quarta-feira, 18 de novembro de 2009
EDUCAR PARA NÃO PROIBIR: UMA PARTILHA...
Edison Hüttner (*)
Faz tempo que queria partilhar minha experiência de campo com os índios Arara de Ji-Paraná em Rondônia, estive lá em 2007 apoiando o setor de saúde indígena. Me chamou atenção este fato. Eu estava numa bar feito de madeira, distante 5 quilômetros da aldeia dos índios Arara onde estava acampado. Apareceu um índio amigo meu para comprar uma garrafa de cerveja. O dono do bar mostrou uma lei para o índio dizendo que não podia vender para índios bebida alcoólica, e mostrou colado na parede, numa folha de papel, o Xerox da Lei que o impedia de vender. O índio foi embora – sem poder comprar sua garrafa, muito triste. Eu diria, sentido-se descriminado... O vendedor me disse que se ele vendesse, ele seria responsável pelo que aconteceria com o índios em caso de acidente, etc.É muito difícil para eles. No Brasil é proibido vender bebida alcoólica para índios. É claro que eles conseguem por outros meios, mas fazer “escondido, proibido”, não faz bem. Talvez seja este um dos fatores que conduz ao alcoolismo nas aldeias.
Noutra ocasião, em Brasília, 2006, eu estava com amigos num bar. Logo chegaram 3 índios vindos do interior, de bermuda e camiseta e pediram duas cervejas – Alguém no bar levantou o braço e disse: “O senhor não pode vender bebida alcoólica para índio”... os três saíram quietos. Fiquei olhando a cena. Tendo presente estes fatos, pois já faz um bom tempo que estou vendo o momento certo para partilhá-los e encaminhá-los ao seu devido lugar de discernimento e desdobramento.
Primeiros argumentos para discussão:
A Lei que segue abaixo, a mesma colocada no bar em Ji-Paraná, a mesma que impediu os índios de comprar cerveja em Brasília – precisa ser revista e se possível abolida.
1º. Porque é descriminação;
2º. Pela nova Constituição de 1988: “III - autodeterminação dos povos. Art. 5.º Todos são iguais perante a lei”;
3º. Estamos num novo tempo de autonomia dos povos indígenas – de valorização de sua cultura, de seu ensino nas escolas garantida também por Lei – do numero de escolas indígenas bilíngüe. O que diremos nas escolas sobre esta Lei de proibição? Realmente já é momento de mudar;
4º. Não é com proibição que se vai impedir a bebida alcoólica nas aldeias, mas é com educação. Como é em toda família livre no Brasil.
Hoje no Brasil o Estatuto do Índio em sua LEI Nº 6.001 - De 19 de Dezembro de 1973,
CAPÍTULO II - Dos Crimes Contra os Índios, Art.58°, diz:
“III - propiciar, por qualquer meio, a aquisição, o uso e a disseminação de bebidas alcoólicas, nos grupos tribais entre índios não integrados. Pena - detenção de seis meses a dois anos;” http://www.funai.gov.br/quem/legislacao/estatuto_indio.html
Esta Lei em vigor reflete o século XVI, numa das “Recopilación de Leyes de los Reinos de las Indias”: No Livro VI, Lei 36. Titulo Primeiro dos Índios. Diz:
“Que não se pode vender vinho aos índios”. Disponível em: http://www.congreso.gob.pe/ntley/LeyIndiaP.htm Atualizado em 18/11/2009.
Acredito que este tema precisa ser colocado em pauta na perspectiva da luta pelo direito – deva ser levado ao Ministério da Justiça. Contem comigo no que precisar.
(*) É Coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Cultura Indígena da PUCRS.
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