terça-feira, 1 de novembro de 2011

MANAUS, MENINA QUE NÃO CONSEGUE CRESCER

Ellza Souza (*)

São 342 anos desde o primeiro e único forte nessas bandas. O Forte da Barra do São José do Rio Negro que deu origem ao seu redor o primeiro aglomerado de casas ou palhoças e daí pra frente o processo de invasão foi constante até hoje. Claro que por aqui já fervilhavam, entre exuberantes árvores e igarapés, muitos povos com diferentes conhecimentos. Os primeiros habitantes lutaram muito mas se renderam aos invasores armados e dispostos a tudo para ocupar as terras e impor sua própria cultura.

Mesmo com esse início sangrento a cidade seguiu sua história, inicialmente num grande marasmo e em seguida com a prosperidade da borracha que durou pouco tempo. Já naquela época não soubemos aproveitar as experiências, boas ou más, para crescer harmonicamente dentro de um contexto inerente à nossa região. Muitas passagens humanas a própria natureza encarregou-se de descartar com doenças como a malária, com as distâncias enormes, com rios intransponíveis, com a maldade dos poderosos que se achavam donos das terras sem dono e com direito a escravizar à vontade. Depois veio a época pós borracha e finalmente a chamada Zona Franca de Manaus descarrilada para o PIM ou Pólo Industrial de Manaus.

A entrevista do deputado federal do PT, Francisco Praciano, no programa Na Terra de Ajuricaba da TV Ufam nos demonstra algumas dificuldades que são de longa data e não conseguimos sanar, sai governo e entra governo. A impressão que temos é que existe uma continuidade na administração pública e falta de projetos bons, planejamento adequado e objetivos claros em torno de melhorias para a sociedade como um todo e não apenas para minorias que se enquadram apenas nos planos de bajulação de governantes que não se preocupam nem um pouco com as pessoas que sobrevivem numa região como a Amazônia ainda pouco conhecida e cheia de peculiaridades, que precisa de administradores competentes e que pensem na maioria não como massa de manobra em eleições mas para lhes oferecer dignidade e esperança num futuro melhor.

O deputado Praciano, no programa, não hesitou e disse que “a ponte não era prioridade”, se referindo à polêmica obra inaugurada como um presente aos manauaras e que atravessa o largo rio Negro, ligando a capital ao município de Iranduba. E disse mais “a ponte não tem nada a ver com a logística da Zona Franca”. Ele acha que por falta dessa logística “não somos atrativos para as empresas”. Mas também não é por isso que temos o direito de fazer um porto de grande calado na área do entorno do Encontro das Águas. É por isso que precisamos de autoridades com inteligência e bom senso para saber quais os projetos adequados à nossa realidade. A desordem está aí no trânsito caótico, nas ruas e estradas esburacadas, nos meios de transportes ruins, no patrimônio histórico abandonado, no espaço público privatizado.

Os problemas da cidade, que hoje faz parte da região metropolitana com mais doze municípios agregados à grande Manaus, são maiores pois a população agora passa dos dois milhões e duzentos mil habitantes com mais de 60 bairros ou comunidades só na capital. Francisco Praciano é contra a privatização da água e espera que seja feito um plebiscito sobre a questão do retorno desse serviço para o Amazonas. Nem sabemos mais direito quem manda nesse tão prioritário serviço. Segundo o deputado os experientes franceses abandonaram as bombas dágua que estão agora nas mãos dos paulistas. Assim como o porto que depois de haver uma esculhambação total no romântico “rodway” com a privatização, parece que agora vai voltar para as mãos do governo federal. Ainda falando dos problemas da grande Manaus, Praciano considera que o “monotrilho não resolve e será um desastre” e que quanto aos transportes coletivos “o que falta é autoridade do governo municipal junto aos empresários”. Em relação a atual administração da cidade garante que serão “quatro anos perdidos”.

Ainda em relação à ponte que é o assunto do momento, esperamos que traga um pouco de facilidade no transporte das pessoas que vivem do outro lado do rio e que seja de fato um presente à sociedade. O que se vê, aliás, é que os “pais da ponte” são muitos, alguns vieram de longe, ofegantes já tão desacostumados com o calor tórrido do sertão e do Amazonas mas bem presentes na hora do discurso e da festa. Esperamos colher “bons frutos” com a ponte Rio Negro pois a terra de lá é pródiga e floresce de tudo que é bom mas temos que ter cuidado pois além da beleza e da fertilidade temos a história de nossos ancestrais sob aqueles solos ainda pouco estudados.

Se veio para melhorar a situação de nosso povo que seja bem-vinda mas não esqueçam de que, apesar de estar muito bem paga, o pedágio mais tarde é uma enorme possibilidade.

Povo Feliz - Infelizmente não foi possível a publicação da minha crônica no dia 24 de outubro como eu gostaria. Apesar do título de metrópole, Manaus ainda não dispõe de serviços eficientes, que em qualquer pequena cidade do mundo já são considerados corriqueiros. No meu pequeno quadrante onde moro e apesar de pagar caro, fiquei sem telefone fixo, televisão e internet e não pude enviar o texto a tempo. Por um lado foi bom pois pude ver a reação do povo durante a inauguração da ponte Rio Negro e descrever os primeiros números.

Não estive na festa mas a coisa foi do jeito que previa. Uma invasão popular com as pessoas querendo a todo custo tocar na ponte, se deleitar e aproveitar aqueles primeiros momentos históricos. Gente de lá e de cá, famílias inteiras, corriam numa felicidade só e digo que pareciam pintos na ponte. Meu medo era que alguém quisesse dar o primeiro mergulho lá do alto. Os números dos jornais (como sempre desencontrados) dão conta de que entre 50 e 90 mil pessoas circularam na ponte nesse primeiro dia.

Podemos dizer que desceu toda a população do município irandubense que é de pouco mais de 40 mil seres e o restante (quase na mesma proporção) eram de manauaras e agregados que ansiavam por mais este point ou melhor ponte, para dar umas voltinhas nas cálidas noites enluaradas. Cinco mil carros abriram o tráfego de Iranduba para Manaus. Alguns ousados já fizeram a travessia a pé marcando 35 minutos para isso ou seja muito menos do que se levava para fazer o trajeto de balsa que agora é coisa do passado. Não sei vocês mas tenho só uma observação a fazer: com tanto dinheiro investido não dava pra fazer um pouquinho mais larga essa ponte e incluir logo as modernas ciclovias? Bem, nem tudo é perfeito...

(*) É jornalista, escritora e articulista do NCPAM/UFAM.

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