quarta-feira, 11 de julho de 2012


COISA DE DOIDO

Ellza Souza (*)

              É tênue demais a linha que separa a sanidade da loucura. No balcão o olhar da atendente denota medo, frieza e até arrogância. Naquele local de tanta beleza e história as pessoas procuram desesperadas um calmante para suas agruras, para o seu desconforto, para as suas moléstias nem sempre físicas. Fui ao hospital resolver um problema e fiquei a observar o tratamento destinado aos doentes e seus parentes. Bem cedo já havia tido uma confusão com imprensa e tudo que certamente tentava mostrar à sociedade as mazelas do ambulatório situado no hospício que está sendo desativado no dia 16 próximo. Dizem que continua no antigo casarão do século XIX, o atendimento a casos graves e a permanência dos doentes residentes. Até, quem sabe, morrer o último doente e aí então zera tudo. Ou continua bem longe dali.

E me pergunto do alto da minha banda que considero sã. Para onde vão essas pessoas tão abandonadas, tão esquecidas, tão necessitadas de políticas públicas? A impressão que tenho é que essas pessoas estão sendo  pulverizadas, tiradas da cena da copa do mundo e o atendimento, segundo se ouve por aí será nas policlínicas distribuídas em alguns bairros. Como sei o que é atendimento público nas unidades de saúde e policlínicas, já imagino o patamar de dificuldades e sofrimento que espera essas criaturas. Uma testemunha de uma dessas policlínicas avisa que o atendimento é “péssimo” e eu acredito nisso porque também fui testemunha de uma delas, que  inaugurada há pouco tempo é tão ineficiente em relação ao atendimento de certos profissionais. Não funciona e isso é fácil de constatar.

Meu coração ficou muito apertado de ver as condições precárias e a falta de tudo para um atendimento digno naquele lugar. A higiene é ruim e acredito que faz tempo aqueles corredores e salas não são lavados. Me encostei próximo aos banheiros e o cheiro não era dos mais agradáveis. No chão água ou mijo, sei lá. Muita gente, insatisfeita com o atendimento no balcão, queria  passar na porta onde o guarda tentava dar um pouco de consolo respondendo com bons modos a seres tão desesperadamente aflitos na busca de um médico ou de remédios ou mesmo de uma palavra de conforto.

Porque nossos governantes não usam da transparência e explicam de uma vez o que estão pretendendo fazer ali. Porque mais um hospital (o outro a Santa Casa de Misericórdia que infelizmente está longe da área futebolística) está sendo aos poucos desativado? Qual a verdadeira intenção que move essa atitude das autoridades? E pode perguntar que ninguém responde. Nem os frondosos taperebazeiros que enfeitam toda  a área do hospital e aquelas lindas frutinhas alaranjadas que caem pra valer na grama  numa determinada época, foram capazes de tocar o coração de nossos políticos quanto mais aquelas pessoas que se não eram loucas, ficam, com tanto descaso. Os quase 30 mil pacientes que procuraram tratamento no Centro Psiquiátrico Eduardo Ribeiro, este ano, estão completamente abandonados e perdidos neste mundo de corrupção e horror.

Quem se acha melhor que eles não atire a primeira pedra.

(*) É escritora, jornalista e articulista do NCPAM/UFAM.   

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