sábado, 10 de dezembro de 2011

AS VARAS TORTUOSAS DA JUSTIÇA PARA EFETIVAÇÃO DO DIREITO DO "ENCONTRO DAS ÁGUAS"

Ademir Ramos (*)

Impor o ônus da prova naqueles que afirmarem que a atividade proposta não causará dano significativo e fazer com que as partes interessadas sejam responsabilizadas pelo dano ambiental.

Este preceito legítimo integra o corpo de postulado da Carta da Terra, instrumento de Direito Internacional traduzido para 40 línguas e subscrita por 4.600 organizações, representando os interesses de centenas de milhares de pessoas. A compreensão deste universo requer dos operadores da Justiça a construção de uma nova ordem pautada nas garantias efetivas de que a terra e os recursos ambientais também são protagonistas do Direito, a reclamar proteção da Sociedade e do Estado frente às ameaças e os desmandos sofridos.

A batalha jurídica em disputa no Tribunal Federal do Amazonas para se garantir o Direito do Encontro das Águas, dos Rios Negro e Solimões, como sujeito de Direito, tem sido tortuosa por abrigar em si múltiplos interesses particulares que muitas vezes, quase sempre, contrariam a vontade geral chancelada pelo interesse público.

A marcha desta vontade começa com as manifestações do Movimento S.O.S. Encontro das Águas, criado em setembro de 2008, por lideranças comunitárias da Colônia Antonio Aleixo, Zona Leste de Manaus, com a participação de religiosos, professores, pesquisadores, escritores, estudantes, donas de casa e demais representantes da sociedade organizada, buscando defender a integridade deste patrimônio cultural e natural do povo do Amazonas, contra a pretensa construção do Terminal Portuário das Lajes sob o mando das empresas Log-In Logística Intermodal S/A, Juma Participações S/A, Lajes Logística S/A, com aval do Governo do Amazonas.

Um dos marcos importantes da manifestação popular contra a construção do Porto das Lajes registrou-se em 19 de novembro de 2008, na Audiência Pública realizada na Quadra poliesportiva da Colônia Antonio Aleixo, convocada pelo Instituto de Proteção Ambiental do Estado do Amazonas (IPAAM), para que fossem apresentados aos comunitários os Estudos Prévios de Impacto Ambienta (EPIA) e o respectivo Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) relativos ao empreendimento do Porto das Lajes. Na oportunidade, os moradores da Colônia Antonio Aleixo, somados em mais de 500 pessoas, manifestaram-se contra a construção do Porto no frontal do Encontro das Águas.

AÇÃO CIVIL DO MPF, DE JULHO 2010

O Movimento S.O.S. Encontro das Águas tem no Ministério Público Federal (MPF) um dos aliados mais importantes nesta luta pelo Direito, visto que o então Superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), Juliano Valente era pautado pelos interesses privados sob a ordem do Deputado petista do Amazonas, Sinésio Campos. Por isso, recorreu-se ao MPF para que operasse juridicamente em favor do Tombamento do Encontro das Águas, o que é feito por meio de uma Ação Civil com Pedido de Liminar de Antecipação da Tutela, datada de 23 de julho de 2010.

Na peça apresentada, o MPF advoga que “independentemente da concretização do ato administrativo de tombamento pelo IPHAN, provisório ou definitivo, objetiva-se nesta ação civil pública que o próprio Poder Judiciário reconheça o valor histórico, cultural, paisagístico e estético do Encontro das Águas, impondo restrições a seu uso e a construção do empreendimento (Porto das Lajes) no local”.

Para esse fim, o MPF recorre a Informação Técnica 04/2009/IPHAN fundamentando cientificamente o objeto da Ação. Com a mesma determinação vale-se também do Relatório do Ministério da Minas e Energia, Serviço Geológico do Brasil (fls. 145 IPHAN – Anexo I) para dar relevância ao conceito como um “fenômeno resultante da união desses dois cursos d’água, no caso rio Solimões, águas classificadas como brancas, com o rio Negro, de águas classificadas como pretas e que surge o Encontro das Águas, onde as águas não se misturam por longo trecho, se tornando um dos pontos turísticos mais visitados da capital”.

O QUE REQUER O MINISTÉRIP PÚBLICO FEDERAL

Pelo exposto, o MPF reclama da Justiça Federal reconhecimento quanto à extensão do Encontro das Águas centrado em seu valor cultural, arqueológico, paleontológico, geológico, estético e paisagístico deste monumento natural como patrimônio cultura brasileiro. A proposta do Tombamento tem como limites as ilhas de Xiborena, e Marapatá, inclusive, a costa da Terra Nova, no município do Careiro da Várzea na Vila do Careiro até o farol, situado no Rio Amazonas e deste, em diagonal, até o limite da restinga do Lago do Aleixo, último igapó da margem esquerda do Rio Negro, situado à jusante do Encontro das Águas, incluindo toda a restinga, a área de proteção permanente ao longo da margem esquerda do Rio Negro, incluindo a RPPN Daisaku Ikeda, o “mirante da Embratel” e dali, evitando a zona urbana de Manaus, seguindo em diagonal até a ilha de Marapatá, a ser ulteriormente georreferenciada com a indicação de suas coordenadas geográficas, como forma de tutelar o meio ambiente cultural e paisagístico, em harmonia com os princípios da preservação, da promoção ambiental para as presentes e futuras gerações.

TOMBAMENTO PROVISÓRIO, NOVEMBRO DE 2010

De Brasília, o Presidente do IPHAN, Luiz Fernando de Almeida, tomou para si a coordenação dos trabalhos sobre o Tombamento Provisório do Encontro das Águas. Para isso fez publicar no Diário Oficial da União, do dia 11 de outubro de 2010, a Notificação à Respeito do Tombamento do Encontro das Águas dos Rios Negro e Solimões no Estado do Amazonas, seguindo coordenadas geográficas bem diferentes das que foram apresentadas pelo MPF junto à Justiça Federal no Amazonas. Assim sendo, em cumprimento a notificação, nos termos do Edital de Tombamento n. 1.599-T-10 (processo n. 01450.015766/20009-08), o Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural do IPHAN resolveu aprovar o parecer do conselheiro Eduardo Góes Neves, no dia 04 de novembro, a favor do Tombamento Provisório do Encontro das Águas.

IPHAN E MPF sem nenhuma interlocução faz com que Ação Civil Pública com Pedido Liminar de Antecipação de Tutela, de julho de 2010, prossiga seu curso processual requerendo da 7ª Vara da Justiça Federal no Amazonas DECISÃO de ordem do senhor Juiz Federal, DIMIS DA COSTA BRAGA, datada de 30 de setembro de 2011.

A MÃO DO GOVERNO DO ESTADO

De imediato, no dia 17 de janeiro de 2011, o governador Omar Aziz, manifestou-se contrário ao Tombamento do Encontro das Águas, movendo junto à Justiça Federal, Ação Ordinária de Anulação de Processo Administrativo de Tombamento com Pedido de Antecipação dos efeitos da Tutela. A SENTENÇA foi proferida no dia 04 de agosto de 2011, de autoria do Dr. DIMIS DA COSTA BRAGA, nos seguintes termos:

“Ante o exposto, julgo parcialmente procedente os pleitos requeridos pelo autor (Governo do Amazonas), nos termos do artigo 269, I, do CPC, para anular o Procedimento nº 1.599-T-10 – Tombamento do Encontro das Águas dos Rios Negro e Solimões, no Estado do Amazonas, tão somente com efeitos a partir do ato que decidirá pelo Tombamento Provisório, inclusive, até que sejam realizadas as audiências públicas, pelo menos uma em cada município diretamente afetados, nos termos da fundamentação, conforme art. 32 e seguintes da Lei 9.784/99, bem como viabilizadas consultas públicas na forma aludidas no artigo 31 e seguintes da Lei 9.784/99”.

Na mesma onda, amparado nos gradientes fundamentalista, como refém da Caverna de Platão, o operador da Justiça, DIMIS COSTA BRAGA decide pelo julgamento da Ação Civil Pública com Pedido Liminar de Antecipação de Tutela, de autoria do MPF do amazonas. Note bem, Ação data do dia 23 de julho de 2010, a DECISÃO DO JUIZO é de 30 setembro de 2011, quando impõe a MPF o ônus da prova. Assim:

“Requer o MPF a produção de prova pericial multidisciplinar, a ser realizada por arquiteto, geógrafo, geólogo, antropólogo, arqueólogo, e paisagista [...]. Sendo assim nomeio os seguintes peritos.”

Para esse fim, assentado em suas convicções, o Magistrado Federal resolveu designar datas e horas para Audiências de Instrução que, segundo ele tem por objetivo “organizar a perícia multidisciplinar a ser realizada, fixação dos pontos controvertidos, honorários periciais, e definição dos quesitos das partes”.

ENCAMINHAMENTO

No dia 13 de outubro, por ordem do Magistrado Federal, realizou-se a primeira Audiência de Instrução que depois de ouvir razões e contra-razões das partes resolveu remarcar para o dia 16 de novembro a próxima Audiência, que por sua vez também pouco ou nada decidiu quanto à celeridade da Justiça, ficando acordado entre as partes que no dia 25 de janeiro de 2012, às 9h voltariam a se reunir para cumprir a seguinte ordem: que as partes apresentem no prazo de 10 (dez) dias, a indicação de quesitos e assistentes técnicos para a perícia; que os peritos apresentem por ocasião da audiência sua proposta de honorários; a proposta será elaborada por cada perito, individualmente, porém, deverá ser apresentada de forma conjunta, com as especificações feitas por cada profissional, no dia da audiência marcada em pauta. Ainda mais, o MPF e a UNIÃO requereram o prazo comum de 5 (cinco) dias para se manifestarem acerca da inclusão do Estado do Amazonas na qualidade de assistente litisconsorcial, o que fora DEFERIDO.

ATENÇÃO REDOBRADA

Na próxima Audiência de Instrução, no dia 25 de janeiro às 9h, no prédio da Justiça, situada na Av. André Araujo, 25, Aleixo, os militantes do Movimento Socioambiental S.O.S. Encontro das Águas deverão estar presentes para monitorar os procedimentos periciais e junto com os MPF e os advogados da UNIÃO definir alguns instrumentos reparadores quanto aos Pontos Controvertidos e principalmente referentes aos Quesitos formulados por Dr. DIMIS COSTA BRAGA, inibindo ou não as práticas dos especialistas a serem contratados.

A coordenação da pericia, nomeada pelo Magistrado Federal, está sob a direção do professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Amazonas, Dr. NELCIONEY JOSÉ DE SOUZA ARAUJO. Quanto aos Pontos Controvertidos e os Quesitos apresentados é bom lembrar que cada perito tem autonomia para se manifestar e formular a sua proposta de trabalho, não se deixando abater pelo imperativo do dito que muitas vezes contraria o fato jurídico na totalidade.

Da nossa parte contestamos a formulação do Quesito direcionado. Visto que no final de cada bloco de Quesito o Juiz DIMIS COSTA BRAGA tenha direcionado a favor da construção do Porto das Lajes, vejamos: Arquitetura – O projeto de arquitetura relativo ao empreendimento portuário de grande porte de que trata os autos seria compatível como fenômeno natural do Encontro das Águas dos Rios Negro e Solimões. Geografia – Existem, nas proximidades da área, atividades de grande impacto ambiental? Em caso positivo de que maneira ela influenciam a dinâmica geográfica da região? e assim prossegue o dirigismo ordenado pelo Magistrado.

A GARANTIA DO TOMBAMENTO

A luta pelo Direito não pode esquecer que o fim último é a efetivação da Justiça. Por isso, devemos está atento a respeito da Perícia porque pode ser uma forma de desqualificar o Tombamento Provisório ou quem sabe permitir também que se discuta a ampliação dos marcos do Tombamento, redimensionando as coordenadas nos termos da Ação Civil Pública apresentada pelo MPF. Pergunta-se: Quais são as coordenadas que irão nortear o trabalho dos peritos no campo? – Esta questão é sem dúvida o objeto da próxima Audiência, assim como também, o tempo e o modo de trabalho dos peritos? Na seca ou na cheia das águas são procedimentos diferentes variando também as coordenadas.

Saiba que o Tombamento Provisório do nosso Encontro das Águas está garantido por força da DECISÃO do Presidente do Tribunal Regional Federal da Primeira Região de Brasília, Desembargador OLINDO MENEZES, que no dia 29 de setembro de 2011 lavrou a seguinte SENTENÇA: “Defiro em parte a suspensão pleiteada tão somente quanto aos efeitos do tombamento provisório, que fica mantido para todos os efeitos legais [...].

(*) É professor, coordenador do NCPAM/UFAM e membro do Movimento S.O.S. Encontro das Águas.

Um comentário:

ITAMAR FEITOSA disse...

Nao e verdade,nesse dia nao tinha 500 pessoas,segundo nossa comunidade nunca foi contra a construçao do tpl,terceiro queremos que este empreendimento se instalhe o mas rapido possivel e outra nao vai prejudicar o encontro das aguas,eu seria o primeiro a ser contra.