sexta-feira, 24 de setembro de 2010

UM PAÍS DE PASPALHOS

Ellza Souza (*)

Foi só um sonho. Sonhei que vivia num país onde a maioria da população vota em candidato que encabeça as pesquisas, para “não perder o voto”. Vota em cantor, apresentador, palhaço, em mulher feia de cara mas recheada de silicone, vota no doutor que não conhece, vota no que lhe dá um abraço em campanha sem reparar na cara de nojo que o candidato faz, vota naquele que dá dentadura, um milheiro de tijolos, uma dúzia de tábuas, um óculos, uma bolsa –esmola. Não deu para entender o nome do país pois antes disso acordei.

É inacreditável que exista, mesmo nos mais inusitados sonhos, um país assim. Pelo que entendi o país dos meus sonhos já havia passado uma fase de repressão, de inflação, de censura, mas as coisas foram mudando, mudando e até melhorou mas sem querer querendo tudo foi retrocedendo novamente. As instituições foram perdendo a credibilidade, todos reclamam de tudo, o posto de saúde atende mal, a escola está ruim, na universidade federal faltam os recursos para a sua manutenção e para as pesquisas. Os preços aumentam descaradamente e não existe inflação, uma façanha das mais difíceis no mundo real.

Pelos índices das pesquisas, aquele deve ser o melhor dos mundos, pois tem governantes muito amados pela população. A essa altura eu já estava dentro do meu próprio sonho. Resolvi dar uma olhada nos jornais. “Motoqueiro metralhado em tentativa de assalto”. “Bala perdida mata menino”. “No interior do país escola só tem aula três vezes na semana por falta de professores”. “Oposição tem sigilo bancário quebrado”. “Aposentado morre na fila de espera do hospital”. “Duelo entre traficantes e polícia fecha o comércio local”. “Drogas passam livremente pela fronteira”. “As faculdades particulares estão muito bem mas os recém formados estão sem emprego”. “Falta armamento, carros e bons salários na polícia”. “Os corruptos estão soltos e muito bem obrigado”. “Criminoso condenado a 30 anos cumpre apenas seis”. Que povo carente esse do meu sonho. Só desgraça.

Mas teve o lado bom desse bendito sonho. O lugar era abençoado pela natureza. Vegetação exuberante, rios caudalosos, fartura de peixes e plantas. Temperatura amena. O povo alegre, legal, “dado”. Um povo bom mas paspalho...pois vota em seu próprio algoz. Ainda bem que era só um sonho.

(*) É jornalista e colaboradora do NCPAM/UFAM.

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