o primeiro presidente do século XXI.

Para ser o primeiro presidente do século XXI, Mr. Obama terá de fazer uma inflexão na política e no comportamento dos EUA.

A primeira inflexão será trazer a preocupação ambiental para o centro do debate e das decisões na economia, na sociedade, na ocupação da Terra pelos norte-americanos e demais cidadãos do mundo. Precisará começar por assinar o acordo de Kyoto, até hoje recusado pelos EUA. E ir além. Propor, inspirar, formular, aprovar dentro dos EUA e nos fóruns internacionais medidas que possam reverter a clara tendência suicida do projeto civilizatório. A economia tem que ser reorientada para um compromisso com o equilíbrio ecológico. Para ser considerado o primeiro presidente norte americano do século XXI é de esperar que Obama, além de presidente negro, seja um presidente verde também.

A preocupação social com a pobreza é uma segunda inflexão necessária para fazer de Obama um presidente do século XXI. A marcha da economia sem compromisso social tem que ser reorientada para uma economia comprometida com a redução da pobreza. O presidente do século XXI, além de negro e verde deverá ser também vermelho. Não no sentido de subverter a ordem econômica e romper as bases da economia, mas no sentido de criar os mecanismos para enfrentar o quadro de desigualdade em nos países e no mundo.

O abandono da postura de arrogância imperialista que caracterizou os EUA a partir do final século XIX e ao longo de todo o século XX também precisa ser revertida no século XXI. A partir sobretudo do final da Segunda Guerra, os EUA passaram a ver-se como os portadores do destino da humanidade e tentaram apropriar-se ao máximo dos mercados e recursos dos demais países, influir para fazer de cada um deles parte da economia norte-americana. Além de antagonismos, de injustiças, de desrespeito às soberanias de muitos povos, os EUA terminaram criando e apoiando sistemas autoritários e que, mesmo quando mais democráticos, criaram desigualdades ainda mais formidáveis do que havia antes. Sobretudo, impediu nestes países, especialmente na América Latina, a procura autônoma de seus próprios rumos, conforme seus recursos e suas vontades políticas. Neste sentido, o presidente do século XXI além de negro deve ter também a cor branca da paz. Como exemplo, deve reverter meio século de bloqueio e sabotagem em relação a países, como Cuba é um exemplo e um símbolo.

O fim da arrogância deve levar a uma postura de tolerância com a diversidade cultural. Os EUA do século XX tentaram impor visões e estilos do "american way of life" a todo o mundo. E grande parte do mundo aceitou por ver neste padrão um estágio superior de desenvolvimento. Hoje, além do choque entre este padrão e as possibilidades ecológicas, há uma resistência cultural que os EUA precisam entender e tolerar. O novo presidente deve respeitar plenamente a diversidade religiosa, cultural, e sobretudo de experiências como novos modelos econômicos, desde que dentro de valores humanistas definidos por instancias internacionais como as Nações Unidas. Por esta razão, o primeiro presidente do século XXI deve abrir diálogo com todos que desejam participar do concerto humano, desde que todos abram mão da violência, do terrorismo, muitas vezes como resultado de antagonismo às imposições norte-americanas. O presidente negro, para ser o primeiro do século XXI deve aceitar as variadas cores que há na sociedade planetária dos seres humanos.

Deve também submeter-se a valores morais internacionais. A democracia limitada a cada país, elegendo seus presidentes a cada quatro anos não vai permitir enfrentar os problemas de longo prazo e globais, planetários da humanidade. Os valores como limites ecológicos ao crescimento, limites éticos ao uso da ciência e da tecnologia, padrões de comportamento humanistas de respeito aos direitos humanos, deverão ser cada vez mais questões globais, internacionais, de toda a humanidade. O primeiro presidente do século XXI terá que aceitar para seu governo e para seus cidadãos o respeito às cortes internacionais.

Finalmente, o primeiro presidente século XXI deve ser um indutor da distribuição da educação, do conhecimento científico e tecnológico, da cultura ao redor do mundo. Depois da segunda guerra mundial, os EUA tiveram um papel fundamental na distribuição do capital econômico entre os países do mundo. O século XXI vai exigir a distribuição do seu novo capital: o conhecimento. Este capital conhecimento será capaz de quebrar a desigualdade que ocorreu com o desenvolvimento econômico do capital das finanças e das máquinas, vai liberar energias que estão sendo reprimidas em bilhões de cérebros humanos pela falta de educação. O presidente do século XXI deverá ser o defensor da visão do capital conhecimento como a base do futuro em cada nação e no mundo global e ser o promotor de uma revolução intelectual no mundo inteiro por meio da educação.

Deverá fazer a inflexão do desenvolvimento pela economia do consumo material para poucos, em direção a uma sociedade do desenvolvimento do conhecimento para todos. Um desenvolvimento que respeite a diversidade de modelos e estilos de vida; defina limites sociais inferiores a que ninguém será condenado e limites ecológicos superiores a que ninguém terá direito; aceite, sem constrangimento ético, a desigualdade de renda, mas ofereça a todos a chance de participar do desenvolvimento conforme o talento e esforço de cada um.


No meio destes limites uma desigualdade legitima e ética decorrente do talento, em um mundo onde todos tiveram os mesmos direitos de acesso, como aqueles que permitiram a um jovem negro se transformar no primeiro presidente negro dos EUA, criando a expectativa de que ele será o primeiro presidente do século XXI.

*Senador da República pelo PDT, ex-ministro da educação e militante das causas libertárias.

Publicado originalmente no jornal El País

Um comentário:

Anônimo disse...

B.OBAMA NÃO VAI DAR MUITO SAMBA!