terça-feira, 22 de dezembro de 2009

A LÓGICA DA AÇÃO COLETIVA NA COP-15

Breno Rodrigo de Messias Leite*

“A COP-15 foi um fracasso...”, “Um acordo pífio marca o termino do evento...”, “Lula e Obama entram em rota de colisão...”, “O naufrágio nas negociações de Copenhague...”. Em linhas gerais e sem razões para otimismo estas foram as principais manchetes dos jornalões no Brasil e no mundo.

Por mais paradoxal que possa parecer, um consenso do não-consenso foi registrado para a surpresa de muitos: os países desenvolvidos (EUA, UE e Japão), em via de desenvolvimento (BRICs, África do Sul, Europeus Orientais e Asiáticos) e pobres/paupérrimos (Africanos, Médio Orientais, Centro e Andino americanos) não entraram em um acordo comum quanto as metas de controle da emissão dos gases causadores do efeito estufa (gás carbônico, metano, hidrofluorcarboneto, perfluorcarboneto, hexofluor sulfuroso e óxido nitroso), das mudanças climáticas e do superaquecimento no planeta.

Para além do encanto de setores da intelectualidade, da imprensa e da comunidade científica internacional de discutir um tema tão nobre e cartesianamente embasado nos laudos técnicos dos cientistas do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, o que realmente está em jogo é a disputa político-econômica pelo controle e ampliação dos recursos financeiros que garantirão por um bom tempo o desenvolvimento econômico dos países.

Por trás dos resultados medíocres é que nenhum país do mundo, por mais voluntarista que possa parecer a sua política de negociação, está disposto a abrir mãos de sua política industrial; do incentivo ao consumo de massa que garante o dinamismo e a expansão do mercado interno e, consequentemente, a arrecadação de impostos. A civilização do petróleo ainda dita as regras do jogo internacional. O interesse nacional é a força motriz dos Estados no contexto da globalização assimétrica.

O que digo não está escrito nas estrelas. Trata-se de uma tese muito forte na Ciência Política dos últimos 40 anos. Ao lado de autores como Anthony Downs, James Buchanan, Gordon Tullock e Kenneth Arrow, o norte-americano Mancur Olson, autor de The Logic of Collective Action, de 1965, fundou as bases de uma interpretação essencialmente egoísta, individualista e realista das relações políticas e econômicas entre os grupos sociais (sindicatos, partidos políticos, associações de toda ordem, grupos empresariais, fazendeiros etc.) no provimento do bem coletivo.

O fundamento da tese de Mancur Olson é que mesmo pertencendo a um determinado grupo, os indivíduos que compartilham os mesmos interesses coletivos, portanto, com um interesse comum ao referido grupo, agem procurando salvaguardar os seus próprios interesses individuais; pois mesmo diante de um interesse comum, os indivíduos não se comportam no sentido cooperativo para a provisão do bem coletivo. Ou seja, os indivíduos racionais buscam apenas maximizar suas rendas de utilidade, direcionando o desempenho do grupo para esse fim específico.

Em suma, pode-se dizer que a ação coletiva é uma ação centrada nos microfundamentos individuais. Este mesmo hobbesianismo teórico de Mancur Olson irmanado à teoria realista das relações internacionais (Edward H. Carr, Hans Morguenthau, Raymond Aron entre outros) permite que possamos entender com mais clareza e profundidade o que a opinião mediana considerou como um fracasso no último encontro em Copenhague.

Trocando em miúdos, o que Olson quer dizer é que mesmo que todos os países queiram salvar o planeta das consequências nefastas do aquecimento global, ainda não estão dispostos a sacrificar seus interesses representados pelas taxas de crescimento dos setores econômicos sem ter como contrapartida imediata a garantia de que não haverá subtração em sua massa de desenvolvimento, ceteris paribus.

Na verdade, o que os países realmente desejam é que seus vizinhos ou concorrentes reduzam significativamente a emissão de gases poluidores. Mas, por sua vez, não estão dispostos a seguir os mesmos passos de seus vizinhos e concorrentes, imprimindo dessa forma o que a teoria dos jogos chama de comportamento do carona (free rider).

Ante este quadro pessimista, seria uma atitude racional do governo norte-americano, que enfrenta simultaneamente duas guerras, quem se encontra em processo de retirada da sua maior crise financeira do pós-guerra, sem falar do galopante crescimento das dívidas internas e externas, ratificar um protocolo que impactaria negativamente no seu desempenho macroeconômico?

E para o governo chinês que precisa alimentar cotidianamente o maior contingente populacional da terra? Daí a razão de se manter taxas astronômicas de crescimento de seu PIB e de sua renda per capita combinando a fórmula do autoritarismo político e economia de mercado.

Por fim, o Brasil, que apesar da retórica eloquente e otimista do presidente Lula, estaria tão comprometido em colocar dinheiro no Fundo Climático Internacional?

A única maneira de se assegura um acordo mínimo entre os países é a intensificação e generalização das catástrofes reais. Os acordos serão levados em conta quando o custo da desordem começar a superar o custo da ordem. Ou seja, quando as catástrofes “naturais” começarem a destruir as principais cidades, quando os níveis dos mares se elevarem inundando toda a infra-estrutura e dizimando vidas humanas, e quando o processo de desertificação inviabilizar a agricultura e aumentar a fome em todos os continentes. Só assim, os países se darão conta das graves consequências das mudanças climáticas no mundo.

Apenas assim, diante de um cenário apocalíptico e onde os líderes mundiais serão eleitoralmente pressionados pelos cidadãos, os políticos poderiam viabilizar uma agenda internacional mais cooperativa e ecologicamente correta.

Pelo andar da carruagem, a COP-16 que será realizada na Cidade do México em dezembro de 2010 está novamente fadada a repetir os mesmos resultados da COP-15.

O que resta saber é se o planeta dará o tempo necessário para uma mudança de estratégia dos negociadores. Sobre este assunto, penso que nem Olson se arriscaria a dar um palpite!

*Mestrando em Ciência Política (UFPA) e bolsista da CAPES.

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