sábado, 2 de julho de 2011

A NOÇÃO DE CULTURA NAS CIÊNCIAS SOCIAIS

Aquiles Pinheiro (*)

A noção de cultura é inerente à reflexão das Ciências Sociais. Ela é necessária, sobretudo para pensarmos a unidade da humanidade na sua diversidade, para além da sua unidade genética, ou seja, se em termos biológicos, a humanidade é una, o mesmo não acontece com relação aos seus modos de vida e de crença. Com efeito, o conceito de cultura torna-se necessário para explicar de forma mais satisfatória a questão da diferença entre os povos, uma vez que a resposta fornecida pelo conceito de “raça” foi desacreditada pelo espetacular avanço dos estudos da genética humana.

As Ciências Sociais parte do pressuposto de que o homem é essencialmente um ser de cultura, resultado de um longo e sofrível processo de “hominização” iniciado há aproximadamente quinze milhões de anos. Esse processo, no decorrer do qual houve a passagem de uma adaptação genética ao ambiente natural a uma adaptação cultural, consistiu numa formidável regressão ou supressão dos instintos que foram sendo progressivamente substituídos pela cultura.

Esta adaptação imaginada e controlada pelo homem se mostraria mais funcional que a adaptação genética por ser muito mais flexível mais fácil e rapidamente transmissível as gerações futuras. A cultura permite ao homem não somente adaptar-se a seu meio, mas também adaptar este meio a si próprio, as suas necessidades e seus projetos (individuais ou coletivos). Em suma, “a cultura torna possível a transformação da natureza”.

Prova insofismável da eficácia da cultura na “domesticação dos instintos” e transformação da natureza, é o fato de que, ainda que as “populações” humanas possuam a mesma carga genética, elas se diferenciam por suas escolhas culturais, ou seja, pelas soluções originais que cada uma dá aos problemas que lhe são colocados. Entretanto, tais diferenças não são irredutíveis umas às outras, pois considerando a unidade genética da humanidade e a suposta e controvertida “unidade do psiquismo humano” (E. B. Tylor [1832-1917]), elas representam aplicação de princípios culturais universais suscetíveis a transformações.

A noção de cultura serve, portanto, para desconstruir as explicações “naturalizantes” dos comportamentos humanos. Isto implica dizer que “a natureza do homem é inteiramente interpretada pela cultura”. Nada é puramente natural no homem. Mesmo as necessidades fisiológicas, como a fome, o sono, o desejo sexual entre outros, não podem ser jamais compreendidas em seu “estado bruto” (natural), isto porque a(s) cultura(s) se apropria(m) imediatamente delas, orientando e informando os diferentes modos de satisfação de tais necessidades. Em outras palavras, as sociedades não dão exatamente as mesmas respostas às necessidades fisiológicas do homem.

Se por um lado, as pesquisas sobre sociedades extremamente diversas trouxeram a tona uma certa coerência simbólica (jamais absoluta, no entanto) do conjunto das práticas (sociais, políticas, econômicas, religiosas, etc.), seja de uma coletividade particular seja de um grupo de indivíduos. Por outro lado, os estudos sobre o encontro de culturas distintas, demonstram que estes encontros se realizam segundo modalidades muito variadas e leva a resultados extremamente contrastantes segundo as situações de contato.

Assim sendo, a noção de cultura conquanto se aplique unicamente ao que é humano, oferece a possibilidade de enfrentarmos o maior desafio das Ciências Sociais, em particular da Antropologia, que é explicar a unidade do homem na diversidade de seus modos de vida e de crenças, enfatizando, de acordo com os pesquisadores, a unidade ou a diversidade. A trama do texto está baseado na introdução do livro: “A Noção de Cultura nas Ciências Sociais” de autoria de Denys Cuche. São Paulo: EDUSC, 2002, p. 9-13.

(*) É pesquisador do NCPAM e pós-graduando de Antropologia na UFAM.

Um comentário:

Anônimo disse...

O POVO QUER E NELE CONFIA TPL JA