terça-feira, 31 de maio de 2011

"A AMAZÔNIA NÃO É SÓ FLORESTA"

Ellza Souza (*)

“Precisamos conhecer a Amazônia”. A primeira frase foi dita pelo professor Ademir Ramos e a segunda que inicia esse texto foi pronunciada pelo geólogo amazonense Fred Cruz, respeitado pelo seu conhecimento da região e pela sua fala que empolga a todos que o assistem. Fred fez doutorado em Paris. Quem não faria se pudesse? Afinal o planeta terra é um só e lá o conhecimento e a pesquisa são levados a sério pelos governantes. Diferente do Amazonas que basta olhar para as escolas e laboratórios públicos de qualquer esfera para saber a diferença de estudar aqui e lá. Sabemos que lá não tem mais minérios e aqui tem demais e não sabemos lidar com isso.

A conversa do Ademir Ramos com o Fred Cruz no programa da TV Ufam “Na Terra de Ajuricaba” foi esclarecedora. O apresentador instiga às boas respostas e sabe cortar no momento exato quando a explicação começa a virar discurso de político. Pena que o tempo do programa é pouco. O assunto dos minerais amazônicos é tema para muitos outros programas.

“A Amazônia é uma somatória de viventes e não viventes e deve ser discutida na sua questão biológica e mineral”, diz o geólogo. Entendi com a “aula” do pesquisador que já é de conhecimento da ciência o grande potencial mineral da região mas falta discutir pelos que aqui vivem, os seus reais interesses. Áreas ricas em minérios como o Rio Negro, Pari Cachoeira (ouro e cassiterita), o rio Madeira conhecido como o “rio do ouro”, baixo Amazonas, Rio Preto da Eva (caulim), Manaus (água), Presidente Figueiredo (água da mais pura qualidade), Apuí (ferro, manganês, ouro).

Temos em abundância na região principalmente no sul de Roraima e em Pitinga no Amazonas, um mineral muito utilizado no mundo da tecnologia (celulares, reatores, computadores, câmeras de vídeo e outros) que é a “tantalita”. Sempre estamos copiando modelos e um dia deixamos escapar o nosso produto que está aí, naturalmente. Foi assim com a borracha que com a aquiescência governamental foi enriquecer outros povos mais esforçados.

“O ouro do Amazonas vai para São Paulo“, diz Fred. Que vá mas que fique a riqueza social e mais uma vez nos deparamos com a falta de políticas públicas adequadas e inteligentes. “Porque não existe um pólo de jóias em Humaitá e Manicoré”? pergunta o geólogo. Uma boa pergunta para a qual não temos resposta nenhuma. A Zona Franca de produtos eletrônicos acabou, porque não criar uma Zona Franca mineral? Exportar matérias primas é coisa do passado. “Precisamos industrializar essas matérias primas aqui”. E o empolgado estudioso reflete: “Se exportamos celular e moto porque não conseguimos exportar 1 quilo de polpa de cupuaçú”?

“Faltam investimentos em ciência e tecnologia”, opina o entrevistador e reforça “é preciso repensar os cursos de pós graduação”. “O homem está desmatando na Amazônia pela ausência de políticas acertadas o que favorece a corrupção e o oportunismo”. O próprio índio, segundo o geólogo, está fazendo contrabando de tantalita e outros minerais, pela completa omissão do Estado. Um bom projeto para a região passa pela ciência sem deixar de modo algum o conhecimento popular e tradicional. Isso exige competência e muita seriedade de quem faz essas políticas no país.

As guerras sempre passam pela questão mineral e a questão territorial. Como conciliar isso se a própria legislação federal vive em conflito com as políticas estaduais. Não há entendimento nem entre os próprios pesquisadores quanto ao Novo Código Florestal que dizem uns “vai acabar com a Amazônia” e outros “Não existem estudos sobre a questão”. É o que dá o descaso da sociedade para com tudo que se relacione com a sua própria existência. Os estudiosos não estudam e os políticos não legislam em causa coletiva. Talvez por isso já começam a descer na pacata e rica Presidente Figueiredo, naves espaciais trazendo uns terrestres extras carentes de uma “paz verde e amarela” extintas em seus planetas imaginários.

Mas Fred Cruz não desiste: “É possível a atividade mineral na Amazônia”. O impossível é fazer a coisa certa com decência e pensando no bem comum.

(*) É jornalista, escritora e articulista do NCPAM/UFAM.

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