quinta-feira, 8 de julho de 2010

ROTEIRO SENTIMENTAL DA NOSSA MANAUS

José Martins Rocha (*)

Caminhar por Manaus entre memória e lembrança. Há diversos lugares para fazer caminhada em Manaus, os preferidos pelos manauaras são: Calçadão da Ponta Negra, Boulevard Amazonas, Parque dos Bilhares, Largo de São Sebastião, Parque Jefferson Péres, Parque dos Idosos, Parque do Mindu e Amazonas Shopping, - no entanto, resolvi fazer a minha caminhada pela Avenida Sete de Setembro até a orla do Rio Negro, terminando no Porto de Manaus; nunca ouvi falar que alguém gostasse de caminhar por aquela via pública, que pena, pois ela é pura história de Manaus, além de ser calma e tranquila (aos domingos, é claro!)

Iniciei o percurso pelo Paço da Liberdade, este imponente prédio público está abandonado pelas autoridades do município, o local seria transformado no Museu da Cidade de Manaus, fiz uma caminhada pela Praça D. Pedro II, está tomada por dezenas de famílias de índios desaldeiados, abandonaram as suas tribos para tentarem a vida na cidade de Manaus – esta Praça foi uma das mais belas da nossa cidade, está também abandonada, suja e depredada – segundo os indígenas, estão no local por dois motivos: primeiro, ali já foi um cemitério indígena (eles cultivam o amor aos seus antepassados) e segundo, foi uma forma de chamar a atenção das autoridades públicas sobre a sua situação na cidade, inclusive, o atual governador já prometeu doar casas para todos eles – prometeu e não cumpriu, como sempre!

A caminhada estava somente no início, passei pelo Centro Cultural Palácio Rio Branco, está uma beleza, todo recuperado, dei uma olhada no Cabaré Chinelo; em seguida, passei em frente ao Edifício do IAPTEC (foi o primeiro espigão de Manaus), as meninas gostam de bater o ponto bem frente ao prédio, ao passar por lá uma delas detonou: - Vamos nessa, gato velho? Respondi: - Eu, hein, tô fora! O objetivo é caminhar, fui em frente, passei pela antiga sede do Poder Legislativo Municipal (está abandonada, poderia servir para alguma coisa, talvez seria uma boa ser um abrigo para os mendigos de Manaus), pela agência do Banco da Amazônia (a sua fachada é toda de madeira da região amazônica), pela Biblioteca Arthur Reis (não sei se está aberta ao público), Casa 22 Paulista, Igreja Matriz, Líder Hotel e a Loja Aur Bon Marché – caminhando um pouco mais encontrei as ruínas do antigo Grande Hotel, a Biblioteca Pública (fechada para reformas faz três anos) e a Praça Heliodoro Balbi, antiga Praça da Polícia (está limpa, bonita e policiada), o Colégio D. Pedro II, conhecido como Colégio Estadual.

Na esquina com a Avenida Getúlio Vargas, tive uma dor no peito, não foi Angina ou Infarto (ainda bem!), foi apenas uma revolta por terem destruído os Cines Guarany e Polytheama, no primeiro, foi erguido uma agência do Banco Itaú, um prédio de gosto duvidoso, no segundo, deixaram apenas uma parede que lembra os velhos tempos da minha infância; no quarteirão até a Avenida Sete de Setembro, lembrei da professora Carmelita Esteves, ela escreveu várias crônicas sobre os moradores daquele lugar. Caminhando um pouco mais encontrei o Canto do Quintela, existe somente o canto, enquanto o Quintela, já era! Mais um pouco a frente está o Museu do Homem do Norte, antigo prédio do Corpo de Bombeiros, fechado pelos homens da Prefeitura de Manaus (qual será o motivo? - Não sei, talvez não renda grana, eles preferem construir viadutos e passagens de nível). Um pouco mais adiante, parei aonde nasci – o meu Igarapé de Manaus – na Primeira Ponte, fiquei absorto em meus pensamentos – os meus vizinhos foram mandados embora, o pessoal do Prosamim passou por lá, destruíram todas as casas e mandaram todos para bem longe, no local construíram o Parque Igarapé de Manaus – o tempo estava fechando, dei uma parada no Centro Cultural Palácio Rio Negro, antiga sede do Poder Executivo do Amazonas; caiu uma forte chuva, resolvi me abrigar no Parque Jefferson Péres, fiquei bem embaixo da casa em que o governo mandou destruir, restou somente a fachada, no local construíram um Centro de Convenções - passou a chuva, continuei a caminhada, parei no Parque Bittencourt, o Prosamim passou também por lá, tive o prazer de ouvir os pássaros cantarem nas árvores frutíferas que estão nos quintais das casas do entorno do parque.

Caminhando um pouco mais encontrei muitos prédios antigos, a grande maioria está bem conservada, passei pelo antigo prédio da Escola Técnica Federal do Amazonas, atual Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia, pelo Colégio Santa Terezinha (está faltando uma pintura) – passei também pela Cadeia Pública Desembargador Raimundo Vidal Pessoa, um prédio de 1904 e, finalmente a Terceira Ponte, a famosa Ponte Benjamin Constant, está toda recuperada, fiz questão de caminhar por ela, parei no Mercado Municipal Walter Rayol, construído em 1965 pelo então governador Plínio Coelho, visitei todos os boxes, foi uma volta ao passado. E agora José?

A Caminhada continua, passei pelo antigo prédio da CEM, na minha infância era conhecida como “Sem Energia” - os carvoeiros foram expulsos para algum lugar incerto e não sabido - o tempo continuava fechado, São Pedro estava chutando os camburões – quem está na chuva é para se molhar! Continuei a minha caminhada, passei pelo Parque do Mestre Chico, uma beleza, porém, as marcas do abandono começam a aparecer, não tem policiamento, os parquinhos estão todos quebrados, sem manutenção, as autoridades não imaginam o quanto um parquinho faz falta para uma criança pobre – pelas aquelas bandas existe o Makro, um grande centro de vendas no atacado de produtos alimentícios, além da Montana (do grupo Coca-Cola), revendedora da Ford, bem que os empresários poderiam fazer uma parceria com o governo do Estado, no sentido de adotarem o Parquinho, seria o mínimo que eles poderia fazer pelo “social”, mas, pelo visto, eles não estão nem aí!

Caminhando um pouco mais encontrei o Estaleiro do Caxangá – lembrei da minha infância quando ia até lá remando o meu Bote (pequeno barco), agora está tudo aterrado, fizeram a tal “Manaus Moderna”. A caminhada continua, meu irmão! Passei pela orla do Rio Negro, o tempo estava bom, sem sol, uma maravilha! Parava uma vez e outra também, afinal, a idade pesa ,fiquei admirando o “Beiradão dos Educando”, está cheio de Estaleiros, muitas casas palafitas e muitos barcos, alguns fundeados e outros tantos afundados; na orla, existe um local somente para vendas de barcos, canoas, empurradores, balsas e o escambau, passei pelo Teatro Chaminé, está belo, merece uma visita; depois, dei um pulo na Feira da Manaus Moderna, tomei uma água de coco (possui um alto poder reidratante); aproveitei para ver "in loco" o tal propalado "Choque de Gestão do Amazonino" (o alcaide da Manô de mil contrastes), uma loucura o lugar, nota zero para o Negão!

Parei para ver os barcos saírem para a Praia do Tupé, deu vontade de entrar num deles, um vendedor me falou que o preço é R$ 15,00, ainda existe praia (apesar de ainda estarmos na cheia do rio), segundo ele, no trajeto o barco vai na “manha” para os clientes encherem a cara de cervejas e curtirem muita música ao vivo de boi e forró-brega. Eu, hein, tô fora! O meu foco era caminhar, talvez no próximo domingo dê um pulo até lá. Passei pelo Mercado Municipal Adolpho Lisboa, tristeza pelo que vi, apesar de está em processo de recuperação e pelo andar da carruagem vai está pronto somente em 2014!

Cheguei no Porto de Manaus, estão destruindo dois Armazéns do início do século passado para a construção do "Camelodrómo! Égua, sai prá lá Di Carlis e De Bronzes da vida! Ponto final da caminhada - fui até o Bar Jangadeiro (fica no Edifício Tartaruga), tinha que fazer uma completa reindratação, afinal, ninguém é de ferro! Caminhar faz bem a saúde física e mental, melhor ainda é caminhar pelas ruas de Manaus repensando os feitos dos governantes em contraste com a alegria dos cidadãos que cultivam a memória e a lembrança de uma Manaus resistente, berço da civilização dos Manaós e demais povos que construíram aqui a sua morada. É isso aí.

(*) Rochina é blogueiro militante, manauara, filho de uma boa cepa.

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