terça-feira, 19 de maio de 2009

PORTO DAS LAJES: ANTES E DEPOIS DOS PROTESTOS POPULARES


No ano passado, os empresários e o governador do estado do Amazonas, Eduardo Braga(PMDB) anunciavam a construção do complexo portuário das Lajes com data e hora marcada para começar. O noticiário encontra-se estampado no portal da Superintendência Estadual de Navegação, Portos e Hidrovias (SNPH), datado de 02 de julho de 2008, informando que:

“O início da obra do novo terminal portuário de Manaus está na contagem regressiva. A previsão da Lajes Logística S.A. – empresa oriunda da parceria (joint venture) entre a carioca Log – in Logística Intermodal S.A., e a manauense Juma – é que a partir do dia 1º de outubro deste ano os operários já estejam com a ‘mão na massa’ literalmente na construção. O terminal terá uma área de 144 mil metros quadrados, em um terreno de 600 mil metros quadrados localizado no bairro Colônia Antônio Aleixo, Zona Leste”.

Com o aval do governador Eduardo Braga, o processo de Licenciamento do Porto ficou sob a responsabilidade do estado através do IPAAM. Desse modo, tudo sairia de “carreirinha” de acordo com a vontade dos empresários:

“A Lajes Logística já recebeu o aval prévio do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) e concluiu os estudos topográficos e a chamada patimetria, que é a medição da profundidade do rio e a velocidade da correnteza. ‘O Ipaam já liberou a licença ambiental prévia (LP) e em uma semana estaremos concluindo a sondagem (perfuração) do terreno’, explicou o diretor de implantação, Laurits Hausen”.

De “carreirinha”, o governo do estado liberou a Licença Prévia e de pronto a Log-In Logística Intermodal S.A., com sede no Rio de Janeiro, contrata por lá mesmo as empresas para fazer o projeto básico de engenharia naval e civil da obra:

“Já contratamos as empresas que vão fazer esses projetos. Eles (os projetos) permitem contratar as empresas para a construção em si”, ressaltou o diretor de implantação da Lajes. As duas empresas contratadas foram a PGE, que é do Rio de Janeiro e atua na área de engenharia, projeto, planejamento, acompanhamentos de contratos e construção naval e offshore (realocação de processos de negócio) e a PLANAVE Estudos e Projetos de Engenharia, ambas do Rio de Janeiro.

A reportagem postada no portal da SNPH informa ainda, que: “A joint venture entre Log-In e Lajes foi anunciado no dia 2 de março deste ano (2008) pelo governador Eduardo Braga. Na ocasião, os empresários lembraram que a construção do novo terminal faz o Amazonas reviver os 200 anos da abertura dos portos para o mercado internacional em 28 de janeiro de 1808, por D. João VI”.

O investimento estimado na obra é de R$ 210 milhões, segundo os empresários: “Na primeira fase, o terminal terá capacidade de movimentar, por ano, 250 mil TEUs (contêiner de 20 pés). Pelo tamanho da obra, que deve ser entregue em 2010, o numero de empregos diretos a serem gerados somente na construção do porto será superior a 500”.

DEPOIS DOS PROTESTOS



O marco dessa participação popular é a Audiência Pública (AP), que a comunidade exigiu que fosse feita na Colônia Antonio Aleixo, no dia 19 de novembro de 2008, sob a presidência do IPAAM, quando as lideranças comunitárias se manifestaram contrárias a construção do Porto das Lajes na confluência do majestoso Encontro das Águas.

A participação dos comunitários se deu em número de 700 pessoas, aproximadamente. O evento iniciou às 15h e prolongou-se até a 0h do outro dia. Somaram para essa decisão o posicionamento do Ministério Público Estadual, a participação do Núcleo de Cultura Política da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), as análises comparativas apresentadas aos moradores por pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia, da UFAM e, sobretudo, o conhecimento experimental que os comunitários detêm sobre a fauna e flora do ecossistema do Encontro das Águas.

No entanto, muito antes da AP, as lideranças já se articulavam junto às agências públicas para se inteirar das propostas e dos interesses que movem os empresários, o governo do estado e a própria Superintendência da Zona Franca de Manaus (SUFRAMA) quanto à pretensa construção do Porto das Lajes, no território da Colônia Antonio Aleixo, na zona leste de Manaus.

Dessa vez, por meio de ofício datado de 17 de novembro passado, as lideranças da Colônia Antonio Aleixo dirigiram-se ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, apresentando os documentos e registros fotográficos a respeito do “descaso das políticas públicas, instituições ambientais, das empresas do pólo industrial, programas habitacionais do governo, madeireiras e especialmente a implantação do Projeto Super Porto das Lajes na área da ex-colônia de portadores de hanseníases”.

Nos termo do ofício, os comunitários pedem providências ao Presidente da República, alegando que: “os proponentes da construção do Super Porto das Lajes não apresentam outra área de viabilidade para a construção do Porto. A terra é de propriedade da União, margem do rio Negro (internacional) e o rio Solimões (interestadual)”.

Em resposta as providências reclamadas pelas lideranças da Colônia Antonio Aleixo junto ao Presidente Lula quanto apropriação das terras da união, os comunitários receberam em anexo, ofício n. 084/2009/GRPU-AM, datado de 02 de março de 2009, assinado pelo Gerente Regional do Patrimônio da União no Amazonas, João Ricardo de Melo e Lima, afirmando, em seu item 4, que “o Projeto do Porto de Lajes, que inclui a construção de um Terminal Portuário de Uso Privativo Misto, prevê a utilização de área de propriedade da União, denominada ‘faixa de terreno marginal de rio federal’, carecendo, portanto, de regularização de sua ocupação nesta Secretaria do Patrimônio da União”.

No mesmo ofício, em seu item 5, o Gerente Regional do Patrimônio da União informa também, que “tal regularização se deu através do instituto da Inscrição de Ocupação do terreno marginal (Processo Administrativo MP n. 04985.000310/2008-12), ato administrativo que registra oficialmente a posse precária de áreas públicas, tendo como responsável a empresa Juma Participações S.A., proprietária do imóvel lindeiro ao terreno da União e cedido em regime de comodato à Lajes Logística S.A., companhia responsável pelo projeto do porto, da qual também é acionista”.

QUESTÃO FUNDIÁRIA



No corpo do processo n. 04985.000310/2008-12, constata-se de imediato que, embora seja a Juma Participações S.A, proprietária do terreno localizado na Alameda Cosme Ferreira, km 17, no Bairro Colônia Antonio Aleixo, nas proximidades do terreno da União, o requerente é a empresa Lajes Logística S.A., agindo por meio de sua representante legal Meirejane Rodrigues Ribeiro.

O Requerimento de Inscrição de Ocupação data de 07 de março de 2008, sendo dirigido ao Gerente Regional do Patrimônio da União no Estado do Amazonas (GRPU), com o seguinte enunciado: “o abaixo assinado requer a V.Sa. a Inscrição de Ocupação do imóvel adiante identificado, de acordo com a qualificação e demais informações fornecidas”.

A quem interessar possa: “em 10 de dezembro de 1997 à Juma Participações S/A., adquiriu de Petrônio Augusto Pinheiro, o Lote de Terras denominado Empresa de Plantações Segundo, situado a Estrada do Aleixo, com uma área de 638.400m2 , contendo benfeitorias constantes de uma Casa de madeira, que Petrônio Augusto Pinheiro adquiriu da Companhia Brasileira de Plantações, nos termos da Escritura de 26 de julho de 1962, lavrada em Notas do Tabelião do 1o Ofício desta Capital [...]; que Companhia Brasileira de Plantações S/A adquiriu de Empreza de Plantações Limitada, nos termos da Certidão da Constituição da referida Sociedade, em data de 31de julho 1937”.

Em atenção a requerimento formalizado pela Lajes Logística S/A., o chefe de Serviço de Divisão de Identificação e Fiscalização /GRPU/AM, Nelson Alves prado, emitiu parecer n. 096, datado de 20 de agosto de 2008, afirmando em seu item 2, que “realizou vistoria no aludido imóvel no dia 29.07.08, constatando que parte da área pleiteada pela Empresa interessada está inserida inequivocamente em área de propriedade da União, denominada Faixa de Terreno Marginal de Rio Federal. Entretanto, verificamos também que no trecho em questão, não existe demarcação das linhas LLTM (Linha Limite de Terreno Marginal) e LMEO (Linha Média das Enchentes Ordinárias)”.

Quanto à questão ambiental, embora não sendo objeto do referido processo, o parecer mencionado, em seu item 3, afirma: “a referida área encontra-se quase que completamente em seu estado natural, sobretudo no tocante a área marginal, não havendo obras, cortes ou quaisquer tipos de modificações no terreno”.

Por fim, o parecer técnico, em seu item 4, verifica que: “o levantamento apresentado pela interessada incorre em erro, pois, mostra que parte da área pleiteada está localizada dentro do curso d’água no Rio Amazonas (Rio Federal de propriedade da União cf. III, art. 20 da CF/88), identificado como sendo um canal navegável, ainda que por pequenas embarcações, abrangendo esta mesma área parte de uma pequena ilha do outro lado deste canal. Conseqüentemente, o Registro Cartorial do imóvel incorre no mesmo erro, quando descreve e autentica uma área com estas características, devendo portanto sofrer retificação, ocasião em que deverão ser excluídas as áreas pertencentes a União”.

Para fim de Direito, o Gerente do GRPU-AM, João Ricardo de Melo e Lima esclarece, que a Inscrição de Ocupação requerida pela Lajes, na forma do Decreto-Lei 1.561, de 13 de julho de 1977, “é instrumento de caráter precário, revogável a qualquer momento pela Administração, não ensejando o reconhecimento de quaisquer direitos sobre o terreno ou o pagamento de indenização por benfeitorias realizadas, mas que possibilita à União controle da utilização do seu patrimônio e a auferição de renda por essa utilização, em obediência ao mandamento legal que veda, salvo autorização em lei, a ocupação gratuita de terrenos da União”.

O Decreto-Lei mencionado acima, em seu Art. 20, parágrafo 2o é categórico quanto à defesa do interesse público, tratando-se em particular da salvaguarda do Encontro das Águas e dos Sítios Peleontológicos das Lajes, onde se pretende construir o complexo portuário: “a inscrição será mantida enquanto não contrariar o interesse público, podendo a União proceder ao seu cancelamento em qualquer tempo e reintegrar-se na posse do terreno após o decurso do prazo de 90 (noventa) dias da notificação administrativa que para esse fim expedir em cada caso”.

Ademais, conclui o Gerente do GRPU no Amazonas, que “a efetiva implantação do

Projeto do Porto das Lajes depende da anuência de vários outros órgãos, dentre eles, e principalmente, do órgão competente em matéria ambiental [...]”. Nesse caso específico, o próprio Ministério Público Federal do Amazonas já questiona a competência do IPAAM em legislar sobre o licenciamento do Porto das Lajes, considerando o Amazonas como Rio Federal, estando de acordo também com o parecer técnico aqui apresentado de responsabilidade da Gerência Regional do Patrimônio da União no Amazonas.

Portanto, compete ao IBAMA o ofício de fazê-lo em defesa do interesse público, garantindo a presente e futura geração a beleza e a vitalidade dos recursos naturais do nosso magnífico Encontro das Águas e todo paisagismo o cerca.

Nenhum comentário: