sexta-feira, 28 de agosto de 2009

JORNALISTA NÃO É PROSTITUTA



*Cesar Vandeley

Estamos passando pela semana em que se comemorou o Dia do(a) Jornalista, 7 de abril. Profissional que trabalha para tentar levar à sociedade informações que contribuam para mudar a vida pra melhor. Profissionais que quase sempre tem que trabalhar em dois empregos para manter um nível razoável de vida. Uma vida digna. Profissionais hoje submetidos, quase sempre, a jornadas superiores a oito horas diárias – mesmo quando tem um emprego só, e, principalmente, quando esse emprego é em um jornal.

Nos veículos impressos de Manaus, jornalistas estão na fase anterior à Revolução Industrial: trabalham de dez a 12 horas diárias – quando não ultrapassam essa jornada. E pensam, leitores (imagino os/as pouquíssimos/as leitores que este texto terá), pensam que recebem pagamento pelas horas-extras que realizam? Neca. Os senhores donos dos jornais, auxiliados por alguns e algumas infelizes colegas, prometem folgas que, quase sempre, não são gozadas.

As jornalistas que tem filhos de até seis anos de idade tem direito a auxílio-creche, mas a maioria dos jornais não paga. Quando viaja para cobrir matéria fora do município de Manaus, jornalista tem direito a receber uma graninha a título das horas-extras que eventualmente realize (e sempre realiza) durante a cobertura que vá fazer, mas a maioria dos donos de jornais não paga. Sem falar nos direitos básicos de todo trabalhador, que muitas vezes não são observados: carteira de trabalho assinada, depósito do FGTS, e coisa e tal. Nesse quesito, o Amazonas Em Tempo é hors concours.

O sentimento de vários profissionais que tentam trabalhar com seriedade, muitas vezes é de desânimo, especialmente porque a resistência em não entrar no jogo do poder é visto, por muitos chefes, como fraqueza, falta de visão, de ação. O mais incrível – e triste – é que um número específico de colegas que se deixam corromper, por descrédito num futuro melhor para todos ou mesmo por falta de coragem para lutar, são vistos como heróis. Utilizam da força que adquirem não para apoiar a categoria, mas para massacrá-la ainda mais ou negligênciá-la totalmente.

No exercício da profissão, os jornalistas enfrentam desafios permanentes:

1. para exercitar a força do nosso caráter frente às pressões políticas e econômicas;
2. para manter a dignidade como cidadãos e cidadãs, ganhando o sustento no exercício de um ofício – irrisório sustento;

3. colegas do mesmo veículo, que disputam espaço, porque algumas chefias, de tão submissas ao patrão, não sabem administrar e prestigiar o esforço individual e aproveitá-lo em equipe, criando, em vez de harmonia, competitividade irracional.

A semana, a primeira do mês, iniciou com jornalistas na pauta do Supremo Tribunal Federal (STF). Os 11 ministros começaram a julgar a recepcionalidade ou não da Lei de Imprensa pela Constituição Federal e chegaram a incluir o julgamento da manutenção ou não da exigência do diploma em Jornalismo para o exercício da profissão de jornalista. Este último saiu de pauta. Deverá voltar em maio. Dois ministros chegaram a manifestar voto na questão da Lei de Imprensa, mas a sessão foi suspensa e retornará em uma semana e meia, mais ou menos.

Os donos dos veículos de comunicação (jornais, rádios, TVs, portais na internet) querem a desregulamentação da profissão. Não precisa de diploma, coisa nenhuma. Quem vai dizer quem é ou não é jornalista é o dono da vaga, do emprego.

Aí, meus caros e minhas caras pouquíssimos/as leitores/as, vocês vão ver quem é prostituta, né Ismael. Porque embora jornalista submeta-se a toda essa circunstância, jornalista não é prostituta ou prostituto – que, aliás, prostituta também tem sua ética. Com todo respeito a essas e esses profissionais do prazer. Mas jornalista não vende o corpo. Vende força de trabalho. Especializada. Jornalismo é uma profissão que tem imensa responsabilidade social. É para toda a sociedade que trabalha. Os que, ao vender a força de trabalho, entregam junto a consciência estão enganando o leitor-telespectador-ouvinte. É venda casada. Enganam a própria mãe.

E, infelizmente, não estão sozinhos neste mundo de meu Deus. Quanto advogado vimos, volta-e-meia, preso porque tentou ludibriar alguém ou toda uma coletividade, metidos em quadrilhas de corrupção. Quanto médico deixa gaze dentro do corpo do paciente, opera o membro errado, ganha sem trabalhar. Mas nem por isso podemos sair por aí dizendo que advogados e médicos são pilantras. Contra esses maus profissionais, está sempre pesando a mão dos Conselhos, das Ordens. Mau profissional tem de ser punido com a suspensão da licença para atuar ou mesmo com o impedimento definitivo. Quer fazer o mal? Que faça apenas a si mesmo.

Nós, jornalistas, padecemos as conseqüências de não termos Conselho. Por que outras profissões podem ter e jornalistas, não? Por que a OAB não reprime nem censura os advogados no trabalho diário e o Conselho Federal de Jornalismo reprimiria, censuraria?

São os donos dos veículos de comunicação, caras leitoras e caros leitores, esses sim, que tornam promiscua a profissão, que promiscuem a imprensa e a querem mais promiscuídas ainda e sempre. Não prostituídas. Promiscuídas.

Os profissionais resistem. E resistiram sempre. É a nossa sina.

César Wanderley é jornalista e presidente do Sindicato dos Jornalistas do Amazonas. Colaborou: Joelma Amorim.

Fonte: O AVESSO

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