sábado, 9 de janeiro de 2010

A QUEDA DO "AMIGO DA ONÇA" DOS TRÓPICOS


Ademir Ramos (*)

Na cultura popular ser “amigo-da-onça” significa colocar o outro em situação constrangedora às vezes por motivo banal ou quase sempre em benefício próprio. A encarnação do personagem foi eternizada na literatura pelos traços do nordestino Péricles de Andrade Maranhão, cartunista da Revista Cruzeiro, na década de 40, no século passado, quando o personagem deixava “nu com as mãos no bolso” seu interlocutor, sem saber explicar as razões apresentadas pelo amigo muito mais da onça do que do homem.

Na política, o “amigo da onça” é parte de uma fauna da floresta que vive do abate do povo. Para isso, de forma sorrateira vale-se dos artifícios do felino para dominar e saquear a riqueza dessa gente. Esse ator político apresenta-se em situações mais diversa possível, fazendo crer que sem ele nada se move e o pior, pelo poder da mídia, consegui arrebatar votos para legitimar seus planos, instituindo uma legião de predadores e abutres, que juntos promovem a perversa desigualdade social e a miséria do povo, beneficiando-se diretamente do orçamento do Estado.

Em situação, concorda-se com o filósofo Pascal, quando em seus Pensamentos afirmava que: “o poder dos reis baseia-se na razão e na loucura do povo”. Razão operacional esta, que se manifesta por meio da mídia, da cooptação dos agentes públicos ou privados, reduzindo os poderes da República em instrumento de negociata e outras trapaças governamentais. O jogo é concebido e pensado visando à perpetuação do Poder sob as garras dos felinos e abutres.

A loucura do povo, por sua vez, deixa de ser criativa e passa a ser mórbida. Resultante das relações instituídas pelo amigo da onça e seus abutres, que passam a manipular o povo e suas lideranças com propósito de reproduzir a dependência e a submissão. Dessa feita, expropriam das organizações sociais sua forças material e política, transformando a sociedade em curral, presa fácil para os abates dos governantes amigos da onça promotores do desencanto e da miséria dessa gente.

Passado o tempo, o descaminho da racionalidade destes governantes faz o povo resgatar suas forças, fortalecendo suas organizações e qualificando suas propostas de luta de forma criativa apostando nas suas próprias forças. Nesta direção, as lideranças políticas dos segmentos sociais avançam na formulação de políticas públicas que beneficiem diretamente o coletivo, impondo a derrota nas urnas e o ostracismo histórico aos políticos predadores, que se escondem nesta floresta dos trópicos.

O processo está em curso, podendo surpreender a todos porque é sabido que não há males que durem para sempre e o sol que brilhava apenas para alguns pode a vir lumiar o caminho de todos sob o controle e a força da sociedade civil organizada aparelhada da justiça social. Desse modo, o dito de Pascal transforma-se em conceito traduzido em soberania popular ancorado na democracia participativa.

(*) Professor, antropólogo e coordenador do NCPAM/UFAM.

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