segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

MEMORIAL APONTA OS POSSÍVEIS DANOS DAS USINAS DO MADEIRA

Bruno Calixto *

O Instituto Madeira Vivo (IMV), uma organização de Rondônia que atua em defesa do rio Madeira, entrou recentemente com uma petição em forma de memoral para prestar esclarecimentos sobre a usina hidrelétrica de Santo Antônio, no rio Madeira.

Trata-se de uma petição chamada Amicus Curiae, ou Amigo da Corte, na tradução do latim. Ela é uma figura jurídica que recentemente tem sido aceita na jurisdição brasileira.

A petição, que foi oficialmente entregue no dia 15 de dezembro e ainda aguarda apreciação do juiz, permite a terceiros interessados em uma controvérsia jurídica fazer considerações em ações que tenham relevância social, como na área de direitos humanos ou meio ambiente.

De acordo com a advogada Fernanda Venzon, que coordenou a redação da petição, o Instituto Madeira Vivo pede ao juiz a participação na Ação Civil Pública proposta pelas organizações Amigos da Terra - Amazônia Brasileira, Associação de Defesa Etno-ambiental Kanindé e Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), em junho de 2009 contra a construção da usina de Santo Antônio.

"A ação foi promovida por organizações civis contra o governo e o consórcio. Mas o Amicus Curiae não está defendendo nem uma parte, nem outra. Ele defende os interesses sociais e ambientais que estão em jogo nessa questão. Ele serve para mostrar ao juiz que tem mais coisas a serem vistas, principalmente na questão de direitos humanos".

Direitos Humanos - A contribuição do IMV para a ação levanta problemas na construção da usina de Santo Antônio que resultam em danos às populações afetadas. O texto, por exemplo, questiona o tratamento dado pelos empreendedores e governo aos povos indígenas, já que o licenciamento "deixou desprotegidos os povos indígenas isolados, sobre os quais não há sequer estudos de impacto ambiental, pese a que a obras já começaram, o que os põe em situação de extrema vulnerabilidade".

Além disso, Fernanda ressalta que não foram feitas consultas às populações afetadas no Brasil, muito menos na Bolívia. "Os impactos na Bolívia praticamente sumiram dos estudos!". Segundo o Amicus Curiae, as populações devem ser consultadas, pois elas têm "uma relação profunda com suas terras e recursos naturais. Devido a esta relação, seus direitos humanos fundamentais estão estreitamente vinculados com o bem-estar de suas terras e recursos naturais, o que os deixa vulneráveis quando alguma atividade impacta negativamente o ambiente do qual dependem".

O texto mostra que existem diversos problemas nos estudos e no tratamento dado aos povos indígenas impactados. Por exemplo, as comunidades localizadas à jusante dos empreendimentos foram desconsideradas nos estudos, não foi dada a devida importância à presença de povos isolados na área de influência das usinas e as medidas tomadas são "insuficientes para compensar ou mitigar os impactos".

O documento também levanta falhas no processo de licenciamento ambiental, como a pressão para aprovar as usinas e a arbitrariedade na concessão das licenças. Um exemplo foi substituir os Estudos de Impacto Ambiental (EIA) não aprovados pela equipe técnica do IBAMA por pareceres de consultores independentes, que foram realizados às pressas e sem discussão em audiências públicas.

Amicus Curiae - Desde o início do século XX, o instituto jurídico denominado Amicus Curiae (“Amigo da Corte”) é adotado na Suprema Corte norte-americana, objetivando proteger direitos coletivos (de grupos identificados) ou de proteger direitos difusos (da sociedade em geral). Sua função é chamar a atenção dos julgadores para alguma matéria que poderia, de outra forma, escapar-lhe ao conhecimento. Um memorial de amicus curiae é produzido, assim, por quem não é parte no processo, com vistas a auxiliar a Corte para que esta possa proferir uma decisão acertada, ou com vistas a sustentar determinada tese jurídica em defesa de interesses públicos e privados de terceiros, que serão indiretamente afetados pelo desfecho da questão. Recentemente, este instituto passou a ser utilizado no Brasil em processos junto ao Supremo Tribunal Federal e nos Tribunais de Justiça dos Estados.

A Afirmação é do professor e advogado Luiz Fernando Martins da Silva, que é doutorando em Ciência Política do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro – IUPERJ. O instituto em pauta "tem por função chamar a atenção dos julgadores para alguma matéria que poderia, de outra forma, escapar-lhe ao conhecimento. Um memorial de amicus curiae implica em substantivas modificações na jurisdição e no processo constitucional brasileiro, ocasionando inédito alargamento da legitimidade para participar e interpretar a Constituição nos processos de controle concentrado de constitucionalidade, que tramitam nos Tribunais de Justiça dos Estados e no Supremo Tribunal Federal", conclui o professor.

(*) É colaborador da Amazônia.og.br

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