quinta-feira, 2 de abril de 2009

O PORTO INCÔMODO E A AUTORIDADE

Ninguém é contra a construção desse e de outros portos que amplie a logística do setor produtivo. Ninguém rasga dinheiro nem dispensa empregos! Os manauenses querem quantos portos vierem, desde que eles sejam construídos em lugares adequados, com menor impacto ambiental possível. Aliás, o chamado capitalismo moderno se orienta pelo conceito de sustentabilidade, que atende a interesses econômicos, sociais e ambientais. Então, a pergunta que não quer calar é essa: que tipo de capitalismo é esse que quer danificar o Encontro das Águas, um lugar que une beleza natural, valor histórico e sentimental, diversidade biológica e enigmas ainda por serem decifrados pela ciência?

Wilson Nogueira*

A provável construção de um porto no Encontro das Águas deslegitima a pretensão de referência ecológica do Amazonas em escala mundial. Quem será capaz de acreditar que o estado que menos derruba árvores e paga bolsa floresta a caboclos é o mesmo que permite a descaracterização do cartão postal da Amazônia? A geógrafa Bertha Becker, que vislumbra Manaus como o status de capital mundial em razão do ativo ambiental que possui, também se indignará com a conivência de autoridades locais e nacionais com o capitalismo de terra arrasada.

É de se estranhar que o governador Eduardo Braga, que arrecada dinheiro com marketing verde, tenha tapado os ouvidos ao apelo da sociedade civil em favor do bom senso. A imagem de garoto verde do governador, disseminada na imprensa nacional e internacional, derrete-se diante da indiferença dele nesse episódio. Ao menos até agora. O titubeio lhe causa constrangimento público e prejuízos incalculáveis a pessoas e à natureza.

Ninguém é contra a construção desse e de outros portos que amplie a logística do setor produtivo. Ninguém rasga dinheiro nem dispensa empregos! Os manauenses querem quantos portos vierem, desde que eles sejam construídos em lugares adequados, com menor impacto ambiental possível. Aliás, o chamado capitalismo moderno se orienta pelo conceito de sustentabilidade, que atende a interesses econômicos, sociais e ambientais. Então, a pergunta que não quer calar é essa: que tipo de capitalismo é esse que quer danificar o Encontro das Águas, um lugar que une beleza natural, valor histórico e sentimental, diversidade biológica e enigmas ainda por serem decifrados pela ciência?

O movimento de defesa do Encontro das Águas, felizmente, amplia-se a cada dia. É mais um José, um João, uma Maria, uma Joana, uma Joaquina, uma Socorro, que se juntam ao Márcio, ao Tenório, ao Ademir, ao Dori, à Ivânia, à Elisa e daí por diante. Esticou-se de tal forma que chegou o Congresso Nacional por meio dos senadores João Pedro, Artur Neto e Jefferson Praia e do deputado Francisco Praciano; já alcançou os ministérios da Cultura e do Meio Ambiente. E pode até invadir os escritórios dos banqueiros e empresários que financiam "projetos verdes" no Amazonas. Essa gente, de uns dias para cá, tem evitado grudar a imagem de suas empresas e negócios a pessoas, eventos e/ou atitudes antiecológicas.

Fica claro que o Encontro das Águas é um símbolo que une em torno de si pessoas dos mais variados segmentos sociais e profissionais. Primeiro, porque tem o reconhecimento de que é um singular patrimônio natural e turístico; segundo, pelo sentimento de pertencimento que ele transmite aos amazonenses e amazônidas. Esse pedaço é nosso! Ele pertence a todos nós. E que assim seja, para que a luta das águas dos dois gigantes amazônicos encha os olhos dos turistas e inspire os poetas eternamente.

Mexa-se governador! Não deixe que a sua autoridade esverdeada lhe escape entre os dedos das mãos.

* Sociólogo, jornalista e escritor.

Do blog Textobr

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