Luciney Araújo
A cultura religiosa africana foi desenvolvida no Brasil através do conhecimento de sacerdotes negros, que com parte de seu povo, foram capturados e escravizados juntamente com seus Deuses entre 1532 e 1888. A legitimidade apresentada nas diversas nações de candomblé, existentes na cidade de Manaus, partem da premissa da chegada dos negros no Amazonas. Essa legitimidade, tanto no Candomblé de Angola como no de Nação Ketu utiliza a categoria de pureza na demarcação de sua categoria a fim de marcar sua identidade e legitimação.
Os primeiros autores que estudaram as religiões de matriz-africana indicavam a existência de outras formas de manifestação religiosa que se diferenciavam de algumas casas de cultos tradicionais da cidade de Salvador, como é o caso das Nações Angola e Jeje. Autores como Edson Carneiro (1991), Artur Ramos (1962), Ruth Landes (1967), Nina Rodrigues (1988) já apresentavam em seus estudos uma diversidade étnica entre os descendentes de africanos que tinham o candomblé como religião. Até a primeira metade do século XX os estudiosos apresentavam o candomblé como uma única religião oriunda do continente africano.
Em estudos sobre religiosidade de matriz africana na região amazônica, o Antropólogo Sergio Ferreti (1983) apresenta uma lacuna sobre dados dessas religiões no Estado do Amazonas, apontando para o fato da presença de escravos na região amazônica ser pouco estudada e também pela proporção de números de escravos que vieram para a região. Os estudos mais conhecidos sobre as religiões de matriz africana no Estado do Amazonas, obras são dos pesquisadores Chester Gabriel (1985), Nunes Pereira (1947), Mario Ypiranga Monteiro (1983) e comunicações do pesquisador Geraldo Pinheiro a Nunes Pereira. No ano de 2005, a Cientista Social, Glacy Ane A. de Souza, apresentou seu trabalho monografia intitulado “A Festa do Povo de Santo”, na qual faz uma leitura etnográfica de três terreiros de candomblé na cidade de Manaus.
Autores como Reginaldo Prandi (1991), Sérgio Ferretti (1983), Stefania Capone (2004) começam a desmistificar a noção de que o candomblé era uma nação pura, e inicia apresentação das diferentes nações que formam o candomblé no Brasil.
Na cidade de Manaus, assim como em outros centros do país a instituição do Candomblé de Angola como religião data apenas da segunda metade do século XX. Diferente das outras cidades Manaus sofria uma grande influência de terreiros de origem Jeje, elementos indígenas, de umbanda e batuques, conforme relatos de Chester Gabriel (1985) de que “em Manaus, no período de 1970-73, todos os grupos pareciam ter ainda uma forte base de catolicismo”. O autor afirma que, esses batuques que eram realizados na cidade foram apresentados como de linhagem africana devido o uso de tambores, e tinham suas origens casas de culto afro tradicionais como as de Belém e do Maranhão. Com isso, os dados apresentados pelo autor apontam que, até meados da década de 1970, a inexistência de um Candomblé de Nação Angola, ou seja, a predominância de cultos denominados afros era representada pelo Batuque, na qual apresentava elementos sincréticos com outras formas religiosas, como o catolicismo, o kardecismo e a pajelança.
Gabriel (1985) faz um levantamento detalhado dos cultos afros na cidade de Manaus, onde o autor aponta apenas a existência de Centros, Mesinha de Cura ou Banquinha de Cura de Batuque e Tambores que até no inicio da década de 1970 eram vistos como de tradição africana ou linha africana, porém não se faziam os rituais completos de iniciação e nem festas dedicados os Inkissess. Esses dados levantados por Gabriel vão ao encontro com relatos e entrevistas coletados no Abassá de Angola, de que apenas em 1975, com a chegada do Tata de Inkissess baiano Wilson Falcão que se teve o primeiro toque para Inkisses em terras amazonenses, que fora realizado.
O candomblé é fruto de tradições e nações – jeje, nagô ou angola-, os terreiros são frutos de um processo histórico, uma nova reconstrução de identidades de tradições religiosas africanas e que preza uma visibilidade e uma reaproximação com um complexo cultural-religioso africano, onde a oralidade e a incorporação de novos símbolos visam buscar essa reafirmação e constitui uma filosofia de vida. Geertz aponta que: (...) “os significados transmitidos historicamente, incorporados em símbolos, um sistema de concepções herdadas, expressas em formas simbólicas por meio das quais os homens se comunicam, perpetuam e desenvolvem seu conhecimento e suas atividades e relação à vida”.
Nos depoimentos colhidos durante as pesquisas de campo realizadas no Abassá de Angola, o posicionamento de ambos informantes aponta que foi Tata de Inkisses Wilson Falcão Real a pessoal responsável pela formação da primeira família de candomblé de Angola em Manaus, datando de meados da década de 1970.
Comparando os depoimentos colhidos no Abassá de Angola com dados apresentados por Chester Gabriel (1985), levam a crer que a instituição do Candomblé de Angola de Angola deu-se em meados da década de 1970 e apontam Wilson Falcão Real como precursor da religião na cidade de Manaus e promovendo a saída de um primeiro barco de iniciados no candomblé de Angola.
Wilson Falcão Real ganha um terreno na Estrada da Cidade Nova e constrói o Inzo Muzambo Tata Multambô, local onde Mãe Dora receberia o cargo de Yakekeré da casa, e se tornaria herdeira de Wilson Falcão Real. Que funcionaria até o ano de 1990 ano em que Wilson Falcão Real falece após uma parada cardíaca decorrente de uma agressão sofrida em frente a sua residência. Considerada a extensão do Inzo Munzanbo Tata Mutalembê o Abassá de Angola da Danda Keumaze é fundado no ano de 1996, em um terreno pertencente a família de Mãe Dora, preserva em sua estrutura religiosa elementos fincados por Wilson Falcão Real, tendo em sua essência os costumes do candomblé de Angola e em sua liturgia o culto a Nkisses, caboclos e boiadeiros.
A lacuna existente nos estudos sobre negros no Amazonas e principalmente estudos referentes à sua religiosidade é uma das dificuldades enfrentadas na construção pesquisa sobre o candomblé de Angola em Manaus, os dados encontrados na construção dessa pesquisa apresentam uma forte influencia das casas de culto de Tambor de Mina, como foram apontados por Chester Gabriel (1985), de que na primeira metade da década de 1970, existia em Manaus uma predominância de casas de Tambor de Mina. Com a chegada de Wilson Falcão Real na década de 1970, uma nova configuração das casas de culto afro se formaria na cidade, ou seja, a fundação de um Abassá, a saída de um barco de yaôs e muzenzas, a constituição de uma família-de-santo e a chegada de pessoas que exerciam “cargos” dentro da religião, ajudaram na formação de uma nova denominação religiosa na cidade.
Existem em Manaus hoje, duas casas de candomblé de Angola, ambas localizadas no bairro do Lírio do Valle, com duas irmãs de santo em sua direção, Mãe Dora e Mãe Dimas, ajudam na preservação da memória de Tata Wilson Falcão Real, consideradas por elas como responsável pela iniciação de ambas Mametos de Nkisses na religião e na preservação dos costumes e ritos dos antepassados africanos.
Bibliografia
CAPONE, Stefania: A Busca da África no Candomblé - Tradição e Poder no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Pallas e Contra-Capa, 2004.
CARNEIRO, Edson: Religiões Negras - Negros Bantos. Editora Civilização Brasileira, 3° Edição. Rio de Janeiro, 1948.
FERRETTI, Sergio F: Querebentã da Zomadonu. Etnografia da Casa das Minas. São Luís: EDUFMA, 1996, 2 ª Ed.
GABRIEL, Chester: Comunicação dos Espíritos - Umbanda, Cultos Regionais em Manaus e a Dinâmica do Transe Mediúnico. São Paulo: Loyola, 1985.
GEERTZ, Clifford: A Interpretação das Culturas. Editora LTC. Rio de Janeiro, 1989.
LANDES, Ruth: A Cidade das Mulheres. Tradução de Maria Lúcia do Eirado Silva. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1967.
MONTEIRO, Mário Ypiranga: Cultos de Santos & Festas Profano-Religiosas. Manaus, Imprensa Oficial, 1983.
PEREIRA, NUNES, M: A Casa das Minas - O Culto dos Voduns Jeje no Maranhão. Petrópolis: Vozes, 1979
PRANDI, Reginaldo: Os Candomblés de São Paulo - A Velha Magia na Metrópole Nova. São Paulo, Hucitec, 1991.
RAMOS, Arthur: Introdução à Antropologia Brasileira. Obras Complementas 1° Volume 3° Ed, Editora da Casa do Estudante do Brasil. Rio de Janeiro, 1961.
RODRIGUES, Nina: Os Africanos no Brasil. Editora UnB, Brasília; 7º Edição, 1988.
SOUZA, Glacy Ane A.: A Festa do Povo-de-Santo – Festas em Terreiros de Batuque de Manaus. 2001. 127 f. Monografia (Graduação em Ciências Sociais) – Instituto de Ciências Humanas e Letras, Universidade Federal do Amazonas, Manaus. 2005.
(*) É pesquisador do NCPAM/UFAM e um dos especialistas da cultura e religiosidade afro na Amazônia.
A cultura religiosa africana foi desenvolvida no Brasil através do conhecimento de sacerdotes negros, que com parte de seu povo, foram capturados e escravizados juntamente com seus Deuses entre 1532 e 1888. A legitimidade apresentada nas diversas nações de candomblé, existentes na cidade de Manaus, partem da premissa da chegada dos negros no Amazonas. Essa legitimidade, tanto no Candomblé de Angola como no de Nação Ketu utiliza a categoria de pureza na demarcação de sua categoria a fim de marcar sua identidade e legitimação.
Os primeiros autores que estudaram as religiões de matriz-africana indicavam a existência de outras formas de manifestação religiosa que se diferenciavam de algumas casas de cultos tradicionais da cidade de Salvador, como é o caso das Nações Angola e Jeje. Autores como Edson Carneiro (1991), Artur Ramos (1962), Ruth Landes (1967), Nina Rodrigues (1988) já apresentavam em seus estudos uma diversidade étnica entre os descendentes de africanos que tinham o candomblé como religião. Até a primeira metade do século XX os estudiosos apresentavam o candomblé como uma única religião oriunda do continente africano.
Em estudos sobre religiosidade de matriz africana na região amazônica, o Antropólogo Sergio Ferreti (1983) apresenta uma lacuna sobre dados dessas religiões no Estado do Amazonas, apontando para o fato da presença de escravos na região amazônica ser pouco estudada e também pela proporção de números de escravos que vieram para a região. Os estudos mais conhecidos sobre as religiões de matriz africana no Estado do Amazonas, obras são dos pesquisadores Chester Gabriel (1985), Nunes Pereira (1947), Mario Ypiranga Monteiro (1983) e comunicações do pesquisador Geraldo Pinheiro a Nunes Pereira. No ano de 2005, a Cientista Social, Glacy Ane A. de Souza, apresentou seu trabalho monografia intitulado “A Festa do Povo de Santo”, na qual faz uma leitura etnográfica de três terreiros de candomblé na cidade de Manaus.
Autores como Reginaldo Prandi (1991), Sérgio Ferretti (1983), Stefania Capone (2004) começam a desmistificar a noção de que o candomblé era uma nação pura, e inicia apresentação das diferentes nações que formam o candomblé no Brasil.
Na cidade de Manaus, assim como em outros centros do país a instituição do Candomblé de Angola como religião data apenas da segunda metade do século XX. Diferente das outras cidades Manaus sofria uma grande influência de terreiros de origem Jeje, elementos indígenas, de umbanda e batuques, conforme relatos de Chester Gabriel (1985) de que “em Manaus, no período de 1970-73, todos os grupos pareciam ter ainda uma forte base de catolicismo”. O autor afirma que, esses batuques que eram realizados na cidade foram apresentados como de linhagem africana devido o uso de tambores, e tinham suas origens casas de culto afro tradicionais como as de Belém e do Maranhão. Com isso, os dados apresentados pelo autor apontam que, até meados da década de 1970, a inexistência de um Candomblé de Nação Angola, ou seja, a predominância de cultos denominados afros era representada pelo Batuque, na qual apresentava elementos sincréticos com outras formas religiosas, como o catolicismo, o kardecismo e a pajelança.
Gabriel (1985) faz um levantamento detalhado dos cultos afros na cidade de Manaus, onde o autor aponta apenas a existência de Centros, Mesinha de Cura ou Banquinha de Cura de Batuque e Tambores que até no inicio da década de 1970 eram vistos como de tradição africana ou linha africana, porém não se faziam os rituais completos de iniciação e nem festas dedicados os Inkissess. Esses dados levantados por Gabriel vão ao encontro com relatos e entrevistas coletados no Abassá de Angola, de que apenas em 1975, com a chegada do Tata de Inkissess baiano Wilson Falcão que se teve o primeiro toque para Inkisses em terras amazonenses, que fora realizado.
O candomblé é fruto de tradições e nações – jeje, nagô ou angola-, os terreiros são frutos de um processo histórico, uma nova reconstrução de identidades de tradições religiosas africanas e que preza uma visibilidade e uma reaproximação com um complexo cultural-religioso africano, onde a oralidade e a incorporação de novos símbolos visam buscar essa reafirmação e constitui uma filosofia de vida. Geertz aponta que: (...) “os significados transmitidos historicamente, incorporados em símbolos, um sistema de concepções herdadas, expressas em formas simbólicas por meio das quais os homens se comunicam, perpetuam e desenvolvem seu conhecimento e suas atividades e relação à vida”.
Nos depoimentos colhidos durante as pesquisas de campo realizadas no Abassá de Angola, o posicionamento de ambos informantes aponta que foi Tata de Inkisses Wilson Falcão Real a pessoal responsável pela formação da primeira família de candomblé de Angola em Manaus, datando de meados da década de 1970.
Comparando os depoimentos colhidos no Abassá de Angola com dados apresentados por Chester Gabriel (1985), levam a crer que a instituição do Candomblé de Angola de Angola deu-se em meados da década de 1970 e apontam Wilson Falcão Real como precursor da religião na cidade de Manaus e promovendo a saída de um primeiro barco de iniciados no candomblé de Angola.
Wilson Falcão Real ganha um terreno na Estrada da Cidade Nova e constrói o Inzo Muzambo Tata Multambô, local onde Mãe Dora receberia o cargo de Yakekeré da casa, e se tornaria herdeira de Wilson Falcão Real. Que funcionaria até o ano de 1990 ano em que Wilson Falcão Real falece após uma parada cardíaca decorrente de uma agressão sofrida em frente a sua residência. Considerada a extensão do Inzo Munzanbo Tata Mutalembê o Abassá de Angola da Danda Keumaze é fundado no ano de 1996, em um terreno pertencente a família de Mãe Dora, preserva em sua estrutura religiosa elementos fincados por Wilson Falcão Real, tendo em sua essência os costumes do candomblé de Angola e em sua liturgia o culto a Nkisses, caboclos e boiadeiros.
A lacuna existente nos estudos sobre negros no Amazonas e principalmente estudos referentes à sua religiosidade é uma das dificuldades enfrentadas na construção pesquisa sobre o candomblé de Angola em Manaus, os dados encontrados na construção dessa pesquisa apresentam uma forte influencia das casas de culto de Tambor de Mina, como foram apontados por Chester Gabriel (1985), de que na primeira metade da década de 1970, existia em Manaus uma predominância de casas de Tambor de Mina. Com a chegada de Wilson Falcão Real na década de 1970, uma nova configuração das casas de culto afro se formaria na cidade, ou seja, a fundação de um Abassá, a saída de um barco de yaôs e muzenzas, a constituição de uma família-de-santo e a chegada de pessoas que exerciam “cargos” dentro da religião, ajudaram na formação de uma nova denominação religiosa na cidade.
Existem em Manaus hoje, duas casas de candomblé de Angola, ambas localizadas no bairro do Lírio do Valle, com duas irmãs de santo em sua direção, Mãe Dora e Mãe Dimas, ajudam na preservação da memória de Tata Wilson Falcão Real, consideradas por elas como responsável pela iniciação de ambas Mametos de Nkisses na religião e na preservação dos costumes e ritos dos antepassados africanos.
Bibliografia
CAPONE, Stefania: A Busca da África no Candomblé - Tradição e Poder no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Pallas e Contra-Capa, 2004.
CARNEIRO, Edson: Religiões Negras - Negros Bantos. Editora Civilização Brasileira, 3° Edição. Rio de Janeiro, 1948.
FERRETTI, Sergio F: Querebentã da Zomadonu. Etnografia da Casa das Minas. São Luís: EDUFMA, 1996, 2 ª Ed.
GABRIEL, Chester: Comunicação dos Espíritos - Umbanda, Cultos Regionais em Manaus e a Dinâmica do Transe Mediúnico. São Paulo: Loyola, 1985.
GEERTZ, Clifford: A Interpretação das Culturas. Editora LTC. Rio de Janeiro, 1989.
LANDES, Ruth: A Cidade das Mulheres. Tradução de Maria Lúcia do Eirado Silva. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1967.
MONTEIRO, Mário Ypiranga: Cultos de Santos & Festas Profano-Religiosas. Manaus, Imprensa Oficial, 1983.
PEREIRA, NUNES, M: A Casa das Minas - O Culto dos Voduns Jeje no Maranhão. Petrópolis: Vozes, 1979
PRANDI, Reginaldo: Os Candomblés de São Paulo - A Velha Magia na Metrópole Nova. São Paulo, Hucitec, 1991.
RAMOS, Arthur: Introdução à Antropologia Brasileira. Obras Complementas 1° Volume 3° Ed, Editora da Casa do Estudante do Brasil. Rio de Janeiro, 1961.
RODRIGUES, Nina: Os Africanos no Brasil. Editora UnB, Brasília; 7º Edição, 1988.
SOUZA, Glacy Ane A.: A Festa do Povo-de-Santo – Festas em Terreiros de Batuque de Manaus. 2001. 127 f. Monografia (Graduação em Ciências Sociais) – Instituto de Ciências Humanas e Letras, Universidade Federal do Amazonas, Manaus. 2005.
(*) É pesquisador do NCPAM/UFAM e um dos especialistas da cultura e religiosidade afro na Amazônia.
4 comentários:
gostaria de saber o endereço...deixe por email paulinha_freitas_28@hotmail.com
aguem pode me dar o inderço dos barracao?
Tudo aqui em Manaus endereço por favor
Abre a xereca e deixa eu botar meu pauzão ai
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