MEU FUTURO, MINHA VIDA
Ellza Souza (*)
Não tem como ficar neutro numa eleição como a de
2012 para prefeito em Manaus. No começo da campanha até olhava a candidata com
bons olhos. Com o tempo percebi que aquele olhar não se dirigia a mim, cidadã.
Com os debates na televisão comecei a prestar atenção não só naquele olhar
feminino e plácido mas em toda a sua face, em sua expressividade, em suas
palavras, nos detalhes de olhos e bocas. Não gostei do retrato resultante das
minhas observações.
No último debate
fiquei de olhos vidrados nos candidatos. O candidato vestia-se com
uma camisa branca impecável que, segundo ele, simbolizava a paz. A candidata
com uma também impecável blusa verde, não disse, mas pela sua face e suas
palavras belicosas, presumo que estava vestida para brigar até o último momento
e a cor poderia representar a esperança. Estavam bem vestidos e tensos e o
tempo não possibilitava maiores informações sobre as propostas que
eventualmente, entre as farpas, poderiam apresentar. Mas, sem sombra de dúvida,
deu para perceber a idiossincrasia de cada um.
Em todos os
debates que assisti a candidata perdeu. Pela sua insistência em se referir a
pessoas fora do contexto naquele momento. Pela sua insistência em querer puxar
briga e se referir ao adversário como se ele fosse o responsável pela bagunça
na cidade. A candidata, que eu saiba, está com todos os poderes ao seu lado.
Federal, na pessoa da própria “presidenta” que veio dar aquela força
pessoalmente. Estadual, na pessoa do nosso governador que prometeu parcerias e
agrados a candidata. Municipal que, se não aparece agora o apoio mas em outras
circunstânscias já houve essa cumplicidade. Até ex-sindicalista (votos dos
trabalhadores e pobres) ou ex-presidente (votos dos ricos) deu uma
mãozinha . Não sei por qual motivo o marqueteiro não percebeu que não era esse
o caminho. O engraçado é que as falas dos candidatos desse “time” (assim a
candidata se referiu ao seu poderoso grupo de apoio) se pareciam, tanto aqui
quanto na capital paulista. Gabando-se disse: “Eu represento aquele grupo que
tem ajudado o país” e citou alguns projetos federais como Minha casa Minha vida
como “leis do nosso time”. Eu que não aprecio futebol não gostei desse negócio
de time.
Em algumas
ocasiões a candidata fazia propaganda e esquecia das propostas. “Vote 65”. Mas
os políticos agora são assim. No afã de ganhar esquecem de planejar. E prometem
de um tudo. Todos os problemas de Manaus serão resolvidos, segundo as promessas
dos candidatos. Qualquer um sabe que é impossível sanar todos pois o abandono
de nossa ex-cidade promovida hoje a metrópole é latente e gigantesco. Numa
oportunidade a candidata salientou sua visão de futuro: “Quero transformar
Manaus e sei que não vou conseguir em um só mandato”. Numa tentativa de
amenizar as farpas, o candidato pergunta o que a enternece na educação. “Tudo
me enternece”, globaliza a candidata após prometer as bem-faladas creches que
esperamos sejam criadas por qualquer um dos eleitos. E confusa disse “não estou
entendendo o que ele vai fazer quando chegar na Prefeitura” (ops...). “Ora diz
uma coisa ora diz outra”. O candidato diz que vai fazer uma “reforma
administrativa”, realocando pessoas e promovendo concursos. Enxugar a máquina
deveria ser a proposta dos dois mas me pareceu que a candidata vê a lei de
responsabilidade fiscal como algo que impede o crescimento econômico. E pregou
uma outra vertente de “responsabilidade social” (mais votos) com plano de
cargos e salários para a máquina inchada. A responsabilidade tem que ser fiscal
e social. Os gastos e desvios excessivos das verbas públicas podem levar
qualquer país à bancarrota.
Saindo desse
espinhoso assunto pois como economizar com tantas promessas? Passou-se ao tema
“água” ou a falta dela na cidade e de esgoto (que não temos mas pagamos assim
mesmo). O candidato diz que “ou a empresa se adequa ou sai de Manaus” e
repetindo uma obra que marcou sua gestão anterior vai “retomar o trabalho de saneamento
básico”. Engraçado é que mesmo sendo uma obra importante, as críticas davam
conta de que ele estava “enterrando votos”.
O candidato
pergunta sobre a violência aos idosos. A candidata prontamente diz:
“Vou cuidar dos idosos”, das crianças, dos jovens. “Vou cuidar das pessoas como
nenhum prefeito nunca cuidou”. Para isso fará todo tipo de centros de
convivência e espaços de lazer. “Idoso não fica mais em filas no atendimento
médico”. Acho que o problema não é o tempo na fila mas a agilidade, eficiencia
do atendimento e profissionais capacitados e bem remunerados. O candidato
pergunta sobre os indios urbanos. E a resposta “com o apoio do governo federal vou
qualificá-los para que produzam seus artesanatos”. “Vou tratá-los com dignidade
como nenhum desses prefeitos os tratou”. “Eu peço o seu voto no próximo
domingo”. A candidata tentou um venenozinho contra os membros da Assembléia de
Deus: “Ele desrespeitou os líderes da Assembléia de Deus chamando-os de
caciques”, o que considero, se verdadeiro, um elogio. No Amazonas quem não é
cacique é indio e disso devemos nos orgulhar.
Me chamou a
atenção o projeto do candidato para o centro da cidade: “Vou virar a cidade de
frente para o rio”; “revitalizar a praça da Matriz”. E continuou falando o que
todo manauara quer ouvir quanto ao nosso berço histórico: um centro prazeiroso
de andar, iluminação adequada, lojas abertas à noite. Eu sugiro ainda uma bela
de uma padaria por ali. Acho que acabar com mordomias, boquinhas, enxugar a
máquina administrativa como prometeu o candidato, é bom para todos. “Vamos
colocar a Santa Casa de Misericórdia para funcionar” aproveitando um bom
projeto de um antigo adversário seu e que ora lhe apoia. As boas idéias se
aproveitam. Os bons projetos têm continuidade. Esqueceram de falar, talvez por
falta de tempo, do Mercado Adolpho Lisboa, da Biblioteca Pública, do Museu do
Porto e outros mas espero estar na vontade dos dois no momento que pensarem na
revitalização do centro da cidade.
E entre farpas e
apertos de mão o debate chegou ao fim. Às vezes precisamos agir com severidade
principalmente quando se trata da coisa pública. O importante é não perder o
viés democrático da escolha bem pensada e baseada na leitura, no debate e no
bom senso. Essa preciosa liberdade de votar num ou noutra é vital para o
nosso crescimento econômico e social. E disso não podemos abrir mão. Precisamos
sim abrir bem os olhos para quem quer que venha a governar a cidade de Manaus,
inculta, bela e precisando urgente de um bom prefeito ou prefeita.
(*) É
escritora, jornalista e articulista do NCPAM/UFAM.
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