quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

O AMAZONAS, O NILO E A CULTURA DA SUSTENTABILIDADE

Tombamento do Encontro das Águas: "Com um requerimento, ocorre a abertura do processo que após aferição técnica preliminar, é submetido à deliberação dos órgãos responsáveis pela preservação. No caso de ser aprovada a intenção de proteger um bem cultural ou natural é desde então, expedida ao seu proprietário, uma Notificação. A partir desta Notificação o bem já se encontra legalmente protegido contra destruíções ou descaracterizações até que seja tomada a decisão final. O Processo termina com a respectiva inscrição no Livro Tombo e comunicação formal aos proprietários." (O grifo é nosso).
DAHER, Marlusse Pestana. Tombamento. Jus Navigandi.
As grandes civilizações nasceram e se estruturam à margem dos rios e mares. O Nilo é o nosso primeiro exemplo, quando as culturas milenares se apoderam de suas fontes e passam a construir todo aparato para desenvolver e conquistar novos povos e territórios. Nessa mesma perspectiva, os conquistadores portugueses, no período colonial, agem em relação à Amazônia brasileira, definindo a construção de toda a lógistica da dominação a partir da cartografia estratégica dos rios e seus tributários, bem como os acidentes geográficos. No entanto, de forma cognitiva às margens do grande Nilo, as culturas se desenvolveram fundamentada em valores que regram até hoje os limites dos recursos naturais quanto ao consumo dos beneficiários. Na Amazônia, as práticas coloniais caracterizadas pelo saque e a rapinagem, visando o lucro fácil e o imediatismo econômico vingaram e sufocaram as demais manifestações locais de origem dos povos indígenas e assim tornaram-se ideias dominantes que foram se naturalizando por meio de formulações de políticas governamentais com aparato de legalidade, acelerando a depredação, o desmatamento e a desestruturação das comunidades tradicionais na direção de integrá-las sob a lógica da perversa desigualdade que se vive em terras brasileiras, em particular no norte do Brasil. A conquista do Movimento S.O.S. Encontro das Águas em garantir por meio do IPHAN, o Tombamento desse Bem como Patrimônio Cultural do povo brasileiros, não tem só um significado paisagístico natural, é uma grito de alerta para que todos (as) sintam-se comprometidos contra o determinismo econômico, a depredação e outras estratégias neocoloniais que visam reduzir rios e florestas para acelerar cada vez mais a acumulação do capital em detrimento da saúde do homem e do planeta. O texto abaixo provoca tal reflexão e nos convida a proteger esta "galinha dos ovos de ouro" contra o "cavalo de Tróia" dos armadores opotunistas e venais que pretendiam construir um Terminal Portuário na confluência do nosso Encontro das Águas, ameçando de morte a vida, a beleza e a economia da floroesta Amazônica.

Mauro Schorr (Orua) (*)

Desde as primeiras letras aprendemos que a bacia do rio Amazonas é a maior do mundo. Ninguém nunca duvidou que ele era o mais caudaloso do planeta, mas se questionava essa primazia quanto ao seu comprimento. Hoje a controvérsia está esclarecida: com 6.937 quilômetros de extensão, o Amazonas supera em 140 quilômetros o Nilo, que perdeu essa liderança multissecular.Qualquer número em relação ao “rio-mar” (ou o “mar doce” dos espanhóis, os primeiros europeus a navegá-lo) é grandioso.Ele lança, em média, 170 milhões de litros de água por segundo no Oceano Atlântico.

Suas águas barrentas podem avançar 100 quilômetros além da barreira de águas salgadas e projetar seus sedimentos em suspensão no rumo norte, até o litoral da Flórida, nos Estados Unidos. São milhões de toneladas de nutrientes, arrastados desde a cordilheira dos Andes, onde nasce o grande rio, e engrossados por seus afluentes, que também se posicionam entre os maiores cursos d’água que existem.

Essas grandezas têm servido de inspiração para o ufanismo nacional, mas não para tratar melhor os nossos gigantes aquáticos. Nenhum brasileiro – ou mesmo o nativo – dá ao Amazonas a importância que os egípcios conferem ao Nilo. O Egito não existiria sem a faina incansável do seu grande rio, a fertilizar suas margens, cercadas por desertos hostis, e civilizar o país. Por isso, é considerado sagrado.

Os brasileiros parecem acreditar que, por ser monumental, abrangendo 7 milhões de quilômetros quadrados do continente sul-americano (quase dois terços em território brasileiro), a bacia amazônica foi blindada pela mãe natureza contra as hostilidades do homem.

Já está na hora de se pôr fim a essa ilusão, acabando com a insensibilidade geral, que se alimenta do desconhecimento e da desinformação. O Amazonas está sob ameaça.
Não uma, mas várias.

Um dos capítulos mais recentes está sendo travado diante da maior cidade da Amazônia, Manaus, a capital do Amazonas, com seus 1,7 milhão de habitantes (2 milhões com as duas cidades vizinhas). No dia 5, o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) decretou o Tombamento do Encontro das Águas do Amazonas com o Negro, um dos seus principais tributários da margem esquerda.O desavisado pode até achar que o ato é de significado museológico, para efeito acadêmico.

O processo do Tombamento, porém, se arrastou durante dois anos. Deveria ser simples: a área de 30 quilômetros quadrados, o polígono de terra e água onde ocorre a junção dos dois enormes rios, é cenário para o maior de todos se encontrar com o maior rio de águas negras do mundo. Na margem direita, o barrento Solimões pressiona o rio ao lado, que ganhou seu nome pela inusitada cor das suas águas, num entrevero que pode se estender por 10 quilômetros lineares nas duas direções.

É um encontro ciclópico. A vazão do Solimões nesse ponto (onde justamente muda pela última vez de nome, passando a ser Amazonas) é de 135 milhões de litros de água por segundo. A do Negro, que chega ao fim do seu percurso de 1.700 quilômetros, a partir da Venezuela, é de 50 milhões de litros.

Encorpado, o Amazonas segue em frente até a foz, dois mil quilômetros abaixo. Não sem antes oferecer o espetáculo das duas cores líquidas em paralelo ou em fusão tumultuada, para a admiração ou o espanto de uma crescente legião de turistas.

O problema é que no ponto de encontro dos rios está Manaus, com 60% da população e 90% da riqueza de todo estado do Amazonas, o maior do Brasil, com 20% do território nacional. Desde quase meio século atrás, Manaus deixou de ser o produto do Amazonas para ser o efeito da Zona Franca, um entreposto comercial e um núcleo industrial que só se tornaram possíveis pela renúncia da União a recolher o imposto sobre a importação das empresas instaladas na remota paragem.

Hoje, Manaus é a origem do maior fluxo de contêineres do país. Motocicletas, computadores, geladeiras e muitos outros produtos são mandados para o sul do país, principalmente São Paulo, e espalhados para outros destinos. O velho porto flutuante, que os ingleses construíram no início do século 20 para atender a exportação de borracha (que chegou a ser responsável por 40% do comércio exterior brasileiro), não serve para essa demanda nova.

A pressão é tão forte que alguns terminais privados, legais ou não, surgiram na orla da cidade. O maior deles, o Porto Chibatão, foi parcialmente arrastado, no mês passado, pelas águas do Negro, a apenas três quilômetros do seu encontro com o Amazonas, com mortes e a perda de diversos contêineres. Qualquer ribeirinho sabia que o local era contra-indicado para o fluxo de carga que o precário terminal movimentava.

Um novo, muito maior e mais adequado, está sendo projetado para uma área de 100 mil metros quadrados, na qual poderão ser estocados 250 mil contêineres. Antes desse mega-terminal, porém, uma subsidiária da mineradora Vale (o novo nome da Companhia Vale do Rio Doce, quando estatal) começou a construir seu próprio porto, com investimento de 220 milhões de reais. Nele deverá operar seu novo navio cargueiro, com capacidade para 1.500 contêineres, e outros cinco já encomendados, por algo como meio bilhão de reais, multiplicando sua capacidade de transporte.

Esses números pareciam muito mais importantes do que a localização do porto, na província paleontológica das Lages, próximo de uma tomada de água para 300 mil habitantes da cidade e de um lago, o último do rio Negro, importante para milhares de moradores de um bairro que se formou em torno dele.

O processo que levou ao desmoronamento do Porto Chibatão seguiria sua lógica malsã se não tivesse surgido a iniciativa de Tombar o encontro das águas. Ninguém se aventura a dizer-se contra o Tombamento, mas ele provocou uma batalha judicial que chegou a Brasília, com vitórias e derrotas, protelações e pressões, até que, no dia 5, finalmente o Iphan assumiu a tutela sobre o encontro das águas.Qualquer novo projeto que a partir de agora se fixe na área do polígono terá de ser submetido ao instituto, além de obter a licença ambiental.

Certamente haverá quem se indigne com o fato: o raciocínio automático é de que a razão (ou anti-razão) econômica prevaleça sobre qualquer outro tipo de consideração – e sempre com vantagens para o investidor.

A decisão do Iphan, não bloqueia a evolução dos empreendimentos produtivos na região, mas talvez ajude o país a se dar conta de que destruindo os recursos naturais, em especial aqueles que representam uma grandeza única, é a Amazônia que estão destruindo. Substituem a galinha dos ovos de ouro por um cavalo de Tróia.

Na mitologia ou na realidade, sabemos qual será o desfecho.

(*) É direção do Instituto Anima de Desenvolvimento e Cultura Sustentável Sitio Cristal Dourado e Espaço Terapêutico PulsarPrêmio Fritz Müller 2009 - Fatma - Governo do Estado de SC -Rua Jaborandi 900 - Bairro Campeche - Florianópolis - SC Brasil - 88.065-035Fones (55) - (48) - 3338 2267 - 8442 7424 Sites: http://www.institutoanima.org/ e http://www.permaculturabr.ning.com/Produtos: http://permaculturabr.ning.com/group/InstitutoAnima/forum/topics/cooperativa-do-instituto-anima Entre em Nossa Rede "Instituto Anima Teia da Vida": Copie e cole no navegador... http://br.groups.yahoo.com/group/institutoanimateiadavidaVídeos: Parte I e outrosdo Sitio do Anima: http://www.youtube.com/v/iTrUPs6dEfw&hl=pt_PT&fs=1&Tenha o DVD Completo do Instituto Anima: uma universidade da verdade em seu bolso!Visite e faça estágio no Sitio Cristal DouradoEstamos nas Ecofeiras da UFSC nas quartas entre 07-15 hs, na Lagoa da Conceição aos sabados e aos domingosVeja nossos eco-produtos: ajude a salvar o nosso futuro, a sua saúde e plenitude, vá na nossa Ecoloja no site http://www.institutoanima.org/ e nas nossas ecofeiras !Rumar para a Paz e a Comunhão das Diferenças é a nossa meta no mundo!

Foto: Jorge Herran

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