sábado, 27 de outubro de 2012


MEU FUTURO, MINHA VIDA

Ellza Souza (*)

Não tem como ficar neutro numa eleição como a de 2012 para prefeito em Manaus. No começo da campanha até olhava a candidata com bons olhos. Com o tempo percebi que aquele olhar não se dirigia a mim, cidadã. Com os debates na televisão comecei a prestar atenção não só naquele olhar feminino e plácido mas em toda a sua face, em sua expressividade, em suas palavras, nos detalhes de olhos e bocas. Não gostei do retrato resultante das minhas observações.

No último debate fiquei de olhos vidrados  nos candidatos. O candidato vestia-se com uma camisa branca impecável que, segundo ele, simbolizava a paz. A candidata com uma também impecável blusa verde, não disse, mas pela sua face e suas palavras belicosas, presumo que estava vestida para brigar até o último momento e a cor poderia representar a esperança. Estavam bem vestidos e tensos e o tempo não possibilitava maiores informações sobre as propostas que eventualmente, entre as farpas, poderiam apresentar. Mas, sem sombra de dúvida, deu para perceber a idiossincrasia de cada um.

Em todos os debates que assisti a candidata perdeu. Pela sua insistência em se referir a pessoas fora do contexto naquele momento. Pela sua insistência em querer puxar briga e se referir ao adversário como se ele fosse o responsável pela bagunça na cidade. A candidata, que eu saiba, está com todos os poderes ao seu lado. Federal, na pessoa da própria “presidenta” que veio dar aquela força pessoalmente. Estadual, na pessoa do nosso governador que prometeu parcerias e agrados a candidata. Municipal que, se não aparece agora o apoio mas em outras circunstânscias já houve essa cumplicidade. Até ex-sindicalista (votos dos trabalhadores e pobres) ou ex-presidente  (votos dos ricos) deu uma mãozinha . Não sei por qual motivo o marqueteiro não percebeu que não era esse o caminho. O engraçado é que as falas dos candidatos desse “time” (assim a candidata se referiu ao seu poderoso grupo de apoio) se pareciam, tanto aqui quanto na capital paulista. Gabando-se disse: “Eu represento aquele grupo que tem ajudado o país” e citou alguns projetos federais como Minha casa Minha vida como “leis do nosso time”. Eu que não aprecio futebol não gostei desse negócio de time.

Em algumas ocasiões a candidata fazia propaganda e esquecia das propostas. “Vote 65”. Mas os políticos agora são assim. No afã de ganhar esquecem de planejar. E prometem de um tudo. Todos os problemas de Manaus serão resolvidos, segundo as promessas dos candidatos. Qualquer um sabe que é impossível sanar todos pois o abandono de nossa ex-cidade promovida hoje a metrópole é latente e gigantesco. Numa oportunidade a candidata salientou sua visão de futuro: “Quero transformar Manaus e sei que não vou conseguir em um só mandato”. Numa tentativa de amenizar as farpas, o candidato pergunta o que a enternece na educação. “Tudo me enternece”, globaliza a candidata após prometer as bem-faladas creches que esperamos sejam criadas por qualquer um dos eleitos. E confusa disse “não estou entendendo o que ele vai fazer quando chegar na Prefeitura” (ops...). “Ora diz uma coisa ora diz outra”. O candidato diz que vai fazer uma “reforma administrativa”, realocando pessoas e promovendo concursos. Enxugar a máquina deveria ser a proposta dos dois mas me pareceu que a candidata vê a lei de responsabilidade fiscal como algo que impede o crescimento econômico. E pregou uma outra vertente de “responsabilidade social” (mais votos) com plano de cargos e salários para a máquina inchada. A responsabilidade tem que ser fiscal e social. Os gastos e desvios excessivos das verbas públicas podem levar qualquer país à bancarrota.

Saindo desse espinhoso assunto pois como economizar com tantas promessas? Passou-se ao tema “água” ou a falta dela na cidade e de esgoto (que não temos mas pagamos assim mesmo). O candidato diz que “ou a empresa se adequa ou sai de Manaus” e repetindo uma obra que marcou sua gestão anterior vai “retomar o trabalho de saneamento básico”. Engraçado é que mesmo sendo uma obra importante, as críticas davam conta de que ele estava “enterrando votos”.

O candidato pergunta sobre  a violência aos idosos. A candidata prontamente diz: “Vou cuidar dos idosos”, das crianças, dos jovens. “Vou cuidar das pessoas como nenhum prefeito nunca cuidou”. Para isso fará todo tipo de centros de convivência e espaços de lazer. “Idoso não fica mais em filas no atendimento médico”. Acho que o problema não é o tempo na fila mas a agilidade, eficiencia do atendimento e profissionais capacitados e bem remunerados. O candidato pergunta sobre os indios urbanos. E a resposta “com o apoio do governo federal vou qualificá-los para que produzam seus artesanatos”. “Vou tratá-los com dignidade como nenhum desses prefeitos os tratou”. “Eu peço o seu voto no próximo domingo”. A candidata tentou um venenozinho contra os membros da Assembléia de Deus: “Ele desrespeitou os líderes da Assembléia de Deus chamando-os de caciques”, o que considero, se verdadeiro, um elogio. No Amazonas quem não é cacique é indio e disso devemos nos orgulhar.

Me chamou a atenção o projeto do candidato para o centro da cidade: “Vou virar a cidade de frente para o rio”; “revitalizar a praça da Matriz”. E continuou falando o que todo manauara quer ouvir quanto ao nosso berço histórico: um centro prazeiroso de andar, iluminação adequada, lojas abertas à noite. Eu sugiro ainda uma bela de uma padaria por ali. Acho que acabar com mordomias, boquinhas, enxugar a máquina administrativa como prometeu o candidato, é bom para todos. “Vamos colocar a Santa Casa de Misericórdia para funcionar” aproveitando um bom projeto de um antigo adversário seu e que ora lhe apoia. As boas idéias se aproveitam. Os bons projetos têm continuidade. Esqueceram de falar, talvez por falta de tempo, do Mercado Adolpho Lisboa, da Biblioteca Pública, do Museu do Porto e outros mas espero estar na vontade dos dois no momento que pensarem na revitalização do centro da cidade.

E entre farpas e apertos de mão o debate chegou ao fim. Às vezes precisamos agir com severidade principalmente quando se trata da coisa pública. O importante é não perder o viés democrático da escolha bem pensada e baseada na leitura, no debate e no bom senso. Essa preciosa liberdade de votar num ou noutra é vital para o nosso crescimento econômico e social. E disso não podemos abrir mão. Precisamos sim abrir bem os olhos para quem quer que venha a governar a cidade de Manaus, inculta, bela e precisando urgente de um bom prefeito ou prefeita.

(*) É escritora, jornalista e articulista do NCPAM/UFAM.

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