terça-feira, 29 de setembro de 2009

RESPONSABILIDADE AMBIENTAL


Marcelo Colombelli Mezzomo*

A existência de qualquer ser vivo gera reflexos no meio circundante, diretas ou indiretas, por mais tênues que sejam. Isto é um fato. No caso dos seres humanos, estes reflexos se avolumam, pois nossas capacidades intelectivas nos permitem multiplicar nossa capacidade de interação com o meio ambiente.

Assim é que atividade humana é, direta ou indiretamente, responsável por modificações de monta na maior parte da cobertura vegetal do planeta, e está relacionada à extinção de várias espécies animais.

A proteção ambiental tem em vista os reflexos destas atividades sobre outros seres humanos, pois o meio ambiente é um sistema formado por complexas e recíprocas interações entre os elementos naturais e os seres vivos.

Mas evidentemente que não são todos os reflexos que são objetos de previsão legislativa, se não aqueles de maior monta, e que sejam capazes de gerar dano ambienta, potencial ou efetivamente.

Ao operador jurídico interessa o conceito jurídico de dano, e não é todo o dano ambiental que demanda responsabilidade jurídica. Sim, porque se qualquer dano ambiental fosse implicar em responsabilização, a maior parte das atividades corriqueiras dos seres humanos se tornaria inviável.

Neste passo, urge socorrermo-nos da lei, mais especificamente da Lei nº 6.938/81, pois é neste diploma que encontramos os conceitos básicos relacionados à proteção ambiental. É pertinente a invocação do artigo 3º, in verbis:

Art. 3º. Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:

I - meio ambiente: o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida, em todas as suas formas;

II - degradação da qualidade ambiental: a alteração adversa das características do meio ambiente;

III - poluição: a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente:

a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;
b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;
c) afetem desfavoravelmente a biota;
d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;
e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos;

IV - poluidor: a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental;

V - recursos ambientais: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora.

Trata-se, como se vê, de um dispositivo de conceitos amplos, abrangentes, e que traz os conceitos fundamentais para o operador jurídico. É de suma importância que verifiquemos que a noção leiga de meio ambiente e degradação ambiental muito se distancia da amplitude que lhe confere a lei.

O conceito jurídico de meio ambiente não se confunde com o estereótipo de uma área bucólica ou com densa vegetação e animais silvestres. Degradação ambiental e poluição, de seu turno, não se limitam a grandes complexos industriais ou obras gigantescas, como soe parecer na visão leiga. Impedir a regeneração de uma área, por exemplo, também é degradar.

Por aí se vê que todas as atividades humanas aptas a gerar qualquer alteração ambiental estão sob a alçada do direito ambiental.

O que ocorre é que somente algumas delas recebem previsão específica e sancionamento. De qualquer forma, ainda assim, a quantidade de situações potencialmente passíveis de ensejar a proteção ambiental e a responsabilização do agente infrator é consideravelmente maior do que costumeiramente pensamos. Este aspecto merece atenção: para trabalharmos com direito ambiental, temos de desconsiderar muitas noções culturais "leigas" a respeito da matéria.

Outro aspecto para o qual devemos atentar é aquele que concerne às feições da responsabilidade ambiental in genere, entendida como a imputação de conseqüências ao infrator da legislação ambiental. É que, juridicamente, a infração ambiental pode ter repercussão em três esferas distintas e independentes, embora uma possa, eventualmente, ter repercussão em outra. Assim sendo, a infração de normas ambientais poderá ter reflexos penais, civis e administrativos, conforme a natureza da norma em pauta.

A apuração destas três modalidades de responsabilidade não é realizada pelo mesmo órgão, tem conseqüências jurídicas diversas, e está submetida a regime jurídico específico, embora se verifiquem alguns pontos em comum.

É que constatada a existência de uma infração às normas ambientais, deverá ter início uma série de procedimentos de ordem legal e administrativa, os quais invariavelmente materializam-se em atos concatenados em um rito procedimental.

Como a Constituição Federal assegura ampla defesa e contraditório, tanto no processo administrativo, como judicial, já se infere que a observância destes aspectos é imperativa em qualquer das hipóteses.

Da mesma forma, a apuração da responsabilidade em uma esfera pode ter reflexos em outra eventualmente. É o caso da condenação criminal, que torna certa a obrigação de reparar o dano. A natureza difusa dos direitos atingida pelo dano ambiental não é óbice para a aplicação desta regra.

Mas, como já referido, a natureza das responsabilidades é diversa e demanda tratativa separada.

(*) Juiz de Direito Substituto da 2ª Vara Cível de Erechim (RS).

NR: O artigo na íntegra pode ser consultado nas páginas http://jus2.uol.com.br/doutrina . O texto favorece aos debates que estamos travando juntos aos “doutos” autores do Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório (EIA/RIMA) pertinente à construção do Terminal Portuário das Lajes nas imediações do Encontro das Águas. Para nós, o paradoxo levantado pelo autor do texto sobre os parâmetros legais e o saber popular é ranço de uma forte tradição do positivismo do Direito cultuado, sobretudo na prática tradicional dos operadores dessa ciência. A discussão em pauta recorre à epistemologia do Direito a merecer dos estudiosos ampla apreciação quanto à construção de seus paradigmas.

Um comentário:

Anônimo disse...

Importante ler também:

http://www.conjur.com.br/2011-fev-19/entrevista-marcelo-colombelli-
mezzomo-ex-juiz-rio-grande-sul