domingo, 5 de junho de 2011

O SISTEMA E A REFORMA POLÍTICA

Nesse campo não se pretende ser original. O que buscamos é promover a pesquisa e a discussão sobre o tema palpitante que circula no Congresso Nacional a respeito da Reforma Política. O recorte é sobre o Sistema Político e a questão da Democracia Participativa. É nessa perspectiva que reunimos os alunos de Ciências Sociais da Universidade Federal do Amazonas, do Curso de Introdução à Ciência Política, para se fazer uma oficina de trabalho visando compreender a problema e destacar alguns pontos para a crítica social. Desse esforço participaram os acadêmicos André Gustavo Rambalducci, Isabel Vieira Julie Baptista, Laryssa Rodrigues, Paloma Lima; Richardson Falcão e Thais Sallet, sob a orientação do professor Ademir Ramos. A discussão está posta e gostaríamos de ampliar o debate em Rede, registrando o posicionamento dos protagonistas sociais.

O sistema político, em sua acepção mais ampla, segundo Norberto Bobbio, no Dicionário de Política, refere-se a qualquer conjunto de instituições, grupos ou processos políticos caracterizados por certo grau de interdependência recíproca. Na ciência política contemporânea, todavia, quando se fala de Sistema político e de “análise sistêmica” da vida política, se faz referência a uma noção e a um procedimento de observação caracterizado por específicos requisitos metodológicos e por âmbitos precisos de uso.

O homem, como animal social, está sempre envolvido numa multiplicidade de relações, em virtude das quais ele condiciona os seus próprios semelhantes e é por estes condicionados. E qualquer agrupamento social há ao menos dois componentes fundamentais - de um lado, os indivíduos singulares, e do outro, os contextos que caracterizam a convivência recíproca dos indivíduos em agrupamentos sociais, devendo ser considerado sob um duplo aspecto: como uma constelação de membros e como uma rede de relações inter-individuais mais ou menos complexas, ambas observáveis unitariamente em termos de sistema.

O Brasil, assim dizendo, tem um sistema político pluripartidário que admite a formação legal de vários partidos. O partido político é uma associação voluntária de pessoas que compartilham os mesmos ideais, interesses, objetivos e doutrinas políticas, que tem como objetivo influenciar e fazer parte do poder político. Aqui procuramos destacar a forma de governo no Brasil e seus pontos principais em relação à Reforma Política, que tramita no Congresso Nacional.

Reforma Democrática

Anthony Giddens, um dos mais influentes teóricos da democracia, reafirma que se trata de “um sistema político no qual quem governa é o povo, e não os monarcas ou os aristocratas.” Existem dois tipos de democracia: a democracia participativa, em que as decisões são tomadas pelo coletivo e a democracia representativa, no qual as decisões são tomadas por representantes eleitos pelo povo.

Em 1945, o Brasil já tinha no cenário nacional três partidos políticos, ou seja, já era uma democracia representativa. Com a queda da ditadura, a democracia passou a ser o sistema político preferido de todos que buscavam igualdade política, a defesa do interesse comum, tomadas de decisões que levassem em conta os interesses de todos, proteção a liberdade e garantia dos direitos fundamentais. Nasce um vínculo em grande parte inédito entre direitos políticos e direitos econômico-sociais, um novo patamar de cidadania, mais abrangente e exigente.

Porém, o que nessa época parecia o início de uma “maravilhosa” forma de representação, hoje em dia é diferente, falta muito ao Brasil em termos de regime democrático em relação a garantia dos direitos sociais. Isso porque, não há regime político algum capaz de satisfazer a todos igualmente. Os representantes já não conseguem mais identificar e atender todas as demandas da sociedade. Devido a esses e outros estrangulamentos, além da questão democrática, o Senado da República tomou para si a iniciativa de promover uma reforma no Sistema Político Eleitoral, visando à construção de um sistema integrado de participação popular.

Controle Social

A participação efetiva da sociedade civil pressupõe um avanço na construção de uma sociedade democrática, que determina alterações profundas nas formas de relação do aparelho de Estado com o cidadão. Através da reforma é possível se modernizar os aparelhos de Estado, criando mecanismos capazes de viabilizar a integração dos cidadãos no processo de definição, implementação e avaliação da ação pública.

Por meio do controle social crescente será possível garantir serviços de qualidade, pois a partir do momento em que o Estado deixa de participar, passando apenas a promovê-los e gerenciá-los, buscará ao mesmo tempo, o controle social direto e a participação da sociedade.

Além disso, o controle social é uma forma de se estabelecer uma parceria eficaz e gerar a partir dela um compromisso entre poder público e população capaz de garantir a construção de saídas para o desenvolvimento econômico e social do país. Controle social pressupõe, igualmente, que haja descentralização do Estado em direção à sociedade, ou seja, a participação da população na gestão pública e a possibilidade do cidadão em controlar instituições e organizações
governamentais para verificar o bom andamento das decisões tomadas em seu nome.

Por isso, hoje, quando se fala em controle social, primeiramente ocorre à idéia de participação popular em nível municipal, por ser a esfera pública mais próxima dos problemas enfrentados pela comunidade.

A sociedade organizada e solidária exerce inúmeros importantes meios de controle social, como o direito à informação, a reivindicação de conselhos comunitários, a democratização do processo decisório sobre aplicação do orçamento, dentre outras ferramentas capazes de oferecer maior transparência à gestão pública e que contribuem para uma melhor qualidade dos serviços oferecidos diretamente aos cidadãos.

Organizações Sociais

Não existem modelos notáveis histórica ou teoricamente para pensar como organizações civis podem construir uma representatividade de índole política e por isso a questão tem recebido pouca atenção a despeito da sua crescente importância. Isso mostra que as dinâmicas de representação no terreno das organizações civis ocorrem em estreita conexão com os canais tradicionais da representação política, mais: ao lado de noções de representação que encarnam desarmonia, irreconciliáveis com a democracia, há evidências do surgimento de uma nova noção de representação propriamente política e compatível com a democracia no seio das organizações civis.

Em inúmeros países está se vivenciando uma abertura do poder Executivo à participação de atores societários – organizações civis– investidos juridicamente como representantes de determinados segmentos e interesses da população no desenho, na implementação e na supervisão de políticas públicas. De modo semelhante ao que aconteceu nas primeiras décadas do século XX, quando as instituições da representação política foram alargadas juntamente com a própria democracia, mediante a emergência dos partidos de massa, esses processos de reconfiguração da representação englobando o poder Executivo podem confluir para uma nova ampliação da democracia. Como as organizações civis estão a desempenhar de facto um novo papel ativo na representação política e tal papel é diferente ao desempenhado por partidos e sindicatos, isso cria dilemas acerca da sua representatividade. Em contraste com tais instituições, a grande maioria das organizações não utiliza mecanismos eleitorais para estabelecer sua representatividade, nem funciona sob a lógica de afiliação.

Não existem modelos para pensar como organizações civis podem construir uma representatividade de índole política por fora de tais mecanismos. Os atores, porém, não estão aguardando os teóricos. Uma diversidade de noções de representação, parcialmente construídas, encontra-se hoje no seio das organizações civis. Algumas dessas noções apresentam conteúdos compatíveis com o alargamento da democracia, outras têm conteúdos essencialmente antidemocráticos. O embate existe, principalmente, com as agremiações partidárias.

Partidos Políticos

O partido político é uma associação de direito privado, tendo em vista participar, de modo permanente, do funcionamento das instituições e buscar acesso ao poder, ou ao menos influenciar no seu exercício, para fazer prevalecer às idéias e interesses. Estas idéias e estes interesses reputados como os mais convenientes para a comunidade pretendem ser convertidos em lei ou em linhas de ação política de Governo. No regime democrático, são três as finalidades básicas do partido político:

I. Servir de agente catalisador de uma determinada corrente de opinião: Geralmente, há um grande grupo de pessoas, na comunidade, que pensa da mesma maneira sobre certo número de assuntos. No entanto, essas pessoas estão separadas, esse pensamento uniforme, não pode se transformar em ação, especialmente em ação política, que é capaz de fazer com que a orientação desejada termine sendo adotada como lei, como norma obrigatória para todos. É imperioso que haja um grupo mais nítido de pessoas, habilitado a orientar a todos os que pensam da mesma maneira, a fim de reunir suas opiniões e buscar expressá-las em votos, suficientes para levar seus representantes às atividades governamentais.

II. Selecionar e enquadrar os eleitos: A seleção inicial é feita quando são escolhidos os nomes dos candidatos aos postos eletivos, e que é procedida dentro do Partido, seja pelos seus membros de todos os matizes, seja apenas pelos seus líderes. Depois do resultado das eleições em que os candidatos de um partido normalmente disputam os lugares com os candidatos de outro ou outros partidos os eleitos deverão estar orientados para seguir e fazer transformar em leis as linhas mestras do programa que representa a orientação do partido. A maneira como o partido exige o comportamento daquele que foi eleito, em termos de disciplina e obediência às diretrizes programáticas, vai definir o aspecto da fidelidade partidária.

III. Educar e informar o eleitor: O partido tem como uma das suas finalidades maiores a de preparar o eleitor para a vida política, a fim de que este esteja sempre suficientemente informado sobre os problemas nacionais, para poder votar conscientemente e, por outro lado, poder exigir dos seus representantes eleitos uma ação firme de acordo com a orientação do próprio partido, em princípio fixada no seu programa. Cabe ao partido mostrar ao eleitor o que é relevante e prioritário ou não quanto às idéias e ações políticas.

Partido Político no Brasil


Primordialmente, os partidos políticos se organizaram como associações de direito comum. Não havia maior diferença entre eles e as demais associações de pessoas, a não ser a finalidade ou os objetivos. Um partido político era uma associação de pessoas com o objetivo de participar do processo político. Finalmente, surgiram leis específicas sobre os partidos políticos, leis que tratavam de sua organização, controle financeiro, propaganda partidária, etc. Aí, sim, os partidos políticos passaram a ter existência legal, de natureza própria, supervisionada pelo Poder Público.

Com a evolução no caminho de uma legalidade, os partidos passaram a ter sua existência consagrada nos textos constitucionais. Com isso, passaram os partidos políticos a serem efetivos canais de opinião pública; passou-se a exigir que houvesse apresentação de candidaturas partidárias, isto é, apenas candidatos inscritos por partidos políticos poderiam concorrer a cargos eletivos.

O período monárquico foi caracterizado pela existência de partidos nacionais, mas sem real militância nas suas bases, pois, para alguns pensadores políticos, o Brasil Império era uma “democracia coroada”, uma espécie de democracia original, pois não tinha eleitores. Na República, no seu período inicial (1889/1930), não houve mais partidos nacionais, porque toda a luta pelo poder se desenvolveu nos entendimentos e desentendimentos entre o Presidente da Nação e os Chefes dos Estados-Membros da Federação, cada um dos quais organizava e dirigia partidos estaduais. Entre 1930 e 1946 poucos partidos existiram, estes com duração limitada. Essa situação mudou com a entrada em vigor da Constituição de 1946, de notável teor democrático, quando se organizaram alguns partidos estruturados em função de certas idéias matrizes.

Foi a Constituição de 1988, ora vigente, que operou uma total reformulação do quadro partidário, com a pulverização dos partidos anteriores e o surgimento de novos, sempre de caráter nacional. Em razão do pluralismo político, um dos fundamentos da República Federativa do Brasil (Art. 1.º, V, da CF), surgiu os chamados mini-partidos, meras legendas vazias de efetivos eleitorais, ao lado de alguns partidos que, embora recém-fundados apresentavam eficiência na mobilização política, notadamente na eleição de 1989.

A atual Constituição Federal (CF), no seu artigo 17, contempla o partido político num capítulo próprio, dentro do Título II – DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS. Determina a CF, que a criação, alteração estrutural e dissolução de partido político é de inteira liberdade, exigindo apenas a obediência aos princípios fundamentais do sistema partidário inscritos na Constituição sob a supervisão da Justiça Eleitoral, no que concerne ao seu registro e ao uso do dinheiro para as suas atividades. A Lei que regula os partidos políticos no Brasil, na atualidade, é a de n.º 9096, de 19 de setembro de 1995, com alterações pontuais, quase sempre vésperas das eleições.

A Constituição de 1988 promove no Brasil a liberdade de organização partidária. Essa liberdade, como não poderia deixar de ser, não é incondicionada. O texto constitucional fixa princípios e cria deveres de incidência obrigatória sobre os partidos políticos.

A Questão da Fidelidade

Na democracia representativa, o voto é instrumento essencial, através do qual o povo se pode escolher aqueles que irão exercer o poder em seu nome. Mas essa escolha deverá estar amparada em determinados valores, princípios e programas. Por isso, não há funcionamento perfeito da democracia representativa, sem partidos fortes e com programas definidos. O eleitor moderno, do mundo globalizado, bombardeado pelos meios de comunicação de massa, que faz deste mundo um mundo só no sentido dessa sensibilidade coletiva, não pode mais confiar nas promessas de candidatos não comprometidos com a fidelidade a um programa e a um partido.

Um partido político estruturado é a garantia de que, com ou sem aquele candidato, as expectativas do eleitor serão correspondidas, a partir do momento que exista fidelidade a um ideal e a um programa do qual o próprio eleitor cidadão compartilha través do voto. Enfim, em face do presente momento vivido pelos partidos no Brasil, nunca será demais destacar a importância da fidelidade partidária para o fortalecimento da democracia.

Fidelidade partidária, no Direito eleitoral, trata da obrigação de que um político deve ter para com seu partido, tendo por base a tese de que se no Brasil todos os candidatos a cargos eletivos precisam de partidos políticos para se eleger, eles não podem se desvincular do partido para o qual foram eleitos, sob pena de perderem o mandato.

Desde a redemocratização do Brasil nos anos 80, a troca de partidos após a eleição foi prática corriqueira, gerando protestos em diversos setores da sociedade civil. Em 27 de março de 2007, mesmo sem uma lei formal, o TSE, respondendo a uma consulta do DEM (Democratas), decidiu que o mandato pertencia ao partido, o que levou aos partidos que se sentiram prejudicados com o troca-troca a requerer a cassação do mandato dos infiéis e sua posterior substituição por seus suplentes. Em 4 de outubro de 2007, o STF estabeleceu o entendimento de que a fidelidade partidária passa a ser a norma, porém só valendo a cassação dos mandatos de parlamentares que trocaram de partido após a decisão do TSE.

Num período de quase um ano depois, diversos políticos vêm tendo seus mandatos cassados por infidelidade. Levantamento feito em janeiro de 2008 concluiu que até o final de 2007, já haviam chegado à Justiça Eleitoral 6.296 pedidos de perda de mandato por infidelidade partidária.

O Tribunal Superior Eleitoral editou a Resolução - TSE nº 22.610, de 25.10.2007, alterada pela Resolução - TSE nº 22.733, de 11.03.2008, que disciplina o processo de perda de cargo eletivo e justificação de desfiliação partidária. De acordo com a Resolução, o partido político interessado pode pedir, perante a Justiça Eleitoral, a decretação da perda de cargo eletivo em decorrência de desfiliação partidária sem justa causa.

A Reforma Política em discussão no Congresso Nacional influencia o sistema político brasileiro no contexto de fortalecimento da democracia participativa. O objetivo é permitir que o povo possa, cada vez mais, se manifestar diante de todas as decisões que devem ser tomadas nos mais diversos aspectos políticos, econômicos, sociais. Deste modo a democracia será de fato a promotora da igualdade social. E assim a soberania do povo será respeitada e reconhecida frente os aparatos do Estado.

Para tanto, é necessário que os debates ganhem as ruas, que o movimento social participe das discussões, formulando propostas que venham redefinir a organização partidária como legenda democrática e não como balcão de negócio, reduzindo os partidos em moeda de troca, servindo apenas para favorecer o populismo e a corrupção eleitoral. É necessário que as organizações socias se levantem e comecem a mobilizar forças para enfrentar a trama dos partidos, que no momento representam muito mais os interesses dominantes do que a vontade popular. Reforma sem participação popular é afronta aos direitos fundamentais do povo brasileiro.

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