segunda-feira, 14 de setembro de 2009

"ELES ESTÃO TENTANDO NOS INTIMIDAR E QUEREM ANULAR AS ELEIÇÕES"

Final de semana, em lugar seguro, conseguimos entrevistar com exclusividade, o líder comunitário da Colônia Antonio Aleixo, Isaque Dantas (32), que foi eleito no dia 16 de agosto, para a direção da Associação do Moradores do bairro, contrariando os interesses da empresa Lajes Logística S/A aliada com empreiteiros locais, que pretendem construir um Terminal Portuário nas proximidades do nosso Encontro das Águas. Na entrevista, Isaque fala das ameaças sofridas e das medidas que foram tomadas para garantir sua integridade física e dos companheiros do Movimento SOS Encontro das Águas também ameaçados de morte pelos capangas da empresa. A primeira baixa do Movimento foi o deslocamento do padre Orlando Barbosa para lugar incerto e desconhecido, deixando a comunidade do Aleixo em estado de choque. No entanto, segundo Isaque, “a luta continua e cada vez mais forte”. Na oportunidade, aproveita a entrevista para reatar a comunicação com o padre Orlando, avaliando o embate da comunidade contra o poderio da empresa Lajes e seus aliados políticos, acadêmicos e governamentais, informando-o sobre o avanços da lutas e apelando para que mesmo distante, o padre mobilize forças para barrar de uma vez a pretensa construção do Porto das Lajes. A entrevista denuncia a prática do coronelismo da empresa da Lajes, o que compromete diretamente o governo do Estado quanto ao dirigismo político relativo à manipulação do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM), colocando o órgão estadual sob suspeição quanto à análise do processo de licenciamento do empreendimento do Porto das Lajes. Leia entrevista na íntegra e manifeste sua indignação.

NCPAM: Para o senhor, qual a importância do trabalho comunitário na sua formação?

ISAQUE: Sempre tive uma participação na luta da comunidade, sempre fui muito inquieto com a realidade local, sobretudo pela discriminação que nós sofríamos por morar na Colônia Antônio Aleixo (antigo leprosário de Manaus), pois meu avô era hanseniano e por isso sofria todo tipo de preconceito. Além disso, o que me inquietava também era vê os candidatos em tempo de eleições prometerem e nada faziam em favor dos comunitários do nosso bairro. Mas, toda essa discussão eu fazia de forma empírica, quando entrei para faculdade eu comecei a refletir de modo mais sistemático, pois o meu curso era de serviço social e esta formação me deu base técnica para analisar e discutir a realidade e formular novas propostas.

NCPAM: Nesse caso, o acesso a informação e ao conhecimento ajudaram o senhor a participar muito mais na luta da comunidade...

ISAQUE: Sim, porque hoje não se discute se não tiver o domínio da informação técnica à luz dos conhecimentos científicos. Por isso, devemos ampliar cada vez mais o valor do ensino na formação da juventude, lutando pela qualidade da educação.

NCPAM: Quando e por que o senhor resolveu sair candidato para Associação dos Moradores da Colônia Antonio Aleixo?

ISAQUE: Na verdade, não foi nada pensado, calculado. Mas, a situação nos leva a “pegar ou largar”, pois quando me fizerem o convite eu analisei o quadro e vi como as lideranças eram tratadas, quase sempre enganadas por candidatos e governantes, deixando muito a desejar quanto à organização da nossa comunidade. Por isso, organizamos uma chapa e começamos a trabalhar em equipe, obedecendo alguns critérios tais como: a não discriminação religiosa, a participação das mulheres, a determinação de se ouvir a comunidade em tudo e por tudo, formulando propostas e criticas e juntos celebrar compromisso para melhorar a qualidade de vida da nossa gente.

NCPAM: O processo eleitoral como se deu e por que teve tanta repercussão nos meios de comunicação de Manaus?

ISAQUE: Foi muito conturbado porque a empresa Lajes, que pretende construir um Porto em nossa comunidade interferiu diretamente em todo processo, bancando chapas e inclusive favorecendo, digo influenciando, a comissão eleitoral, orientada por pesquisa, que apontava a nossa vitória com margem de 60 %. Aí eles ficaram doidos e partiram para ignorância, cancelando data da eleição e comprando eleitores para beneficiar os candidatos favoráveis a construção do Porto. Isso tudo se dava as vésperas das Audiências Públicas que estava marcada para o dia 22 e 27 (o que ocorreu sem nenhuma legalidade, devendo ser remarcada novas datas). A repercussão das eleições resulta dos interesses empresariais e políticos de manipular lideranças locais para justificar a possível construção do Porto das Lajes nas imediações do nosso Encontro das Águas. Da nossa parte cumprimos a risca o que a comunidade nos delegou, posicionando contra a construção desse monstrengo, que é o projeto Porto das Lajes...

NCPAM: E o resultado?

Isaque: Ganhamos contra a empresa Lajes Logística S/A, posicionando-se contra a possível construção do Porto das Lajes, com a mesma margem de voto que a pesquisa encomendada por eles já anunciava. As eleições se deram no domingo (16 agosto), quando ganhamos com uma diferença de 1.200 votos a favor da chapa 3 – “um novo olhar para o futuro” - contra as duas outras bancadas pela empresa Lajes. No final do pleito, as chapas concorrentes reconheceram a nossa vitória e se comprometeram somar com o fortalecimento da nossa comunidade...

NCPAM: E a posse já foi marcada?

ISAQUE: A posse se deu após o resultado das eleições, contando com a participação dos nossos adversários. No entanto, contrariado os interesses da empresa Lajes, que pretendia ganhar as eleições no grito para continuar manipulando algumas lideranças em favor do aceite da pretensa construção do Porto das Lajes. Por sua vez, a empresa não aceitou o resultado pelo vultoso investimento que fez nos seus candidatos Manoel Penha e Itamar, obrigando, portanto, que eles protestassem na justiça o resultado das eleições. Lamenta-se o comportamento dos companheiros, mas já que venderam a alma pro diabo eles têm que entregar também o corpo para ser devorados pelos abutres.

NCPAM: Então quer dizer que vocês ganharam, mas não levaram. Então como fica a situação da Comunidade?

ISAQUE: Muito difícil porque a Associação dos Moradores da Colônia Antonio Aleixo, não tem recurso pra bancar os custos de um advogado, ao contrário deles que contam com o patrocínio da empresa Lajes. Por isso, tudo está parado e a maioria que nos elegeu está indignada com a empresa e com aqueles que fizeram pacto com o capeta. O fato é que eles estão tentando nos intimidar e querem anular as eleições. Mas, a comunidade já se manifestou, dizendo que se vierem de novo vão levar uma peia ainda maior. O que sabemos é que passado as Audiências Públicas, os amigos do capeta vão ser descartados porque não tem mais utilidade e essas ditas lideranças vão se transformar em garoto de recado das Lajes.

NCPAM: Do resultado das eleições o senhor acha que a comunidade saiu fortalecida para lutar contra a pretensa construção do Porto das Lajes?

ISAQUE: Claro que sim. As eleições para Associação dos Moradores da Colônia Antonio Aleixo transformaram-se num verdadeiro plebiscito, numa consulta pública a favor ou contra o projeto de construção do Porto das Lajes, sendo vitoriosa a chapa da comunidade que sempre se posicionou contrária a possível construção do Porto, ferindo de morte os interesse do governo e dos empresários. Por isso, eles não querem reconhecer a vitória esmagadora da chapa 3 e obrigam nossos concorrentes a protestarem na justiça, tentando desqualificar a vontade da maioria.

NCPAM: É verdade que o desespero dos capetas foi tão grande que partiram para as agressões físicas, ameaçando o senhor e outras lideranças de morte?

ISAQUE: Os fatos denunciam no curso da história, que quando se contraria a vontade dos poderosos, eles recorrem a toda forma de instrumento para fazer valer os seus interesses. Aqui não seria diferente, pois fizeram de tudo para dividir e manipular a comunidade, disseminando uma prática do “pão e circo”, bancando rua de lazer, forró e distribuição de camisas e brindes, como se fosse uma verdadeira campanha eleitoral nos moldes populistas que conhecemos muito bem. Tudo isso seguido de ampla publicação na imprensa local como ação sustentável, falando de um projeto verde, não de nossas florestas, sim do dólar como medida de valor. E assim passamos a sofrer toda forma de constrangimento. No entanto, ficamos preocupados quando na quarta-feira, 26 de agosto, um dia antes da Audiência Pública do Careiro, o padre Orlando e os seus confrades religiosas tiveram sua casa invadida por 4 homens armados, que até hoje não foram identificados. A perseguição ao padre continuou de tal forma que se sentindo acuado de todos os lados, junto com outras lideranças locais celebrou sua última missa na comunidade de São João Batista, na Colônia Antonio Aleixo, compartilhando com os fiéis as ameaças sofridas e citando o meu nome como um dos marcados para morrer. Por tudo isso, de forma organizada recorre-se a Secretaria Estadual de Segurança Pública, a Polícia Federal, a Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Estado, ao Centro dos Direitos Humanos da Arquidiocese de Manaus, ao Conselho Estadual de Segurança Pública, a Comissão de Direitos Humanos da OAB e a Anistia Internacional para informar a estas entidades dos fatos e requerer providencias, resguardando o direito à vida e a integridade física das lideranças do movimento social contrários a pretensa construção do Porto das Lajes, nas redondezas do Encontro das águas.

NCPAM: Frente a essas ameaças qual a mensagem que o senhor passaria para os seus companheiros do movimento SOS Encontro das Águas, que lutam contra realização do projeto do Porto das Lajes?

ISAQUE: Nesse momento, estou pensando no padre Orlando, onde ele estiver, tenho certeza que vai acessar esse instrumento de comunicação e se informar do avanço da nossa luta por aqui. Saiba que toda a comunidade da Colônia está muito triste com a sua ausência, mas temos consciência que vencer não é sempre avançar. Os poderosos pensavam que com a sua saída, o movimento perderia força, mas posso garantir que a cada dia outras lideranças somam conosco na luta em favor do nosso meio ambiente. Cito a nossa participação no movimento do grito dos excluídos, no dia 7 de setembro, onde mais de 3 mil pessoas na zona leste de Manaus participaram protestando contra o projeto de construção do Porto das Lajes e outras pragas sociais que ameaçam diretamente o povo do Amazonas. As lideranças do movimento SOS Encontro das Águas manifesto o nosso compromisso de continuar firme na luta, mobilizando força e articulando os meios necessários para enfrentar os tubarões e seus comparsas políticos, acadêmicos e governamentais que querem empurrar de goela abaixo projetos negociados nos gabinetes, contrariando a política ambiente do Estado e a qualidade de vida do nosso povo da Colônia Antonio Aleixo. A nossa luta tem sido vitoriosa, mas não basta, é preciso barrar uma vez por toda o projeto, afirmando-se como povo que sabe o que quer, sonhando juntos um novo projeto para o nosso Amazonas.

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