O reconhecimento normativo da existência de Conhecimento Tradicional Associado à biodiversidade (CTA) constitui grande marco do Direito Ambiental Internacional firmado em Tratado na ECO-92.
A Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) atestava para o mundo jurídico que saberes gerados pelos povos tradicionais podem adquirir valoração econômica (e fez eco à monetarização que, até então, só se atribuía ao saber científico).
Com o decantado potencial lucrativo para a bioindústria, o CTA desde a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) é regulado por princípios e regras de softnorm, ou seja, internacionalmente o acordo firmado serve apenas de “recomendação”, “carta de intenções” aos países signatários que a ratificam – dentre os quais alguns países provenientes do Norte Econômico (detentores de biotecnologia) e outros tantos do Sul Econômico (detentores de biodiversidade).
Nestes termos, cada um dos países signatários deve refletir sobre o caráter monetário disponibilizado na Convenção para seus prováveis Conhecimentos Tradicionais. No entanto, usufruindo de suas soberanias, aos países detentores de biodiversidade cabe decidir de forma independente, desatrelada dos demais, sobre a regulamentação dos Conhecimentos Tradicionais Associados de seus povos.
Atualmente, os países signatários da CDB ainda se esforçam para produzirem sua legislação de Direito Interno e, assim, resguardar-se juridicamente contra a apropriação indébita, tanto os recursos naturais de seu território quanto os direitos de propriedade intelectual do conhecimento associado (a tais recursos da biodiversidade e oriundo dos povos tradicionais).
Isso porque, em se tratando de Conhecimento Tradicional cada país deve levar em conta não só o potencial de sua diversidade biológica mas, sobretudo, os povos e populações tradicionais que habitam seu território e os Conhecimentos Associados à biodiversidade de que sejam detentores.
Na regulamentação do “Direito à propriedade intelectual do conhecimento tradicional associado, protegido pela CDB” algumas hipóteses são aqui problematizadas:
1) Se dois países vizinhos possuem população tradicional ou um povo indígena de circulação e vivência entre as fronteiras políticas, a que país corresponde o conhecimento tradicional associado à biodiversidade produzido por eles?
2) Sendo países soberanos como conformar a decisão sobre proteção desse conhecimento (até mesmo com veto ao acesso e divulgação do CTA) em comum e a repartição de beneficios? Se um dos países decidir pela comercialização com o aval de sua parte da população tradicional e o outro país decidir pelo não acesso e divulgação?
3) E se não só a população que detem o conhecimento mas o próprio recurso biológico for similar entre países vizinhos? Se o que encontro no Brasil, encontro de igual forma no Peru, na Colômbia? Em uma decisão de Direito Interno posso vetar a saída de tal semente, animal, substância, mas como vetar a divulgação e o acesso ao conhecimento?
Parto dessas hipóteses para acenar a possibilidade de existirem Conhecimentos Tradicionais associados à biodiversidade que extrapolam à territorialidade e à regulação solitária de um Estado Nacional: são o que denomino Conhecimentos Tradicionais Associados Transnacionais. Isso porque são Conhecimentos que transcendem as fronteiras e a soberania do Estado-Nação, construindo-se em um espaço que rompe com a idéia de interno/externo das fronteiras políticas dos países que o compartilham, para um delineamento baseado em uma territorialidade inter-nações, que conjuga um espaço local geográfico com um espaço social povos, um bioma que em virtude de fronteiras políticas dividiu-se juridicamente mas na prática comunga de similar bio e sociodiversidade.
Adianto que falo do bioma Amazônico. Mais precisamente da Pan-Amazônica e seus países amazônicos que dividindo a Amazônia em oito países e um território francês podem afetar com suas regulamentações internas a regulamentação soberana do outro país.
Trago a baila o bioma Amazônico e a realidade possível do “CTA transnacional dos povos indígenas amazônicos e das populações tradicionais”, para agregarmos ao debate sobre a regulamentação nacional da CDB, minha crença na necessidade que o CTA seja pensado também em regime internacional, dentro do contexto socio-geográfico de trocas de conhecimento das populações e de compartir de recursos naturais.
1. SOBERANIA EVOLUÇÃO CONCEITUAL
Soberania é elemento essencial do Estado, ao lado dos conceitos de território e população. E sendo o Estado assunto relevante quando tratamos de direito ambiental internacional cabe inicialmente uma sucinta explanação da evolução histórica do conceito.
O conceito já designou, na era medieval, o próprio monarca que centralizava o poder antes pulverizado entre os senhores feudais. Jean Bodin foi um dos principais justificadores desta acepção conceitual que da forma que foi concebida foi essencial para o exercício do poder pelos reis, força emergente da época. Assim unificou-se o Estado com a afirmação do poder soberano do rei sobre um determinado povo e território. As atitudes do monarca, como escolhido divino, possuíam total supremacia não se sujeitando a nenhum outro poder. Os recém-criados Estados-nação eram soberanos e passavam a considerar os demais Estados como iguais, inaugurando o que hoje conhecemos por soberania dos Estados, a igualdade entre Estados irmãos.
Com o movimento iluminista, a soberania já não emana do monarca mas dá espaço à um novo contrato social, o contratualismo democrático, onde a vontade do soberano seria substituída pela vontade do povo, assim o elemento essencial político do Estado muda de mãos. Locke e Rousseau conceituam, guardadas as suas particularidades, que este elemento essencial do Estado, a soberania, é agora expressão da vontade do cidadão vislumbrada na dos seus representantes democraticamente eleitos. Nascem assim os Estados representativos, onde a soberania continua a viger em um território, obrigando um determinado povo, mas cujo poder emana de cada um destes. Era a soberania da vontade popular.
A dinâmica das relações internacionais necessitam de elasticidade dos conceitos, assim, surgido num período em que soberania era a representação despótica do monarca, mais tarde passa para a representação da vontade popular e atualmente a soberania continua a ser sinônimo de Estado-nação, moldando-se às novas necessidades dos países, que na busca por interesses comuns aliam-se através de blocos econômicos, convenções, tratados, pactos, aumentando o poder de barganha e sucesso nas suas investidas. Trata-se da soberania compartilhada.
Dentro deste novo cenário os Estados soberanos criam obrigações entre si, autolimitando-se, mas continuam soberanos, pois esta mesma soberania não exclui a possibilidade de que os entes soberanos obriguem-se à regras jurídicas através de tratados e que estejam a eles vinculados respondendo face às decisões conjuntas aceitas por todos os obrigados.
Na soberania compartilhada os Estados-membros não renunciam à sua soberania, mas passam a exercê-la de forma compartilhada com os outros Estados naquelas matérias expressamente previstas nos tratados. Não havendo perda da soberania, muito menos perda de parte desta, pois soberania não é algo que se possa ter em maior ou menor grau. A soberania é uma condição do Estado, propondo-se tão somente o compartilhamento dela.
1.1 RELAÇÕES INTERNACIONAIS DO BRASIL E SOBERANIA COMPARTILHADA
Diversas são as temáticas que levam à busca em conjunto dos países por soluções. O processo de degradação ambiental é apenas uma delas, fazendo o mundo buscar soluções em conjunto para a desaceleração da perda de diversidade biológica, e inclusive para frenar os impactos ambientais.
Em 1992 a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) envolveu países ricos em biodiversidade e ricos em tecnologia para o tratamento da diversidade natural, o uso, o acesso, o compartilhamento dos recursos, assim como o compartilhamento dos benefícios resultantes da exploração do CTA. O Brasil como país megadiverso e grande interessado, foi sede da Eco-92, evento onde se abriu à ratificação a CDB.
A partir da CDB inaugura-se no Brasil um intenso debate legislativo que não obstante os projetos de lei com base nele elaborados, o da então senadora, ex-ministra do Meio ambiente Marina Silva, o projeto de lei do Deputado Jacques Wagner foi atropelado pela edição da Medida Provisória 2.186-16, que atualmente junto ao Decreto 3.945 de 2001 regem o tema.
Embora houvesse a participação dos Estados Unidos na feitura da referida convenção, este não a ratificou, mas, no âmbito da Organização Mundial do Comércio tratou de elaborar o Tratado sobre Aspectos de Direitos da Propriedade Intelectual, relacionados ao comércio (TRIPS) que por grande adesão dos Estados, e por possuírem mecanismos de retaliação não obstante sua inadequação em tutelar os conhecimentos tradicionais é o que rege internacionalmente a tutela dos conhecimentos tanto científicos quanto tradicionais associados à biodiversidade.
Enquanto que os princípios do TRIPS, que data de 1995, elaborado no âmbito da OMC não levaram mais de três anos para serem implementados (9.279/96 – Lei da Propriedade Intelectual, 9.610/98 Lei dos direitos autorais) os da CDB buscam até hoje efetividade dos seus preceitos de repartição de benefícios, teconologia, consentimento prévio informado etc.
Ademais a CDB realizada como framework convention (convenção quadro) estabelece princípios e regras gerais, mas não estipula prazos e obrigações específicas, ao contrário do TRIPS.
2. CONHECIMENTO TRADICIONAL ASSOCIADO E CDB
A Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) atestava para o mundo jurídico que saberes gerados pelos povos tradicionais podem adquirir valoração econômica (e fez eco à monetarização que, até então, só se atribuía ao saber científico).
Com o decantado potencial lucrativo para a bioindústria, o CTA desde a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) é regulado por princípios e regras de softnorm, ou seja, internacionalmente o acordo firmado serve apenas de “recomendação”, “carta de intenções” aos países signatários que a ratificam – dentre os quais alguns países provenientes do Norte Econômico (detentores de biotecnologia) e outros tantos do Sul Econômico (detentores de biodiversidade).
Nestes termos, cada um dos países signatários deve refletir sobre o caráter monetário disponibilizado na Convenção para seus prováveis Conhecimentos Tradicionais. No entanto, usufruindo de suas soberanias, aos países detentores de biodiversidade cabe decidir de forma independente, desatrelada dos demais, sobre a regulamentação dos Conhecimentos Tradicionais Associados de seus povos.
Atualmente, os países signatários da CDB ainda se esforçam para produzirem sua legislação de Direito Interno e, assim, resguardar-se juridicamente contra a apropriação indébita, tanto os recursos naturais de seu território quanto os direitos de propriedade intelectual do conhecimento associado (a tais recursos da biodiversidade e oriundo dos povos tradicionais).
Isso porque, em se tratando de Conhecimento Tradicional cada país deve levar em conta não só o potencial de sua diversidade biológica mas, sobretudo, os povos e populações tradicionais que habitam seu território e os Conhecimentos Associados à biodiversidade de que sejam detentores.
Na regulamentação do “Direito à propriedade intelectual do conhecimento tradicional associado, protegido pela CDB” algumas hipóteses são aqui problematizadas:
1) Se dois países vizinhos possuem população tradicional ou um povo indígena de circulação e vivência entre as fronteiras políticas, a que país corresponde o conhecimento tradicional associado à biodiversidade produzido por eles?
2) Sendo países soberanos como conformar a decisão sobre proteção desse conhecimento (até mesmo com veto ao acesso e divulgação do CTA) em comum e a repartição de beneficios? Se um dos países decidir pela comercialização com o aval de sua parte da população tradicional e o outro país decidir pelo não acesso e divulgação?
3) E se não só a população que detem o conhecimento mas o próprio recurso biológico for similar entre países vizinhos? Se o que encontro no Brasil, encontro de igual forma no Peru, na Colômbia? Em uma decisão de Direito Interno posso vetar a saída de tal semente, animal, substância, mas como vetar a divulgação e o acesso ao conhecimento?
Parto dessas hipóteses para acenar a possibilidade de existirem Conhecimentos Tradicionais associados à biodiversidade que extrapolam à territorialidade e à regulação solitária de um Estado Nacional: são o que denomino Conhecimentos Tradicionais Associados Transnacionais. Isso porque são Conhecimentos que transcendem as fronteiras e a soberania do Estado-Nação, construindo-se em um espaço que rompe com a idéia de interno/externo das fronteiras políticas dos países que o compartilham, para um delineamento baseado em uma territorialidade inter-nações, que conjuga um espaço local geográfico com um espaço social povos, um bioma que em virtude de fronteiras políticas dividiu-se juridicamente mas na prática comunga de similar bio e sociodiversidade.
Adianto que falo do bioma Amazônico. Mais precisamente da Pan-Amazônica e seus países amazônicos que dividindo a Amazônia em oito países e um território francês podem afetar com suas regulamentações internas a regulamentação soberana do outro país.
Trago a baila o bioma Amazônico e a realidade possível do “CTA transnacional dos povos indígenas amazônicos e das populações tradicionais”, para agregarmos ao debate sobre a regulamentação nacional da CDB, minha crença na necessidade que o CTA seja pensado também em regime internacional, dentro do contexto socio-geográfico de trocas de conhecimento das populações e de compartir de recursos naturais.
1. SOBERANIA EVOLUÇÃO CONCEITUAL
Soberania é elemento essencial do Estado, ao lado dos conceitos de território e população. E sendo o Estado assunto relevante quando tratamos de direito ambiental internacional cabe inicialmente uma sucinta explanação da evolução histórica do conceito.
O conceito já designou, na era medieval, o próprio monarca que centralizava o poder antes pulverizado entre os senhores feudais. Jean Bodin foi um dos principais justificadores desta acepção conceitual que da forma que foi concebida foi essencial para o exercício do poder pelos reis, força emergente da época. Assim unificou-se o Estado com a afirmação do poder soberano do rei sobre um determinado povo e território. As atitudes do monarca, como escolhido divino, possuíam total supremacia não se sujeitando a nenhum outro poder. Os recém-criados Estados-nação eram soberanos e passavam a considerar os demais Estados como iguais, inaugurando o que hoje conhecemos por soberania dos Estados, a igualdade entre Estados irmãos.
Com o movimento iluminista, a soberania já não emana do monarca mas dá espaço à um novo contrato social, o contratualismo democrático, onde a vontade do soberano seria substituída pela vontade do povo, assim o elemento essencial político do Estado muda de mãos. Locke e Rousseau conceituam, guardadas as suas particularidades, que este elemento essencial do Estado, a soberania, é agora expressão da vontade do cidadão vislumbrada na dos seus representantes democraticamente eleitos. Nascem assim os Estados representativos, onde a soberania continua a viger em um território, obrigando um determinado povo, mas cujo poder emana de cada um destes. Era a soberania da vontade popular.
A dinâmica das relações internacionais necessitam de elasticidade dos conceitos, assim, surgido num período em que soberania era a representação despótica do monarca, mais tarde passa para a representação da vontade popular e atualmente a soberania continua a ser sinônimo de Estado-nação, moldando-se às novas necessidades dos países, que na busca por interesses comuns aliam-se através de blocos econômicos, convenções, tratados, pactos, aumentando o poder de barganha e sucesso nas suas investidas. Trata-se da soberania compartilhada.
Dentro deste novo cenário os Estados soberanos criam obrigações entre si, autolimitando-se, mas continuam soberanos, pois esta mesma soberania não exclui a possibilidade de que os entes soberanos obriguem-se à regras jurídicas através de tratados e que estejam a eles vinculados respondendo face às decisões conjuntas aceitas por todos os obrigados.
Na soberania compartilhada os Estados-membros não renunciam à sua soberania, mas passam a exercê-la de forma compartilhada com os outros Estados naquelas matérias expressamente previstas nos tratados. Não havendo perda da soberania, muito menos perda de parte desta, pois soberania não é algo que se possa ter em maior ou menor grau. A soberania é uma condição do Estado, propondo-se tão somente o compartilhamento dela.
1.1 RELAÇÕES INTERNACIONAIS DO BRASIL E SOBERANIA COMPARTILHADA
Diversas são as temáticas que levam à busca em conjunto dos países por soluções. O processo de degradação ambiental é apenas uma delas, fazendo o mundo buscar soluções em conjunto para a desaceleração da perda de diversidade biológica, e inclusive para frenar os impactos ambientais.
Em 1992 a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) envolveu países ricos em biodiversidade e ricos em tecnologia para o tratamento da diversidade natural, o uso, o acesso, o compartilhamento dos recursos, assim como o compartilhamento dos benefícios resultantes da exploração do CTA. O Brasil como país megadiverso e grande interessado, foi sede da Eco-92, evento onde se abriu à ratificação a CDB.
A partir da CDB inaugura-se no Brasil um intenso debate legislativo que não obstante os projetos de lei com base nele elaborados, o da então senadora, ex-ministra do Meio ambiente Marina Silva, o projeto de lei do Deputado Jacques Wagner foi atropelado pela edição da Medida Provisória 2.186-16, que atualmente junto ao Decreto 3.945 de 2001 regem o tema.
Embora houvesse a participação dos Estados Unidos na feitura da referida convenção, este não a ratificou, mas, no âmbito da Organização Mundial do Comércio tratou de elaborar o Tratado sobre Aspectos de Direitos da Propriedade Intelectual, relacionados ao comércio (TRIPS) que por grande adesão dos Estados, e por possuírem mecanismos de retaliação não obstante sua inadequação em tutelar os conhecimentos tradicionais é o que rege internacionalmente a tutela dos conhecimentos tanto científicos quanto tradicionais associados à biodiversidade.
Enquanto que os princípios do TRIPS, que data de 1995, elaborado no âmbito da OMC não levaram mais de três anos para serem implementados (9.279/96 – Lei da Propriedade Intelectual, 9.610/98 Lei dos direitos autorais) os da CDB buscam até hoje efetividade dos seus preceitos de repartição de benefícios, teconologia, consentimento prévio informado etc.
Ademais a CDB realizada como framework convention (convenção quadro) estabelece princípios e regras gerais, mas não estipula prazos e obrigações específicas, ao contrário do TRIPS.
2. CONHECIMENTO TRADICIONAL ASSOCIADO E CDB
O conhecimento tradicional associado à biodiversidade é aquele gerado por povos que guardam interstina relação com a conservação do meio ambiente. Diferentemente da sociedade qua agora se volta para o CTA na busca por cura de chagas e por produtos lucrativos, os povos tradicionais não possuem os mesmos valores de acumulação de capital e de exploração desenfreada do seu habitat, antes restringem-se ao necessário para sua subsistência, retirando o que precisam através de atividades de baixo impacto para a floresta, e contribuindo, segundo pesquisas, para a biodiversidade desta que é considerada uma das mais ricas regiões em diversidade natural, a Amazônia. A apropriação do conhecimento hoje segue os parâmetros que regem os demais conhecimentos ocidentais.
Embora não seja conhecimento individualizado, pertencente a um só criador vêm sendo apropriado nos moldes das patentes. Face à esta problemática no âmbito do TRIPS, o conselho TRIPS, fórum mais importante de discussão da proteção do conhecimento tradicionais, os países ricos em biodiversidade, e entre eles o Brasil, observando o Guia de Boas Condutas de Bonn, buscam a revisão do art. 27.3 (b), propondo emendas para que que sejam evidenciados o país de origem do CTA usado na invenção; a evidência do consentimento prévio informado, e a evidência de benefícios, de acordo com o regime nacional do país de origem.
Para Juan Senant Flores a apropriação do CTA pelos instrumentos atuais de propriedade intelctual é uma forma mais sutil e mais complexa de colonização que aquelas da era moderna, quando se deu o processo de colonização de outras terras, outros povos e outras culturas. Embora durante séculos tivessem sido relegados ao patamar de “não ciência”, hoje se transfiguram em potenciais lucrativos para geração de produtos que num mundo cada vez uniformizado e monocultural encontra no conhecimento associado à diversidade natural potenciais produtos e novas medicinas.
Juan Senant Flores assinala ainda que estes mesmos povos que secularmente têm sido autônomos e que originalmente não tem necessitado de transferência de tecnologia para sua manutenção souberam reconhecer e utilizar e desenvolver os recursos que o meio natural oferecia e sobre os quais geraram o conhecimento tradicional associado.
2.1. CDB E REFLEXOS PARA A AMAZÔNIA
Embora criado com forte ingerência dos Estados Unidos a CDB constitui um avanço na temática da proteção dos conhecimentos tradicionais e da biodiversidade dos países do Sul. Além de consistir em grande avanço nas discussões sobre o tema no âmbito interncaional. No entanto, vigorosos esforços devem ser feitos para que os preceitos da CDB sejam efetivados e no caso da região amazônica a realidade transnacional também precisa ser melhor estudada para oferecer soluções face ao princípio da soberania dos povos para regulamentação de seus recursos e conhecimentos tradicionais associados.
Em nível regionalizado os países amazônicos já tratam de alguns temas como os recursos hídricos, cabe agora também o tratamento regionalizado da exploração dos recursos naturais e conservação do equilíbrio do meio ambiente na Amazônia, pois a sinergia entre os países para a busca de soluções quanto às diversas problemáticas do bioma, desde contaminação das águas por esgoto urbano, até o conhecimento tradicional compartilhado pelos povos amazônicos deve ser pensada como um todo poderá alcançar melhores resultados na proteção dos recursos naturais.
Enquato a CDB preceitua a soberania dos países para regulamentar o tema conhecimento tradicional os países da Amazônia. de cada Estado-nação em regulamentar seus recursos, reclamando por um tratamento mais relacionado com a soberania comparilhada, uma vez que os Estados amazônicos compartilham do mesmo bioma.
O Brasil, país-sede da Convenção sobre Diversidade Biológica de 1992, deve acrescer à “via crusis” legislativa a regulamentação de possíveis CTAs Transnacionais, não só em âmbito de Direito Interno, mas no patamar internacional - da biodiplomacia.
Abordado dentro da biodiplomacia, como um bloco ambiental-econômico, o bioma amazônico lidaria com o conhecimento tradicional associado transnacional de forma mais coerente com os objetivos do art 8j da CDB, fazendo a repartição dos benefícios oriundos do CTA transnacional ou sua proteção, possíveis frente ao jogo de mercado da bioindústria.
Ainda como exemplo, a Amazônia abriga em seu território povos tradicionais e indígenas que, sem enxergar fronteiras entre os países que a compõem produzem Conhecimento Tradicional Associado à biodiversidade (CTA) através de constante compartilhamento de saberes.
Estimulados pela tradição oral da difusão do conhecimento, pela troca de experiências sobre um mesmo bioma e pela lógica coletiva de intercâmbio de saberes, as diferentes populações e povos da região amazônica geram, por vezes, CTA assemelhado para Bolívia, Peru, Colômbia, Equador, Guiana, Suriname e Venezuela e Guiana Francesa. Podemos ver tal singularidade bem expressa na reportagem alencada no livro POVOS INDIGENAS NO BRASIL 1996-2000 do instituto Socioambiental ISA, exposto na pag. 413 que noticia:
TICUNAS DE ONDE? O cadastramento de estrangeiros no alto Solimoes (AM) já começa a preocupar autoridades eclesiasticas da região.. Os religiosos questionam o criterio que será adotado para cadastrar a população indigena – principalmente os TICUNA, que circulam de uma aldeia a outra, entre Brasil, Peru e Colombia, e não sabem a que pais exatamente pertencem (A Critica 27/01/1996).
Neste sentido, dentre outros exemplos os conhecimentos encontrados entre os povos tradicionais dos países fronteiriços convergem dentro de uma fronteira simbólica, que não corresponde a fronteira politica da soberania individualizada, mas que urge por uma soberania compartilhada. Bioma onde a nacionalidade as vezes é fragilizada diante da ordenação social, de forma que o CTA dos povos TICUNA do Brasil é também gerado e aperfeiçoado pelos TICUNA da Colômbia e Peru.
Ou seja, além de possuir similitude de recursos naturais, o bioma amazônico ainda apresenta particularidades nas regiões de fronteira política dos países amazônicos, os vínculos e mobilidade sociais que organizam as vidas de populações tradicionais e, em específico dos povos indígenas, nestas áreas torna o conhecimento de dificil contenção nas fronteiras políticas do país.
A Pan-Amazônia, portanto, por suas particularidades, reclama por um sistema normativo relacionado com a realidade dos povos tradicionais amazônicos, para assim poder efetivar a proteção ao conhecimento tradicional gerado nesta região transnacional.
Como já dito, inclusive, os países Amazônicos elaboraram o Tratado de Cooperação Amazônico, em prol da melhor gestão dos recursos hídricos (tal evento deu-se em 1978 (e a existência do mesmo para a discussão da temática agua continua sendo atual). A criação da Organização do Tratado de Cooperação Amazônico (OTCA) faz reviver o debate iniciado com a criação do TCA, mas os interesses comuns a serem discutidos pelos Estados da Pan-Amazonia podiam não estar tão restringidos e acrescer a questão da biodiversidade, e ainda do Conhecimento Tradicional Associado relativa ao bioma Amazônico, reivindicando por soluções.
2.2. ATÉ ONDE VAI A AMAZÔNIA?
Não existe uma uma única forma de definir a Amazônia; sua definição depende do fator ou fatores cosiderados e do que se quer fazer com tal definição.
Podemos utilizar o critério de bacia hidrográfica, critério selva tropical úmida com altas temperaturas, critérios legais ou administrativos. Podemos utilizar o critério nível da região toda, e nesse critério, estaria a definição do Tratado de Cooperação Amazônica (TCA) que em seu art 2º determina que o tratado se aplicará nos territórios das Partes Contratantes na Bacia Amazônica, assim como, também, em qualquer território de uma Parte Contratante que, pelas suas características geográficas, ecológicas ou econômicas, se considerem estritamente vinculado à mesma. Para superar as limitações de todos os critérios, Gutierrez, Acosta e Salazar (2004:32) propõem a definição Grande Amazônia, que é a região integrada pelos conceitos político-administrativos, ambientais e geográficos, e que é equivalente ao termo Pan-Amazônia.
A definição da Amazônia atende, grosso modo ao conceito grande amazônia, embora este ainda precise ser melhor definido.
2.3 QUAL A EXTENSÃO DA AMAZÔNIA TICUNA
Expressão das particularidades do tratamento do Conhecimento Tradicional na Amazônia é a realidade transnacional do bioma, que possui povos indígenas tais como os povos ticunas com comunidades espalhadas por diversos países (Peru, Brasil e Colômbia). Os Ticuna se distribuem na zona de fornteira de Colômbia, Peru e Brasil, ao longo do rio Amazonas, em uma extensão de 900km, compreendidos entre a desembocadura do rio Atacuari na Colômbia, até a desembocadura do rio Coari, no Brasil.
Na Colômbia se localizam nos municípios de Letícia e Porto Nariño, no Peru no departamento de Loreto, na província de Mainas, e nos distritos Ramón Castilla e Yavarí, no Brasil nos municípios de Tabatinga, Benjamin Constant, São Paulo de Olivença, Tefé, Santo Antônio do Içá, Jutái, Anamã, Beruri, Amaturá, Tonantins, Uarini, e Alvarães.
Reprodutores de uma cultura essencialmente oral, os povos ticunas repartem com os seus irmãos colombianos e peruanos os saberes ancestrais, assim como os ribeirinhos habitantes das áreas fronteiriças, também o fazem levando conhecimentos e promovendo o intenso intercâmbio entre os povos não enxergando as fronteiras politicamente erigidas pelos Estado-Nação.
A exemplo da exploração do recurso natural dos Ticuna, o curare, também outros saberes compartilhados entre as nações para sua efetiva proteção necessitam de um regramento capaz de refletir os interesses dos países amazônicos e a sua precedente transnacionalidade.
3. TCA - O QUE É?
Criado em 1978 e composto pelos oito países Amazônicos Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela, o Tratado de Cooperação Amazônica tem 25anos de vigência.
Embora nascido sob a inspiração de uma consciência ecológica, no seu texto se vê mais preocupações desenvolvimentistas que preocupações com a conservação do meioambiente1. A grande maioria dos seus artigos trata sobre a proteção dos recursos hídricos. A ênfase dos rios se justifica em razão da multiplicidade de funções que possuem no processo de desenvolvimento econômico e social da região amazônica. Em 2002 criou-se a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica – OTCA, que recentemente ampliou a abordagem dos temas, passando a abrager também a discussão sobre biodiversidade e conhecimento tradicional.
3.1 TCA COMO INSTRUMENTO IDEAL PARA TRATAR DO CONHECIMENTO TRADICIONAL NA AMAZÔNIA
1 SILVEIRA, Edson Damas. Ddireito Socioambiental – Tratado de Cooperação Amazônica O TCA possui duas características que fazem dele ideal para o tratamento da temática do Conhecimento Tradicional na Amazônia, pelo fato de ser um tratado multilateral fechado, pois restrito a Estados independentes com territórios naquele espaço geográfico e sem possibilidade de adesão; e por ser tratado guarda-chuva, ou seja, permite a inclusão de várias áreas temáticas em sua atividade.
Trazer para o debate sobre o assunto Conhecimento Tradicional Associado os países amazônicos permitirá um maior alcance dos mecanismos a serem criados atendendo as necessidades da região. Em 2002 foi implantada a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, organismo que surgiu para reafirmar os princípios objetivos de integração do TCA. Sob a direção da equatoriana Rosalía Arteaga nos seus se voltou para planificação onde se deu início a estudos sobre a região para formação da base de um plano estratégico que harmonizasse os interesses dos países componentes.
Em recente reunião a secretária-geral da OTCA afirmou que se intensificará a discussão sobre a biodiversidade e o conhecimento tradicional alargando o tema original do Tratado.
O trabalho integrador da OTCA proporcionará maiores resultados que o trabalho isolado dos países, assim também se dá com relação aos recursos hídricos e será igualmente interessante no que tange ao conhecimento tradicional.
Rosalía Arteaga, secretário-geral da OTCA, adverte que como organismo internacional a Organização do Tratado de Cooperação Amazonico não pode interferir diretamente, sob pena de ser acusada de violentar a soberania nacional. Os organismo internacionais só intervêm quando chamados pelo país. O trabalho da OTCA é o de harmonizar a ação entre os governos, começando por alguns temas fundamentais, e cada vez mais alargando as discussões para tratar também de biodiversidade e conhecimentro tradicional associado.
Para garantir a efetividade do TCA, no entanto lembrando que os saberes produzidos pelos povos tradicionais dos diferentes países por vezes são assemelhados é necessária uma aliança capaz de garantir benefícios, e não fomentar a concorrência entre os países, uma vez que levantando uma hipótese, caso certo produto fosse patenteado pelo Peru, e o mesmo resurso natural existisse no Brasil desencadearia um conflito biodiplomático, que deve ser por lógico evitado através de acordos regionais aos moldes do TCA.
Faz-se nescessário um projeto centrado na preocupação com um padrão de vida de vida decente para os amazônidas, que valorize todas as bandeiras amazônicas. Como trata Armando D. Mendes & Ignacy Sachs um projeto que leve em conta o veto ao (ab)uso desses recursos para sustentação de economias predadoras, levando em conta que o (ab)uso desses recursos pode-se fazer tanto pela exploração como pela conservação irracional.
Deve ser realizado um pacto onde se beneficia toda humanidade amazônica, assim como a extra-amazônica e o TCA parece ser ideal para este papel junto ao apoio da OTCA, e ainda das Universidades e Institutos de Pesquisa dos oito países amazônicos, congregados na UNAMAZ.
CONSIDERAÇÕES FINAIS (CONCLUSÕES ARTICULADAS)
1- O Conhecimento Tradicional Associado produzido na região Amazônica requer sinergia entre os Estados que compõem o bioma transnacional para a construção de um sistema de proteção efetiva ao conhecimento nele gerado, evitando que povos que usufruem e geram os mesmos saberes sejam prejudicados pela apropriação indébita;
2- O Tratado de Cooperação Amazônico ao reunir os oito países que possuem em seu território o bioma amazônico constitui-se em cenário ideal para criação de um projeto amazônico que através de discussões e estudos da realidade da região buscará soluções para o Direito Intelectual do conhecimento tradicional amazônico.;
3- Faz-se necessária criação de mecanismos de controle e monitoramento do respeito aos princípios a serem estabelecidos com a finalidade de proteger o conhecimento tradicional associado amazônico no âmbito do TCA.
REFERÊNCIAS
ALBAGLI, Sarita. Convenção sobre Diversidade Biológica: Uma visão a partir do Brasil. In. Dimensões Humanas da Biodiversidade. Petrópolis: Vozes, p.113-133, 2006.
ARAGÓN, Luiz E. Populações da Pan-Amazônia. Belém: NAEA, 2005.
ARIOSI, Mariângela F. Direito Internacional e Soberania Nacional. Jus navigandi, Teresina, ano 9, n.498, 17 nov.2004. Ddisponível em : http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5942. Acesso em : 02 nov. 2006.
BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico ; tradução Fernado Tomaz – 7ª ed. – Rio de janeiro ; Bertrand Brasil, 2004.
BRUNO, Paulo Roberyo Abreu ; ERTHAL, Regina de Carvalho (org). « Pra frente » com a escola: reflexões sobre a educação Ticuna, In. Rastros de memórias : histórias e trajetórias das populações indígenas na Amazônia. Manaus:EDUA, 2006.
CUNHA, Manuela Carneiro da; ALMEIDA, Mauro Barbosa, organizadores. Enciclopédia da Floresta. São Paulo : Companhia das Letras, 2002.
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MENDES, Armando D. ; SACHS Ignacy. A inserção da Amazônia no Mundo. In Faces do Trópico Úmido. Conceitos e Questões Sobre Desenvolvimento e Meio-ambiente.
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Embora não seja conhecimento individualizado, pertencente a um só criador vêm sendo apropriado nos moldes das patentes. Face à esta problemática no âmbito do TRIPS, o conselho TRIPS, fórum mais importante de discussão da proteção do conhecimento tradicionais, os países ricos em biodiversidade, e entre eles o Brasil, observando o Guia de Boas Condutas de Bonn, buscam a revisão do art. 27.3 (b), propondo emendas para que que sejam evidenciados o país de origem do CTA usado na invenção; a evidência do consentimento prévio informado, e a evidência de benefícios, de acordo com o regime nacional do país de origem.
Para Juan Senant Flores a apropriação do CTA pelos instrumentos atuais de propriedade intelctual é uma forma mais sutil e mais complexa de colonização que aquelas da era moderna, quando se deu o processo de colonização de outras terras, outros povos e outras culturas. Embora durante séculos tivessem sido relegados ao patamar de “não ciência”, hoje se transfiguram em potenciais lucrativos para geração de produtos que num mundo cada vez uniformizado e monocultural encontra no conhecimento associado à diversidade natural potenciais produtos e novas medicinas.
Juan Senant Flores assinala ainda que estes mesmos povos que secularmente têm sido autônomos e que originalmente não tem necessitado de transferência de tecnologia para sua manutenção souberam reconhecer e utilizar e desenvolver os recursos que o meio natural oferecia e sobre os quais geraram o conhecimento tradicional associado.
2.1. CDB E REFLEXOS PARA A AMAZÔNIA
Embora criado com forte ingerência dos Estados Unidos a CDB constitui um avanço na temática da proteção dos conhecimentos tradicionais e da biodiversidade dos países do Sul. Além de consistir em grande avanço nas discussões sobre o tema no âmbito interncaional. No entanto, vigorosos esforços devem ser feitos para que os preceitos da CDB sejam efetivados e no caso da região amazônica a realidade transnacional também precisa ser melhor estudada para oferecer soluções face ao princípio da soberania dos povos para regulamentação de seus recursos e conhecimentos tradicionais associados.
Em nível regionalizado os países amazônicos já tratam de alguns temas como os recursos hídricos, cabe agora também o tratamento regionalizado da exploração dos recursos naturais e conservação do equilíbrio do meio ambiente na Amazônia, pois a sinergia entre os países para a busca de soluções quanto às diversas problemáticas do bioma, desde contaminação das águas por esgoto urbano, até o conhecimento tradicional compartilhado pelos povos amazônicos deve ser pensada como um todo poderá alcançar melhores resultados na proteção dos recursos naturais.
Enquato a CDB preceitua a soberania dos países para regulamentar o tema conhecimento tradicional os países da Amazônia. de cada Estado-nação em regulamentar seus recursos, reclamando por um tratamento mais relacionado com a soberania comparilhada, uma vez que os Estados amazônicos compartilham do mesmo bioma.
O Brasil, país-sede da Convenção sobre Diversidade Biológica de 1992, deve acrescer à “via crusis” legislativa a regulamentação de possíveis CTAs Transnacionais, não só em âmbito de Direito Interno, mas no patamar internacional - da biodiplomacia.
Abordado dentro da biodiplomacia, como um bloco ambiental-econômico, o bioma amazônico lidaria com o conhecimento tradicional associado transnacional de forma mais coerente com os objetivos do art 8j da CDB, fazendo a repartição dos benefícios oriundos do CTA transnacional ou sua proteção, possíveis frente ao jogo de mercado da bioindústria.
Ainda como exemplo, a Amazônia abriga em seu território povos tradicionais e indígenas que, sem enxergar fronteiras entre os países que a compõem produzem Conhecimento Tradicional Associado à biodiversidade (CTA) através de constante compartilhamento de saberes.
Estimulados pela tradição oral da difusão do conhecimento, pela troca de experiências sobre um mesmo bioma e pela lógica coletiva de intercâmbio de saberes, as diferentes populações e povos da região amazônica geram, por vezes, CTA assemelhado para Bolívia, Peru, Colômbia, Equador, Guiana, Suriname e Venezuela e Guiana Francesa. Podemos ver tal singularidade bem expressa na reportagem alencada no livro POVOS INDIGENAS NO BRASIL 1996-2000 do instituto Socioambiental ISA, exposto na pag. 413 que noticia:
TICUNAS DE ONDE? O cadastramento de estrangeiros no alto Solimoes (AM) já começa a preocupar autoridades eclesiasticas da região.. Os religiosos questionam o criterio que será adotado para cadastrar a população indigena – principalmente os TICUNA, que circulam de uma aldeia a outra, entre Brasil, Peru e Colombia, e não sabem a que pais exatamente pertencem (A Critica 27/01/1996).
Neste sentido, dentre outros exemplos os conhecimentos encontrados entre os povos tradicionais dos países fronteiriços convergem dentro de uma fronteira simbólica, que não corresponde a fronteira politica da soberania individualizada, mas que urge por uma soberania compartilhada. Bioma onde a nacionalidade as vezes é fragilizada diante da ordenação social, de forma que o CTA dos povos TICUNA do Brasil é também gerado e aperfeiçoado pelos TICUNA da Colômbia e Peru.
Ou seja, além de possuir similitude de recursos naturais, o bioma amazônico ainda apresenta particularidades nas regiões de fronteira política dos países amazônicos, os vínculos e mobilidade sociais que organizam as vidas de populações tradicionais e, em específico dos povos indígenas, nestas áreas torna o conhecimento de dificil contenção nas fronteiras políticas do país.
A Pan-Amazônia, portanto, por suas particularidades, reclama por um sistema normativo relacionado com a realidade dos povos tradicionais amazônicos, para assim poder efetivar a proteção ao conhecimento tradicional gerado nesta região transnacional.
Como já dito, inclusive, os países Amazônicos elaboraram o Tratado de Cooperação Amazônico, em prol da melhor gestão dos recursos hídricos (tal evento deu-se em 1978 (e a existência do mesmo para a discussão da temática agua continua sendo atual). A criação da Organização do Tratado de Cooperação Amazônico (OTCA) faz reviver o debate iniciado com a criação do TCA, mas os interesses comuns a serem discutidos pelos Estados da Pan-Amazonia podiam não estar tão restringidos e acrescer a questão da biodiversidade, e ainda do Conhecimento Tradicional Associado relativa ao bioma Amazônico, reivindicando por soluções.
2.2. ATÉ ONDE VAI A AMAZÔNIA?
Não existe uma uma única forma de definir a Amazônia; sua definição depende do fator ou fatores cosiderados e do que se quer fazer com tal definição.
Podemos utilizar o critério de bacia hidrográfica, critério selva tropical úmida com altas temperaturas, critérios legais ou administrativos. Podemos utilizar o critério nível da região toda, e nesse critério, estaria a definição do Tratado de Cooperação Amazônica (TCA) que em seu art 2º determina que o tratado se aplicará nos territórios das Partes Contratantes na Bacia Amazônica, assim como, também, em qualquer território de uma Parte Contratante que, pelas suas características geográficas, ecológicas ou econômicas, se considerem estritamente vinculado à mesma. Para superar as limitações de todos os critérios, Gutierrez, Acosta e Salazar (2004:32) propõem a definição Grande Amazônia, que é a região integrada pelos conceitos político-administrativos, ambientais e geográficos, e que é equivalente ao termo Pan-Amazônia.
A definição da Amazônia atende, grosso modo ao conceito grande amazônia, embora este ainda precise ser melhor definido.
2.3 QUAL A EXTENSÃO DA AMAZÔNIA TICUNA
Expressão das particularidades do tratamento do Conhecimento Tradicional na Amazônia é a realidade transnacional do bioma, que possui povos indígenas tais como os povos ticunas com comunidades espalhadas por diversos países (Peru, Brasil e Colômbia). Os Ticuna se distribuem na zona de fornteira de Colômbia, Peru e Brasil, ao longo do rio Amazonas, em uma extensão de 900km, compreendidos entre a desembocadura do rio Atacuari na Colômbia, até a desembocadura do rio Coari, no Brasil.
Na Colômbia se localizam nos municípios de Letícia e Porto Nariño, no Peru no departamento de Loreto, na província de Mainas, e nos distritos Ramón Castilla e Yavarí, no Brasil nos municípios de Tabatinga, Benjamin Constant, São Paulo de Olivença, Tefé, Santo Antônio do Içá, Jutái, Anamã, Beruri, Amaturá, Tonantins, Uarini, e Alvarães.
Reprodutores de uma cultura essencialmente oral, os povos ticunas repartem com os seus irmãos colombianos e peruanos os saberes ancestrais, assim como os ribeirinhos habitantes das áreas fronteiriças, também o fazem levando conhecimentos e promovendo o intenso intercâmbio entre os povos não enxergando as fronteiras politicamente erigidas pelos Estado-Nação.
A exemplo da exploração do recurso natural dos Ticuna, o curare, também outros saberes compartilhados entre as nações para sua efetiva proteção necessitam de um regramento capaz de refletir os interesses dos países amazônicos e a sua precedente transnacionalidade.
3. TCA - O QUE É?
Criado em 1978 e composto pelos oito países Amazônicos Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela, o Tratado de Cooperação Amazônica tem 25anos de vigência.
Embora nascido sob a inspiração de uma consciência ecológica, no seu texto se vê mais preocupações desenvolvimentistas que preocupações com a conservação do meioambiente1. A grande maioria dos seus artigos trata sobre a proteção dos recursos hídricos. A ênfase dos rios se justifica em razão da multiplicidade de funções que possuem no processo de desenvolvimento econômico e social da região amazônica. Em 2002 criou-se a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica – OTCA, que recentemente ampliou a abordagem dos temas, passando a abrager também a discussão sobre biodiversidade e conhecimento tradicional.
3.1 TCA COMO INSTRUMENTO IDEAL PARA TRATAR DO CONHECIMENTO TRADICIONAL NA AMAZÔNIA
1 SILVEIRA, Edson Damas. Ddireito Socioambiental – Tratado de Cooperação Amazônica O TCA possui duas características que fazem dele ideal para o tratamento da temática do Conhecimento Tradicional na Amazônia, pelo fato de ser um tratado multilateral fechado, pois restrito a Estados independentes com territórios naquele espaço geográfico e sem possibilidade de adesão; e por ser tratado guarda-chuva, ou seja, permite a inclusão de várias áreas temáticas em sua atividade.
Trazer para o debate sobre o assunto Conhecimento Tradicional Associado os países amazônicos permitirá um maior alcance dos mecanismos a serem criados atendendo as necessidades da região. Em 2002 foi implantada a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, organismo que surgiu para reafirmar os princípios objetivos de integração do TCA. Sob a direção da equatoriana Rosalía Arteaga nos seus se voltou para planificação onde se deu início a estudos sobre a região para formação da base de um plano estratégico que harmonizasse os interesses dos países componentes.
Em recente reunião a secretária-geral da OTCA afirmou que se intensificará a discussão sobre a biodiversidade e o conhecimento tradicional alargando o tema original do Tratado.
O trabalho integrador da OTCA proporcionará maiores resultados que o trabalho isolado dos países, assim também se dá com relação aos recursos hídricos e será igualmente interessante no que tange ao conhecimento tradicional.
Rosalía Arteaga, secretário-geral da OTCA, adverte que como organismo internacional a Organização do Tratado de Cooperação Amazonico não pode interferir diretamente, sob pena de ser acusada de violentar a soberania nacional. Os organismo internacionais só intervêm quando chamados pelo país. O trabalho da OTCA é o de harmonizar a ação entre os governos, começando por alguns temas fundamentais, e cada vez mais alargando as discussões para tratar também de biodiversidade e conhecimentro tradicional associado.
Para garantir a efetividade do TCA, no entanto lembrando que os saberes produzidos pelos povos tradicionais dos diferentes países por vezes são assemelhados é necessária uma aliança capaz de garantir benefícios, e não fomentar a concorrência entre os países, uma vez que levantando uma hipótese, caso certo produto fosse patenteado pelo Peru, e o mesmo resurso natural existisse no Brasil desencadearia um conflito biodiplomático, que deve ser por lógico evitado através de acordos regionais aos moldes do TCA.
Faz-se nescessário um projeto centrado na preocupação com um padrão de vida de vida decente para os amazônidas, que valorize todas as bandeiras amazônicas. Como trata Armando D. Mendes & Ignacy Sachs um projeto que leve em conta o veto ao (ab)uso desses recursos para sustentação de economias predadoras, levando em conta que o (ab)uso desses recursos pode-se fazer tanto pela exploração como pela conservação irracional.
Deve ser realizado um pacto onde se beneficia toda humanidade amazônica, assim como a extra-amazônica e o TCA parece ser ideal para este papel junto ao apoio da OTCA, e ainda das Universidades e Institutos de Pesquisa dos oito países amazônicos, congregados na UNAMAZ.
CONSIDERAÇÕES FINAIS (CONCLUSÕES ARTICULADAS)
1- O Conhecimento Tradicional Associado produzido na região Amazônica requer sinergia entre os Estados que compõem o bioma transnacional para a construção de um sistema de proteção efetiva ao conhecimento nele gerado, evitando que povos que usufruem e geram os mesmos saberes sejam prejudicados pela apropriação indébita;
2- O Tratado de Cooperação Amazônico ao reunir os oito países que possuem em seu território o bioma amazônico constitui-se em cenário ideal para criação de um projeto amazônico que através de discussões e estudos da realidade da região buscará soluções para o Direito Intelectual do conhecimento tradicional amazônico.;
3- Faz-se necessária criação de mecanismos de controle e monitoramento do respeito aos princípios a serem estabelecidos com a finalidade de proteger o conhecimento tradicional associado amazônico no âmbito do TCA.
REFERÊNCIAS
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Leticia: Universidad NACIONAL DE Colombia, Unibiblos, p. 73, 2003.
*Advogada pela Universidade Federal do Amazonas, colaboradora do Núcleo de estudos estratégicos pan-amazônicos – NEEPA, e do Núcleo de Cultura política no Amazonas - NCPAM.
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