sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

MUDANÇA NECESSÁRIA

Em 2006, não havia diferença substancial nos programas dos dois grandes candidatos à Presidência da República e não haverá diferença entre os programas que se prevê para 2010, nenhuma inflexão em qualquer dos setores da sociedade brasileira. O Brasil precisa de uma inflexão que mantenha os acertos do passado, na responsabilidade fiscal, na existência de políticas sociais, na garantia das regras democráticas, na abertura comercial, na construção da infra-estrutura.

*Cristovam Buarque

Apesar de toda a crise, os EUA são um país com um rumo muito mais definido do que o Brasil. Mesmo assim, o novo presidente Obama tomou posse afirmando que seu país precisa de uma mudança de rumo. No Brasil, entretanto, de Collor a Lula foram cinco mandatos de um mesmo projeto nacional, sem qualquer ideia de uma reorientação de rumo. Todos demonstraram algumas diferenças de personalidade, ênfase e estilo, mas nenhuma substancial do ponto de vista dos rumos do País. Um mais generoso que outro nos aspectos sociais, um menos radical que outro na redução do papel do Estado, um mais competente que outro no combate à inflação. Mas cinco governos sem qualquer inflexão de rumo, nenhum futuro alternativo sendo construído.

É como se no Brasil o processo político da ditadura, tivesse sido substituído por um conjunto de sublegendas de um mesmo invisível partido que domina o processo político da democracia. O povo escolhe o próximo presidente de qualquer partido, desde que estes partidos sejam apenas sublegendas do Sistema.

Enquanto o PT propunha uma inflexão de rumo, o sistema não aceitava Lula, como não aceitou Brizola. Em 2006, não havia diferença substancial nos programas dos dois grandes candidatos à Presidência da República e não haverá diferença entre os programas que se prevê para 2010, nenhuma inflexão em qualquer dos setores da sociedade brasileira.

A observação dos resultados dos últimos anos mostra grandes acertos na continuidade das bases econômicas, na consolidação da democracia, na generosidade das políticas assistenciais; mas indica que perdemos terreno em um mundo global baseado na economia do conhecimento; que nossas cidades estão se degradando; a floresta amazônica sendo destruída; a violência crescendo; a desigualdade não apenas de renda, mas de qualidade de vida se ampliando. A economia se faz mais vulnerável às tendências de médio e longo prazos e o imediatismo e o corporativismo dominam cada vez mais as decisões políticas, agravando a perda do sentimento de pátria e nação.

O Brasil precisa de uma inflexão que mantenha os acertos do passado, na responsabilidade fiscal, na existência de políticas sociais, na garantia das regras democráticas, na abertura comercial, na construção da infra-estrutura.

Esta inflexão deve fazer com que não apenas ajudemos a indústria automobilística a vender mais automóveis, mas também que ela mude o perfil de seu produto; a inflexão deve tirar o Brasil da vergonhosa lentidão como enfrenta o problema educacional e ir além das Cotas, Fundef, Fundeb, Piso Salarial. É preciso fazer uma revolução que provoque o salto para em poucos anos a sociedade brasileira ser toda ela educada, criando a base para o funcionamento de diversos importantes centros científicos e tecnológicos de padrão mundial em todas as áreas; deve reorientar os programas baseados em bolsas-assistências para programas de transformação social mesmo que usando bolsas-transformadoras - como a bolsa-escola - ; ir além das pequenas avaliações do impacto ambiental e implantar um modelo econômico que cresça em equilíbrio com a natureza.

Para conseguir uma inflexão no Brasil é preciso uma inflexão na maneira como são escolhidos os candidatos: criar um turno anterior ao primeiro, as prévias; fazer com que o primeiro turno seja respeitado e não desconsiderado pela mídia que, antes mesmo das eleições, escolhe aqueles que irão ao segundo turno; e chegar ao segundo turno com propostas alternativas e não apenas a repetição do mesmo, em sublegendas do sistema.

*Cristovam Buarque é senador pelo PDT e professor pela UNB.

Artigo publicado no Jornal do Comércio, no dia 24 de janeiro de 2009

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