domingo, 4 de outubro de 2009

A QUESTÃO FUNDIÁRIA DO PORTO DAS LAJES FORA DO EIA/RIMA



Ademir Ramos *

Os questionamentos formulados resultam das análises que foram feitas nas mesas de discussões organizadas pelos pesquisadores do NCPAM referentes às peças documentais que fazem parte do Estudo de Impacto Ambiental acompanhado do seu Relatório de Impacto do Meio Ambiente (EIA/RIMA) atinentes ao empreendimento a ser desenvolvido pela Lajes Logística S/A sobre a construção de um terminal privativo de uso misto para a movimentação de cargas diversas denominado Terminal Portuário das Lajes, a ser implantado em área localizada próxima ao Distrito Industrial de Manaus, nas imediações do magnífico espetáculo do Rio Negro com Solimões, mundialmente conhecido como Encontro das Águas.

O EIA/RIMA significa a peça vestibular de todo o processo de Licenciamento de Implantação de uma obra “potencialmente causadora de significante degradação do meio ambiente”, conforme determina a Constituição Federal em seu capitulo específico. Para esse fim, segundo o Instituto de Proteção Ambiental do Estado do Amazonas (IPAAM), em parecer técnico n° 0101/08 – GEPE, datado de 15/12/2008, informa que: “foi concedida Licença Ambiental para realização dos estudos visando à concessão de Licença de Instalação”.

Esses procedimentos formais relativos ao Terminal Portuário das Lajes, na prática ocorreram muito depois das tratativas celebradas entre as partes: Governo do Estado do Amazonas, Log-In Logística Intermodal (mineradora Vale mais a Bovespa) representada por outra empresa com nome sugestivo de Laje Logística, que é a comodatária da Juma Participações S/A, proprietária do latifúndio denominado de Fazendinha Ipê. Dessa feita, o EIA/RIMA, que deveria ser a “peça vestibular” transforma-se num arranjo decorativo da farra ambiental promovida pelo poder público e privado no Amazonas.

No entanto, o que deveria ser uma farra para os empreendedores transforma-se numa bandeira de luta para os Amazonenses responsáveis, em particular para as lideranças comunitárias da Colônia Antonio Aleixo, Zona Leste de Manaus, que desde setembro passado vêm enfrentando várias tormentas para fazer valer a integridade do Encontro das Águas e dos Sítios Paleontológico das Lajes, primando pela qualidade de vida dos moradores, que vivem na circunvizinhança do pretendido projeto, bem como para garantir a paz e o equilíbrio dos ecossistemas do Encontro das Águas no coração da nossa Amazônia.

A essa luta somaram-se pessoas jurídica e física, que fazem parte do Movimento S.O.S Encontro das Águas, com objetivo de acordar os desatentos, despertar a cidadania e a responsabilidade ambiental fundamentado na governança ambiental e na ética da responsabilidade promotora de uma relação saudável e justa com a natureza. Nesse contexto, o Ministério Público Estadual tem cumprido com o mandamento constitucional quando por meio de seus operadores tem garantido “a ordem jurídica do regime democrática e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”, convertendo-se na caixa de ressonância dos que protestam contra a construção do Porto das Lajes nas condições presentes impostas aos Amazonenses.

Pelo exposto, passa-se a discutir as questões metodológicas sem a pretensão de reduzir os fatos à viseira dos mandatários corruptos, que se julgam os intérpretes da verdade, simplesmente por defenderem interesses privados em detrimento do coletivo republicano, o que fazem seguido da Mídia Publicitária para convencer a si mesmo de que estão ungidos de boas intenções e virtudes tal como os capetas do inferno de Dante. Não, o contexto é outro.

Aqui a pratica é desconstruir o castelo de cartas do EIA/RIMA do Porto das Lajes para se compreender as interfaces do processo de objetivação daquilo que é e não do que eles, os empreendedores gostariam que fosse. Nessa perspectiva, referenciada no princípio da realidade objetiva é importante afirmar que os estudos apresentados no EIA/RIMA embora sejam dotados de argutas observações empíricas, não dão conta da complexidade do projeto porque sua metodologia de trabalha não contempla a totalidade, mas a soma das partes.

Explico imediatamente, o EIA/RIMA tornou-se um conjunto de relatórios de campo feito por especialistas que encerra em si mesmo suas certezas e dúvidas, sem capilaridade densa que responda a complexidade de um corpo vivo que são os ecossistemas do Encontro das Águas, bem como a constituição paleontológica das estruturas formadores dos Sítios das Lajes. Aliás, nessa circunstancia, o discurso científico é relativizado frente às tratativas políticas dos empreendedores com o Poder Público. Nesses termos, os pesquisadores não têm autonomia nenhuma para propor, transformam-se nos escribas da agência que os contratou.

No caso específico do Terminal Portuário das Lajes, os modelos matemáticos apresentados foram minimizados em favor do estreito interesse de justificar a construção do empreendimento no latifúndio da Juma Participações, alegando “profundidade sempre acima de 15m, estando à jusante dos pontos de atenção à navegação; tem ainda condição privilegiada para a entrega e o recebimento rodoviário, área suficiente para expansões e acesso a infraestrutura adequadas; possui toda a documentação comprobatória de posse e propriedade; esta área é a única que atende às condições para a implantação do projeto do terminal portuário”, a única... e tenho dito.

No entanto, nos relatórios apresentados – Antrópico; Biótico; Caracterização; Físico; Prognóstico; Programas e o RIMA -, em nenhum momento se dá relevância a Questão Fundiária. Apenas, no Físico, no item 2.1 obtemos uma vaga informação quanto à matéria: “o terreno destinado à construção do Terminal Portuário das Lajes está localizado na Alameda Cosme Ferreira, Km 17, no município de Manaus, com área total de 596.464,64 m2. O terreno tem as seguintes fronteiras: ao norte, com a margem direita do Igarapé da Cachoeirinha; a leste, com terras da Fábrica de Papel Sovel; ao sul, com a margem esquerda do rio Amazonas; e a oeste, com o terreno da Alumazon”.

Volta-se à discussão sobre a documentação comprobatória da posse e propriedade acima referida. Consta que no dia 13/10/2008, conforme despacho às fls. 118 dos autos, Processo Administrativo n° 04985.000310/2008-12, em curso, na Gerência Regional de Patrimônio da União no Amazonas junto a Divisão de Gestão Patrimonial (GRPU/DIF/AM), o imóvel em questão foi cadastrado no Sistema Integrado de Administração Patrimonial (SIAPA), sendo atribuído o RIP n° 0255.0100082-33, sob a responsabilidade da empresa Juma Participações S/A com uma área total de 678.393.12 m² e área do terreno da União de 9.765,48 m². Muito mais extensa do que vem sendo informado no EIA/RIMA das Lajes, podendo se mensurar o dano a ser causado ao paisagismo da região.

Todas essas informações foram repassadas ao Movimento S.O.S Encontro das Águas por Diogo De Sant’Ana, Assessor do Chefe do Gabinete Pessoal do Presidente da República. O Memorando encaminhado confirma também o que os moradores do Lago do Aleixo repetem constantemente que: “a referida área encontra quase que completamente em seu estado natural, sobretudo no tocante a área marginal, não havendo obras, aterros, corte quaisquer tipos de modificações no terreno”, alertando a todos para o dano irreparável que está sendo perpetrado contra os ecossistemas do Encontro das Águas e do seu entorno.

O Gerente Regional do Patrimônio da União no Amazonas, João Ricardo de Melo e Lima informa também que “a regularização da área em nome da empresa Juma Participações S/A, continua inalterada e que o processo encontra-se sobrestado na Divisão de Identificação e Fiscalização desta GRPU/AM, aguardando documentos para a transferência do terreno para a Laje Logística S/A”.

Essa informação é valiosíssima para a defesa do meio ambiente Amazônico, data de 10 de agosto passado. Portanto, pode-se deduzir que a luta do Movimento S.O.S Encontro das Águas não tem sido em vão. Pelo contrário, tem “sobrestado” as negociatas dos arrivistas que pretendem depredar o nosso patrimônio. Da mesma forma, os acionistas da Log-In Logística Intermodal podem já ter aventado a possibilidade do projeto ser construído em outro terreno, descartando o regime de Comodato celebrado com a Juma Participações. Pelo sim, pelo não, a luta continua em todas as frentes: jurídica, organizacional, acadêmica, política, buscando apoio internacional junto ao Partido Verde da Comunidade Européia. Participe você também, manifestando também sua indignação e sendo um dos primeiros contribuintes do Fundo S.O.S Encontro das Águas.

(*) Professor, Antropólogo, coordenador do NCPAM/UFAM e participante efetivo do Movimento S.O.S Encontro das Águas.

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