terça-feira, 3 de março de 2009

PARALELO ENTRE PERSONAGENS DA GUERRA DE BUSH

Argemiro Ferreira

Enquanto a bancada republicana bloqueava no Congresso, há dois anos, o debate da guerra, um relatório oficial do Inspetor Geral (IG) do Departamento da Defesa confirmou o que todo mundo já sabia - que antes da invasão do Iraque o Pentágono manipulou deliberadamente informações de inteligência, na obsessão de ligar Saddam Hussein à al-Qaeda de Osama Bin Laden e às ações terroristas de 11 de setembro de 2001.

Essa ligação inexistente, como lembrou então o senador democrata Carl Levin, à frente da comissão de Serviços Armados, foi o argumento central usado para “vender” a guerra de Bush ao povo americano - em plena histeria patrioteira abraçada pela mídia do país. O que o Pentágono fez, disse Levin, “foi errado, foi uma distorção, foi inapropriado (…) e foi algo altamente perturbador”.

Como se processou aquela manipulação? Os detalhes foram expostos no texto. O relatório deixou claro que os responsáveis maiores tinham sido os dois das fotos acima - o então chefão do Pentágono, Donald Rumsfeld, secretário da Defesa, e o número dois, Paul Wolfowitz, secretário adjunto. Em seguida vinha o sub-secretário (para programas) Douglas J. Feith, cujo gabinete Colin Powell chamou uma vez de “Gestapo” e “governo paralelo”.

Mas o relatório do IG, estranhamente, alegava ao mesmo tempo que não tinha havido ilegalidade (saiba mais sobre o relatório AQUI). Simplesmente porque aquela gente estava autorizada pelo escalão superior - leia-se, George W. Bush - a fazer o que fizera.

O desastre de US$3 trilhões no Iraque

Ou seja, o IG não considerou crime a manipulação deliberada, ainda que ela tenha fabricado pretextos para uma guerra declarada ilegal com base na Carta das Nações Unidas. Há dois anos Rumsfeld, Wolfowitz e Feith já não estavam no governo. No entanto, Rumsfeld continuava a usar um gabinete no Pentágono, Wolfowitz era presidente do Banco Mundial (demitiu-se em meio a escândalo envolvendo a namorada) e Feith ensinava (o que?) na Escola de Serviço Exterior da Universidade de Georgetown.

Wolfowitz repetira a proeza de Robert McNamara, secretário da Defesa na fase inicial da guerra do Vietnã, contemplado com a mesma mordomia do Banco Mundial. Mas McNamara ao menos, ao assumir o Banco Mundial estava arrependido de seu papel no banho de sangue (no premiado documentário The Fog of War, do cartaz ao lado, o cineasta Errol Morris apresentou o depoimento dele). Não foi esse o caso dos três executores dos planos bélicos da dupla Bush-Cheney, que primeiro decidiu fazer a guerra e só depois mandou que se achassem pretextos para justificar a invasão.

Bush, Cheney, Rumsfeld, Wolfowitz, Feith e o resto da turma certamente nunca chegaram a perder o sono por causa da trapaça macabra. Mesmo conscientes de sua participação no processo de decisão ou na manipulação de dados para fazer a guerra de US$3 trilhões (cálculo de Joseph Stiglitz e Linda Bilmes), na qual já morreram 4.252 soldados americanos (por enquanto, até esta semana - confira os dados oficiais AQUI) e 650.000 a 800.000 civis iraqueanos (na estimativa conservadora da Universidade Johns Hopkins, já que outras falam em mais de 1 milhão).

Feith manifestou até certa euforia pelo relatório do IG. Estava convencido de que seu papel não fora ilegal e que tudo o que fizera tinha sido devidamente autorizado. Coube a ele, entre outras coisas, conduzir o OSP (Escritório de Planos Especiais), criado por Rumsfeld para falsificar dados capazes de contestar o ceticismo da CIA, cujos analistas negavam a ligação Saddam-Bin Laden, a existência de armas de destruição em massa.


Um tenente na corte marcial

Agora, passo a outro personagem. Se todos aqueles fabricantes e planejadores da guerra estão tranquilos e nunca sequer perderam o sono, é bem diferente a situação do tenente do Exército Ehren Watada, considerado modelo de militar. Por tudo o que se sabia na época, muito antes do relatório do IG, ele concluiu ser ilegal a guerra do Iraque. Assim, ofereceu-se para lutar no Afeganistão ou outro lugar. Como insistiram em mandá-lo para o Iraque, preferiu ser julgado por uma corte marcial.

Em 2007, enfrentou um primeiro julgamento. Não chegou ao fim, devido a falhas de procedimento. Houve ainda um impasse. Depois, foi para o segundo. Tratava-se do primeiro e único oficial a se recusar publicamente a lutar no Iraque. Sua unidade, numa brigada de Fort Lewis, estado de Washington, seguiu para a guerra em junho. Ele ficou. Respondia por cinco acusações diferentes (saiba mais AQUI).

Em geral, a grande mídia dos EUA não dá maior atenção a essas coisas. Ao contrário, finge que não aconteceram. Watada está agora com 30 anos. Ele é do Havaí, onde o presidente Barack Obama nasceu e viveu boa parte de sua vida. Quando explicou aos superiores que achava aquela guerra ilegal e imoral, eles lembraram o que já sabia: não cabe a um militar escolher a guerra de que quer participar. E também não podia deixar o Exército - tinha de enfrentar as consequências de sua decisão.

Nem covarde e nem pacifista

O fato ocorre com mais frequência no escalão inferior, entre os soldados. Milhares já desertaram ou se declararam contrários à guerra. No caso de oficial, a máquina militar se mexe, teme a subversão do esforço de guerra. O capítulo mais recente da aventura de Wataba, que continuou a servir (em tarefas burocráticas) em sua brigada de Fort Lewis, foi vivido a 22 de outubro do ano passado.

Um juiz federal, Benjamin Settle, decidiu naquele dia que Watada não terá de enfrentar uma nova Corte Marcial em três das acusações, pois isso equivaleria a ser julgado duas vezes pelos mesmos crimes (leia AQUI). Ficou em aberto se ainda terá de ir a julgamento pelas outras duas acusações, ambas relacionadas a “conduta indigna de um oficial e cavalheiro”. Sem dúvida, uma vitória, mas não o capítulo final. Pois se for julgado, ainda pode receber pena de prisão, embora por apenas dois anos.

Além disso, Wataba agora é cause célèbre. Fotos dele frequentam protestos antiguerra, embora alegue ser apenas “um americano comum” - nem “pacifista” e nem “covarde”, mas um “patriota” que viveu um dilema moral e agiu de acordo com a própria consciência. “Não tenho medo de lutar, (…) se meu país precisar, seria o primeiro a pegar o fuzil. O que não quero é participar de uma guerra que considero criminosa”, declarou ao jornal Los Angeles Times.

A oposição dele à guerra começou quando se revelaram fraudulentos os pretextos invocados pelo governo Bush para a guerra. O pai e a mãe dele passaram a ir a escolas e igrejas, em diferentes pontos do país, para falar do caso. Quanto aos guerreiros Bush, Cheney, Rumsfeld, Wolfowitz, Feith & Cia, é verdade que já estão fora do governo, mas nunca tiveram por que se preocupar
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Um comentário:

Anônimo disse...

A crise financeira que castiga o sistema financeiro norte-americano e mundial foi detonada por dentre inúmeras razões a insanidade mental de G BUSH pela guerra contra o terror e pelo livre mercado neoliberal especula dor, sem fiscalização que hoje agoniza em socorro ao estado para ser estatizado, o grande mal do neoliberalismo que foi a figura do ESTADO agora é a velha salvação aos moldes do socialismo