sábado, 20 de fevereiro de 2010

VIDA VAI SOBREVIVER AO CAPITALISMO

Por muitos séculos o colonialismo e o capitalismo trataram de subdesenvolver a Amazônia, despovoando-a na busca de mão-de-obra, destruindo sua diversidade biológica e fazendo terra arrasada de suas culturas milenares.

Márcio Souza (*)

Perdão pela insistência no assunto, mas hoje o conceito de desenvolvimento sustentável começa a ser banalizado. Até mesmo a linguagem da publicidade utiliza o termo para vender seus produtos. Esvaziado de seu significado mais profundo, o termo rapidamente se transformou num jargão que parece tudo explicar.

Para os formuladores do conceito, a questão da sustentabilidade é crucial para a sobrevivência da Amazônia, já que o caminho que o processo de ocupação econômica está seguindo, nada restará da selva como hoje a conhecemos.

No caso da Amazônia, que é um ecossistema muito volátil, embora guarda em seu meio a maior diversidade de espécies vivas que o planeta já teve, o avanço das frentes destrutivas têm configurado uma catástrofe, queimando e passando a moto-serra em espécimes que jamais chegaremos a conhecer.

O planeta terra tem cerca de quatro e meio bilhões de anos e pode seguir por mais cinco bilhões de anos.

Os planetas do sistema solar são estéreis, somente nossa Terra criou organismo e fez evoluir vida inteligente. Mas nas próximas décadas do século 21, veremos desaparecer milhares, talvez milhões de espécies. A maioria das vidas que se extinguirão está na Amazônia, que também será destruída tanto como selva quanto como ecossistema.

Mesmo que não se aceite visões pessimistas e apocalípticas, é preciso compreender que em pouco mais de uma geração este quadro se cumprirá.

O fim da Amazônia arruinará o solo, mudará o clima em escala global e resultará na extinção mais radical de espécies que a que ocorreu no período Cretáceo, sessenta e quatro milhões de anos atrás. Naquele passado remoto a colisão de um corpo celeste com a Terra, escureceu os céus e matou 50% das espécies existentes.

A vida vai resistir e sobreviver à doença capitalista, como sobreviveu ao impacto do asteróide. É neste quadro de iminente catástrofe que Allan A. Wood, professor do Instituto Amazônico de Investigações Imani, da Universidade Nacional de Colômbia, em Letícia, em seu ensaio “La búsqueda de sostenibilidad em los sistemas productivos amazônicos”.

“Seria mais correto considerar que a sustentabilidade econômica parte não da rentabilidade e sim da capacidade de prover todos os recursos – que podem incluir o dinheiro – necessários para a reprodução do sistema produtivo e suas unidades de produção. Isto coincide com a percepção da economia como a maneira de utilizar recursos escassos para produzir e distribuir bens e serviços de valor para a sociedade. Assim concebida, a sustentabilidade econômica ganha um sentido mais amplo, que poderia incluir a rentabilidade ou não. De todos os modos, quando falta sustentabilidade econômica a um sistema e os atores não encontram uma saída factível para tal situação, contribui para a perda progressiva dos recursos (em termos de mercado, a descapitalização) e a pobreza, que por si conduz a mais destruição ambiental e mais conflitos sociais”.

Como podemos perceber, não há uma solução de sustentabilidade que não esteja baseada na dinâmica das forças sociais, na tecnologia e nas formas sócio-culturais heterogêneas.

Por muitos séculos o colonialismo e o capitalismo trataram de subdesenvolver a Amazônia, despovoando-a na busca de mão-de-obra, destruindo sua diversidade biológica e fazendo terra arrasada de suas culturas milenares.

Para que o conceito de sustentabilidade se torne alternativa de sobrevivência, é preciso evitar a tentação do primitivo, de buscar ressuscitar experiências desastrosas do passado, como o extrativismo.

Para o futuro da Amazônia não há diferença em criar uma reserva extrativista ou desmatar a selva para plantar a soja, ambas são parte da mesma retórica.

(*) É manauara, dramaturgo, articulista de A Crítica, escritor de reconhecimento internacional e crítico social.

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