terça-feira, 20 de outubro de 2009

ADIOS LA MERCEDITA


Kleiner Michiles *

O dia 04 de outubro de 2009 seria como um outro dia qualquer se não fosse pela imensa perda que sofreu o continente Sul-Americano, quando faleceu uma de suas mais ilustres filhas que respondia pelo nome de Mercedes Sosa ou “lá Negra” como era conhecida internacionalmente por causa de seus longos cabelos negros, ou simplesmente “Lá Mercedita” como era tratada pelos íntimos. Nascida em 04 de julho de 1935 na Província Tucuman na cidade de São Miguel de Tucuman, noroeste da Argentina, Mercedes começou sua carreira artística aos 15 anos interpretando músicas do cancioneiro popular argentino e logo se destacou pelo belo timbre de voz (contralto), e por suas posições políticas que fazia questão de expressá-las com clareza nas músicas que interpretava.

Em 1959 grava seu primeiro disco Lá voz de lá zafra, em 1960 se torna expoente do movimento musical conhecido como Lá nueva canción, ainda no mesmo ano participa do festival folclórico argentino onde se tornou conhecida e aclamada dos povos indígenas de todas as partes do seu país, que viam-na como porta-voz de seus anseios lutas e sonhos. Daí em diante Mercedes não parou mais em 1965 lança o premiadíssimo álbum intitulado Canciones com Fundamento, trabalho baseado em musicas folclóricas de grande apelo popular, em 1967 embarca para uma turnê nos Estados Unidos e Europa onde obtém fama e reconhecimento internacional.

Em 1970, já de volta a Argentina grava a Cantata Sudamericanas e Mujeres Argentinas belíssimo espetáculo sucesso de publico e de crítica, em parceria com Ariel Rodrigues (música) e Felix Luna (letra), onde o tema é critica social em particular a vidas das camponesas exploradas nos latifúndios do imenso continente Sulamericano. Mercedes foi ainda, melhor interprete da compositora chilena Violeta Parra com quem fez longa parceria, sua voz forte e eloqüente ajudou a imortalizar canções como: Gracias a la vida e Volver aos los 17, também cantou ao lado de nomes da música internacional como: Sting, Andreas Bocelli, Pavarotti, Joan Baez, Pablo Milanês, Caetano Veloso, Chico Buarque, Milton Nascimento, Djavan e outros.

Além do sucesso profissional, Mercedes ainda será lembrada pelo grande ser humano que foi, sua voz seu talento estavam a serviço dos sem voz, dos desvalidos e dos injustiçados como ela mesmo fazia questão de dizer: “não canto para mim mesmo porque carrego um povo em minha voz “ esse povo a qual se referia era o povo Latino Americano com o qual se identificava em qualquer circunstancia em qualquer lugar. Além de defensora ardente da integração dos povos latino americano, Mercedes combateu tenazmente a ditadura militar que se abateu sobre seu país a partir de 1976, com shows, passeatas, discursos inflamados, ela denunciava as situações de arbitrariedade, abuso de autoridade e toda sorte de violência praticadas nesse período sombrio da história de seu país e de toda a América Latina.

Por ter se engajado na luta contra a ditadura em seu país, Mercedes teve muitos dissabores: teve shows cancelados, foi cerceada de todas as formas de manifestar seu pensamento, teve espetáculos invadidos e acabou exilada como tantos outros que como ela se opuseram a todo esse estado de coisas. Porém, mesmo exilada continuou com seu trabalho de denuncia contra os desmandos que vinham acontecendo em seu país. E ao retornar do exílio em Paris em 1982, retoma suas atividades que tem inicio com um aplaudidíssimo show no teatro Colón em Buenos Aires, em 2000 foi nomeada pela UNESCO embaixadora da boa vontade para América Latina e Caribe. Ainda Em 2000, ela ganhou o Grammy de melhor disco de música folclórica por Misa Criolla, feito que iria se repetir em 2003 com Acústico e em 2006 com Corazón Libre. Sua interpretação de "Balderrama", de Horácio Guarany, fez parte da trilha-sonora do filme de 2008 Che, sobre o histoico guerrilheiro argentino Che Guevara. Seu último disco, Cantora, encontra-se indicado a três prêmios Grammy Latino.

Honrarias merecidas a parte, Mercedes nos deixa um legado que mistura genialidade e humildade dedicado a uma causa maior, que não podia ser outra se não a emancipação do ser humano. Seu canto era um canto a liberdade, a igualdade que iluminava as mentes, confortava as almas aflitas e apontava caminhos. Por isso e por muito mais, só tenho a dizer: obrigado Mercedes por sua luta e dedicação a uma causa tão nobre. Adios e descasa em paz!

(*) É Cientista Social formado pela UFAM.

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