Tenório Telle (*)
Milagre inefável e mágico, as flores simbolizam tudo o que há de mais belo, simples e inexplicável na tessitura da vida. Com beleza de suas cores, a delicadeza de suas pétalas, macias como a pele dos bebês, e o perfume de sua corolas encantam a existência, fascinam os poetas e alegram o cotidiano dos homens.
As flores encerram, no efêmero milagre de nascer e florescer, toda a eternidade. E por isso fascinam e nos ensinam que o belo e o grandioso estão nas coisas mais simples. Embora tanta gente siga iludida com ouro e trono.
Ser eterno é ser bom, gostar das crianças, ser solidário com os indefesos e se admirar com o voo das borboletas, com o amanhecer e com a brejerice dos passarinhos. Ou com o caminhar faceiro dos calanguinhos entre as pedrinhas do jardim.
A flor que refiro é uma corajosa e bela mulher que acaba de partir deste mundo. É Dona Zilda Arns. Sua passagem pela terra foi abreviada por uma fatalidade. Seu generoso coração parou de pulsar - mas seus ideais e seu trabalho a favor das crianças pobres deste país continuam na motivação e compromisso dos milhares de voluntários de sua causa.
Não poderia ter tido morte mais expressiva, no cumprimento de seu dever moral e social. Sua passagem tem profundo conteúdo poético caiu ao lado daqueles que elegeu como a razão de ser de sua ação humana e política. É simbólico que tenha sido no Haiti, um dos países mais miseráveis do planeta.
O Haiti sucumbiu à corrupção, a governos tirânicos e corruptos, especialmente à falta de espírito público e republicano de suas elites. Peço ao bom Deus que o Brasil nunca se transforme num Haiti, embora não nos falta coveiros. Foi lá, nesse terra desolada pela dor, pobreza e abandono do povo que Dona Zilda perdeu sua vida. Que o seu sangue ajude a regenerar as forças vitais desse pobre país e faça germinar as sementes da esperança, do bem, da solidariedade e do futuro - para que as crianças tenham direito de nascer e crescer, e ajudem a reconstruir sua pátria.
A morte de Dona Zilda não foi em vão. Não foi em vão pelo bem que fez aos seres humanos, pelo exemplo de cidadania com os seus semelhantes. Sua história é a negação desse modo de vida que elegemos como modelo.
Essa mulher quis para sua existência não tesouros, posição ou vaidade. Quis servir. Fez-se média não por status ou por ambição, mas para ajudar a cuidar das crianças do Brasil: salvá-las da fome e da desatenção.
Com essa história exemplar e nobre, ganha lugar de destaque entre os benfeitores da humanidade. Seu legado são suas realizações, seu amor ao próximo. É sua história de luta, de alguém que não ficou esperando no porto, nem choramingando, ou "dentro do apartamento com a boca escancarada esperando a morte chegar". Fez acontecer, fez sua parte. Transformou seu sonho em realidade.
Que os espíritos protetores e os anjos a acolham na morada dos bons e dos justos.
(*) É professor, poeta, escritor, membro da Academia de Letras do Amazonas e articulista de A Crítica.
Nenhum comentário:
Postar um comentário